• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 4 – Estratégias de escolha em curso no Brasil

4.4 Escolhas Representativas

Nas escolhas Representativas, conforme Quadro 19 abaixo, temos 103 instituições federais de ensino superior, incluindo universidades, institutos federais e centros tecnológicos de educação superior, além de 3 fundações. As escolhas são predominantemente representativas para os 542 cargos de direção36, com apenas 97 dos cargos (16%) providos discricionariamente.

Sigla da organização Natureza jurídica Nível do cargo Nome do cargo

Qtde. de

cargos Estratégia

1 FCRB F N1 Presidente 1 Representativa

N2 Diretor Executivo 1 Discricionária

2 FIOCRUZ F N1 Presidente 1 Representativa N2 Vice-Presidentes 4 Discricionária N2 Diretor 16 Representativa 3 FUNDACENTRO F N1 Presidente 1 Representativa

N2 Diretor Executivo 1 Representativa

N2 Diretor 2 Discricionária

4 103 IFES 23 F e 80 A

N1 Reitor 103 Representativa

N2 Vice-Reitor e Diretores 341 Representativa

N2 Pró-Reitores 83 Discricionária

Quadro 1919 organizações com estratégia - Estrutura de direção das organizações com estratégia Representativa. Fonte: elaboração do autor.

Nota(1): os dados totalizam 106 cargos de primeiro nível hierárquico e 436 cargos de segundo nível hierárquico, distribuídos em 80 autarquias

e 26 fundações.

Nota(2): para mais detalhes, consultar o Apêndice H.

A Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB) foi aqui classificada pela adoção eventual de um processo de escolha de seu Presidente baseado em consulta à comunidade escolar, para indicação de nomes com origem no quadro de pessoal da própria fundação:

Não existem critérios nem mecanismos formais para o processo de escolha dos dirigentes. No entanto, em 2015, com a posse do Ministro Juca Ferreira no comando do Ministério da Cultura, foi estimulada a participação do conjunto dos servidores da FCRB na indicação de uma relação de nomes, membros do corpo funcional, em ordem de preferência, para ocupar a Presidência da instituição. Após amplo processo de debate interno, foi indicada uma lista tríplice, liderada por pesquisadora do quadro efetivo da FCRB, sendo a indicação acatada pelo ministério e a servidora nomeada pela Presidenta da República. O processo de consulta interna foi reproduzido também nos Centros finalísticos, cujos servidores indicaram os Diretores nomeados pelo Ministro. O Diretor Executivo e a Coordenadora Geral de Planejamento e Administração, foram indicados pela Presidente (FCRB, 2016b).

Dados adicionais, no entanto, não foram disponibilizados pela FCRB, que nos informou que “não há documentação ou qualquer regulamentação detalhando os procedimentos para a escolha. A consulta foi informal e não há, portanto, material público a ser disponibilizado” (FCRB, 2016a).

A Fundação Jorge Duprat e Figueiredo (FUNDACENTRO), por sua vez, informou não adotar nenhum procedimento de seleção, tendo seus ocupantes definidos pelo Ministro do Trabalho e Previdência Social. No entanto, informou e disponibilizou minuta de projeto que prevê a nomeação do Presidente e de seu Diretor-Executivo após análise curricular, a ser realizada por seu Conselho Curador, seguida do encaminhamento de nomes para que seus servidores, por votação, optem pela conformação de uma lista tríplice que, então, será encaminhada para escolha do Ministro. Este processo se assemelha ao praticado pela FIOCRUZ.

A Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) tem seu Presidente escolhido a partir de lista tríplice, indicada pela comunidade de servidores da Fundação, após processo eleitoral, baseado no voto direto, para a conformação dos nomes. Este procedimento também é adotado em suas Unidades Técnico-Científicas, que se assemelham aos institutos de pesquisa do MCT. O Vice-Presidente é escolhido livremente pelo Presidente. Para os cargos de Presidente e de Diretor de Unidade podem candidatar-se profissionais de reconhecida competência técnico-científica, pertencentes ou não ao quadro de funcionários da FIOCRUZ, segundo seu regimento interno (FIOCRUZ, 2016; 2003).

Temos, por fim, as instituições federais de ensino superior, incluindo as universidades. Para as segundas, seus dirigentes são escolhidos a partir da conformação de uma lista tríplice elaborada pelo colegiado máximo da organização e só podem ser compostas por “docentes integrantes da Carreira de Magistério Superior, ocupantes dos cargos de Professor Titular ou de Professor Associado 4, ou que sejam portadores do título de doutor” (IFES, 2007; 1996; 1995). Para os demais casos, com exceção dos Pró-Reitores de institutos federais, os Reitores e Vice-Reitores devem ser escolhidos também dentre o quadro de docentes da instituição, devendo possuir 5 anos de efetivo exercício em instituição federal de educação profissional e tecnológica e possuir, alternativamente, título de doutor ou estar posicionado nos dois níveis mais elevados

da carreira do Magistério. Para cargos de Diretor, há a possibilidade de o candidato ser originário de carreiras técnico-administrativas da instituição, mas respeitando tempo mínimo de exercício e formação, como no caso dos Reitores. Nos casos em que a organização não possui profissionais com estes perfis, as listas podem ser completadas com docentes de outras unidades ou instituição.

Tais previsões relacionadas à escolha dos dirigentes dialogam diretamente com os princípios da educação superior no país, estabelecidos pelo artigo 56 da Lei nº 9.394, de 1996:

Art. 56. As instituições públicas de educação superior obedecerão ao princípio da gestão democrática, assegurada a existência de órgãos colegiados deliberativos, de que participarão os segmentos da comunidade institucional, local e regional. Parágrafo único. Em qualquer caso, os docentes ocuparão setenta por cento dos assentos em cada órgão colegiado e comissão, inclusive nos que tratarem da elaboração e modificações estatutárias e regimentais, bem como da escolha de dirigentes (Lei nº 9.394, de 1996).

Este modelo de escolha Representativa, além de não enfatizar a dimensão das competências gerenciais de seus dirigentes, à semelhança das categorias tratadas até aqui, restringe, com exceção da FIOCRUZ, a nomeação de seus dirigentes a servidores pertencentes aos seus quadros de pessoal, a não ser em algumas posições em que as escolhas são Discricionárias, conforme demonstrado.

Tal aspecto tem levado, em geral, a duas principais discussões. Para os defensores do modelo, debate-se o aprimoramento dos mecanismos de escolha, de modo a serem mais representativas. Para os institutos federais, por exemplo, a consulta escolar por meio do processo eletivo dá pesos iguais para o corpo docente, o corpo discente e para os servidores técnico-administrativos (IFES, 2008), enquanto para as universidades a consulta prévia à comunidade universitária deve estabelecer o peso de 70% para a manifestação do pessoal docente em relação à das demais categorias (IFES, 1995).

O objetivo está associado à discussão recorrente de tornar as instituições mais democráticas, aprimorando os processos de escolha e entendendo que tais escolhas influenciam, diretamente, no processo de gestão escolar; assim, quanto mais democrática e participativa a decisão, mais democrática e participativa será a gestão do futuro dirigente e melhor representados estarão os membros da organização (OLIVEIRA; MORAES; DOURADO, 2017; FERREIRA, 2008). Há, no entanto, uma vinculação direta deste modelo ao fortalecimento do corporativismo das carreiras na área da educação. O estudo de Peci (2008), já citado, ao analisar diferentes modelos de escolha para as agências reguladoras federais, consultou alguns entrevistados em relação aos modelos de escolha fechados para servidores. Nesse sentido, um dos entrevistados se manifestou da seguinte maneira:

O problema de ter Diretor de quadro próprio como obrigação é o problema do corporativismo; porque ele é diretor naquele momento e ele sabe que vai voltar pra funcionário de carreira, ele não vai contrariar nenhum dos interesses dos funcionários de carreira; que é o que acontece, muitas vezes, com as universidades, né, o cara só pode ser reitor se for do quadro, só pode ser diretor da faculdade se for do quadro, chefe do departamento se for do quadro, e aí lá ele não compra nenhuma briga, não

faz nenhum enfrentamento, porque?, porque ele vai voltar a ser professor, aquele cara vai ser companheiro de trabalho dele por mais de trinta anos [...] (PECI, 2008, p. 35).

O problema em ser servidor é apontado justamente pela falta de incentivo deste dirigente em comprometer-se com o resultado nos casos em que são necessárias ações que contrariem interesses corporativos. No mesmo sentido, quando questionado sobre o modelo mais adequado para a escolha de Reitores universitários, Bresser Pereira (2007) defendeu as vantagens do comitê de busca em relação às ao método de lista tríplice composta por eleição. Enquanto o primeiro método é aquele adotado pelas universidades americanas, o segundo é típico das universidades estaduais brasileiras:

O comitê de busca assegura a escolha de administradores mais competentes porque a escolha é eminentemente técnica, ao invés de ser uma ação entre amigos como é no sistema de eleição, e porque o universo de candidatos não se limita aos professores, mas se abre para todos os administradores escolares ou de organizações semelhantes que existam no país [...] Na gestão das organizações não faz sentido falar em democracia; o essencial é falar em liderança e em respeito a direitos. Em princípio, na gestão de organizações, a escolha dos dirigentes deve ser feita de acordo com critérios de competência profissional, não de apoio prévio de seus futuros subordinados (BRESSER PEREIRA, 2007, p. 1)

Nos primeiros anos da reforma gerencial no país, segundo o Entrevistado 1 (2016), não se obteve avanço algum no âmbito das universidades, embora se propusesse, à época, que adotassem o modelo de organizações sociais, assim como foi feito para os institutos de pesquisa do MCT, e que adotassem modelos de escolha similares ao que veio ser proposto para o MCT alguns anos mais tarde, ou seja, a adoção dos comitês de busca. No entanto, segundo entrevistados, o principal empecilho para o avanço das reformas esteve muito relacionado ao forte peso corporativista destas organizações: “não, a cultura das universidades não... é muito corporativista, não tem jeito, não tem jeito” (ENTREVISTADO 1, 2016). Há, assim, uma forte oposição nesse debate entre o peso do corporativismo das carreiras, pautado pelo discurso da democratização das escolhas e a orientação dessas organizações aos resultados pretendidos. Marcovitch (2015), ex-Reitor da Universidade Estadual de São Paulo (USP) baseado em pesquisa sobre modelos de escolha junto a 27 das principais universidades em todo o mundo, tais como a Universidade de Oxford (Inglaterra); de Lausanne (Suíça); de Lyon (França); de Berlin (Alemanha); e de New York (EUA), para citar algumas, demonstrou as vantagens e desvantagens dos comitês de busca, comparando-o ao modelo atual de eleições indiretas, ou eleições por colegiados, compostos, em sua grande maioria, pelos corpos docentes das universidades:

Eis a resposta que nos foi enviada pelo dr. Bernard J. Shapiro, da McGill University, do Canadá: “Eu não acredito que em nosso meio o voto direto pelos estudantes e/ou funcionários da universidade seria muito bom. As contendas envolvendo publicidade politizam desnecessariamente o ambiente e raramente produzem a liderança necessária para uma instituição acadêmica. Além do mais existem muitos ‘stakeholders’ da universidade que não são representados por aqueles que frequentam a Universidade ou que nela trabalham” (MARCOVITCH, 2015).

Seguindo na mesma defesa daquela proposta por Bresser Pereira (2007), há um entendimento de que “vincular o funcionamento da instituição aos interesses do sindicalismo interno e posições corporativas ou partidárias é o mais grave erro que se pode cometer numa escolha reitoral” (MARCOVITCH, 2015), já que o principal aspecto a ser considerado é a capacidade de liderança e, acrescentamos, o conjunto das competências específicas do dirigente, aí incluída sua habilidade de diálogo não apenas com os membros do corpo interno da organização, mas com seus diversos parceiros externos.

Conclusões preliminares

Para concluir, indicamos os seguintes aspectos apreendidos da análise do material coletado no âmbito das organizações com escolhas Representativas:

- A maioria expressiva das organizações com escolhas Representativas é composta pelas instituições federais de ensino superior, razão pela qual a discussão sobre as escolhas de dirigentes, nestes casos, está diretamente associada a aspectos específicos das políticas públicas da área acadêmica; são exceções a FIOCRUZ, organização que atua com pesquisa científica e tecnológica de ponta na área da saúde, e as fundações FCRB e FUNDACENTRO, a primeira mencionada pela adoção esporádica deste mecanismo de escolha e a segunda porque defende o uso deste modelo para futuros dirigentes; em todos os casos, o aspecto central está na defesa da participação de servidores nos processos de escolha e na reserva dos espaços de direção para quadros da organização;

- Este procedimento de escolha Representativa está relacionado à forma como o espaço de direção é compreendido: para dirigentes mais representativos, busca-se um mecanismo de escolha baseado na participação e representação dos diferentes membros que compõem o quadro de pessoal da organização;

- A crítica ao modelo das eleições nas universidades associa-se à crítica ao corporativismo de seu corpo docente que, além de impedir avanços ou mudanças nos procedimentos de escolha vigentes, teriam impedido avanços na própria redefinição do modelo de ensino superior no país, na época da reforma gerencial, afastando as instituições de ensino federais das práticas mais avançadas e modernas do cenário internacional;

- Em geral, a escolha a partir de processos eletivos é confrontada com a adoção de comitês de busca, modelo adotado por universidades internacionais e entendido como mecanismo capaz de orientar a escolha de dirigentes com capacidade de liderança e orientação a resultados; o modelo Representativo estaria orientado essencialmente por aspectos democráticos e corporativos, levando à politização indevida dos espaços de direção; - No caso do MCT, que veremos a seguir, o modelo do comitê de busca emerge no início

dos anos 2000, inspirado pelo modelo das universidades americanas; até hoje, não está isento de pressões de cunho corporativo; sofre pressões para incorporar a participação dos servidores em seus processos de escolha;

- Por fim, por enfatizar as escolhas precedidas de processos eleitorais capazes de conferir à direção da organização maior representatividade de seu corpo de servidores, tal categoria, à semelhança das categorias tratadas até aqui, não enfatiza a dimensão das competências gerenciais de seus dirigentes.