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CAPÍTULO III – FONTES DA TEORIA MATEMÁTICA DE ZOLTAN

3.2 JEAN PIAGET

3.2.2 Estágios de desenvolvimento cognitivo

3.2.2.3 Estágio das operações concretas

O estágio das operações concretas (7 a 11 anos) difere do estágio sensório- motor e do estágio pré-operacional, porque nestes, a atividade cognitiva baseia-se nas ações que a criança imprime sobre os objetos, enquanto que no estágio das operações concretas, observa-se um salto qualitativo surpreendente no raciocínio da criança – classificações lógicas, raciocínios por transitividade, conservação das quantidades físicas, etc. – o que torna a atividade intelectual cada vez mais móvel e interna. O sistema de ações mostra-se integrado e coerente com propriedades estruturais, o que torna possível falar em operação. Note-se que o estágio anterior denomina-se ―pré-operacional‖, isto é, anterior ao conceito de operação.

A operação define-se como qualquer ato representacional que é parte de um conjunto de atos inter-relacionados. Nesse nível, a essência de uma operação está na interiorização de coordenações oriundas do plano das ações, mas que no presente estágio existe a possibilidade de reversibilidade, isto é, o passado pode ser

acessado em pensamento. Segundo Piaget (1980), aos 7-8 anos inicia-se um terceiro período caracterizado por

[...] interiorizações, coordenações e descentralizações crescentes que conduzem a uma formação geral de equilíbrio que constitui a reversibilidade operatória (inversões e reciprocidades). Em outras palavras, assiste-se à formação das operações (PIAGET, 1980, p. 40).

Uma operação sempre apresenta as seguintes características: é uma ação que pode ser internalizada ou realizada em pensamento tão bem quanto materialmente; é reversível; supõe sempre uma conservação ou invariância e nunca existe isoladamente.

Piaget utiliza como modelo do estágio das operações concretas a estrutura lógico-matemática, denominada agrupamento. A construção dessa estrutura e sua aplicação generalizada a diversos domínios são responsáveis pelo salto qualitativo neste período. O agrupamento é uma estrutura, criada por Piaget e seus colaboradores, que ainda não atingiu o nível operacional de grupo matemático. O agrupamento lembra um grupo matemático, muito limitado. Dessa forma, as operações concretas estabelecem ―a transição entre a ação e as estruturas lógicas mais gerais, que implicam uma combinatória e uma estrutura de ‗grupo‘ a coordenarem as duas formas possíveis de reversibilidade‖ (PIAGET; INHELDER, 2006, p. 91).

O agrupamento é uma híbrida estrutura lógico-algébrica oriunda de uma ―mestiçagem‖ de duas estruturas conhecidas dos lógicos e matemáticos: o grupo e o reticulado.

O grupo é uma estrutura abstrata composta de um conjunto de elementos e de uma operação que relaciona estes elementos, por meio das propriedades de composição, associatividade, identidade e reversibilidade. Esta estrutura será aprofundada no próximo estágio de desenvolvimento cognitivo, denominado estágio das operações formais.

O reticulado, segundo Flavell (1975), é uma estrutura diferente do grupo e é formado por um conjunto de elementos e de uma relação que pode ocorrer entre os elementos. Como exemplo, pode-se citar como elementos o conjunto de classes de

uma hierarquia de classes. A relação escolhida será a inclusão de classes e, neste caso, simbolizada por ≥. A classe A será representada pelos cães e a classe B, pelos mamíferos. Pode-se afirmar que B ≥ A ou que B contém a subclasse A.

O exame das classes A e B em relação à hierarquia de classes como um todo estabelece que é possível definir a menor classe da hierarquia que inclui a classe A e a classe B. Esta, é a classe B. Ela inclui todos os mamíferos e todos os cachorros. O simbolismo lógico para expressar a operação realizada é: A+B=B ou A U B = B. Na teoria do reticulado, a classe resultante da soma ou união lógica de ambas, recebe o nome de limite superior mínimo (l.s.m.) dos elementos mencionados.

O exame das classes onde se escolhe a classe maior cujos membros são ao mesmo tempo cachorros e mamíferos é a classe dos cães. Esta é a classe maior na qual A e B estão incluídas. O simbolismo lógico para expressar a operação realizada é: A X B = A ou A ∩ B = A.

Então, os agrupamentos são as estruturas das operações concretas que se situam entre os reticulados e os grupos. Piaget distingue essas estruturas em oito sistemas distintos que se diferenciam segundo se trate de classes ou relações de composições aditivas ou multiplicativas ou de correspondências simétricas (biunívocas) ou assimétricas (counívocas).

Agrupamento I – adição primária de classes: agrupamento mais simples que contém operações e inter-relações essenciais entre operações presentes na hierarquia simples de classes. (Exemplo: ―fila brasileiro‖, incluída em ―cachorros‖, incluídos em ―mamíferos‖, incluídos em ―seres vivos‖). A representação simbólica corresponde a A + A‘ = B e assim por diante.

Agrupamento II – adição secundária de classes: enquanto o agrupamento I lida com relações de inclusão de uma classe em outra que a contém, o agrupamento II relaciona divisões alternativas da mesma classe. (Exemplo: a classe dos animais mamíferos pode ser dividida em ―cachorros e não-cachorros‖). A representação simbólica toma a forma: A1 + A‘1 = B (cachorros + não-cachorros = mamíferos) e assim por diante.

Agrupamento III – Multiplicação biunívoca de classes: ocorre quando os elementos de um conjunto são classificados baseando-se em duas propriedades ou atributos como critérios, por exemplo, a cor e a forma. (Exemplo: consideram-se as seguintes nomenclaturas: vermelho (A), não-vermelho (A‘), quadrado (B) e não-

quadrado (B‘), então teremos as seguintes multiplicações biunívocas de classes: vermelho e quadrado (AB), não-vermelho e quadrado (A‘B), vermelho e não- quadrado (AB‘) e não-vermelho e não-quadrado (A‘B‘).

Agrupamento IV – multiplicação counívoca de classes: é uma extensão do agrupamento III, pois existem casos em que a multiplicação de dois atributos não resulta em todas as quatro classes. (Exemplo: na multiplicação cachorros versus não-cachorros por gatos versus não-gatos, não existe animal que seja ao mesmo tempo cachorro e gato).

Agrupamento V – adição de relações assimétricas: refere-se à compreensão da noção de transitividade: Se A > B e B > C, então A > C ou, se A < B e B < C, então A < C. (Exemplo: ordenação de objetos do maior para o menor ou do menor para o maior em conjuntos de tamanhos diferentes).

Agrupamento VI – adição de relações simétricas: inclui composições aditivas de vários tipos encontradas principalmente em hierarquias genealógicas. (Exemplo: se A e B são irmãos e B e C têm o mesmo avô, então A e C têm o mesmo avô).

Agrupamento VII – multiplicação biunívoca de relações: agrupamento que descreve tipos de relações que ordenam objetos assimetricamente, levando em conta dois atributos ao mesmo tempo. (Exemplo: ordenar dois conjuntos: o primeiro conjunto formado de bonecas de várias alturas e o segundo conjunto formado por sombrinhas de várias alturas). A criança deve pôr as bonecas em ordem de altura e relacionar a sombrinha correspondente a cada boneca.

Agrupamento VIII – multiplicação counívoca de classes: é uma extensão do agrupamento VII e refere-se à multiplicação de classes numa hierarquia de classes do tipo piramidal, genealógica. (Exemplo: Se A é o pai de B e B é primo de C, então A é tio de C).