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Neste tópico, serão apresentados os detalhes que particularizam a TVi e no final será esboçado um modelo funcional com alguns parâmetros que, ao nosso ver, são os essenciais para analisar as propostas dos capítulos seguintes. Antes de adentrarmos na TVi, deve ser esclarecido que neste texto será considerado “TV tradicional” aquela de transmissão analógica (por cabo, ar ou satélite) cujo modelo de distribuição é o broadcast, ou seja, um emissor para muitos receptores.

Afinal, o que é TV Interativa? Edward Schwalb afirma que TV interativa “pode ser

vista como a próxima evolução, uma fusão da Internet e a TV Digital” (Schwalb 2004: 1). Vários textos na imprensa e mesmo autores acadêmicos costumam usar apenas o termo “TV Digital”, sem incluir o termo interativo, por exemplo, “o termo TV Digital foi adotado pelo

FCC para descrever suas especificações para a próxima geração de transmissão de televisão broadcast” (Pagani 2003: 54). Já Lugmayr et al (2004) explica que TV digital é

mais do que apenas vídeo comprimido, melhor qualidade de imagem e interfaces humanas. Consumidores são encaixados e cercados por serviços com softwares transparentes e invisíveis, dispositivos fáceis de usar, para onde quer que se dirijam, a qualquer hora que queiram. Simplificando, TV digital é um “novo ambiente – sem fio – imersivo” (Lugmayr et al 2004: 137).

Lugmayr e Pagani chamam o meio de TV digital mas ambos não incluem o termo “interatividade”, o que dá a entender que o fato de ser digital torna a TV interativa, mas não é bem assim. Pelas definições acima podemos enumerar algumas questões que podem gerar confusão: TV digital é diferente de TVi? O que representa o termo “digital” nas definições acima? TVi é TV mais Internet? O que é vídeo comprimido? O que é TV móvel, sem fio, em qualquer lugar e qualquer hora? O primeiro passo para tentar compreender e responder a todas estas questões é separar cada um dos elementos que podem contribuir para a confusão.

O termo “interativo” já foi tratado anteriormente, vale apenas lembrar que a TV pode ser interativa sem ser digital, há vários exemplos disso, discutidos no item 1.1.2. Dessa forma, a primeira questão pode ser considerar respondida, ou seja, a TV tradicional, assim como a TV digital e TV de alta definição (HDTV), são diferentes do que aqui é considerado TV interativa (TVi). É possível ter interatividade na TV tradicional, da mesma forma que é possível ter TV digital sem interatividade. Assim, não é ser digital nem ter interatividade que define a TVi. Com toda a amplitude que tem, a definição de Gawlinski para a TVi parece ser a mais apropriada:

TV interativa pode ser definida como qualquer coisa que permita que os telespectadores se engajem em um diálogo com o pessoal que faz um canal de TV, um programa ou um serviço. Mais especificamente, pode ser definida como um diálogo que leva os espectadores além da experiência passiva de assistir e os permite fazer escolhas e tomar ações – mesmo que tais ações sejam tão simples como preencher um cartão postal e enviá-lo pelo correio, ou desenhar uma imagem na tela da televisão (Gawlinski 2003: 5).

Pela definição de Gawlinski até o fato de enviar uma carta resposta para a emissora de TV é uma ação interativa. Desenhar na tela da TV em resposta ao pedido do personagem também é TV interativa, de forma que podemos deduzir que Gawlinski considera que existem diferentes graus de interatividade, assim como faz Ryan (2005a) e que foi discutido acima. Para que este trabalho flua sem ficar retornando à questão da interatividade, assume-se que

TVi é um ambiente dos meios digitais que permite aos usuários manterem um diálogo individualizado com uma emissora, um programa ou um serviço, mediante agência sobre aplicativos interativos.

Dessa forma, para o presente trabalho, quando um programa da TV tradicional trava diálogo com um telespectador não é TVi, é um programa de TV com uma dinâmica interativa. E um canal de TV digital que não permite ao usuário manter um diálogo através de interfaces na tela da TV não é TVi, é TV com transmissão digital. É possível ter HDTV interativa como também é possível ter HDTV sem interatividade alguma (Schwalb 2004: 6). Quando a HDTV permite interatividade, ela é TVi, caso contrário, é TV digital de alta definição. Um aparelho celular de terceira geração (3G) poderá receber sinal de TV digital, assim, se nesses celulares acontecer alguma interatividade com o programa da TV, será considerado TVi. Caso os celulares apenas recebam o sinal de TV, sem permitir uma forma de interatividade, será considerado apenas TV móvel (TVm). O fato de este trabalho fazer esta distinção não quer dizer que estão errados os que usam o termo TVi para designar TV Digital, HDTV ou TVm. Essa é uma convenção assumida em função de que o que se busca aqui é compreender o usuário como um elemento ativo na comunicação, como alguém que trava um diálogo em tempo real com duas classes de programas da emissora, as narrativas e os jogos. Interação através de cartas para emissora, como permite a definição de Gawlinski, não é o tipo de experiência que o presente trabalho quer retratar. Nem aquelas experiências em que o telespectador telefona para a emissora, por dois motivos. O primeiro é que nenhuma emissora poderia conversar com milhões de telespectadores simultaneamente. Alguém pode argumentar que o telespectador não precisa se comunicar verbalmente, ele pode “votar” pelo telefone, como aliás tem acontecido. Até mesmo as duas classes de programas que se pretende

analisar aqui tem sido em algum grau interativas. Há programas ao vivo em que os apresentadores mudam instantaneamente a programação de acordo com o índice de audiência com a finalidade de suplantar a concorrência. Já as novelas têm sofrido alterações de diversas formas ao sabor das pesquisas. É sabido e freqüentemente noticiado que autores de novelas modificam a trama, a ênfase num núcleo dramático, o comportamento de personagens de uma novela, entre outras coisas, em função do sucesso e da aceitação do público. Nesses casos o canal de retorno é sempre o índice de audiência que pode ser imediato, como no caso dos programas ao vivo. Então, o segundo motivo é que, pelo menos nos casos vistos até o momento, o voto ou a aceitação do telespectador é apenas mais um entre milhões, e o que as emissoras têm feito é computar todos esses votos juntos, em tratamentos estatísticos, sem considerar um espectador individualmente. Colocando em termos de “agência”, visto anteriormente, nesses casos o espectador tende a experimentar a sensação de ter “opinado” e não de ter “agido”. Não há a sensação de ter realizado alguma ação que realmente influenciou no resultado, que modificou o conteúdo e o ambiente. É uma opinião diluída entre milhões de outras, e não parece que a opinião singular de um telespectador tenha feito diferença entre milhões de outras opiniões. Voltamos à questão dos graus de interatividade, que é inevitável.

O que nesta pesquisa é assumido como TVi difere da “TV tradicional com feedback”, qualquer que seja a forma desse feedback, porque na TVi “cada telespectador” tem um dispositivo que cuida de sua interação em particular, localmente. Mais ainda, este dispositivo pode cuidar de estabelecer e manter um diálogo com a fonte da mensagem, em tempo real ou praticamente real. Os tratamentos particulares, diretos e imediatos da interação é o que define a TVi no presente texto. Ao menos nos tempos atuais, com a tecnologia disponível, esse tratamento particular da interação só é conseguido em ambientes digitais, através de aparelhos ou dispositivos com capacidade computacional. Além de ser computadorizado, para que o usuário mantenha um diálogo direto com a emissora, é necessário que esse aparelho ou dispositivo esteja conectado de alguma forma a uma “rede digital” que permita fechar o laço de retorno com a emissora. Chega-se assim à segunda questão apontada anteriormente: o que representa a palavra “digital” em termos como “redes digitais”, “TV digital” etc?