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Fatos e Construção de Versões

DO VALOR DA CAUSA

Dá-se à causa o valor de R$45.000,00(quarenta e cinco mil reais), nos termos do artigo 292, I, o NCPC.

O advogado receberá todas as intimações no endereço do seu Escritório Jurídico, situado à Rua Florida, nº 35, na cidade de Angra dos Reis, Estado do Rio de Janeiro-RJ.

Nesses termos, pede deferimento. Angra dos Reis, 28 de junho de 2014. Assinatura do Advogado

Nº da Inscrição na OAB-RJ

RESUMO

A narrativa jurídica deve expor todos os fatos juridicamente importantes do caso concreto, em ordem rigorosamente linear- o modo de dispor os fatos a serem narrados (= calendá- rio)-, partindo sempre da causa mais remota (nascedouro da relação jurídica) para a causa mais próxima de pedir(não cumprimento da obrigação), utilizando-se das formas verbais no passado - de preferência no pretérito perfeito (por ser ação acabada, concluída)-, na terceira

pessoa do singular, a fim de que o juiz possa tomar ciência da lide, de forma clara e coesa, e julgar o pedido do autor.

Como já visto, a estrutura da narrativa é uma sequência de fatos relacionados entre si, em que há uma ordem temporal e uma causal. A ordem temporal trata da cronologia dos fatos, sucessão de acontecimentos no decorrer do tempo, e a causal estabelece a relação de causa e consequência ou causa e efeito.

O aluno - futuro advogado- não pode se esquecer também, em momento algum, de que a função da narrativa não é apenas o de expor (narrar) o que aconteceu, dentro do que é juridi- camente relevante, mas também persuadir a respeito da “verdade” (leia-se verossimilhança) deles e, para isso, é necessário narrar os elementos circundantes, periféricos, para fornecer mais elementos ainda para a clareza e compreensão do caso concreto (contexto narrativo).

Desse modo, os elementos fáticos (simples) que contribuem para a compreensão dos juridicamente relevantes são aqueles que, embora não imponham consequência jurídica por eles próprios, auxiliam o leitor-juiz (auditório) na compreensão mínima dos juridicamente re- levantes. Eles são circunstanciais, mas possuem a relevante função de explicar e individua- lizar os fatos sobre os quais recaem diretamente os efeitos da norma jurídica (aplicação do Direito).

É sabido que redigir é exteriorizar, em palavras, fatos e ideias em ordem clara, coesa, coe- rente, lógica e com método (Como fazer?), razão por que o advogado deve expor os fatos de forma clara a combinar fatos, conceitos e ideias, com o objetivo de persuadir o seu auditório.

O advogado não deve ser prolixo em suas exposições, por isso deve apresentar uma nar- rativa jurídica objetiva, sem se exceder na exposição dos fatos desnecessariamente, isto é, sem se afastar das questões realmente importantes para o resultado final da lide. Narram-se somente os fatos imprescindíveis para a qualificação jurídica do fato de forma sucinta (objetiva).

Finalmente, a boa escrita é obrigação do advogado, e o conhecimento da língua culta e das técnicas de construção de qualquer tipo de documento ou peça jurídica lhe são essen- ciais para o exercício da prática forense.

ATIVIDADES

01. A forma como os modalizadores do discurso jurídico é utilizado vai influenciar decisivamente na credibilidade ou não aceitação do auditório daquele fato narrado pelo advogado, razão por que

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Fragmento 1:

(Extravio de Bagagem) “O fato é que a T. Turismo atua como mera agenciadora, agindo em nome e por conta da operadora.”

Fragmento 2:

(Extravio de Bagagem) “ (...) extrai que o voo foi fretado, isto é, alugada a aeronave para transporte apenas das pessoas que haviam adquirido o pacote turístico a ela, operadora. ” Fragmento 3:

A autora, sentindo fortes dores em sua perna esquerda, procurou diagnóstico do seu mé- dico-ortopedista ZZZ, o qual atestou a gravidade do problema (doc.1): não havia circulação de sangue nos dedos do pé esquerdo da autora, razão pela qual se roxeavam.

Diante desse fato, o referido profissional contatou a médica infectologista YYY, inte- grante do hospital AAA, credenciado pelo Plano de Saúde da autora, informando-lhe ser a autora diabética e solicitou-lhe urgente atendimento a ela, cuja perna esquerda necrosava e cujas veias entupiram-se (doc.02). Todavia, a autora não foi internada no local, porque a 1ª ré – Plano de Saúde- negou a respectiva e necessária autorização, em face do que a referida médica encaminhou a paciente para o hospital público WWW. Nesse lugar, a autora recebeu o devido tratamento, que culminou com a amputação de parte da sua perna necrosada. 02. Partindo desses ensinamentos, apresente o seu entendimento acerca e “fatos e ver- sões” e a questão da “verdade” no discurso jurídico, tendo como texto inspirador “Apólogo dos dois escudos”, de José Júlio da Silva Ramos (10 a 15 linhas).

Conhecem o apólogo do escudo de ouro e de prata? Eu lho conto.

No tempo da cavalaria andante, dois cavaleiros armados de ponto branco(...), tendo vindo de partes opostas, encontram-se numa encruzilhada em cujo vértice se via erecta uma estátua de vitória, a qual empunhava numa das mãos uma lança, enquanto a outra segurava um escudo. Como tivessem estacado, cada um do seu lado, exclamaram ao mesmo tempo:

-Quer rico escudo de ouro! -Quer rico escudo de prata!

-Como de prata? Não vê que é de ouro? -Como de ouro? Não vê que é de prata? -O cavaleiro é cego.

Palavra puxa palavra, ei-los que arremetem um contra o outro, em combate singular, até caírem gravemente feridos.

Nisto passa um dervis, que depois de os pensar com toda caridade, inquire deles o motivo de contenda.

- É que o cavaleiro afirma que aquele escudo é de ouro. - É que o cavaleiro afirma que aquele escudo é de prata.

-Pois, meus irmãos, observou o daroês, ambos tendes razão e nenhum a tendes. Todo esse sangue se teria poupado, se cada um de vós se tivesse dado ao incômodo de passar um momento ao lado oposto. De ora em diante nunca mais entreis em pen- dência sem haverdes considerado todas as faces da questão.

Vocabulário

•  de ponto em branco: com cuidado, com esmero, completamente. •  dervis: religioso muçulmano.

03. Comentar sobre a seleção vocabular e os modalizadores no caso concreto abaixo e a importância da função deles para o posicionamento do narrador sobre o fato narrado.

Jorge, professor de ensino fundamental, depois de longos 20 anos de magistério, poupou quantia suficiente para comprar um pequeno imóvel à vista. Para tanto, procurou Max com objetivo de adquirir o apartamento que ele colocara à venda na cidade de Teresópolis/RJ. Depois de visitar o imóvel, tendo ficado bastante satisfeito com o que lhe foi apresen- tado, soube que este se encontrava ocupado por Miranda, que reside no imóvel na qualidade de locatária há dois anos.

Jorge firmou contrato de compra e venda por meio de documento devidamente regis- trado no Registro de Imóveis, tendo adquirido sua propriedade e notificou a locatária, a respeito da sua saída, mediante notificação extrajudicial.

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Lamentavelmente, ao tentar ingressar no imóvel, para sua surpresa, Miranda ali per- manecia instalada. Questionada, respondeu que não havia recebido qualquer notifi- cação de Max, que seu contrato foi concretizado com Max e que, em virtude disso, somente devia satisfação a ele, dizendo, por fim, que dali só sairia a seu pedido. Indignado, Jorge conta o ocorrido a Max, que diz lamentar a situação, acrescentando que Miranda sempre foi uma locatária de trato difícil. Disse, por fim, que como Jorge é o atual proprietário cabe a ele lidar com o problema, não tendo mais qualquer respon- sabilidade sobre essa relação.

04. A partir da situação fática abaixo, redija uma narrativa jurídica:

•  Agenor da Silva Gomes, brasileiro, natural do Rio de Janeiro, bibliotecário, viúvo, aposen- tado, residente na Rua São João Batista, n. 24, apartamento 125, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, RJ.

•  Em 19 de março de 2005 contratou o Plano de Saúde Bem-Estar para prestação de ser- viços de assistência médica.

•  O plano contemplava cobertura total em casos de acidentes (cirurgias, emergências, exa- mes, consultas ambulatoriais, resgate em ambulâncias e com uso de helicópteros).

•  Em 4 de julho de 2010, Agenor da Silva Gomes sofreu um acidente vascular cerebral (AVC). •  Foi internado na Clínica São Marcelino Champagnat, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, em estado grave.

•  Seu estado de saúde piora a cada dia.

•  Seu filho Arnaldo da Silva Gomes, brasileiro, natural do Rio de Janeiro, divorciado, dentista, que reside em companhia do pai, está preocupado.

•  Ao visitar o pai, no dia 16 de julho do mesmo mês, é informado pelo médico responsável, Dr. Marcos Vinícius Pereira, que o quadro comatoso do senhor Agenor é de fato muito grave, mas não há motivo para que ele permaneça internado na UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) da clínica: •  O médico recomendou que ele vá para casa com a instalação de home care com os equi- pamentos necessários à manutenção de sua vida com conforto e dignidade.

•  O médico avisou que, em 48 horas, será dada alta ao senhor Agenor para que ele continue com o tratamento em casa.

•  Arnaldo entrou em contato com o plano de saúde, e este lhe informou que não existe a possibilidade de instalar home care para garantir o tratamento do paciente. (Adaptada da Peça prático-profissional de Direito Civil do V Exame de Ordem Unificado)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DRUMMOND, Carlos de Andrade. Poesia e Prosa. Organizada pelo autor. São Paulo: Nova Aguilar S.A., 1988.

ELUF, Luiza Nagib. A Paixão no Banco os Réus. São Paulo: Saraiva, 2002.

GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Trad.: Flávio Paulo Meurer. Petrópolis: Vozes, 1997.

GENETTE, Gerard. Discurso da narrativa. 3.ed. Lisboa: Vega, 1995.

PALADINO, Valquiria da Cunha (ORG.) et al. Argumentação Jurídica. Teoria e Prática. 4ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2013.

PESSOA, Fernando. Obras em prosa. Org. Cleonice Berardinelli. São Paulo: Nova Aguilar S.A., 1993. RICOUER, Paul. Tempo e narrativa. Trad. Constança Marcondes Cesar (Tomo I), Marina Appenzeller (Tomo II) e Roberto Leal Ferreira (Tomo III). Campinas, SP: Papirus, 1994, 1995, 1997.

RODRÍGUEZ, Victor Gabriel. Manual de Redação Forense. Curso de Linguagem e Construção do texto em Direito. Campinas-SP: LZN, 2002.

Anexo I

Roteiro- estudo do caso concreto: passo a passo

Ao se provocar o judiciário por meio de uma Petição Inicial para que um conflito de interesses seja resolvido, pressupõe-se que haja uma relação jurí- dica entre as partes – autor e réu. Tratando-se de área não penal, essa relação jurídica nasce a partir de um fato capaz de gerar entre ambas as partes direitos e deveres (obrigações).

Como já visto, a interpretação é fator de construção do sistema jurídico, logo é impossível pensar as tramas jurídicas sem a atividade interpretativa. O estudioso do Direito tem de se conscientizar de que nenhum direito, por mais importante que seja, pode ser visto como absoluto, ficando sempre condiciona- do ao exame minucioso de cada contexto fático.

Para se desenvolver um bom trabalho forense, há necessidade de o advoga- do primeiramente identificar, na situação fática relatada pelo seu cliente, todos

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perguntas são importantes porque permitem perceber vários pontos relevantes do caso concreto a ser trabalhado.

Após essa primeira etapa, deve-se colocar todos os fatos relevantes (fatos simples e fato jurídico) na ordem rigorosamente linear, estabelecendo relações lógicas entre os fatos narrados, e, em seguida, iniciar a narrativa jurídica.

Atentar sempre para a importância de cada uma dessas perguntas na elabo- ração da narrativa jurídica, como também para a seleção cuidadosa dos fatos que melhor atendem aos interesses do seu cliente.

Isso não significa que o advogado não venha a narrar os fatos que contra- riarem a pretensão do seu cliente, porque isso seria agir de litigância de má fé. Os fatos contrários aos interesses do cliente devem ser narrados e descritos de forma breve sem se dar muita importância a eles (estratégia da indiferen- ça, como se não fossem relevantes ou verossímeis, mas sim meras alegações infundadas).

Portanto, o modo de organizar a narrativa dos fatos já direciona o juiz a re- fletir sobre a veracidade dos fatos narrados e a considerar em seu julgamento a tese mais verossímil e justa que será apresentada pela parte no próximo ele- mento da Petição Inicial - “Do Direito”.