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3. AS MULHERES E SUAS INTERAÇÕES COM A SOCIEDADE E O MERCADO DE TRABALHO: uma narrativa de exclusão estrutural

3.4. Divisão Sexual do Trabalho: lugar de mulher é onde ela quiser (e a sociedade permitir)

Realizada substancial inferência, até este ponto, sobre o sistema capitalista e como esse se integra e influencia o Estado e o Mercado de Trabalho, julga-se impreterível a continuidade do debate do mercado de trabalho, de forma a trazer à tona as características deste mercado, mas desta vez, com relação ao que significa e oferta às mulheres, por sua condição de gênero.

E, no decurso deste novo debate, fundaremos nossa discussão na caracterização feita por Mészaros (2011, p.303), ao definir que “o sistema do capital se constitui sobre os alicerces de estruturas discriminatórias alienantes”.

Durante muito tempo, foi tendência veicular a imagem de uma classe operária moderadamente homogênea, que teria como elementos particulares o emprego e o desemprego, o lugar na produção e a qualificação, o que permitiu ignorar a categoria sexo nessa discussão (HIRATA; KERGOAT, 1994).

Contudo, é fulcral ter em mente que as relações de sexo se transversalizam por toda a sociedade e impulsionam todos os campos do social, logo o que dinamiza um meio certamente terá efeitos sobre a dinâmica de outro (HIRATA; KERGOAT, 1994).

Decerto, as relações tanto de classe, quanto de sexo se firmam na universalidade das práticas sociais, seja qual for o meio que se exerçam. Por conseguinte, ao afirmar que a classe operária se classifica em dois sexos expressa- se essencialmente que as relações de classe são sexuadas (HIRATA; KERGOAT, 1994).

Logo, quando falamos em termos de divisão sexual do trabalho é indispensável ir além de uma mera constatação de desigualdades, torna-se imprescindível não apenas a descrição da realidade, mas também refletir os processos pelos quais a sociedade se utiliza para diferenciar e hierarquizar essas atividades (KERGOAT, 2009).

Nas camadas sociais essencialmente ocupadas na produção de bens e serviços, a mulher nunca foi alheia ao trabalho, que foi importante, em todas as épocas e lugares, para a sobrevivência de sua família, bem como para criar a riqueza social. Logo, durante o tempo em que a família viveu como uma unidade produtiva, tanto as

mulheres quanto as crianças desenvolveram uma função econômica fundamental (SAFFIOTI, 1976).

Contudo, no período pós-industrial, embora uma parcela expressiva da força de trabalho tenha sido composta por mulheres, transformações marcantes no interior da classe trabalhadora possibilitaram a incorporação e o aumento da exploração da força de trabalho feminina, principalmente por oferecer ocupações em tempo parcial e em trabalhos domésticos subordinados ao capital, assim como no setor de serviços (ANTUNES, 2015).

No Brasil, nas primeiras etapas do seu processo de industrialização, tendo em vista a necessidade de redução dos custos de produção, foi realizada a substituição da força de trabalho masculina pela feminina, que trouxe muitos benefícios ao capital, incentivada especificamente pela baixa remuneração oferecida à mulher. Portanto, a industrialização do Brasil se desenvolveu a partir da utilização prioritariamente do trabalho feminino (e infantil) (NOGUEIRA, 2012).

Para todas as sociedades conhecidas, no tempo e no espaço, a divisão social do trabalho se divide em dois princípios organizadores: o da separação (pois há trabalhos de homens e de mulheres) e o da hierarquização (o trabalho de um homem tem mais valor do que o de uma mulher) (KERGOAT, 2009).

No processo de globalização, que tem sido um elemento propulsor das alterações das normativas referentes ao mercado de trabalho, a partir da plena aceleração do processo de precarização, quando se asseveram os crescentes e diuturnos ataques aos parcos direitos dos trabalhadores, serão as mulheres as mais afetadas pelas consequências das políticas neoliberais em expansão. Pensamento sintetizado por Antunes (2018, p.174) quando reitera que “nunca é demais recordar que, como o trabalho tem sexo, são ainda mais intensas as formas e os modos de exploração do trabalho feminino.”

Enquanto, Hirata (2015, p. 16) o complementa ao afirmar que:

A globalização não tem os mesmos impactos sociais, econômicos, políticos, culturais e militares sobre os homens e as mulheres. As dinâmicas de classe, de raça, e os movimentos migratórios não podem ser compreendidos sem a perspectiva de gênero. O gênero é um organizador-chave da globalização neoliberal [...]

À vista disso, a autora ainda se destina a pontuar as várias consequências da globalização para a divisão sexual do trabalho, assim enumeradas:

1. A globalização criou mais empregos femininos, mas ao mesmo tempo empregos mais precários e mais vulneráveis;

2. A abertura de mercados e a política de desregulamentação implicaram em condições de trabalho desfavoráveis para as mulheres, aumentando a carga de trabalho remunerado e não remunerado;

3. Privatização: uma parte do trabalho de reprodução social assegurada antes pelo Estado passa a ser remetida à esfera familiar e ao mercado de trabalho precário (...);

4. Aumento das desigualdades de sexo, de classe, de raça pela reorganização da divisão mundial do trabalho e de acesso aos recursos e a aparição concomitante de um movimento social de mulheres contra a globalização neoliberal [...] (HIRATA, 2015, p.16)

Neste contexto, embora possamos identificar que a classe trabalhadora de hoje esteja em pleno processo de feminização, com índices de mais de 40% ou 50% da força de trabalho em diversos países, temos que essas mulheres têm sido incorporadas pelo sistema capitalista, prioritariamente pelo emprego part-time, precarizado e desregulamentado. São tratadas de modo essencialmente desigual, quando se comparam os salários, os direitos e condições de trabalho em geral (ANTUNES, 2015).

Essa situação é ainda mais delicada se considerarmos que “quando o olhar se volta para a divisão sociossexual do trabalho, evidencia-se a penalização ainda mais intensa imposta às mulheres terceirizadas.” (ANTUNES, 2018, p.174).

Essas desigualdades foram aprofundadas recentemente, por exemplo, com a Reforma Trabalhista, a partir da sanção da Lei nº 13.467 de 13/07/2017, pelo Presidente Michel Temer, que fez grandes alterações na CLT.

A fim de exemplificar a gravidade dessas alterações para as mulheres, temos as modificações quanto ao pagamento de adicional de insalubridade às gestantes e lactantes. Pois, se anteriormente era garantido o afastamento da mulher, em ambas as situações, mesmo que isso representasse o não pagamento do adicional durante esse período, por falta de regulamentação da legislação. A partir da reforma, foi institucionalizado que somente as gestantes serão obrigatoriamente afastadas das atividades insalubres, e apenas daqueles serviços classificados como de grau máximo de insalubridade. Às lactantes foi transferida a responsabilidade de comprovar o acesso ao seu direito de afastamento, a partir da apresentação de atestado médico que comprove essa necessidade. O que, além de colocá-las em

risco, ainda tem ação discriminatória, se considerarmos que as mulheres de baixa renda têm dificuldades de acesso ao sistema de saúde, e, por conseguinte, de obtenção do atestado.

Outra modificação a pontuar, diz respeito ao pagamento de indenização por danos morais ou sexuais a serem destinados ao trabalhador assediado, visto que foi vinculado, para os cálculos, o teto do salário do ofendido. Ora, considerando a disparidade salarial existente não apenas entre homens e mulheres, mas até mesmo entre as próprias mulheres (a depender do nível de qualificação). Temos demonstrado que serão as mulheres, mais precisamente as mulheres mais pobres, a maioria prejudicada com essas alterações sancionadas, em um claro posicionamento discriminatório e elitista.

O nível de exploração a que o trabalho feminino está exposto é capaz de gerar sua marginalização do sistema produtivo de bens e serviços, essencialmente devido à conjunção da personalidade feminina, quer no nível da organização e da estrutura da sociedade, ao trabalho doméstico não remunerado. Atividade que ao ser praticado pelo grupamento mais espoliado e subvalorizado de humanos será equivalente a exprimir a marginalização da própria mulher enquanto socius (SAFFIOTI, 1976).

Dessa forma, a formulação do trabalho feminino como subsidiário, culminou na oferta e aceitação de salários mais baixos em relação aos masculinos. E, como justificativa, invocava-se a menor qualificação, quer em quesitos técnicos, quer em relação a uma personalidade não voltada ao êxito econômico (SAFFIOTI, 1976).

Em consonância com esta afirmativa, Saffioti (1976) enfatiza que o mercado, sempre que sentia a necessidade iminente de baixar os custos da produção, seja quando a sociedade transpunha o período de acumulação originária ou para aumentar sua velocidade de crescimento econômico, recorria à inserção maciça da força de trabalho feminina por se configurar intensamente lucrativa aos empreendedores capitalistas.

Esta situação ocorria, em parte, por causa da pequena capacidade de reivindicação da mulher, que por seu comportamento mais passivo em suas relações de trabalho, as impossibilitava de estar à frente de posições estratégicas. Além de que, nem com um maior potencial de reivindicação da força de trabalho feminina, ou

com o apoio dos homens e da sociedade seriam capazes de proporcionar resultados permanentes na sociedade capitalista (SAFFIOTI, 1976). Pois o capital:

[...] sob a ordem sociometabólica de reprodução do capitalismo privado, este não deixa espaço para a agenda feminista de verdadeira igualdade, que exigiria uma reestruturação radical tanto das células constituintes como do quadro estrutural de todo o sistema estabelecido. [...] Não há risco de introduzir a agenda feminista nem de surpresa nos sistemas capitalistas, já que não pode haver absolutamente nenhum espaço para ela na estrutura rigorosamente circunscrita da tomada de decisão política, destinada ao papel de facilitar a extração mais eficiente possível do trabalho excedente. Não é por acaso que as Indhira Gandhis, as Margaret Thatchers, e as madames Bandaranaikes, desse mundo – e esta última apesar de suas credenciais originárias da esquerda radical – não avançaram em nada a causa da emancipação das mulheres no mínimo aconteceu o contrário.” (MÉSZAROS, 2011, p.292).

Por conseguinte, embora o ingresso das mulheres na força de trabalho tenha sido em extensão tão relevante, durante o século XX, chegando até mesmo a constituir maioria nos países de capitalismo avançado, infelizmente, não resultou em emancipação das mesmas. Pelo contrário, o que vimos foi a generalização, para toda a força de trabalho, da imposição dos salários mais baixos a que mulheres sempre tiveram de se submeter (MÉSZAROS, 2011).

Assim, por meio de um simples cálculo aritmético, é incontestável que o poder do macho não se configura como uma conquista do trabalhador, mas uma vitória para o capitalismo. Visto que a supremacia masculina não causa prejuízos apenas às mulheres, mas também aos homens. Então, fica o questionamento: Apoiar esta cultura, que lhe causa perda financeira, para mandar na mulher é realmente compensador? (SAFFIOTI,1987).

À visto disso, precisamos passar à outra compreensão desse tratamento subvalorizado e essencialmente precarizado destinado à força de trabalho feminina, que além de estar no cerne das formas de exploração que são responsáveis por caracterizarem a dominação de gênero, também encontra paralelismos entre a divisão do trabalho doméstico não remunerado, em conjunto com a divisão do trabalho remunerado e as relações de poder nas sociedades contemporâneas (BIROLI, 2018). Precisamos compreender que os serviços domésticos, embora sejam atividades econômicas, acabam por coibir a caracterização e ocupação da mulher

como ser economicamente independente, nessa sociedade individualista e representada por um certo padrão capitalista (SAFFIOTI, 1976).

Uma vez que essa duplicidade de prática laborativa, em que é explorada pelo capital, tanto no espaço produtivo, ao operar de forma gradativa no espaço público, fabril e de serviços. Quanto no reprodutivo, onde ainda é responsável por realizar primordialmente as atividades próprias do trabalho doméstico, garantindo a esfera da reprodução societal. Encarrega-se então, de um elemento do trabalho que não se classifica diretamente como mercantil, mas que se configura substancial para a reprodução do sistema de desempenho social do capital (ANTUNES, 2015).

Inquestionavelmente, as mulheres trabalham mais que os homens, não importa que sejam orientais ou ocidentais, donas de casa ou que trabalhem em empregos remunerados. Na França, por exemplo, ao trabalho doméstico são dedicadas 40 bilhões de horas. Já nos Estados Unidos, esse trabalho “voluntário” atinge o montante de 18 bilhões de dólares por ano. Em todo o Ocidente, o trabalho doméstico gera entre 25% e 40% do produto nacional bruto (WOLF, 2019). Logo, “A economia dos países industrializados estaria arrasada se as mulheres não trabalhassem de graça.” (WOLF, 2019, p.43).

Desta sorte, fica patente a dupla dimensão do patriarcado: a dominação e a exploração. A compreensão das duas faces deste fenômeno torna-se importante para a análise[...]. (SAFFIOTI, 1987, p.51).

No entanto, precisamos considerar que essa desleal divisão sexual apenas é possível porque existe antes a legitimação social, em que, em busca de conciliar a vida familiar com a profissional, estes empregos são propostos às mulheres. Onde há a validação da sociedade à diferença salarial imposta às mulheres, por esta ser representada usualmente como uma renda complementar (CUTTANÉO; HIRATA, 2009).

Essa legitimação inicia-se no seio familiar, uma vez que “a família está entrelaçada às outras instituições a serviço da reprodução do sistema dominante de valores, ocupando uma posição essencial em relação a elas”. (MÉSZAROS, 2011, p.271).

E, “[...] os dados indicam que o padrão atual de privatização das relações familiares incide desigualmente sobre as mulheres e onera sobretudo aquelas que

não têm recursos para a contratação de serviços no mercado. [...]” (BIROLI, 2018, p.40).

Dessa maneira, serão essas obrigações familiares, as responsáveis por restringir e moldar os serviços executados também fora de casa, ao serem manipulados como pretexto para ampliar a exploração capitalista do trabalho remunerado das mulheres (BIROLI, 2018).

O que corrobora com a disseminação de “termos de ‘dupla jornada’, de ‘acumulação’ ou ‘de conciliação de tarefas’, como se fosse um apêndice do trabalho assalariado” (KERGOAT, 2009) para as mulheres.

É relevante observar que inúmeras mulheres ficaram decepcionadas porque o pensamento feminista a incentivaram a crer que encontrariam a libertação no mercado de trabalho. E o que perceberam foi a realidade em que suas longas jornadas de trabalho doméstico foram somadas às longas jornadas no emprego. Anteriormente ao movimento feminista incentivar o otimismo com relação ao trabalho fora de casa, as necessidades do mercado, iniciadas com a depressão econômica, já ratificavam essa mudança. Assim, mesmo que o movimento feminista contemporâneo não acontecesse, as mulheres ainda teriam sido empurradas para o mercado de trabalho. Contudo, é preciso admitir que, sem o movimento feminista, dificilmente teríamos os direitos que temos, caso as feministas não tivessem combatido a discriminação de gênero (HOOKS, 2019).

Contudo, afora a indispensabilidade de complementar a renda familiar, a mulher também adentra o mercado de trabalho em busca de independência financeira, pois esta proporciona a elas a elevação da autoestima, além de um sentido de autorrealização.

Infelizmente, esse comportamento injusto com relação à responsabilização das mulheres pela realização das atividades domésticas inicia-se desde cedo nas famílias, com o:

O acesso diferenciado ao tempo, diretamente relacionado ao engajamento nas tarefas domésticas, mostra que faz sentido pensar a alocação de responsabilidades segundo uma perspectiva de gênero. Entre as mulheres com mais de 16 anos, 87,6% dizem realizar trabalhos domésticos, o que só se verifica em 45,8% dos homens na mesma faixa etária. Do mesmo modo, entre as mulheres com 10 anos de idade ou mais o número médio de horas semanais dedicadas ao trabalho doméstico é de 23,8, mais do que o dobro do deles que é de 10,1 horas. (BIROLI, 2018, p.40).

Nessa situação, embora a industrialização tenha sido responsável por transferir parte da produção realizada no espaço doméstico para as fábricas, isto não foi capaz de restringir a casa ao espaço reprodutivo. Desse modo, essa responsabilização desigual quanto ao trabalho que pode ser definido como produtivo, mas não remunerado, forma os alicerces do sistema patriarcal no capitalismo. Caracterizado por ser uma estrutura de sistema político de exploração, onde as mulheres têm sua força de trabalho apropriada pelos homens, que se beneficiam coletivamente desse sistema. O que permitirá aos homens a liberdade para comprometer-se no trabalho remunerado com vantagens (BIROLI, 2018). Diante disso:

Os interesses capitalistas e as formas correntes de exploração do trabalho incidem sobre a vida doméstica, a conjugalidade, a divisão cotidiana das tarefas, a possibilidade mesma de fruição do tempo por mulheres e homens. A alocação das responsabilidades na vida cotidiana, por sua vez, pode coibir ou facilitar a atuação em outras esferas da vida, entre elas a do trabalho e a da política institucional. (BIROLI, 2018, p.34)

Logo, a superação dessa divisão sexual do trabalho até aqui debatida, não poderá ser possível sem a concessão do sistema capitalista, pois:

[...] as mulheres podem se tornar membros plenamente iguais da força de trabalho conscientemente ampliada, entrando por esta razão em alguns territórios antes proibidos. No entanto, sob nenhuma circunstância elas poderão questionar a divisão do trabalho estabelecida e seu próprio papel na estrutura familiar herdada. Nas sociedades, pós-capitalistas, as mulheres em geral realmente podem se emancipar a ponto de entrar em qualquer profissão. Elas realmente o fazem, e geralmente sob as mesmas condições de remuneração financeira de seus colegas do sexo masculino. [...]. O chamado, com razão, “segundo turno” das mulheres, que se inicia ao chegarem em casa depois do trabalho, serviu apenas para enfatizar a natureza problemática de todas essas realizações, inclusive a estranha “falsa admissão política” praticada nesse tipo de sociedades, que nada podia fazer para alterar as relações de forças estabelecidas e o papel subordinado das mulheres na força de trabalho estruturalmente subordinada. Ele só enfatizou o fato de que a causa histórica da emancipação das mulheres não poderia progredir sem questionar todas as formas de domínio do capital. (MÉSZAROS, 2011, p.293).

A posição subalterna da mulher brasileira tem sido atribuída ao subdesenvolvimento do Brasil, na crença de que a igualdade social venha de mãos dadas com o desenvolvimento econômico. Mesmo que reste evidente que as mulheres de países altamente industrializados e desenvolvidos ainda preservem a condição de inferioridade social das mulheres. Ou que se tenha consciência de que na vida social nenhuma conquista vem espontaneamente, sem luta (SAFFIOTI, 1987).

Em luta contra essa desumana realidade a que as mulheres estão e sempre estiveram submetidas, as feministas têm buscado poder nas relações sociais, a partir do movimento de empoderamento, que, nessa perspectiva, trata-se de um poder que afirma, reconhece e valoriza as mulheres, numa tentativa de emancipação e resistência. Um desafio à manutenção do patriarcado, por propor alterações nos processos e estruturas que reproduzem a posição de submissão das mulheres como gênero, em que:

[...] Uma esposa que tem um emprego remunerado nunca deixa de ser uma dona-de-casa; pelo contrário, ela se torna uma esposa que trabalha e aumenta a sua jornada de trabalho.[...]. (BAUMAN, 1999, p.208).

Todavia, nesta realidade, pensar em igualdade de condições entre homens e mulheres ainda está distante, pois existem engrenagens capazes não apenas de reforçar, mas de manter a subordinação da condição da mulher com a utilização de recursos políticos à disposição do sistema. Visto que, o movimento em busca de emancipação das mulheres:

[...] que surge do indispensável impulso do capital para a expansão lucrativa e não da mais leve inclinação a uma esclarecida preocupação emancipadora em relação às mulheres – erra o tiro no momento oportuno. Não apenas porque as mulheres têm de aceitar uma parcela desproporcional das ocupações mais inseguras e mais mal pagas no mercado de trabalho e estejam na péssima situação de representar 70 por cento dos pobres do mundo. O movimento também erra o tiro porque, em virtude de seu papel decisivo na família nuclear, as exigências que são (e continuarão a ser) jogadas em cima das mulheres são cada vez mais difíceis de satisfazer no cenário social mais amplo, contribuindo para que qualquer “disfunção social” seja associada à crescente instabilidade da família [...]Do ponto de vista da estabilidade social do sistema do capital, o pior é estarmos diante de um círculo vicioso. Quanto maiores as “disfunções sociais”, maiores a carga e as exigências impostas às mulheres como eixo da família nuclear; quanto maiores esses pesos, menores as suas condições de lidar com eles, além de seu papel de ganha-pão, do “segundo turno” depois do trabalho e

afins...Outro aspecto importante da extralimitação do capital relacionado com as mulheres é a fragmentação e a redução da família nuclear a seu âmago mais interior [...]. (MÉSZAROS, 2011, p. 304).

Não à toa, a Organização das Nações Unidas (ONU) trouxe dados alarmantes e relevantes para o debate aqui em curso. No que tange à falta de mobilidade ascendente no trabalho feminino, apenas um terço dos cargos de gerência das empresas são ocupados por mulheres. E, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), numa média global, a remuneração das mulheres ainda é 20% menor em relação a dos homens, em grande parte motivado pela questão da maternidade. (ONU, 2019).

A OIT também constatou, em 2018, que as mulheres têm maior tendência a desempenhar suas atividades laborativas em ocupações de baixa qualificação e em empregos em condições piores que os homens. Na América Latina, por exemplo,