• Nenhum resultado encontrado

2 A APRENDIZAGEM E O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DO

2.1 A Formação dos professores da infância

Inicio este capítulo tecendo considerações relativas à formação de professores que lecionam no início da Educação Básica, pois estes são os docentes responsáveis pelo ensino e pela aprendizagem da Matemática na Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental. No Brasil, a habilitação necessária para que o professor possa atuar no início da Educação Básica é a graduação em Pedagogia, embora em outros momentos tenha sido possível que sua formação se desse por meio de cursos como o Ensino Médio – Magistério7 e Normal Superior8.

No Brasil, os cursos de graduação em Pedagogia, além de habilitar para a docência em turma de início da Educação Básica e da Educação de Jovens e Adultos (EJA), têm como prerrogativa promover a formação para a gestão educacional. Diante da multiplicidade de possibilidades de atuação dos pedagogos, há uma grande complexidade na organização curricular desses cursos e uma dispersão de disciplinas em decorrência do número de horas prescrito para eles, bem como dos objetivos de formação a que estes se propõem (GATTI, 2010).

7 A habilitação específica de 2º grau para o exercício do magistério de 1º grau (HEM) foi instituída

pelo parecer MEC n. 349/72 (BRASIL, 1972). Em 1982, foi lançado o projeto de criação dos Centros de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério (CEFAM) que também habilitavam para o magistério em 2º grau (SAVIANI, 2009).

8 De acordo com o Parecer CNE 115/999, o Curso Normal Superior foi criado com o intuito de formar

profissionais para atuarem no magistério da Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental (BRASIL, 1999).

Para conhecer as características gerais dos cursos de Pedagogia no Brasil, Gatti e Nunes (2009), realizaram um estudo a partir de informações encontradas no Ministério da Educação e em documentos disponibilizados por instituições de ensino que oferecem esse tipo de graduação. Ao analisar o conteúdo das ementas das disciplinas dos cursos, as autoras observaram diversos aspectos que merecem atenção no que se refere à formação desse profissional, especialmente para o trabalho com o ensino e a aprendizagem nos anos iniciais da Educação Básica.

Gatti (2010) sintetiza a análise das ementas de disciplinas dos cursos de Pedagogia no estudo citado anteriormente, e destaca que:

 A análise das ementas revelou que, mesmo entre as disciplinas de formação específica, predominam as abordagens de caráter mais descritivo e que há menor preocupação em relacionar adequadamente as teorias com as práticas;

 As disciplinas referentes à formação profissional específica apresentam ementas que registram preocupação com as justificativas sobre o porquê ensinar; entretanto só de forma muito incipiente registram o que e como ensinar;

 A proporção de horas dedicadas às disciplinas referentes à formação profissional específica fica em torno de 30%, deixando 70% para outro tipo de matérias oferecidas nas instituições formadoras; cabe a ressalva já feita na análise das ementas, segundo a qual, nas disciplinas de formação profissional, predominam os referenciais teóricos, seja de natureza sociológica, psicológica ou outra, com associação em poucos casos às práticas educacionais;

 Os conteúdos das disciplinas a serem ensinadas na Educação Básica (Alfabetização, Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia, Ciências, Educação Física) comparecem apenas esporadicamente nos cursos de formação e, na grande maioria dos cursos analisados, eles são abordados de forma genérica ou superficial, sugerindo frágil associação com as práticas docentes;

 Poucos cursos propõem disciplinas que permitam algum aprofundamento em relação à educação infantil (GATTI, 2010, p. 1371-1372)

Para a autora, essas constatações possibilitam inferir que a parte curricular que propicia o desenvolvimento de habilidades profissionais específicas para a atuação na sala de aula é bem reduzida nos cursos de Pedagogia de maneira geral, e que há certa insuficiência formativa para o desenvolvimento do trabalho da docência. Essa multiplicidade de possibilidades de atuação a partir de um único curso de graduação coloca em evidência a problemática da formação inicial do professor e o desafio em se organizar um currículo que contemple todas essas questões.

Diante do cenário sobre a graduação em Pedagogia descrito por Gatti e Nunes (2009) e Gatti (2010), é relevante considerar que a formação inicial dos professores para o trabalho com a Matemática na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental tem sido insuficiente para suprir as demandas de ensino presentes no contexto das escolas.

Para exemplificar essa situação, citamos a pesquisa de Almeida (2009) que procurou investigar a formação inicial matemática de alunos concluintes de um curso de Pedagogia de uma universidade pública, e analisar se a formação ofertada teria condições de preparar os estudantes para o exercício da docência em Matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Os resultados desse estudo indicaram que o curso oferece uma única disciplina de 68 horas destinada à Matemática, o que equivale a 2% da carga horária total da formação. Verificou ainda que os aspectos relacionados à Geometria, às Grandezas e Medidas e ao Tratamento da Informação foram pouco abordados na disciplina. O estudo apontou também que a formação pedagógica para o ensino da Matemática pareceu estar restrita à utilização de materiais concretos. Numa atividade de resolução de problemas, a autora verificou ainda que os futuros professores apresentaram dificuldades nos conteúdos que terão de ensinar aos seus alunos, com destaque para: cálculo de áreas de superfícies planas, trabalho com frações, porcentagens, cálculo de volumes de sólidos, interpretação e resolução de problemas simples envolvendo adição e multiplicação de números naturais e racionais.

Outro estudo envolvendo a formação matemática de futuros professores que atuarão com crianças em início de escolarização foi realizado por Costa e Poloni (2012). O objetivo do estudo foi investigar percepções de alunos concluintes do curso de Pedagogia em relação ao preparo para a docência de Matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Os resultados indicaram, entre outras questões, que os formandos dos cursos pesquisados não se sentem preparados no que diz respeito a alguns conteúdos matemáticos, a saber: Operações com Frações, Geometria, Grandezas e Medidas e Tratamento da Informação.

Estudiosos da área da Educação Matemática também vêm indicando aspectos preocupantes relacionados à formação matemática nos cursos de Pedagogia, tanto com relação à carga horária de estudos destinada à disciplina

quanto ao modo como algumas disciplinas da área têm sido trabalhadas nesses cursos.

Nessa perspectiva, Nacarato, Mengali e Passos (2011) afirmam que os estudantes de Pedagogia têm tido poucas oportunidades de ter uma formação em Matemática que os permita enfrentar as atuais exigências da sociedade, e que, quando ocorre formação, ela é pautada apenas em aspectos metodológicos. Corroborando essa afirmação, Grando e Torricelli (2012, p. 68) ressaltam que “existem poucas discussões sobre a Matemática necessária à formação do pedagogo e, geralmente, tais discussões ficam pautadas na resolução de exercícios, sem reflexões sobre seu ensino, sobre seus fundamentos e sua filosofia”. É possível compreender que os cursos de graduação não conseguem suprir todas as necessidades que o professor terá no desenvolvimento da docência. Porém considero essencial que estes possibilitem ao futuro professor o contato com o maior arsenal de aprendizagens consistentes que venham a auxiliá-lo em sua prática futura, tanto no que se refere aos aspectos teóricos, quanto às reflexões e abordagens metodológicas e práticas.

De outra parte, é importante afirmar que, se existe clareza de que a formação inicial é de fato inicial, finalizar um curso de graduação não é suficiente, embora necessário, para uma boa prática profissional (DAY, 2005). A partir daí se observa a importância de novos e diferentes momentos e espaços em que professores possam aprender e se desenvolver profissionalmente, fato que faz emergir a necessidade da formação continuada.

Entretanto considero importante ressaltar que a formação continuada não pode ser compreendida numa perspectiva de acúmulo de conhecimentos ou de complementariedade do sujeito, como cursos de aperfeiçoamento ou atualização que possam vir a fazer. O professor aprende a profissão em contextos formais e não formais de ensino (DAY, 2001). Os diferentes sentimentos, afetos e valores que são agregados ao ser professor também são impregnados das interações com as pessoas em diferentes comunidades (CRECCI, 2016).

A perspectiva de sujeito neste trabalho está ancorada na concepção de Bakhtin (2003), para quem “o sujeito como tal não pode ser percebido e estudado como coisa, porque, como sujeito e permanecendo sujeito, não pode tornar-se mudo; consequentemente, o conhecimento que se tem dele só pode ser dialógico”

(p. 400). Nesse sentido, é fundamental dar voz ao sujeito, o que significa trabalhar com suas linguagens, suas expressões de sentidos e, como afirma o autor, pressupor um processo dialógico.

Axt (2008) entende a formação numa perspectiva dialógica que pressupõe dar voz ao sujeito da linguagem, o qual pode ser entendido também como o sujeito da educação, trabalhando com suas linguagens, suas expressões de sentidos, e “também com os sentidos produzidos nos contextos historicizados, em que os sentidos se produzem enquanto efeito das misturas nos coletivos e no entrecruzamento com outros sentidos” (p. 97).

Nessa perspectiva, o processo formativo do professor é decorrente das diferentes oportunidades em que o conhecimento sobre ensinar e aprender seja produzido também por ele, num processo dialógico, o que possibilitará que aprenda e se desenvolva profissionalmente.