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O TIPO DE DIRECÇÃO — UM VALOR HISTÓRICO

A direcção colectiva e o trabalho colectivo, tal como hoje existem no nosso Partido, jamais poderiam ter resultado de uma mera decisão. Direcção colectiva e trabalho colectivo, tal como existem no nosso Partido, são resultado de um processo longo e irregular, em que intervieram e se somaram numerosos fac- tores.

Os métodos e o estilo de trabalho não são valores intem- porais, absolutos, invariáveis e imutáveis. Estão inevitavelmen-

te relacionados com as condições objectivas em que o Partido actua, com o próprio processo de criação e desenvolvimento do Partido, com o seu desenvolvimento político e orgânico, com a preparação e experiência dos quadros.

As características da direcção colectiva e do trabalho colec- tivo do nosso Partido na actualidade aparecem como seguimen- to e resultado de toda uma longa história e de uma longa e diversificada experiência.

Se examinarmos a evolução do Partido que se verifica? No curto período de legalidade, desde a criação do Parti- do em 1921 até ao golpe militar de 28 de Maio de 1926, reali- zaram-se dois congressos, foram eleitos comités centrais, mas pouco se conhece do funcionamento interno da Direcção.

De 1926 a 1931, o Partido não teve qualquer actividade re- gular. Apenas alguns grupos de camaradas discutiam, sem qual- quer base orgânica nem qualquer actividade política, a pos- sível reorganização nas condições da clandestinidade. Quando da reunião de 1929, que decidiu reactivar o Partido, havia 3 ca- maradas que se consideravam do Comité Central, sem entretan- to desenvolverem qualquer actividade.

Desde a reorganização de 1931 até à prisão de Bento Gon- çalves, secretário-geral do Partido, em Novembro de 1935, a direcção cabia exclusivamente ao Secretariado. Não existia Comi- té Central, nem qualquer outro organismo de direcção central. Mesmo dentro do Secretariado, a direcção estava partilhada — não era colectiva. Bento Gonçalves dirigia o trabalho político em grande parte por decisão individual. Assim, no VII Congresso da Internacional Comunista, a sua intervenção corrigiu pro- fundamente a linha política até então seguida, mas não foi re- digida em Portugal, nem resultou de uma apreciação colectiva com outros quadros. Foi redigida em Moscovo, em conformi- dade com as Teses apresentadas ao Congresso pelo Executivo da Internacional.

Depois da prisão de Bento e de todo o Secretariado, se- guiu-se um período (1935-1938) em que os militantes mais responsáveis que ficaram em liberdade procuraram soluções

para o trabalho de direcção. Fizeram uma reunião de quadros (1936) de que saiu uma primeira e logo gorada tentativa de formação do Comité Central. Formaram um novo Secretariado logo atingido pela repressão (prisão de Manuel Rodrigues da Silva). Constituíram depois novo Secretariado, logo também atingido por um sério golpe (Janeiro de 1938) que mergulhou o Partido numa crise profunda.

Com a reorganização de 1940-1941 formou-se um primei- ro organismo colectivo (Bureau Político), ao qual sucedeu um Secretariado com poderes fortemente centralizados, que pouco depois foi atingido com a prisão de 2 dos seus 3 membros (Fo- gaça e Militão, em Setembro e Novembro de 1942).

Pode dizer-se que foi a partir dessa data que se iniciou o processo, que será ainda longo e acidentado, da criação de uma direcção estável e colectiva.

No Secretariado passou a haver trabalho colectivo e, pou- co a pouco, constituiu-se um núcleo dirigente que, reforçado com novas gerações de quadros, viria a assegurar no fundamen- tal, até hoje, a continuidade do trabalho partidário.

Neste processo, representou importante papel a realização do III Congresso do Partido (Novembro de 1943), primeiro congresso realizado na clandestinidade. Pela primeira vez na clandestinidade se forma um Comité Central eleito em congres- so e pela primeira vez (com exclusão da episódica experiência de 1936) o Secretariado não resultou de cooptação, mas de eleição pelo Comité Central.

A realização de reuniões do Comité Central em 1945 e 1947 e o IV Congresso do Partido (Agosto de 1946) prosseguiram um tal caminho, consolidando, ao nível da direcção central, o tra- balho colectivo do Secretariado assente num Comité Central cada vez mais alargado.

Devido aos violentos golpes da repressão que atingiram o Partido, designadamente o Comité Central, que chegou a ficar reduzido a 6 camaradas em liberdade, a defesa do Partido e a necessidade de sobrevivência do seu núcleo dirigente condu- ziram de novo a um forte centralismo, em que se manifestaram

abusos de métodos administrativos, designadamente no trata- mento de problemas de quadros.

Como reacção natural contra tal situação, o V Congresso, realizado em 1957, estimulado também pelo desvendar do culto da personalidade de Stáline e de todas as suas negativas conse- quências, instituiu normas de democracia interna e inseriu-as nos Estatutos do Partido então aprovados. Entretanto, a oposi- ção ao centralismo e um novo desvio de direita na orientação política — repondo aspectos da «política de transição» que ti- nha sido superada — conduziram a um falso democratismo ul- teriormente criticado como uma «tendência anarco-liberal na organização do trabalho de direcção».

Através de todas estas situações, destas duras batalhas, des- tas soluções diversas e das suas experiências, foi-se forjando um núcleo dirigente de revolucionários dedicados e submetidos às mais variadas provas, e foi-se progressivamente enraizando na Direcção Central do Partido o hábito do trabalho colectivo e da responsabilidade colectiva nos organismos superiores do Partido. O trabalho de elaboração do Programa do Partido em 1964- -1965, os longos debates realizados com a participação de cen- tenas de militantes e, finalmente, a realização do VI Congresso em 1965, culminando esse trabalho, constituíram as primeiras sólidas experiências do trabalho colectivo alargado ao Partido e consagraram definitivamente no PCP os métodos de direcção colectiva.

Nos anos decorridos até ao derrubamento da ditadura fas- cista no 25 de Abril, o caminho do trabalho de direcção não foi fácil. Mas a realização de sucessivas reuniões plenárias do Comi- té Central e os documentos delas saídos mantiveram as gran- des linhas de orientação e aspectos fundamentais da prática do trabalho colectivo na Direcção.

Esta experiência revelou-se fundamental para o desen- volvimento da vida interna após o 25 de Abril.

Saído da clandestinidade, empenhado na luta revolucioná- ria pela transformação política e social, o carácter colectivo da Direcção e o trabalho colectivo do Partido encontraram terre-

no extremamente favorável para o seu enriquecimento e desen- volvimento progressivo, de forma a tornar-se numa caracterís- tica e num traço essencial da Direcção, da vida orgânica e do estilo de trabalho do PCP.

FORMÇÃO DO NÚCLEO DIRIGENTE