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O Ensino de Ciências na escola Waldorf estudada: leituras, vivências e diálogos

No documento O ensino de ciências em escolas alternativas (páginas 133-149)

4 REFLEXÕES SOBRE AS ESCOLAS NO BRASIL

NOME DO CURSO HORÁRIOS DE FUNCIONAMENTO DOS CURSOS

6.2.2 O Ensino de Ciências na escola Waldorf estudada: leituras, vivências e diálogos

Para descrever o Ensino de Ciências dessa escola foram consultadas as transcrições e anotações feitas em diário de bordo, resultantes das visitas, das observações informais sobre aspectos que chamaram atenção durante as vivências, das observações de algumas aulas de Ciências do Ensino Fundamental anos finais e das entrevistas realizadas com o coordenador

pedagógico e professor de Ciências e Biologia, WP. Os documentos escolares, como planos de ensino e PPP escolar, também foram consultados. Além disso, a participação no encontro do Grupo de Ciências Waldorf do Brasil, em abril de 2018, permitiu vivências em aulas e em discussões sobre o Ensino de Ciências Waldorf brasileiro, as quais geraram anotações, desenhos e transcrições em diário de bordo que também puderam ser utilizadas para esta caracterização.

Partindo, portanto, da busca pelos cinco eixos norteadores para o Ensino de Ciências preconizado (interdisciplinaridade, contextualização, história e filosofia da Ciência, CTS/CTSA, atividade investigativa) seguimos com a descrição sobre o Ensino de Ciências nesta escola. Lembramos ainda que, o fato de a pedagogia Waldorf se embasar na Antroposofia faz com que essa permeie todo ambiente escolar, estando presente tanto nos currículos e objetivos para cada área de ensino como na organização da estrutura escolar. Assim, a concepção de Ciência adotada por esta escola vai além da Ciência positivista ou pós-positivista discutida pela literatura, trazendo também aspectos espirituais vinculados a si. Dessa forma, para melhor compreender o Ensino de Ciências nessa escola, antes de descrever o observado, revisitamos o trabalho de Lanz (1979) que descreve em capítulos específicos o Ensino de Ciências e suas relações com a Antroposofia e consequentemente com a pedagogia Waldorf.

Tomando como princípio a ciência espiritual antroposófica, Lanz (1979) diz que o Ensino de Ciências nas escolas Waldorf, ou seja, as matérias científicas (zoologia, botânica, mineralogia, química, física, astronomia), são abordadas com o intuito de trazer o mundo para dentro da classe e abrir os olhos dos alunos para ele, além de, “ao mesmo tempo, ajudar as crianças em seu processo de encarnação” (LANZ, 1979, p. 120). Para isso, os estudos do autor juntamente com as palestras de Steiner (2016) trazem que o Ensino de Ciências deve respeitar o desenvolvimento espiritual e humano de cada criança/adolescente, seguindo os princípios da Antroposofia, tendo que levar em conta o desenvolvimento anímico, o despertar da consciência e o desenvolvimento da mesma durante todo o segundo setênio (dos 7 aos 14 anos), sendo que o ensino com auxílio de professores especialistas, das matérias científicas, só começa a ser introduzido a partir do 4º ano do Ensino Fundamental (LANZ, 1979).

Lanz (1979) realça ainda que o Ensino de Ciências nas escolas Waldorf é completamente fenomenológico, sendo embasado na fenomenologia de Goethe, abordando os conteúdos científicos a partir dos fenômenos observados na natureza. “Outro aspecto importante para o ensino das matérias científicas é a sequência das aulas. Num dia devem ser mostrados os

fenômenos (por exemplo, experimentos), no dia seguinte deve vir a explicação” (LANZ, 1979, p. 121). Sendo assim, o professor de Ciências, antes de compreender os fenômenos científicos que pretende ensinar, deve compreender o ser humano a quem ele está formando.

Seguindo, portanto, os princípios norteadores da pedagogia Waldorf, todas essas características descritas por Lanz (1979) e por Steiner (2016) se mostraram presentes no Ensino de Ciências desenvolvido nesta escola, sendo constatadas através das observações de aula, das entrevistas, conversas com o professor WP e através dos documentos visitados. Por exemplo, essa preocupação com a compreensão do desenvolvimento humano antes da compreensão do fenômeno e do desenvolvimento dele em aula também esteve presente na fala do professor WP quando questionado sobre os objetivos para o Ensino de Ciências na escola.

“A escola Waldorf tem nas disciplina o eixo, que é o aluno, é o desenvolvimento

do aluno, né? Então, nesse sentido, talvez a pergunta seja assim: O que que vive o aluno do 6ºano pra frente, para que ele tenha a Ciência, a Física e a Química surgindo no ensino fundamental? Né?” (Professor WP)

Ainda, a fala do mesmo professor também traz a importância da abordagem antroposófica e fenomelógica para a forma como se desenvolve o Ensino de Ciências nessa escola:

“A gente pode pensar assim, o aluno no 6º ano, no Ensino Fundamental, por volta

dos 12 anos, começa a puberdade, em média. E a puberdade ela é uma fase do desenvolvimento em que o jovem, agora, ele começa a ter uma forma de juízo diferente, uma forma de pensar, assim, diferente. Então, ao mesmo tempo, nessa idade ele pode começar a se reproduzir, corporalmente, de acordo com a Ciência, a partir dos 12 anos o corpo dele começa a ficar pronto pra reprodução. Nessa idade, portanto, como a gente tem na pedagogia Waldorf, ele também começa a ficar pronto para reproduzir ideias, mais abstratas e mais profundas. E esse desenvolvimento de pensamentos mais profundos, ele se dá primeiro através do juízo causal. Isso significa o que? Algo acontece, portanto, se isso acontece eu consigo chegar a uma conclusão em relação a isso.

Então, o ensino da Ciência, no ensino fundamental, ele é extremamente fenomenológico. Sendo que, nesse sentido, a física e a química, elas começam no Fundamental já como uma forma de apresentar um fenômeno e ajudar aos poucos o aluno a desenvolver essa capacidade de pensar, passando por todos esses âmbitos, entende?” (Professor WP)

Tais princípios, antroposóficos e fenomenológicos, orientam também a estruturação das aulas, mantendo a estrutura trimembrada advinda da Antroposofia, sendo que o fenômeno a ser estudado é apresentado ao estudante na etapa do Querer através de um experimento, uma dinâmica ou uma narrativa, buscando despertá-lo para observação do fenômeno a ser estudado. A etapa do Sentir geralmente conta com uma descrição feita pelos estudantes sobre o que sentiram e/ou observaram sobre o fenômeno e, somente na etapa do Pensar que o fenômeno realmente será compreendido, raciocinado e relacionado ao mundo. Podemos observar essas etapas através da descrição feita durante observação de uma aula de Ciências no 9º ano, ministrada pelo professor WP, e que segue no seguinte registro:

“Pude notar que, na aula anterior os estudantes haviam trabalhado sobre a visão e estavam estudando os órgãos do sentido. Dia 10 de maio de 2018, encerrado o “Pensar” da aula anterior, o professor WP deu início ao passo 1 da nova aula, o “Querer”. Para estimular a curiosidade dos estudantes o professor trouxe para esse início diversas imagens de ilusão de óptica que, projetadas em slides, foram vistas pelos alunos, os quais comentavam o que estavam vendo a cada slide. Instigados, logo o professor seguiu com o passo 2 da aula, o “Sentir”, onde pediu que os alunos descrevessem o que haviam visto. Em círculo, os alunos comentavam sobre o que viram, imaginaram e sentiram. A aula encerrou, então, com WP pedindo para que eles fizessem desenhos e descrições da aula vivenciada em seus cadernos, como tarefa de casa.

Dia 11 de maio de 2018, iniciando a aula com o passo 3 da aula anterior, o professor WP propôs que os estudantes relatassem as descrições que haviam feito em seus cadernos. Propôs então um desafio. O desafio da “Aresta do Cubo”, ao desenhar um cubo na lousa, apontou para um vértice superior, perguntando se os estudantes o enxergavam projetado a frente ou atrás do cubo. O desafio era fazer com que os estudantes conseguissem ver o cubo das duas formas, com o vértice em um momento a frente e em outro momento atrás do cubo. A maioria deles conseguiu, porém, descreveram que foi difícil conseguir enxergar essa ilusão de ótica das duas maneiras possíveis. Através dessas observações os estudantes, respondendo as indagações feitas pelo professor, conseguiram concluir que, para compreender a formação de imagens em uma ilusão de ótica não basta somente olhar, torna-se necessário um esforço interior, que acomoda os olhos e nos permite enxergar a mesma coisa por diversos ângulos.” (Diário de Bordo - Escola Waldorf, 2018)

Esclarecemos aqui que, apesar de tal relato aparecer claramente dividido nas etapas Querer, Sentir e Pensar, em nenhum momento o professor se referiu, em aula, sobre elas, ou ainda relatou aos estudantes o momento em que uma etapa se encerraria para dar início a outra. Tal separação foi feita pela pesquisadora no esforço de identificar essa diferente estrutura de aula enquanto assistia e observava a mesma, após ter compreendido e estudado sobre a estruturação das

aulas em uma escola Waldorf. Assim, notamos a trimembração das aulas através da prática do professor e de seus objetivos apresentados para cada atividade proposta.

Além de orientar a ação dos professores e a estruturação das aulas, o cerne da pedagogia Waldorf juntamente com a fenomenologia norteiam, também, a estruturação do currículo de Ciências. Sendo o mesmo elaborado de acordo com os princípios da escola em conjunto com as exigências dos documentos oficiais vigentes. O currículo previsto para o Ensino de Ciências da presente escola pode ser observado no quadro 10.

Quadro 10 – Organização do currículo para o Ensino de Ciências – Escola Waldorf

Nível Eixo Temático

Conteúdo Programático 4º ano Biologia - Os seres vivos;

- Zoologia.

5º ano Biologia - Seres fotossintetizantes; - Botânica.

6ºano Física - Acústica: introdução aos fenômenos acústicos básicos (vibração, tons, volume e timbre), transmissão de som e ressonância;

- Ótica: claro-escuro, vivência de cores complementares, luz e sombra. - Magnetismo: imãs, polos norte e sul magnéticos, atração e repulsão.

- Termologia: contraste entre calor e frio, fontes de calor, fricção, combustão, fusão. - Eletricidade: produção de eletricidade estática e seus efeitos.

7ºano Física Química

- Ótica, acústica e termologia com outros experimentos.

- Eletrodinâmica: noções de corrente, voltagem, resistência elétrica, isolantes térmicos, perigo das correntes elétricas, relampados, aplicações técnicas.

- Magnetismo: noções de campo, polos, magnetismo natural e imantação.

- Mecânica: alavancas, roldanas, planos inclinados, engrenagens de rodas dentadas. - Fenômenos ligados à combustão: o fogo em suas várias formas, observação de resíduos da combustão.

- O aparecimento do gás ácido e da base, outros ácidos. - Estudo dos metais (utiliza-se como base a mineralogia). - Estudo dos sais, ácidos, base e suas propriedades.

8ºano Física Química

- Acústica e Ótica de forma aprofundada, buscando desenvolver a observação, os órgãos do sentido e sua presença no cotidiano.

- Eletricidade: efeitos térmicos e químicos, condutibilidade, campainha elétrica e telégrafo.

- Mecânica: hidrodinâmica, aerostática e aerodinâmica, hidráulica, pressão da água e pressão atmosférica (Explicar os princípios meteorológicos, os tipos de nuvens a formação de ciclones, etc).

-Estabelecer tantas relações quanto forem possíveis entre a Química e as outras matérias.

- Ampliar os conceitos químicos estudados no 7º ano, de forma a demonstrar o quanto os processos industriais estão ligados a química.

Nível Eixo Temático Conteúdo Programático 9ºano Biologia Física e Química*

- Os órgãos sensoriais, principalmente olhos e ouvido. - Visão: estrutura e funcionamento dos olhos.

- Audição: estrutura e funcionamento dos ouvidos. - Sentidos químicos: paladar, olfato e tato. - Anatomia e fisiologia óssea e muscular. - Esqueleto: visão geral e detalhes. - Radialidade e esfericidade.

- Anatomia comparada do esqueleto humano com o de outros animais. - Tipos de articulação e sua mecânica.

- Arcada dentária: instrumento universal de alimentação. - Estrutura e funcionamento da musculatura.

- Músculos extensores e contração. * Física e Química.

* O 9º ano das escolas Waldorf é estruturado como parte do Ensino Médio, portanto possui a divisão das Ciências em Biologia, Física e Química com seus respectivos professores especialistas. Como o foco do presente estudo é o Ensino de Ciências nos anos finais do Ensino Fundamental procuramos conversar com o professor responsável pela disciplina “Ciências”, WP, o qual ministra apenas as aulas de Biologia no 9º ano. Não tivemos a oportunidade de entrevistar os professores de Física e Química, tampouco os documentos disponibilizados (PPP e Planos de aula) trouxeram o conteúdo programático desses elementos curriculares. Entretanto, sabemos que ambos os eixos temáticos (Física e Química) também são desenvolvidos neste ano.

Fonte: Plano de Ensino de Ciências da escola Waldorf, 2018

Ainda, de acordo com o professor WP, o currículo seguido atualmente pelas escolas Waldorf provém, inicialmente, de apontamentos trazidos por Rudolf Steiner em suas palestras. Entretanto, o professor relata que, atualmente, existem livros de trabalho, discussões em grupo de estudos e traduções do trabalho de Steiner que permitem a elaboração de um esqueleto de currículo para o Ensino de Ciências, o qual é seguido. Entretanto, esse currículo mínimo estabelecido também é estudado constantemente de acordo com o desenvolvimento humano de cada nível de ensino, podendo ser modificado conforme as necessidades do professor e/ou dos estudantes. Nas palavras de WP:

“Ao mesmo tempo que o currículo tem norte, ele é muito vivo, ele permite que o professor mude isso. Porque quando eu viro professor Waldorf, ninguém vai me dizer “olha, no 10º ano o que você tem que fazer é isso e no 11º é isso”. Porque eu, enquanto professor posso dizer não, olha isso não se encaixa aqui, vou fazer isso no 12º ano. E essa é uma opção minha, se for coerente pra mim e para minha sala, né?” (Professor WP).

Dessa forma, tanto ao observar o currículo pré-estabelecido quanto a fala do professor notamos a presença dos princípios antroposóficos e do foco em um Ensino de Ciências que se

desenvolve através do estudo dos fenômenos. Relembramos ainda que Amaral (2000), Cachapuz, Praia e Jorge (2004) e Pacheco (1996), ao discutirem o currículo para o Ensino de Ciências, fazem críticas ao foco atual predominante, extremamente acadêmico, conteudista e desvinculado do caráter experimental e do contexto do estudante, sugerindo um Ensino de Ciências que privilegie a profundidade das abordagens programáticas e não a sua extensão.

A organização das aulas, a formação dos professores e a estruturação do currículo de Ciências nessa escola dão indícios de uma formação mais ampla e próxima do objetivo de formar cidadãos cientificamente cultos, sendo que, ao permitir abordagens diversas e profundas sobre os diferentes fenômenos científicos e ao objetivar que ele seja vivenciado e observado no mundo e no contexto do estudante, se afasta do ensino somente conceitual e de caráter transmissivo, se aproximando de um Ensino de Ciências mais amplo. Assim, acreditamos que, por ter os princípios pedagógicos da fenomenologia e do estudo do desenvolvimento humano permeando todas as ações escolares, desde a formação de professores até a estruturação da sala de aula, se esquivando do ensino memorístico e transmissivo desde o início, que na presente escola conseguimos identificar o desenvolvimento de todos os eixos pedagógicos elencados por nós e preconizados pela literatura para um Ensino de Ciências diferente do convencional, os quais serão apresentados nesse momento.

Em um contexto mais amplo, observamos a transdisciplinaridade da Antroposofia na escola, que permeia desde a pedagogia desenvolvida até as relações humanas ali presentes, sendo notada também no desenvolvimento do Ensino de Ciências, como podemos observar no relato seguinte, do professor WP:

“As experiências e as aulas, elas são pensadas de acordo com o que está vivendo na alma do aluno. Então, se eu tenho uma aula, chego na escola, e eu tenho perguntas dentro de mim e eu não entendo quais são essas perguntas...e aí o professor vem e oferece uma vivência, que é um enigma e essa vivência corresponde ao que eu estou vivendo dentro da minha alma, não tem como não ficar atento a ela, você entende?”(Professor WP)

Como menciona o professor, é essa vivência, essa experiência elaborada conforme as necessidades do estudante, de acordo com a Antroposofia, que considera aquilo que ele, estudante, enquanto ser humano, está vivendo e que permite o desenvolvimento de um Ensino de Ciências interativo e interessante. Além disso, a transdisciplinaridade, conforme descrita por Japiassu (1976), enquanto último nível de interdisciplinaridade, na qual as disciplinas se coordenam e

colaboram entre si de forma mútua, também pode ser observada no PPP da escola, em outros trechos da entrevista com o professor WP e, ainda, durante a vivência no Grupo de Ciências Waldorf, no qual professores das mais diversas áreas do conhecimento (matemática, linguagens, geografia, português, química, história etc.) contribuíam com relatos, conteúdos e experiências em discussões sobre as aulas de Ciências apresentadas para o ensino Fundamental e Médio. As discussões eram de cunho pedagógico, metodológico ou ainda curricular e tinham o intuito de, em conjunto, tirar dúvidas e aprimorar o desenvolvimento do Ensino de Ciências dentro da pedagogia Waldorf.

Sobre transdisciplinaridade, o PPP da escola traz o seguinte:

“No Ensino Fundamental destacam-se, como aspectos peculiares da pedagogia, a figura do Professor de Classe e a adequação do conteúdo e metodologia com cada etapa de desenvolvimento. A avaliação é qualitativa, as aulas modulares são conhecidas como aulas em épocas, com abordagens transdisciplinares dos conteúdos, para as quais o Professor de Classe conta com o apoio de auxiliares especialistas nas diferentes áreas abordadas - quer nas áreas científicas, quer nas atividades artísticas múltiplas, trabalhos manuais, atividades lúdicas, entre outras.” (PPP - Escola Waldorf, 2018).

Em outras palavras, de acordo com a pedagogia adotada pela escola, a transdisciplinaridade se dá por meio de uma abordagem diferenciada dos conteúdos e, para que a mesma ocorra, os professores contam com auxiliares especialistas das diferentes áreas, os quais atuam em conjunto em torno de um mesmo objetivo, garantir o desenvolvimento do estudante. Essa experiência transdisciplinar é reforçada ainda pelo professor WP que, quando questionado sobre como costuma preparar suas aulas responde o seguinte:

“Mas então, na prática, respondendo a sua pergunta, eu tenho que dar aula amanhã, o que que eu faço? Eu tenho esse arcabouço por traz, eu tenho pessoas experientes, que eu posso contatar. Eu sempre recebo mensagens, e-mail, whatsapp de pessoas que começaram a dar aula em escola e que falam “nossa, que material que eu uso, o que eu posso fazer?” (...) A gente tem muita tutoria, tanto o professor que vem de fora, quanto o professor daqui que vai pra tutoria em algumas escolas. Então eu acompanho esse professor, a gente conversa, as trocas se dão por aí. E os livros.” (Professor WP).

Assim, através do relato do professor, percebemos que a união entre pessoas de diferentes áreas realmente ocorre em torno de um bem comum, com a troca de experiência entre colegas e

com a tutorias de um professor mais experiente para outro iniciante. Ainda, para além da transdisciplinaridade vivenciada, o Ensino de Ciências nessa escola também apresenta aspectos interdisciplinares.

Por exemplo, retomando a aula sobre visão e ilusão de ótica relatada anteriormente, pudemos observar que tantos conceitos advindos da física, sobre ótica, quanto da neurociência, sobre o processamento dessa imagem pelo cérebro, são levantados, tanto pelo professor quanto pelos estudantes, para compreensão do fenômeno da ilusão gerada a partir da imagem observada. Ainda, outras aulas observadas, os documentos consultados e o relato de aulas trazidos pelo professor WP durante as entrevistas realçam esse aspecto, demonstrando que as trocas advindas da transdisciplinaridade também cooperam para que um único professor seja capaz de introduzir aos estudante o fenômeno de forma interdisciplinar, levando em consideração as diversas áreas do conhecimento necessárias para a explicação daquele fenômeno.

Esses mesmos instrumentos de coleta de dados permitiram, também, os registros de situações em que os eixos CTS/CTSA, História e Filosofia da Ciência, atividades investigativas e contextualização também estão presentes. A maior parte desses eixos pode ser identificada na situação de aula observada e relatada a seguir.

“Os estudante tiveram, como tarefa da aula anterior, que apresentar a animação que eles haviam produzido em bloquinhos de papel. Em círculo, os alunos podiam se levantar e andar até os colegas, assistir e apresentar as animações feitas, de forma simples, desenhadas no papel, como eram feitas antigamente. Para dar continuidade com o “Pensar”, o professor WP trouxe um pouco da história da

animação e do cinema. Comentou sobre “Fantasmagoria”, o 1º desenho animado produzido. Trouxe também uma curiosidade, contando, de forma narrativa, sobre uma propaganda muito discreta, como uma mensagem subliminar, que a Coca Cola colocou nos cinemas antigamente. As pessoas estavam assistindo o filme e, de repente, sentiam vontade de tomar Coca. A partir dessa história ele instigou a curiosidade dos alunos e começou a fazer perguntas, dialogando com eles. Fez perguntas como: “O que faz com que uma imagem se transforme em um filme?” “Por que quando eu passo as imagens rapidamente eu vejo elas como um filme?”

No documento O ensino de ciências em escolas alternativas (páginas 133-149)