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Capítulo 2 – Competências sociais essenciais para relações interpessoais

1. Empatia

A raiz etimológica da palavra empatia deriva do grego empatheia que significa ‘entrar no sentimento’ e a sua utilização remete-nos para Aristóteles. O desenvolvimento sistemático do conceito foi concretizado pelo filósofo alemão Theodor Lipps (1851-1914) que criou uma Teoria estética na qual a empatia é considerada como a possibilidade psicológica da beleza. Define empatia como a união entre o sujeito e o objeto artístico e como a união experiencial entre as ações de dois sujeitos (Salgado, 2000). Posteriormente, nos anos 20 do século XX, Titchner, psicólogo americano, utiliza o termo numa vertente um pouco diferente para designar aquilo que considera ser um mimetismo motor, uma vez que defende a teoria de que a empatia é uma espécie de imitação física do sofrimento do outro, evocando os mesmos sentimentos na própria pessoa (Goleman, 2009). Atualmente é um termo utilizado em áreas diversas do saber como a educação, a psicologia, a saúde e particularmente a enfermagem.

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Empatia é o ato de comunicar a outro ser humano, que compreendemos o que ele está a sentir e como está a sentir. É a capacidade de ir ao encontro do outro e ver o mundo com os seus olhos e o seu coração, devendo diferenciar-se da compaixão, em que o sentido é sentir-se mal por alguém, relativamente à empatia, em que o sentido é sentir-se mal com alguém. É uma atitude quase espontânea e instintiva que permitiu a evolução da espécie humana, e que exige uma certa dose de mimetismo, para que se consiga alcançar o outro na sua plenitude, para se conseguir ver o outro lado da questão e assim, ajudar a reconfortar quem precisa de apoio (Pink, 2009). É o transporte total para o mundo do outro sem perda de si próprio no processo (Pike, 1990). É a compreensão comunicada (Riley, 2004).

Compreender o outro e manifestar-lhe essa compreensão, de forma a permitir que ele evolua (se ele assim o entender) é o propósito máximo da empatia no contexto da Relação de Ajuda em enfermagem (Lazure, 1994). Hoffman (1982) propõe a empatia baseada no altruísmo e nos princípios morais, ou seja, a capacidade de afeto empático de nos colocarmos no lugar do outro leva-nos a seguir determinados princípios morais. Ser empático significa entrar no mundo percetual privado do outro, viver temporariamente a vida do outro, sem julgar. Inclui a comunicação do que se sente acerca do mundo da pessoa (Rogers, 1987).

Importa referir as várias definições de empatia que Carl Rogers foi alterando ao longo dos anos até chegar à mais atual. Assim, em 1951 começou por definir empatia como o ato de assumir o quadro de referência do cliente, sendo necessário comunicar ao outro esta forma particular de o compreender à qual chamou de compreensão empática. Posteriormente, em 1957, define-a como a habilidade para sentir o mundo privado do outro como se fosse o seu próprio, sem nunca esquecer esse como se. Anos mais tarde, em 1975, redefine novamente o conceito de empatia e a grande alteração prende-se com a substituição do como se as if por being in, ou seja, modifica a sua visão de como se estivesse no lugar do outro para colocar-se no lugar do outro (André & André, 2001). De acordo com a literatura verificamos a existência de diferentes perspetivas no que concerne à origem do conceito empatia. Por um lado, uma perspetiva mais cognitivista (Hogan, 1969), em que se levantam questões sobre o que sente e o que vive a pessoa que está diante de nós, a ênfase é colocada na capacidade de adotar com exatidão a perspetiva do outro ao nível do pensamento e sentimentos sem os experimentar necessariamente. Por outro lado, uma perspetiva mais afetiva com alguns componentes cognitivos e relacionada com a moralidade (Hoffman, 1982; 2000; Pike, 1990). Apesar de haver um abandono momentâneo, a pessoa empática nunca perde o sentido da sua própria identidade, estando sempre consciente de que o sentimento é do outro e não seu.

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Existe um interesse genuíno pelo outro no sentido de experimentar sentimentos de preocupação e consolo, e pelo facto desta componente afetiva estar presente isso não significa necessariamente que se tenha que experienciar os mesmos sentimentos do outro mas sim experienciar o entendimento do que é sentido pelo outro (Falcone et al., 2008). Importa realçar a diferença entre simpatia e empatia uma vez que os conceitos, sendo parecidos, não são sinónimos. A simpatia não é uma técnica terapêutica, é usada em contexto de interação social quando se pretende partilhar experiências emocionais, sendo estas o centro da atenção dos interlocutores. A empatia pressupõe a identificação da emoção no outro, sem a sentir realmente. Para o enfermeiro o centro da atenção é a pessoa, ajudando-a a lidar com os seus sentimentos e mantendo sempre o distanciamento profissional necessário na relação (Neeb, 2000).

Verificamos que, atualmente a empatia é considerada como um construto multidimensional abrangendo várias perspetivas, nomeadamente, cognitiva, emocional e comportamental (Davis, 1983; Del Prette & Del Prette, 2001; Riley, 2004; Rogers, 1987). Esta última dimensão é importantíssima para que o outro se sinta verdadeiramente compreendido, é a validação do que foi percecionado e sentido através da comunicação verbal, não verbal e para verbal.

Tendo em conta as considerações feitas acerca da empatia enquanto competência social, decidimos optar pela definição objetiva de Jean Watson, na qual a empatia corresponde “à capacidade para experimentar e, por conseguinte, compreender as perspetivas e sentimentos das outras pessoas e transmitir essa compreensão” (1979 citado em Neil, 2004, p.168). Entendemos assim considerar algumas classes de resposta que se enquadram na empatia, nomeadamente, refletir sentimentos, estabelecer relacionamento afetivo, fazer amizades, prestar atenção ao outro, saber ouvir, respeitar os sentimentos e pontos de vista do outro. A empatia permite um olhar penetrante sobre determinada situação, visa a compreensão e o reconforto do outro permitindo ao mesmo tempo um certo distanciamento emocional da pessoa que ajuda que se inclina sobre as emoções do outro, para a sua própria forma de viver a dificuldade. Para o desenvolvimento de uma relação empática existem determinadas condições sem as quais se torna impossível a sua concretização (Lazure, 1994; Phaneuf, 2005; Riley, 2004; Rogers, 1987) e que são:

- A aceitação incondicional, sem a emissão de juízos de valor ou julgamentos. Esta aceitação vai permitir desenvolver no outro sentimentos de alívio e liberdade, uma vez que não sente a necessidade de lutar para defender o seu ponto de vista ou justificar a sua reação perante os outros. Respeitando a pessoa como ser único e aceitando-a como tal demonstra verdadeira consideração pelo outro com as suas experiências, os seus

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sentimentos e o seu potencial. Contribui para a autoconfiança ao evitar fazer juízos de valor ou dar conselhos.

- Escuta ativa. Escutar é mais do ouvir, “é constatar através do sistema auditivo estimulado, mas é também aceitar o facto de se deixar impregnar pelo conjunto das suas perceções internas e externas”, sendo por isso um “processo ativo e voluntário” (Lazure, 1994, p.15). A escuta é a única via de acesso à compreensão do outro. Ouve-se com os ouvidos e com o corpo todo, pelo contacto visual, aceno de cabeça, toque, encorajamento verbal e para verbal. As palavras não traduzem a realidade total da experiência dos indivíduos, somente associadas à expressão facial, ao tom de voz, aos gestos, ao silêncio se consegue descodificar de uma forma mais correta o verdadeiro significado da vivência do outro.

- Compreensão empática. Requer respostas objetivas, com uma reflexão verbal precisa e específica, sem exagerar ou minimizar o que foi relatado. Importa tentar perceber a mensagem no seu todo e saber retirar o essencial do problema para assim comunicar a compreensão do mesmo. É desejável que a comunicação verbal e não verbal de quem ajuda e o estado emocional do outro sejam congruentes. A compreensão e a reflexão empática podem ajudar o outro a perceber mais objetivamente as suas reações, pois ouvir refletir sobre os próprios sentimentos aumenta a sua consciencialização alargando assim a perspetiva de toda a situação. A demonstração de compreensão contribui para que o outro se sinta recompensado.

Consideramos estas habilidades de comunicação fundamentais e imprescindíveis na operacionalização e treino desta competência bem como a concentração, a observação, a autoconsciencialização e o assumir a perspetiva do outro. Ao estar com o outro atentamente, ouvindo, processando a informação e refletindo sobre o que foi dito, faz com que ele se sinta importante, facilita a reflexão de sentimentos e pode ser facilitador no aumento da autoestima (Castanyer, 2004).

Os estudos encontrados na literatura acerca da empatia revelam a sua importância em diversos âmbitos, nomeadamente no estabelecimento de relações interpessoais mais positivas, maior sucesso profissional, fortalecimento de laços afetivos, satisfação conjugal, diminuição da agressividade, conflitos e comportamentos desviantes (Pavarino, Del Prette & Del Prette, 2005; Falcone, 2000b; Ferreira, 2003; Jardim, 2007; Matos, 2008; Sanchéz-Queija, Oliva & Barra, 2006; Queirós, 1999; Sardinha, Falcone & Ferreira, 2009). Por tudo isto somos de opinião que o desenvolvimento desta competência se revelará uma mais-valia na vida dos adolescentes fazendo sentido inclui-la num programa de treino.

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