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2 A APRENDIZAGEM E O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DO

2.3 Desenvolvimento profissional do professor

Na sessão anterior, discuti a importância da aprendizagem do professor e trouxe em destaque algumas características desse processo com base em autores que reconhecem que aprender continuamente é fundamental à profissão docente

(CONCHRAN-SMITH; LYTLE, 1999; COCHRAN-SMITH, 2012; JIMENEZ-

ESPINOSA, 2002). Na continuidade das discussões teóricas que fundamentam esta pesquisa, trago pressupostos a respeito do desenvolvimento profissional do professor, os quais se configuram como essenciais para a compreensão desta investigação.

É relevante evidenciar que o conceito de desenvolvimento profissional não possui uma compreensão única, e se constitui em um termo polissêmico, sendo muitas vezes utilizado em documentos oficiais e em textos como sinônimo de formação continuada, e outras vezes utilizado de forma distinta (PASSOS et al., 2006). Alguns cursos ou momentos formativos se valem do termo desenvolvimento profissional como objetivo, justificativa ou princípio da proposta formativa, no entanto a forma como são organizados os distanciam do real sentido desse conceito. Os processos formativos planejados e desenvolvidos numa perspectiva de modelar algo ou alguém de acordo com um determinado padrão que se julga como ideal, realizados num movimento que pressupõe a ação de um sujeito (formador) sobre um objeto de formação (futuro professor ou o professor), nos quais o protagonismo da ação de formar é do formador e não do formando, não se constituem em processos que possibilitam o desenvolvimento profissional docente (PASSOS et al., 2006).

Passos et al. (2006) enfatizam que há pesquisadores que compreendem a formação em um sentido oposto ao citado anteriormente. Ancorados em Bondia- Larrosa (1998), indicam que a formação pode ser concebida como um processo em que o formando se constitui como protagonista da ação formativa e de seu desenvolvimento, embora necessite de instituições e da interlocução com outros sujeitos educativos. Essa concepção considera a formação não atrelada à prescrição de modelos normativos para sua realização (PASSOS, et al., 2006, p. 194). Para Bondia-Larrosa (1998), o desenvolvimento profissional do professor é um processo complexo, que envolve aprendizagem e mudança, e que só ocorre a partir do desejo dos docentes e possui uma forte relação com o trabalho realizado em sala de aula.

A formação que ocorre após a graduação, na perspectiva indicada por Passos et al. (2006), se apresenta como algo contínuo que ocorre ao longo da vida e de modo integrado às práticas sociais e cotidianas de cada professor. Os autores consideram a formação docente:

[...] numa perspectiva de formação contínua e de desenvolvimento profissional, pois pode ser entendida como um processo pessoal, permanente, contínuo e inconcluso que envolve múltiplas etapas e instâncias formativas. Além do crescimento pessoal ao longo da vida, compreende também a formação (teórico-prática) da formação inicial — voltada para docência e que envolve aspectos conceituais, didático- pedagógicos e curriculares — e o desenvolvimento e a atualização da atividade profissional em processos de formação continuada após a conclusão da licenciatura (PASSOS et al., 2006, p. 195).

A formação docente na concepção dos autores é compreendida numa perspectiva ampla: ocorre durante a vida profissional, vai além das atividades acadêmicas dos cursos e ocorre também a partir das interações entre os profissionais na escola, das reflexões sobre a prática pedagógica, das pesquisas para o desenvolvimento das aulas, da participação em encontros e discussões em grupos em diferentes momentos.

Um exemplo de política de formação que tem como referencial o desenvolvimento profissional do professor, mas que, no entanto, não se configura efetivamente como uma possibilidade real desse desenvolvimento, é o Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), instituído pela rede estadual de ensino de São Paulo. Fiorentini e Crecci (2012), a partir da análise da perspectiva de professores de Matemática que lecionam na rede estadual paulista na região de Campinas, sobre práticas de desenvolvimento profissional que vivenciam em cursos de formação continuada promovidos pela Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo (SEESP), observaram que os momentos de HTPC têm sido pouco aproveitados para se constituir em um espaço-tempo efetivo de desenvolvimento profissional dos professores.

Diante da relação estreita existente entre o desenvolvimento profissional e a formação docente e da polissemia desse conceito, Fiorentini e Crecci (2013) realizaram um estudo com o intuito de discutir o conceito de Desenvolvimento Profissional Docente (DPC), tendo por base os usos e significados que têm sido estabelecidos na literatura e na pesquisa. Observaram que esse conceito “tende a ser associado ao processo de constituição do sujeito dentro de um campo específico” (p. 13), estando relacionado a um processo de transformar-se ao longo do tempo ou a partir de uma ação formativa.

Para Fiorentini e Crecci (2013), o termo desenvolvimento profissional docente é polissêmico, porém há concordância entre autores brasileiros e estrangeiros sobre aspectos relacionados ao conceito:

Embora não exista um conceito único de desenvolvimento profissional, há estudos nacionais e internacionais que concordam sobre a necessidade de participação plena dos professores, seja na elaboração de tarefas e práticas concernentes ao próprio desenvolvimento profissional, seja na realização de estudos e investigações que tenham como ponto de partida as demandas, problemas ou desafios, que professores trazem de seus próprios contextos de trabalho na escola (p. 15).

Os mesmos autores, discutindo ainda os usos contraditórios do termo desenvolvimento profissional por parte dos formuladores de políticas de formação docente em Estados e Municípios brasileiros, destacam, ancorados em uma pesquisa realizada por Davis et al. (2011), que grande parte das instituições investigadas pelas autoras focam suas políticas em cursos de formação planejados por especialistas com o intuito de aprimorar os saberes docentes. Tal aspecto é questionado pela literatura, que considera esse modelo de formação basicamente instrumental, não sendo coerente com os pressupostos que fundamentam a formação na perspectiva do desenvolvimento profissional.

Uma vez esclarecida a ideia de que os termos formação continuada e desenvolvimento profissional às vezes são utilizados como sinônimos, mas na realidade são conceitos com características distintas, é possível afirmar que o desenvolvimento profissional possui uma forte relação com a formação continuada. No entanto, nem todo processo de formação continuada possibilita efetivamente o desenvolvimento do professor. Considerando o exposto, importa esclarecer algumas compreensões sobre o desenvolvimento profissional, relevantes para esta tese.

Para Imbernón (2002), o desenvolvimento profissional se configura como “toda a tentativa sistemática de melhorar a prática laboral, as crenças e os conhecimentos profissionais, com o propósito de aumentar a qualidade docente, investigadora e de gestão” (p. 19). Para o autor, a formação é um elemento importante do desenvolvimento profissional, porém não é único e talvez não o decisivo. Evidencia que desenvolvimento profissional e a formação contínua docente são duas faces de uma mesma moeda. Para o autor, a ideia de desenvolvimento profissional está relacionada à concepção de que o professor é um profissional do ensino e ao reconhecimento de que os professores estão em um processo de crescimento pessoal e profissional que não se reduz à aprendizagem de conhecimentos e competências propiciadas por cursos de formação dos quais participam.

Para Imbernón (2002), aceitar o desenvolvimento profissional como equivalente à formação contínua, seria concordar com uma definição de desenvolvimento profissional muito restritiva, pois a formação passaria a ser a única via para o desenvolvimento profissional. Para o autor, além da formação, é essencial

acrescentar nesse processo os aspectos funcionais e laborais que facilitam ou condicionam o desenvolvimento profissional. São eles: a remuneração, o ambiente de trabalho, a estabilidade, promoções funcionais, estrutura organizativa e de gestão, contexto cultural, entre outros aspectos.

O desenvolvimento profissional é discutido também por Day (2005), como um processo que envolve as experiências espontâneas de aprendizagem, naturais e evolutivas, planejadas e conscientes. Para o autor:

O desenvolvimento profissional consiste em todas as experiências de aprendizagem natural e em atividades conscientes e planejadas que pretendem fornecer um benefício direto ou indireto ao indivíduo, grupo ou escola e que, através destes, contribui com a qualidade da educação em aula. É o processo pelo qual, individual ou coletivamente, os professores revisam, renovam, e ampliam seu compromisso como agentes de trocas com os fins morais do ensino, e adquirem e desenvolvem criticamente os conhecimentos, destrezas e inteligência emocional essenciais para a reflexão, planejamento e práticas profissionais adequadas com crianças, jovens e colegas, em cada fase da vida docente (DAY, 2005, p. 17).

Day (2005) indica ainda que o desenvolvimento profissional dos professores é compreendido como um processo contínuo de constituição do sujeito. Nele se inserem a formação inicial e continuada e a interação com os pares e com outras pessoas envolvidas com a educação, assim como a aprendizagem em contextos formais e não formais. Trata-se, portanto, de um processo de “vir a ser, de transformar-se ao longo do tempo” (CRECCI, 2016, p. 58).

Saraiva e Ponte (2003) compreendem o desenvolvimento profissional como um processo complexo em que o professor intervém como um todo, e não em apenas uma ou outra faceta no contexto escolar. Para esses autores, numa sociedade e numa escola em mudança, é necessário que o professor se reconheça permanentemente como um aprendiz, como um agente ativo no seu ambiente de trabalho e disposto a colaborar com seus colegas, seja com relação à prática letiva, seja nos problemas educacionais mais amplos.

O desenvolvimento profissional do professor é estudado também por Fiorentini (2013a), que o concebe como um processo contínuo que se estende ao longo de toda vida pessoal e profissional do docente, com início antes do ingresso na licenciatura e que ocorre em múltiplos espaços e momentos da vida de cada um, envolvendo aspectos pessoais, familiares, institucionais e socioculturais. Para o autor, este é um processo complexo que envolve o professor como uma totalidade

humana, permeada de sentimentos, desejos, utopias, saberes, valores e condicionamentos sociais e políticos.

A partir das considerações apresentadas é possível considerar que o desenvolvimento profissional pressupõe três dimensões importantes: uma vinculada à formação em diferentes perspectivas, que ocorre como um processo contínuo de transformação e constituição do sujeito ao longo do tempo; outra relacionada às aprendizagens que englobam os processos formais e informais, individuais e coletivos, e que podem ocorrer em diversos contextos; e uma mais, relacionada com as condições concretas em que o professor exerce a docência e percebe sua valorização profissional.

É relevante ressaltar que, diante dos desafios encontrados no contexto escolar e da necessidade de aprendizagem ao longo da vida, diferentes autores têm estudado e identificado elementos que potencializam o desenvolvimento profissional do professor (DAY, 2005; PONTE, 1998; PONTE; OLIVEIRA, 2002; SARAIVA; PONTE, 2003; PASSOS et. al, 2006; FIORENTINI, 2013a).

O desenvolvimento de práticas como o estudo em contextos