• Nenhum resultado encontrado

1.1.6 – Outras características e diferenças

Há vários pontos que distanciam e que aproximam hipermídia da TVi. Isto acontece em função de ambas serem instâncias dos “novos meios”, de funcionarem em redes de computadores, de permitirem interferência do usuário, de trabalharem com dados na forma digital, dentre outras. As similaridades e diferenças mais importantes foram destacadas nos tópicos anteriores, no entanto, há ainda outras diferenças, por exemplo, no que diz respeito à forma como o usuário pode interferir num programa de TVi e na hipermídia, assunto geralmente tratado como “usabilidade”. A diferença mais importante é que numa interface dentro de um computador pessoal o usuário tem um apontador, guiado geralmente por um mouse, enquanto na TVi não existe o apontador. Uma interface de hipermídia pode ser sensível à entrada do apontador em uma determinada área, por exemplo, mas isso não ocorre

na TVi. A TVi foi pensada para trabalhar da forma mais simples possível, portanto, a interatividade na TVi se dá através de botões no controle remoto. Existem dispositivos adicionais com as quais o STB poderá trabalhar, por exemplo, teclados, joystick, etc, que podem ser agregados para melhorar a usabilidade, mas são exceções e do usuário padrão não será exigida a obtenção de tais acessórios. Isso em parte explica porque páginas da Internet podem não funcionar na TVi. Por exemplo, na TVi objetos não são arrastados e soltos (drag-

and-drop – operação comum nos PCs), objetos são selecionados através de botões no controle remoto. Mais sobre usabilidade, ver Gawlinski (2003: capítulo 5).

Um aspecto que diferencia demasiadamente hipermídia de TVi é o aspecto da produção de conteúdo. Uma centena de páginas de hipermídia pode ser criada por uma pessoa com razoável conhecimento técnico e algum dom artístico, ou por uma pequena equipe. Fazer TV é uma atividade cara e qualquer espetáculo televisual de qualidade exige alto investimento e uma equipe técnica especializada. Fazer TVi é um processo ainda mais caro, demorado e complicado, como mostra Gawlinski (2003: 141-198). Segundo ele, aplicativos interativos para a TVi são construídos usando processos de produção de TV, que vêm sendo refinado por 50 anos, associado à produção de software e à produção de sites para a Internet, e estes últimos itens podem requerer meses de trabalho de múltiplos programadores (ibid: 143). Em função da facilidade de produção, um conteúdo em hipermídia pode ser gerado, atualizado e distribuído por um pequeno grupo de pessoas, o que faz com que se espalhe numa teia de informação que cresce continuamente. Já a característica da TV é centralizar a geração e a distribuição do conteúdo televisual. Os aplicativos interativos na TVi são disponibilizados por provedores de serviços interativos que operam em conjunto com as redes emissoras, operações que demandam grande organização, envolvem sintonia e grandes quantidades de dinheiro (ibid). Na melhor situação, uma rede broadcast de TVi dilui o custo da produção de um conteúdo televisual interativo disponibilizando-o em outra plataforma ou outra emissora.

Outro aspecto que realça a diferença entre a experiência de assistir TV e a de navegar na hipermídia diz respeito às telas das TVs e aos monitores dos PCs. Parece ser apenas um aspecto técnico construtivo, mas Gawlinski explica que pode não ser. Segundo ele, a distância usual de um telespectador à tela da TV varia entre 2 e 3,5 metros e isso significa que a tela da TV geralmente preenche menos espaço na retina do usuário que os monitores de computador, dos quais os usuários geralmente ficam a menos de um metro. Atividades na sala podem facilmente distrair o telespectador, assim, o criador de conteúdos para TV deve se esforçar muito mais para ganhar a atenção do telespectador do que aquele que cria conteúdo para o

computador; além do que, o usuário de computador já senta na frente do monitor com outra postura, mais concentrado, buscando informação Gawlinski (2003: 206-213).

Além disso, a tela da TV faz varredura entrelaçada. Quando a TV foi criada, para baratear custos com a eletrônica, os tubos de raios catódicos montavam as linhas da imagem em ordem alternada, primeiro linhas impares, depois linhas pares. Por isso as transmissões de TV analógica ainda hoje seguem esse padrão. O entrelaçamento, dentre outras coisas, faz com que detalhes pequenos cintilem na tela, especialmente linhas horizontais. Isso potencializa o problema da apresentação de textos na tela da TV. Assim sendo, textos nas telas de TV devem ser grandes para garantir boa leitura.

Outro detalhe é que o formato dos pontos da imagem (pixels) nos computadores é quadrado enquanto na TV é retangular, isto faz com que, por exemplo, um círculo que se mostra perfeito na tela do computador apareça oval na TV.

Outro problema é que aparelhos de TV de marcas diferentes mostram áreas diferentes da mesma imagem, ou seja, nem todo aparelho de TV consegue mostrar na totalidade a imagem transmitida pela emissora. Para garantir que o conteúdo relevante da imagem será visto, costuma-se guardar uma margem de segurança em torno da área da imagem criada para a TV, geralmente 10% de cada lado da tela. Em contrapartida, toda a área da tela do monitor do PC tem sido usada pelas interfaces dos aplicativos, e boa parte do conteúdo dessas telas hipermidiáticas são detalhes pequenos, que os designers não se preocupam em evitar.

Há ainda que se considerar o problema das cores, porque a TV é mais limitada para mostrar cores do que os monitores dos PCs. Na TV cores muito saturadas quando colocadas lado a lado costumam borrar as bordas que as separam. Para saber mais sobre as diferenças técnicas sobre monitores e telas de TV mostradas acima, ver Gawlinski (2003: 218-222).

Todos esses detalhes técnicos e intrínsecos às tecnologias acabam se refletindo na experiência estética, na produção e reprodução de conteúdo nos ambientes de hipermídia nos PCs e na TV. Com a chegada das TVs de alta definição (HDTV) não entrelaçadas, pode-se argumentar que ficam resolvidos os problemas de baixa definição e entrelaçamento das TVs. De certa forma sim, mas enquanto não forem substituídos todos os aparelhos de TV padrão atuais, coisa que no Brasil deverá demorar, não teremos resolvido a questão de usar TV para acessar páginas de hipermídia dos PCs. Segundo levantamento do IBGE (PeNAD 2002), dos 45 milhões de aparelhos de TV que recebem TV aberta no Brasil, metade são TVs de 14 polegadas. Entrar em questões da implantação da TVi no Brasil foge do escopo do presente trabalho, mas fica o registro, para reflexão.