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Aspectos históricos do desenvolvimento da Educação Especial no Brasil

2.3 Educação inclusiva

O fenômeno da Inclusão Escolar surgiu contextualizado nos eventos e transformações sociais que vêm ocorrendo ao longo da história da Educação Especial, caracterizando uma quinta fase na evolução do atendimento educacional que a sociedade, de forma geral, tem oferecido às pessoas com necessidades especiais.

Já havia, na segunda metade dos anos 80, em alguns países da Europa e nos EUA, um consenso, entre os estudiosos e pesquisadores, referente à necessidade de mudanças na forma como o processo de integração/

mainstreaming vinha ocorrendo. Se havia consenso quanto a essas mudanças,

as opiniões dividiam-se em relação às soluções encontradas para implementá- las, daí surgindo basicamente duas orientações.

Uma delas propunha a melhoria e o aprofundamento do conceito de integração/mainstreaming por meio de experiências mais controladas, concomitante ao desenvolvimento de pesquisas. O principal promotor do conceito de integração, Wolfensberger sugeria a substituição do termo

normalização pela expressão “valorização dos papéis sociais”, esperando, com esta mudança, enfatizar o objetivo da normalização, ou seja, o apoio ao exercício dos papéis sociais valorizados pelas pessoas suscetíveis de desvalorização social (Doré et al,1997).

A outra orientação de mudanças trazia para o foco da discussão um novo conceito – a Inclusão Escolar. A Inclusão Escolar despontava como outra opção de inserção escolar e vinha questionar as políticas e a organização da educação especial, assim como o conceito de integração (mainstreaming). De todas as críticas que os defensores da inclusão fazem ao processo de integração/mainstreaming, talvez, a mais radical seja aquela que a irma que a escola acaba ocultando seu fracasso em relação aos alunos com di iculdades, isolando-os em serviços educacionais especiais segregados (Doré et al,1996).

Em relação ao surgimento do movimento inclusivista na educação, apesar dos estudiosos da área concordarem que países desenvolvidos como os EUA, o Canadá, a Espanha e a Itália foram os pioneiros na implantação de classes e de escolas inclusivas, não foi possível definir, com exatidão, a partir da bibliografia pertinente, o marco exato do início do movimento de Inclusão Escolar. Em sua retrospectiva histórica, Semeghini (1998) comenta que, desde a década de 50, a escola inclusiva está atuante em vários países da Europa com o desenvolvimento de projetos e programas de inclusão, apontando a década de 70 como sendo o marco do surgimento do processo de Inclusão Escolar nos EUA. Mrech (1997; 1998; 1999) acredita que tanto o movimento de Integração Escolar e o subsequente movimento da Educação Inclusiva surgiram nos EUA em consequência da promulgação da Lei Pública n.º 94.142, de 1975. Outros autores relatam que o conceito de inclusão surgiu, nos EUA, relacionado à implantação em 1986 de uma política educacional denominada “Regular

Education Iniciative (REI)”, que defendia a adaptação da classe regular de

modo a tornar possível inserir ali o maior número possível de alunos com necessidades especiais; incentivando os serviços de educação especial e outros serviços especializados a associarem-se ao ensino regular (Correia,1997; Doré et al,1996).

Sem a preocupação com a precisão histórica de seu surgimento, o fato é que depois de um período de intensas discussões e críticas a respeito do processo de integração/mainstreaming e suas possíveis limitações, ao inal dos anos 80 e início da década de 90, começaram a tomar vulto as discussões em torno do novo paradigma de atendimento educacional – a Inclusão Escolar.

Na realidade, tanto o processo de Integração quanto o de Inclusão

Escolar são formas de inserção escolar ou sistemas organizacionais de ensino

Apesar da origem comum no mesmo princípio e de terem basicamente o mesmo signi icado, os conceitos de Integração e de Inclusão Escolar estão fundamentados em posicionamentos divergentes quanto à consecução de suas metas. A Integração Escolar remete à ideia de uma inserção parcial e condicionada às possibilidades de cada pessoa, enquanto que o processo de Inclusão refere-se a uma forma de inserção radical e sistemática, total e incondicional, de toda e qualquer criança no sistema escolar comum (Werneck, 1997; Mantoan, 1997; 1998).

Normalizar uma pessoa, dentro do paradigma inclusivista, segundo Werneck (1997), não signi ica torná-la normal; signi ica garantir-lhe o direito de ser diferente e de ter suas necessidades reconhecidas e atendidas pela sociedade. Em relação à área educacional, continua Werneck, normalizar é oferecer ao aluno com necessidades especiais os recursos pro issionais e institucionais adequados e su icientes para que ele tenha condições de desenvolver-se como estudante, pessoa e cidadão.

Dessa forma, o objetivo fundamental da Inclusão Escolar é não deixar nenhuma criança fora do sistema escolar e garantir que todas possam frequentar a sala de aula do ensino regular da escola comum, e, que essa escola, por sua vez, adapte-se às particularidades de todos os alunos para concretizar o objetivo da diversidade, proposto pelo modelo inclusivista. O paradigma da inclusão não admite diversi icação de atendimentos pela segregação e, na busca de um ensino especializado no aluno, procura soluções que atendam às suas diversidades, sem segregá-los em atendimentos especializados ou em modalidades especiais de ensino (Werneck, 1997; Mantoan, 1996; 1997).

Portanto, a inserção proposta no modelo da inclusão é muito mais completa, radical e sistemática, não admitindo que ninguém ique fora da escola; por isso, os pressupostos da inclusão provocam o questionamento das políticas educacionais e da organização da educação especial e regular, assim como o conceito de mainstreaming e de integração.

Nesse sentido, as escolas inclusivas propõem um modo de constituir um sistema educacional que considere as necessidades de todos os alunos e que seja estruturado em virtude dessas necessidades. Assim, a proposta inclusivista provoca uma ampliação na perspectiva educacional, dentro do contexto escolar, já que sua prática não prevê apenas o atendimento aos alunos que apresentam di iculdades na escola. Além disso, o trabalho educacional desenvolvido dentro do paradigma da inclusão apoia a todos os que se encontram envolvidos no processo de escolarização, professores, alunos, pessoal administrativo, para que obtenham sucesso na corrente educativa geral (Mantoan, 1997).

A ênfase da escola inclusivista não se restringe ao atendimento das crianças com necessidades especiais. A meta do novo paradigma é incluir

todos aqueles que se encontram em situação de exclusão, quer sejam eles: pessoas com de iciências ísicas, mentais, sensoriais, ou crianças fracassadas na escola, ou alunos marginalizados por conta de suas peculiaridades raciais ou culturais; ou qualquer outra criança que esteja impedida de usufruir seu direito de acesso à educação democrática e de qualidade que lhe garanta um desenvolvimento social, emocional e intelectual adequado. A escola inclusivista respeita e valoriza as diversidades apresentadas por seus alunos. A proposta da inclusão exige uma transformação radical da escola, pois caberá a ela adaptar-se às necessidades dos alunos, ao contrário do que acontece atualmente, quando são os alunos que devem se adaptar aos modelos e expectativas da escola. Se a meta do processo de inclusão é que todo e qualquer educando seja inserido na escola comum, então, a escola inclusivista deve preparar-se para oferecer um ambiente propício ao desenvolvimento das potencialidades de todos os tipos de alunos, qualquer que seja sua de iciência, diferença, dé icit ou necessidades individuais (Werneck, 1997; Semeghini, 1998).

O princípio da inclusão, sintetiza Correia (1997), apela para uma escola que tenha sua atenção voltada para a criança-todo, e não só a criança-aluno, respeitando os três níveis de desenvolvimentos essenciais – o acadêmico, o sócio-emocional e o pessoal, de modo a proporcionar a essa criança uma educação apropriada, orientada para a maximização de seu potencial.

Em termos teóricos e ideológicos, a ideia da Inclusão Escolar é, sem dúvida alguma, revolucionária. Entretanto, há que se re letir sobre importantes questões de natureza pragmática e operacional levantadas pelos pesquisadores da área.

A instalação de uma prática educacional inclusivista não será garantida por meio de promulgações de leis que, simplesmente, extingam os serviços de educação especial e obriguem as escolas regulares a aceitarem a matrícula dos alunos “especiais”, ou seja, a inserção ϔísica do aluno com de iciência mental em sala de aula regular não garante a sua Inclusão Escolar. Mas, por outro lado, conforme observa Bueno (1999), a implementação de uma escola regular inclusivista demanda o estabelecimento de políticas de aprimoramento dos sistemas de ensino, sem as quais não será possível garantir um processo de escolarização de qualidade.

Uma política de Inclusão Escolar implica no (re)planejamento e na reestruturação da dinâmica da escola para receber esses alunos (GLAT, 1998). Em relação a estas mudanças da escola, alguns autores alertam que estas devam ser feitas com cautela, ponderação e conscientização, alertando que a realização de uma reforma de fundo não ocorre de imediato; ao contrário, trata-se de um processo em curso, que deve ser devidamente estudado e planejado, considerando todos os fatores envolvidos na questão educacional (Correia, 1997; Carvalho, 1998).

Apesar do conceito de inclusão conciliar-se com uma educação para todos e com o ensino especializado no aluno, a opção por esse tipo de inserção escolar não poderia ser realizada sem o enfrentamento de desa ios importantes, uma vez que o maior deles recai sobre o ser humano. Na adoção do paradigma da inclusão, as mudanças no relacionamento pessoal e social e na maneira de efetivar os processos de ensino e aprendizagem têm prioridade sobre o desenvolvimento de recursos ísicos e os meios materiais para a realização de um processo escolar de qualidade (Mantoan, 1998)

Essas novas atitudes e formas de interação na escola dependem de fatores, tais como: o aprimoramento da capacitação pro issional dos professores em serviço; a instituição de novos posicionamentos e procedimentos de ensino, baseados em concepções e práticas pedagógicas mais modernas; mudanças nas atitudes dos educadores e no modo deles avaliarem o progresso acadêmico de seus alunos; assistência às famílias dos alunos e a todos os outros que estejam envolvidos no processo de inclusão. Todas estas mudanças, na opinião de Mantoan (1997; 1998), não devem ser impostas, ao contrário, devem resultar de uma conscientização cada vez mais evoluída de educação e de desenvolvimento humano.

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UNIDADE 3 – MEDIAÇÃO PEDAGÓGICA COMO ESTRATÉGIA