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objeto ↔ atividade ↔ sujeito,

ZONA PROXIMAL DE DESENVOLVIMENTO NAS DIFERENTES PESQUISAS

1.2.3. Discussão e formação crítica

Nesta seção, defino a discussão como forma de ensinar e de desenvolver o pensamento crítico, e as perguntas como instrumento de mediação semiótica na formação do profissional crítico, com base em Brookfield (1987), Freire (1970) e Giroux (1997). Freire (1970), afirma que as perguntas são importantes na formação da consciência crítica e do conhecimento verdadeiro. Para ele, o mundo pode e precisa ser mais justo, mais bonito e mais democrático e a educação é o caminho para a libertação. Ela pode resgatar a condição humana, atuando contra os efeitos da opressão, contribuindo para a humanização.

Em sua obra “Pedagogia do Oprimido”, ele argumenta que vale a pena lutar pela democracia, que a educação crítica é um elemento básico para a mudança social e que a ideologia política é inseparável de nossa compreensão do mundo, do poder e da vida moral que aspiramos ter. A sua grande inspiração, nesta obra, foi a elaboração de uma teoria de mudança social e compromisso, para que os cidadãos pudessem se tornar sujeitos da história e agentes críticos de seu próprio destino.

Nessa mesma linha, Brookfield (1987) comenta que, para os sujeitos desenvolverem o pensamento crítico, é necessário, em primeiro lugar, que haja um espaço, onde eles se sintam livres para se colocar, para expressar suas idéias e seus pontos de vista. Cada sujeito traz para este espaço as suas experiências e suas histórias, que são socialmente construídas e que passam a fazer parte do mesmo. Portanto, no caso das sessões reflexivas, o coordenador, precisa encorajar os participantes a falar de suas experiências que demonstram como foram constituídos, como pensam e agem. Entretanto, essas experiências precisam ser problematizadas para que possam ser instrumentos de aprendizagem e desenvolvimento, para que haja um movimento na zona proximal de desenvolvimento da atividade.

A discussão na sessão reflexiva é, então, uma forma de viabilizar o processo de desenvolvimento do pensamento crítico, revelando a diversidade de opiniões sobre assuntos complexos e permitindo que o conhecimento cotidiano seja parte integrante da sessão reflexiva. A discussão é, assim, um processo democrático, do qual todos podem participar e se expressar, argumentar e contra-argumentar, respeitar a opinião do outro, etc. Assim, a sessão reflexiva pode ser um lugar onde os participantes aprendem a se colocar, a discutir idéias. Por isso, quando os participantes percebem que suas opiniões têm valor e são levadas em consideração, não há como prever as diferentes perspectivas que podem aparecer na sessão reflexiva. Para que isso aconteça, Giroux (1997) enfatiza ser necessário que o professor/coordenador da sessão reflexiva:

• esteja consciente de seu papel, fazendo perguntas para dar prosseguimento ao assunto, parafraseando quando a opinião não está clara e fazendo a ligação de uma idéia com outra; • e os participantes prestem atenção no que o outro diz, já que

muitas vezes o professor/coordenador não tem paciência para ouvir a opinião dos participantes, levando-a em consideração, por sentir-se ainda como detentor do saber;

• e os participantes tenham humildade para perceber que sempre aprendemos uns com os outros;

• e os participantes se preocupem com o desenvolvimento de cada um. A sessão reflexiva/sala de aula colaborativa é aquela na qual participantes e professor/coordenador se responsabilizam pela aprendizagem do outro e

• e participantes tenham boa vontade para discutir, trazendo para a cena evidências, dados, argumentos e contra- argumentos.

Além do processo democrático, a discussão é crítica, conforme comentado por Giroux (1997), quando os participantes tomam parte com mentes abertas e dispõem-se a argumentar e contra-argumentar, quando a voz é dada a eles, para que possam falar de suas experiências sociais, falar das diferenças e discutir tópicos que fortaleçam a cidadania. Ser ouvido é ser respeitado. Quando falamos e não somos ouvidos, sentimos que não temos voz, que estamos sendo ignorados e desrespeitados.

A educação problematizadora com base nas perguntas, também é defendida por Freire (1970), que afirma ser esta capaz de levar o aprendiz a adquirir as habilidades de tomada de decisão necessárias para se tornar um participante ativo, um agente criticamente consciente na vida da comunidade. Para ele, o educador democrático é aquele que sabe ouvir os representantes de minorias, que são basicamente oprimidas. Se não aprendermos como ouvir essas vozes, não aprenderemos como falar. É preciso saber ouvir as vozes silenciadas, para procurar formas que poderão propiciar o processo de leitura do mundo silencioso que está em íntima relação com o mundo dos participantes. Isso significa que o coordenador da sessão/professor deve estar imerso na experiência histórica e concreta dos participantes, não de forma paternalista, para falar por eles, mas para verdadeiramente ouvi-los.

Além de ser um processo crítico e democrático, Brookfield e Preskill (1999) definem a discussão como um processo que envolve reciprocidade e movimento, troca e questionamento, colaboração e cooperação, formalidade e informalidade, e apontam como principais benefícios desse processo:

• ajudar os participantes a ter um entendimento crítico sobre o tópico e a explorar diversas perspectivas;

• aumentar a consciência e a tolerância para com a ambigüidade e expor os participantes à diversidade de opiniões;

• encorajar os participantes a ouvir e demonstrar respeito pela opinião do outro;

• aumentar a agilidade intelectual e desenvolver a capacidade de comunicação de idéias e significados;

• desenvolver a aprendizagem colaborativa e • ajudar a desenvolver capacidade de síntese.

Para viabilizar, então, a discussão na sessão reflexiva, faz-se necessário analisar os tipos de perguntas e como elas podem ser instrumentos de mediação semiótica para a formação de sujeitos críticos. Lucioli (2003) trabalha em sua dissertação de mestrado com diversos tipos de perguntas que fazem parte da sala de aula de inglês. Ela cita autores que pesquisam o assunto: Fernandes (1992), Coracini (1995), Feuerstein (2002) e Marins (2003), ente outros. Os tipos de perguntas propostos por Brookfield e Preskill incluem as que pedem mais evidência e informação sobre os fatos, perguntas que permitem ligar a opinião de um participante com a do outro e as que permitem colocar-se no lugar do outro.

Já Morales (1998) propõe as perguntas para verificar o progresso dos participantes, consolidar o que já foi aprendido, diagnosticar problemas de aprendizagem e também para estimular o pensamento crítico e criativo.

Nesta pesquisa, as perguntas como instrumento de mediação semiótica objetivam possibilitar:

• a reflexão sobre a visão de professor e aluno e concepções de ensino-aprendizagem;

• a reflexão sobre experiências e histórias pessoais que se ligam ao tópico em pauta;

• a percepção de aprendizagem-desenvolvimento; • desenvolvimento do pensamento crítico.

O quadro abaixo sistematiza os tipos de perguntas discutidos nessa seção e os que serão investigados nesta dissertação.

Quadro 5 – Tipos de perguntas

Autores Tipos de perguntas

Brookfield e Preskill

(1999) - que pedem mais evidência e informação; - que pedem explicação ou esclarecimento

- abertas com como e por que;

- que possibilitam ligar a opinião de um participante com outro;

- hipotéticas que permitem o colocar-se no lugar do outro.

Morales (1998) Perguntas que possibilitem: - verificar o progresso do grupo; - consolidar o que foi aprendido;

- diagnosticar problemas do aprendizado; - estimular o pensamento crítico e criativo.

Soares (2007) a ligação do conhecimento cotidiano com o científico; - que possibilitem a reflexão sobre a visão de professor, aluno e concepção de ensino-aprendizagem;

- que possibilitem aos participantes trazer suas experiências e histórias para a cena;

- que possibilitem aos participantes perceber o que aprenderam;

- aos participantes o desenvolvimento do pensamento crítico.

Concluo esta seção retomando Freire (1970), segundo o qual, para que o professor seja realmente um educador, ele precisa desafiar a liberdade criativa de seus alunos, para que eles se tornem donos de sua própria história. Assim, os professores precisam transcender sua tarefa meramente instrutiva e assumir a postura ética de um educador, que acredita na autonomia, liberdade e desenvolvimento daqueles que educa. O desafio, segundo ele, é não tentar salvar este mundo, romantizando-o, mantendo o oprimido como que acorrentado a essas condições românticas e o educador em sua posição de servir o oprimido, encarando-o como herói romântico. O que ele propõe é um profundo respeito pela identidade cultural, pela linguagem, pela capacidade, cor e gênero do outro. Em suma, que os alunos (as professoras, em nossa dissertação) possam ter nas salas de aula/sessão reflexiva o espaço onde aprendam a se constituírem como cidadãos críticos.

Esta seção, que apresentou a discussão como uma forma de viabilizar a formação do pensamento crítico nas sessões reflexivas, finaliza a terceira parte da fundamentação teórica, que objetivou discutir a reflexão,

abordando a sessão reflexiva como espaço para a constituição do professor crítico. Faço, a seguir, a apresentação da base teórica para a análise de dados. 1.3. Pressupostos teóricos para Análise dos Dados

Nesta seção, apresento a base teórica para análise dos dados, da qual fazem parte a teoria da atividade, com análise descritiva dos sistemas, e a análise do discurso. A teoria da atividade oferece, para o pesquisador, além da base para discussão teórica, uma base de análise não reducionista, que permite compreender os dados, ajudando a estruturá-los, sem, entretanto, prescrever o que deve ser procurado, indicando a necessidade de levarmos em consideração a importância do contexto e da historicidade dos elementos da atividade.

Nessa abordagem, portanto, a atividade não é uma simples ação, mas uma ação coletiva, culturalmente e historicamente mediada. Segundo Engeström (1987), os trabalhos que utilizam a teoria da atividade como sustentação teórica devem orientar a análise para os componentes do sistema de atividade, o qual é composto pelos seguintes elementos:

• os participantes da atividade;

• os instrumentos de mediação semiótica que são usados no trabalho;

• as regras que orientam como eles trabalham;

• o objeto para o qual os membros dessa comunidade dirigem seu trabalho;

• a comunidade de onde vêm os participantes; • a forma como o trabalho é dividido;

• os resultados esperados dessa atividade.

Assim, neste trabalho, os eventos organizam-se como sistemas de atividade, no qual são descritos e analisados os elementos, a relação entre eles, os sistemas que os sujeitos trazem para os sistemas e os conflitos e movimentos que promovem transformações, uma análise que tem um base descritiva.

A análise descritiva dos sistemas permite uma melhor compreensão desses eventos e a busca dos sentidos que os sujeitos expressam sobre as coisas do mundo, nesse caso específico, os sentidos que eles atribuem às visões de professor e de aluno e às concepções de ensino-aprendizagem, análise esta que passa pela subjetividade do próprio pesquisador.

Além da análise dos sistemas, faço, também, neste trabalho, a discussão dos princípios que regem o sistema de turnos em uma conversação, as relações horizontais e verticais e a noção de polidez, com base em Kerbrat- Orecchioni (1996). Analiso, também, os tipos de perguntas que permitem a reflexão crítica das participantes.