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Capítulo 2 – Competências sociais essenciais para relações interpessoais

4. Autocontrolo

4.1. Perspetivas explicativas das emoções

O início do estudo das emoções remete-nos para Platão, 400 anos a.C., e continua até aos dias de hoje. Teve desde sempre várias teorias explicativas das quais iremos referenciar apenas quatro, a teoria evolucionista de Darwin, a teoria fisiológica de James e Lange, a teoria cognitiva de Schachter e Singer e a teoria cultural, por serem as que consideramos como as mais significativas na compreensão das emoções.

- A Teoria Evolucionista que teve o seu impulsionador em Charles Darwin, cujo livro A Expressão das Emoções no Homens e nos Animais, escrito em 1872, é o resultado de todos os estudos desenvolvidos em torno da expressão das emoções que lhe permitiram concluir que as emoções são inatas; as expressões faciais são universais; a expressão de emoções não é exclusivamente humana; as emoções fazem parte do processo evolutivo nos seres humanos e são um poderoso instrumento de adaptação ao meio ambiente. Porque quando as pessoas nascem já têm capacidade de identificação e expressão emocional, Darwin denominou essas emoções como primárias, tendo identificado a raiva (ira ou cólera), o nojo (asco), tristeza, alegria, medo e surpresa (espanto).

Posteriormente, em 1934, Paul Ekman retomou os trabalhos de Darwin e é considerado atualmente o pesquisador científico de maior reconhecimento mundial no campo da expressão das emoções. Defende, tal como Darwin, a universalidades das emoções considerando-as independentes do processo de aprendizagem e cultura, salvaguardando a influência que determinadas regras sociais em determinadas culturas têm na maneira como ‘é permitido’ que se expressem as emoções. Relativamente às emoções primárias, Ekman acrescenta ‘o desprezo’ às seis identificadas por Darwin. Izard et al., (1998 citados em Vaz-Serra, 1999) são de opinião que ao longo do processo evolutivo da espécie humana os genes foram desenvolvendo uma tendência de uma resposta específica para uma emoção específica, ou seja, a determinada emoção corresponde determinada forma de pensar ou agir.

- A Teoria Fisiológica, cujos principais estudiosos foram William James (1842-1910) e Carl Lange (1834-1900). Estes autores defendem que as emoções são o resultado dos

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estados fisiológicos provocados pelos estímulos ambientais, isto quer dizer que o corpo reage (por processos fisiológicos ou comportamentais) antes de existir uma vivência emocional completa. A tomada de consciência de determinada emoção é consequência de uma ativação fisiológica prévia com determinada reação no organismo. Posteriormente Walter Cannon (1871-1943) e Philip Bard (1898-1977) vêm dizer contrariamente a James e Lange, que as emoções e as reações fisiológicas ocorrem simultaneamente e as reações fisiológicas das emoções não têm caraterísticas suficientemente distintas para variar consoante a emoção.

- A Teoria Cognitiva é baseada na premissa de que as emoções, para além dos componentes fisiológicos, têm sempre componentes cognitivos de interpretação. Stanley Schachter (1922-1997) e Jerome Singer (1924- ) conceberam a ‘Teoria dos dois fatores’ segundo a qual a emoção é determinada por dois fatores que são a ativação fisiológica e os marcadores cognitivos. Estes marcadores são produzidos através da informação que provém do meio ambiente e social e servem para qualificar as emoções. Baseia-se no princípio de que não é a situação em si mesma que provoca determinada resposta emocional mas a interpretação subjetiva ou avaliação cognitiva que se faz dela (podendo esta avaliação ser feita por processos conscientes ou subconscientes). Surgiram opiniões opostas de Lazarus e Zajonc acerca da primazia do pensamento ou da emoção na interpretação de um estímulo. Desta forma, se os processos cognitivos implicados forem disfuncionais (baseados em valores e crenças irracionais) criam por isso respostas emocionais também disfuncionais (como ansiedade elevada, por exemplo). Os defensores desta teoria acreditam que se se conseguir modificar o tipo de pensamento, também a reação emocional poderá ser modificada.

- A Teoria Cultural cuja premissa é: emocionamo-nos porque é cultural. Apesar das emoções terem caráter universalista a forma de expressão ou interpretação varia consoante a cultura. As regras que determinam como expressar as emoções variam com a cultura, condição social e capacidade cognitiva.

Atualmente sabe-se que a expressão facial apresenta fortes laços biológicos, como defendia Darwin, e pode ser exemplificado pelo seguinte: uma criança cega aprende a sorrir, da mesma maneira que outras crianças não cegas, sem nunca ter visto um rosto sorridente.

Hoje em dia, e com o avanço incontestável no campo das neurociências, salientamos a perspetiva de Damásio (2005) no que às emoções diz respeito. Identifica as emoções

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primárias como as emoções da infância, iniciais, inatas e as emoções secundárias as que resultam das primeiras por um processo de aprendizagem e diferenciação emocional. As estruturas neuronais implicadas nas emoções primárias encontram-se numa imbrincada rede de circuitos do sistema límbico, mais concretamente no cíngulo e na amígdala. As emoções secundárias requerem uma sofisticada rede neuronal que vai para além do sistema límbico estendendo-se aos córtices pré-frontal e somatosensorial. O autor considera duas vias no processo de tomada de decisão: por um lado, um processo consciente, que utiliza o raciocínio em várias etapas (avaliação, deliberação, decisão) e que escolhe o que parece ser a melhor opção no momento. Por outro lado, em situações que requerem uma resposta imediata, Damásio (2005) identifica os ‘marcadores somáticos’ como aspetos corporais que se vão construindo pela experiência e que associados a imagens mentais como agradável/desagradável, prazer/dor (entre outras) apesar de não serem por si só suficientes, ajudam na tomada de decisão aumentando a eficiência do processo não consciente. Ao simularem as consequências esperadas orientam as escolhas e ao atuar “como um sinal automático (…) pode fazer com que rejeite imediatamente o rumo de ação negativo levando-o a escolher outras alternativas (…) dentro de um lote mais pequeno (…)” (2005, p.185). Tomemos como exemplo a seguinte situação: quando uma pessoa passa por um café onde comprou um pastel que tinha um cabelo dentro, a sensação de nojo é evocada imediatamente ao passar nesse local e a tomada de decisão pode passar por um afastamento imediato do local.

Damásio propõe que as emoções estão presentes em todos os processos de decisão, mesmo quando aparentemente se tratam de processos puramente cognitivos e racionais. Neste sentido refere que a noção de competência social passa por um conjunto de capacidades mentais que permitem à pessoa saber o que se passa na sua mente e na dos outros, sendo estas capacidades avaliativas importantes para numa dada situação social problemática poderem ajudar na tomada de decisão eficaz ao reduzirem “a necessidade de filtragem ao permitirem uma deteção automática das componentes mais relevantes de um dado cenário” (2005, p.187).

Apesar das diferentes perspetivas apresentadas todas elas remetem para caraterísticas do processo emocional, hoje consensualmente aceites, tais como, a existência de emoções inatas que não requerem aprendizagem e que têm uma expressão corporal marcada com relevância para a face. Em termos fisiológicos, as emoções, permitem uma organização de respostas nos vários sistemas, partindo do sistema nervoso autónomo, simpático (pela ativação do organismo assegurando uma resposta rápida a um fator de stresse) e parassimpático (pelo relaxamento e regularização de estado geral do organismo). Apesar de existirem emoções universais a sua expressão requer regras que

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dependem do contexto cultural e desenvolvimento cognitivo da pessoa; as emoções têm uma componente motivacional que predispõe a pessoa a pensar e a agir de determinada maneira. A forma como as emoções se integram no nosso ser, guiadas por processos biológicos, psicológicos, sociais e culturais resultam numa relação com os outros e com o ambiente capaz de encontrar respostas adaptativas e funcionais neste trajeto evolucionista da espécie humana.