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Museus I N2 * /DAS-1 ou FCPE-

CAPÍTULO 6 – Alcances e limitações das escolhas Gerenciais à luz das experiências internacionais

6.4 Papel e independência dos comitês de busca

No Ministério da Ciência e Tecnologia, conforme mencionado, o surgimento do modelo de comitê de busca está atrelado à ideia de reunir um grupo de profissionais de alto nível, em geral, pesquisadores científicos e tecnológicos, de quem é esperada atuação independente e orientada a subsidiar, mas não substituir, a escolha política a respeito do futuro ocupante de cargos de Diretor no âmbito dos institutos de pesquisa. A responsabilidade pela escolha final do dirigente é, portanto, compartilhada. Além da avaliação dos candidatos que se submetem ao processo de escolha, o comitê tem, ainda, o papel de buscar potenciais candidatos aptos a ocupar o cargo e, antes disso, de delimitar com clareza qual o perfil profissional requerido para o futuro dirigente, a partir de discussões e alinhamentos que partem da própria clareza em relação à missão e aos resultados esperados da unidade de pesquisa.

Para subsidiar, mas não substituir, a escolha política, o modelo desenhado na gestão do Ministro Sardenberg buscou aprimorar os elementos do modelo anterior, adotado por Bresser Pereira, defendendo, como aspectos fundamentais constitutivos deste comitê a sua composição ímpar de membros externos ao ministério e sua atuação completamente independente em relação ao órgão e ao próprio Ministro, autoridade política responsável pela escolha final do candidato e posterior nomeação, buscando proteger o comitê de interesses políticos ou corporativos. Esta discussão a respeito da independência do comitê de busca reflete-se, diretamente, na forma como são definidos os seus membros. Nesse sentido, um primeiro aspecto a ser destacado é que, em todos os modelos, esta escolha é prerrogativa do Ministro ao qual o órgão está vinculado. Por essa razão, o Entrevistado 7 (2016) afirma que cabe ao próprio ministério garantir a independência na composição dos comitês de busca. Embora a escolha seja da autoridade política, não há impedimentos para que estes membros sejam recomendados por servidores da própria organização ou atores externos. No MCT, tradicionalmente, a área responsável pela gestão das unidades de pesquisa do ministério é quem costumava sugerir uma lista para a composição dos comitês (ENTREVISTADO 4, 2016).

Aspecto fundamental do modelo diz respeito, portanto, aos critérios adotados para a escolha dos avaliadores. No âmbito do MCT, defende-se, desde a emergência dos comitês, que sua composição considere profissionais e pesquisadores do mais alto nível, reconhecidos em seu meio, com ampla experiência nos assuntos relativos à unidade de pesquisa para a qual se realiza

a seleção. A defesa de um modelo independente não constitui marca da experiência do IBRAM, mas espera-se que o comitê de seleção seja composto, igualmente, por profissionais com notório saber em assuntos do setor museológico, e, quando possível, em assuntos específicos do museu para o qual se realiza a seleção. A esse respeito, o Entrevistado 8 (2016) ressalta, para o caso do IPEN, a importância de ao menos parte dos membros do comitê terem um profundo conhecimento da cultura organizacional da instituição para a qual se realiza o processo de escolha, a partir de algum contato mais direto com a mesma, para que sejam capazes de avaliar a capacidade do dirigente de lidar com a dimensão da gestão administrativa e de pessoal do órgão, quando nomeado: “[...] não adianta você trazer uma pessoa ótima de um outro lugar que ele venha com uma cultura totalmente diferente e vai ter um choque e aí o cara acaba não conseguindo realizar muita coisa. Então isso eu acho que acaba sendo um problema”.

Há, portanto, um dilema a ser enfrentado nestas escolhas: buscar membros que detenham um profundo conhecimento daquela organização e do seu escopo de atuação, mas que, ao mesmo tempo, não tenham vínculo direto com a mesma. Denominamos este aspecto como um dilema porque no âmbito dos institutos de pesquisa os conhecimentos requeridos são muitas vezes tão específicos que não existe quantidade expressiva de profissionais para atuar como membros dos comitês ou para concorrerem às seleções. Este é um aspecto presente nestes casos, relatado pelo JBRJ: muitas vezes, um potencial candidato é considerado para o cargo de direção, mas, devido à falta de interesse em assumir a posição, é convidado para atuar como membro do comitê de busca.

Já retomando o aspecto da possibilidade de recomendação de membros para os comitês de busca, entendemos que o fato de tal recomendação não se dar de forma regulamentada – em nenhum caso está explícito quem pode sugerir os nomes aos Ministros – implica na configuração de um cenário no qual são exercidas pressões diversas justamente orientadas a influenciar esta escolha. No âmbito do MCT, faltando 6 meses para o término dos 48 meses de exercício do Diretor, cabe regimentalmente ao Comitê Técnico Científico de cada UP solicitar, ao Ministro, a instauração do comitê de busca, mas não está previsto que o CTC recomende seus membros. No entanto, em 2015, quando esta regra foi descumprida pelo Ministro em exercício para o caso do INPE, houve forte pressão dos servidores para que o comitê fosse redefinido, permitindo sua representação dentre os novos membros. Segundo o Sindicato Nacional dos Servidores Públicos Federais na área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial (SindCT), o Ministro Pansera teria atropelado esta norma “para atender lobby” (MARCIANO, 2016b):

A manobra deu certo: o ministro Pansera atropelou o regimento (e a direção atual) e encaminhou as medidas almejadas pelos lobistas [Rogério Cézar de Cerqueira Leite, presidente do Conselho de Administração da “organização social” do CNPEM, de Campinas; e Helena Nader, presidenta da SBPC]. A presidenta da SBPC faz parte do CTC, embora não tenha comparecido no dia de sua posse. Contudo, ela não foi ao MCTI em nome do conselho e sim por seus próprios interesses. É fácil saber por que o CTC foi deixado de lado: quem o preside é o diretor do INPE, que foi ignorado pelo Ministro e só ficou sabendo da conspiração quando a criação do comitê de busca foi publicada no DOU (MARCIANO, 2016b).

A crítica dos servidores está, mais do que na desconsideração desta regra, na influência exercida por Marco Antonio Raupp na atuação do INPE e na falta de representação dos servidores do INPE no comitê de busca. Raupp exerceu o cargo de Diretor deste instituto de 1985 a 1989,

participou do comitê de busca que escolheu seu Diretor em 2005, depois reconduzido em 2009 pelo próprio Raupp, nesta segunda vez presidindo o comitê e, em 2011, nomeou o novo Diretor quando estava como Ministro do MCT (em processo de escolha realizado pelo Ministro anterior, Mercadante). Outra razão está na proposta de transformação do INPE em organização social, ideia entendida pelos servidores como “privatização”, característica que estaria explícita na composição do comitê: “ao criar um comitê para o INPE com tal fisionomia, o Ministro emite um sinal claro de que o tipo de ‘governança’ que o governo pretende impor ao instituto é privada e deve se pautar por parâmetros empresariais” (MARCIANO, 2016a), e, ainda, no fato de não ter sido respeitada a prerrogativa do CTC de solicitar a instauração do comitê, o que motivou a organização de um abaixo-assinado exigindo a realização de uma eleição interna no INPE para a escolha de um ou mais nomes de servidores que venham a ser adicionados ao comitê de busca instituído, como foi feito na escolha de 2011. “Trata-se, portanto, de um processo sem transparência e nada democrático, já que não há previsão de participação da comunidade do INPE no processo de formação da lista tríplice” (MARCIANO, 2016a). Outro aspecto relacionado à dimensão das negociações em relação à composição dos comitês está na origem dos membros escolhidos. Inicialmente, o MCT escolhia, necessariamente, membros externos ao ministério, mas, devido a pressões de servidores, esta prática começou a ser alterada. A partir da gestão de Sérgio Machado Rezende, no início de 2011, um conjunto de portarias que instituíram comitês de busca no ano de 2010 foram republicadas, de modo a incluir representantes dos servidores nestes comitês (são os casos do INT, INSA, MAST, CTI e LNA, ilustrados no Apêndice K). Para o Entrevistado 4 (2016), essa composição prejudica sua atuação independente:

[...] sou contra qualquer a participação de membros do ministério, seja do ministério próprio, seja dos seus institutos, por que o comitê de busca foi criado para ser isento, e evitar qualquer nomeação política. Esse foi o objetivo principal, para não haver interferência política na indicação dos Diretores dos institutos científicos (ENTREVISTADO 4, 2016).

Essa prática de nomear representantes dos servidores foi continuada pelos Ministros que sucederam Machado Rezende, mas não funciona como regra obrigatória no MCT. Segundo um dos entrevistados:

Há certa pressão das associações de servidores das unidades de pesquisa para alterar a portaria que orienta a constituição dos comitês de busca, de forma a garantir a participação dos servidores das U.P no processo. Nos moldes da portaria atual, não há nenhuma previsão da participação de servidores nos comitês (ENTREVISTADO 9, 2016).

No Jardim Botânico, por sua vez, o comitê de busca é compreendido como um espaço que deve, necessariamente, ser composto por membros externos e internos, devendo seu Presidente ser escolhido dentre os membros externos. Seu desenho também prevê o assessoramento direto por uma Secretaria Executiva, composta, neste caso, pelo próprio Chefe de Gabinete do órgão. Segundo o Entrevistado 13 (2016), esta composição mista é importante. O membro externo, quando bem escolhido, pode trazer outras referências e perspectivas para pensar os próximos passos do JBRJ e o papel do futuro Diretor; também pode ter mais experiência e conhecimentos sobre processos de seleção e avaliação de pessoas, agregando competências que não são

próprias do quadro interno da instituição. Um dos membros do comitê de busca instituído em 2015 era servidor do Ministério do Meio Ambiente, ao qual a autarquia está vinculada. Para os entrevistados (ENTREVISTADO 10, 2016; ENTREVISTADO 13, 2016), esta participação foi muito importante para trazer a perspectiva do próprio ministério, como órgão supervisor e formulador de políticas, sobre o papel do JBRJ. Já a escolha de membros internos tem como principal aspecto o conhecimento amplo da organização que pode ser aportado em apoio aos demais membros na condução dos trabalhos e análise dos candidatos.

Neste comitê instituído em 2015, a composição dos membros foi sugerida por uma comissão preparatória que precedeu a realização deste processo de escolha. A indicação de ao menos um membro interno ser designado para o comitê foi sugerida por esta comissão e acatada pela Presidência que, inclusive, designou 2, e não apenas 1, membro interno. Já os 3 membros externos foram escolhidos a critério da Presidente do JBRJ, entre pessoas de fora da lista de recomendações elaborada por esta comissão (ENTREVISTADO 10, 2016). Sobre a independência do processo de escolha e do envolvimento de seu dirigente, por meio das entrevistas, foi possível identificar que esta é ainda uma questão em aberto para o modelo. Em primeiro lugar, porque cabe ao Presidente instituir o comitê de busca e, ainda que seja consultada a comunidade de pesquisadores e outros funcionários do órgão, o dirigente máximo tem ampla autonomia de indicar pessoas que lhe sejam próximas e com as quais tenha relação de confiança. Se a interferência não direcionar a escolha e a avaliação dos candidatos aptos para a lista tríplice, poderá, ao menos, permitir que o Presidente da instituição tenha acesso a informações do processo de escolha, informalmente, antes do recebimento do relatório oficial do comitê de busca. Este fato fica agravado, ainda, pelo próprio assessoramento prestado ao comitê pela figura da Chefia de Gabinete do órgão, função que, em geral, é considerada de extrema confiança e proximidade com a Presidência.

Já no ICMBio, o comitê de busca deve ser formado por três profissionais “de competência e experiência comprovadas em áreas diretamente associadas à missão do Instituto Chico Mendes, podendo ser servidores ou não”. Têm um papel mais amplo do que os comitês anteriores, porém voltados aos aspectos procedimentais das escolhas, pois devem, inclusive, elaborar o próprio edital de seleção. Este caso escapa de um modelo de escolha orientado a competências gerenciais, conforme foi idealizado no início, e se aproxima, hoje, de um modelo de seleção de servidores públicos.

Diferentemente do modelo do comitê de busca, o modelo do IBRAM, denominado de chamada pública, possui algumas características distintas. A conformação do comitê responsável pela avaliação dos candidatos, chamado, neste caso, de comissão de seleção, não recebe a mesma ênfase que é dada ao caráter de independência da atuação dos membros de um comitê de busca, como no modelo do MCT. O processo, busca, da mesma forma, subsidiar a escolha da autoridade política do órgão, mas não busca isentá-la completamente do processo de escolha. Esta comissão é composta por três membros, entre servidores do órgão ou especialistas externos, com o objetivo realizar a avaliação dos candidatos (ENTREVISTADO 6, 2016). Apesar de não haver essa ênfase à dimensão de sua atuação independente, costumam ser compostas por profissionais com experiência no setor museológico e que conheçam bem as especificidades da unidade para a qual se realiza o processo de escolha (ENTREVISTADO 11, 2017).

Em todos os modelos analisados, a atuação dos comitês é concluída com a elaboração de uma lista tríplice que objetiva, conforme indicamos, subsidiar a escolha da autoridade política a respeito do futuro dirigente. A prerrogativa de escolha nunca deixa de ser a do Ministro

responsável, embora a responsabilidade passa a ser compartilhada com os membros do comitê de busca. Além de poder escolher o dirigente a partir da lista de candidatos considerados aptos, a autoridade política tem, em todos os casos, a prerrogativa de não escolher nenhum deles, podendo nomear um dirigente interino enquanto abre novo procedimento de escolha. É também previsto, nos casos de não serem identificados os 3 candidatos necessários para a conformação da lista tríplice, que apenas 2 sejam recomendados, excepcionalmente. Outra prerrogativa do Ministro é, no caso de exoneração do dirigente já nomeado após o processo de avaliação, recorrer aos demais candidatos da lista. Esta prática, embora não esteja prevista expressamente, foi adotada recentemente pelo JBRJ e está formalmente regulamentada no caso do ICMBio. Segundo o Entrevistado 4 (2016), no MCT, geralmente é escolhido o primeiro candidato da lista, sendo raríssimos os casos em que se nomeou o segundo ou terceiro colocado. Já no JBRJ, no último processo realizado, a escolha da Ministra Izabella Teixeira coincidiu com a recomendação do comitê de busca apenas em um dos casos, nomeando o 1º da lista para a ENBT, mas o 3ª da lista para a DIPEQ. Embora o edital de 2015 seja claro ao estabelecer que não é obrigatória a escolha em ordem de indicação, é possível que sejam gerados questionamentos sobre a não escolha do 1º colocado, conforme identificado a partir das entrevistas, ainda mais considerando que os nomes e ordens de classificação foram tornados públicos, gerando, inevitavelmente, a expectativa de escolha do melhor avaliado (ENTREVISTADO 10, 2016).

Há, por fim, resistências enfrentadas pelo comitê de busca em relação ao modelo como um todo. Para o SindCT, a nomeação de servidores para os comitês constitui apenas uma segunda melhor alternativa para garantir sua participação no processo de escolha. Sua posição oficial defende o modelo de eleição direta do Diretor do INPE por seus servidores (MARCIANO, 2016b):

“Comitês de busca” não são instrumentos apropriados para escolher dirigentes de órgãos públicos de pesquisa. Esse tipo de comitê é um instrumento utilizado por universidades privadas do exterior, que procuram escolher seus reitores no chamado “mercado”. O perfil desejado, nesse caso, é de um “executivo”, um gestor empresarial, ao invés de um experimentado docente ou pesquisador universitário (MARCIANO, 2016a).

Conclusões preliminares

Concluindo esta seção, ressaltamos:

- Os comitês de busca, compostos por profissionais com notório saber e reconhecidos em seu meio, desempenham um papel relevante orientado não apenas à avaliação dos candidatos aos cargos de direção, mas também à busca ativa de potenciais dirigentes; para isso, realizam discussões mais amplas orientadas à própria definição da missão da organização;

- As recomendações do comitê de busca subsidiam, mas não substituem, a escolha política; a responsabilidade pela escolha final do dirigente é, portanto, compartilhada;

- Espera-se que seus membros atuem com independência, protegidos de interesses políticos e corporativos – esta discussão está refletida na forma como os membros do comitê são definidos:

- A prerrogativa de escolha é sempre do Ministro – é ele quem pode garantir, portanto, a independência do comitê;

- Estes membros podem ser recomendados pela própria organização ou por atores externos, devendo considerar, como critérios de escolha, que sejam profissionais de notório saber;

- Combinar a escolha isenta com a especialidade do profissional em relação assuntos e cultura específicos de cada instituto de pesquisa levam a um dilema nestas escolhas; - Além disso, a falta de definição sobre quem pode indicar estes membros ao Ministro

leva a disputas diversas, orientadas a influenciar as composições dos comitês: há a defesa de indicação de membros internos, importantes para apoiar os trabalhos, por conhecerem a fundo a organização, e há a defesa da completa independência do comitê;

- O modelo não está livre de críticas; há casos em que servidores defendem que seja substituído por eleições diretas – como o INPE, do MCT;

- Há, por fim, saídas à adoção integral deste modelo, já que está prevista a prerrogativa de o Ministro não escolher nenhum candidato recomendado na lista tríplice, podendo nomear interinos, abrir novo processo de escolha ou até reconduzir o dirigente em exercício sem exigência de realizar nova seleção.