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Estratégia competitiva sob concorrência

1. Fundamentos Teóricos para Análise do Crescimento e do Desenvolvimento

1.3 Tendência, desenvolvimento e inovação

1.3.2 Neo-Schumpeterianos – enfoque evolucionário

1.3.2.1 Estratégia competitiva sob concorrência

Como já visto, de acordo com o princípio da racionalidade limitada, a empresa age, em geral, através do uso de rotinas e definindo limites dentro dos quais seus resultados são considerados satisfatórios. Estas rotinas determinam as possibilidades de comportamento

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Para uma discussão pormenorizada da analogia evolucionária, ver Nelson e Winter (1982, cap.1).

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Diferentemente da biologia, o processo de mutação não é aleatório, apesar de envolver elementos estocásticos relacionados à incerteza presente no processo de inovação, mas sim conseqüência de um esforço das firmas (neste sentido, mais próximo à teoria Lamarckiana).

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O mercado não é o único ator no processo de seleção, como será visto mais adiante, mas pode ser considerado como o principal.

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A definição de paradigma e trajetória apresentada por Dosi (1984, cap.2, p.14-5), onde o autor explica a analogia com os termos do campo da filosofia da ciência é a seguinte: “In broad analogy with the Kuhnian

definition of a scientific paradigm, we shall define a technological paradigm as a model and a pattern of solution of selected technological problems, based on selected principles derived from natural sciences and on selected material technologies. (…) We will define a technological trajectory as the pattern of normal problem solving activity (i.e. of progress) on the grounds of a technological paradigm (…) In other words, a technological paradigm (or research programme) embodies strong prescriptions on the directions of technical change to persue and those to neglect”. Nelson e Winter se referem aos mesmos conceitos com a terminologia

de “regime tecnológico” e “trajetória natural”. Mais detalhes sobre uso destes conceitos pelos diferentes autores, ver Possas, M. (1989a).

frente a diferentes situações em função de variáveis externas e internas119. As três principais rotinas são: a operacional, a de investimento e uma meta-rotina, que revê as rotinas em função do feedback obtido no mercado, alterando-as caso os resultados obtidos estejam fora das metas estipuladas120. O sucesso da “estratégia inovativa rotineira” adotada determinará o êxito na busca por oportunidades de inovação e/ou imitação e as firmas com rotinas mais competitivas tenderão a “crescer e proliferar-se”.

Entre os fatores considerados pelas empresas ao formularem suas estratégias inovativas estão os paradigmas vigentes e os atributos das inovações subjacentes (oportunidades tecnológicas, cumulatividade e apropriabilidade)121. A oportunidade tecnológica é uma característica específica da tecnologia e diz respeito ao escopo e à facilidade para se alcançar inovações e aprimoramentos. As empresas devem estar atentas a estas oportunidades, procurando aproveitá-las para atingir performance superior à de suas concorrentes. A cumulatividade reflete o grau com que aumenta a probabilidade de sucesso e retorno em função de um mesmo esforço inovativo conforme avança o aprendizado (experiência adquirida através de P&D e da produção). Quão mais cumulativo for o progresso técnico, a firma que tiver maior grau de inovatividade terá maior probabilidade de se manter inovativa ou mesmo aumentar seu ritmo de inovação, tornando-se mais competitiva. Por último, a apropriabilidade está relacionada à possibilidade de a empresa conseguir apoderar-se dos lucros decorrentes do processo inovativo. A forma legal de apropriação mais empregada é a patente, que restringe a imitação. Mas existem alternativas, como a manutenção do segredo industrial ou mesmo as economias de custo derivadas da curva de aprendizado – quão mais tácitas as informações relativas à inovação, maior o tempo necessário para a imitação e maior o diferencial de custo que pode ser criado. Como já sugerido, a apropriação dos ganhos é justamente o incentivo e a recompensa pelo esforço e pelo risco envolvidos no processo inovativo.

Pavitt122 elaborou uma taxonomia setorial com o objetivo de identificar padrões de regularidade relativos à inovação. Partindo da taxonomia proposta por Pavitt, Dosi123

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“Routines govern choices as well as describe methods, and reflect the facts of management practice and organizational sociology as well as those of technology” Winter (1984, p. 291).

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“A heurística e as regras de rotina que caracterizam o processo de busca na abordagem evolucionista se traduzem concretamente na definição de metas e conjuntos de procedimentos para identificar e incorporar meios de chegar próximo dos objetivos – sempre caracterizados por regras práticas de conduta – mas sem que um bom resultado possa ser assegurado” Possas, M. (1989a, pg.161). A explicação do papel das rotinas na teoria evolucionária é explorada ainda por Nelson e Winter (1982, p.14-18).

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Dosi, (1988, p.233). Para descrição dos atributos, ver Dosi (1984, pg. 87-8).

complementa sua análise vinculando as características dos setores aos atributos das inovações presentes. As características do setor em termos dos atributos das inovações, condicionantes das dimensões de concorrência potenciais, influenciam as estratégias adotadas pelas empresas e, ao mesmo tempo, a proporção de empresas utilizando cada estratégia. A tipologia de Freeman124, que classifica as empresas como ofensivas, defensivas, imitativas, dependentes, tradicionais e oportunistas, é uma das mais conhecidas.

São as estratégias inovativas adotadas pelas empresas que determinam os parâmetros para seus esforços de P&D125, como o percentual do valor do faturamento direcionado à pesquisa, o percentual gasto em pesquisa básica ou aplicada, a alocação entre P&D voltado para inovação de processo ou de produto. Ainda, quanto à própria organização da atividade de pesquisa e desenvolvimento, a firma deve decidir se estrutura o P&D in house ou adquire de terceiros. Como destaca Teece126, as vantagens do P&D próprio são as economias de escala, escopo e especialização, a minimização de custos de transação (especialmente contratuais) e a facilidade de adequação do P&D às necessidades da empresa e do mercado (permitindo tirar proveito do importante caráter cumulativo do aprendizado). Cabe à empresa manter um monitoramento contínuo para avaliar os esforços empreendidos em termos de custo-benefício.

As estratégias inovativas das empresas também são fortemente influenciadas por suas competências. A competência da empresa é função, principalmente, de sua base de conhecimento, dos ativos físicos de que dispõe e das rotinas adotadas ao longo de sua história, fatores que permitiram desenvolver sua capacitação mercadológica e tecnológica e, portanto, definir as áreas de especialização e diversificação em torno das quais tem vantagem competitiva. Contudo, num mundo repleto de inovações, a competência relevante é a competência dinâmica, isto é, capacidade da empresa em compreender o ambiente em contínua transformação, aproveitando as oportunidades e superando as ameaças, e de estar constantemente adequando sua capacitação, procurando reforçar seus pontos fortes e eliminar seus pontos fracos. A firma deve sempre saber tirar proveito de suas competências e

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Dosi (1988, p.231-2).

124 Freeman (1974). 125

Para um estudo detalhado sobre as decisões relacionadas aos gastos com P&D, ver Combs, Saviotti e Waltch (1987).

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desenvolver novas, através da adoção de rotinas de adaptação competitiva e, até mesmo, alterando suas rotinas127.

Num contexto concorrencial, onde o principal instrumento é a inovação, a estratégia de preço das empresas, também definida a partir de rotinas de ajuste, assume importância complementar. Na verdade, como será explicado a seguir, a estratégia inovativa passa a interagir com a determinação das políticas de preço, influenciando seus condicionantes.

De maneira geral, como visto em Kalecki, os preços seriam estipulados em cada setor a partir da aplicação de um mark-up sobre os custos. Este mark-up é determinado em função das barreiras à entrada existentes e respeitando o postulado de Sylos-Labini, segundo o qual o preço estabelecido pelas firmas incumbentes (ou em conluio) impede a entrada das potenciais concorrentes, preservando a estrutura de mercado existente (teoria do preço-limite)128. As barreiras à entrada, todavia, podem ser relativizadas se houver uma conjugação da estratégia de preços e da estratégia inovativa, buscando-se tirar proveito dos atributos das inovações. Suponha-se, como exemplo, que uma firma introduza um novo produto elaborado a partir de uma tecnologia que tenha forte caráter cumulativo e elevada apropriabilidade; neste contexto, a firma incumbente pode optar por cobrar um preço baixo, menor do que o preço-limite, para elevar a produção e as vendas, percorrendo um caminho maior na curva de aprendizado e ampliando suas vantagens de custo em relação às potenciais entrantes. Ao mesmo tempo, o menor preço permite à firma ampliar seu mercado e se aproveitar de economias de escala. Assim, a estratégia adotada pode influenciar o nível de barreira à entrada existente no período em que o produto for passível de ser imitado, dificultando a entrada de concorrentes e influenciando o preço-limite vigente deste momento em diante129. Como coloca Dosi:

An existing firm cannot prevent other firms from innovating: what it can do is to prevent, as much as possible, the others from entering its own market, and it is likely to do so by erecting cost-based entry barriers and by pre-empting as much as it can the potential market opportunity on that commodity. 130

Como já foi discutido na apresentação inicial da visão de Schumpeter, práticas restritivas visam proteger o que foi objeto de inovação bem sucedida. Porém, a inovação não

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“Its survival and growth depend upon its capacity to adapt to this rapidly changing external environment and to change it” Freeman (1974, p. 256).

128

Considera-se que as firmas existentes fazem conluio para impedir a entrada, que as competidoras potenciais podem ser reduzidas a uma firma mais capacitada e que esta almeja lucros imediatamente após a entrada.

129

“To repeat, the source of oligopolistic margins lies in structural discontinuities between firms (of both the static and

dynamic kinds, such as economies of scale and learning economies).” Dosi (1984, pg.130). 130

apenas cria, como também destrói, barreiras à entrada131, e a empresa responsável pela destruição estará imediatamente buscando construir novas. Este ponto reforça a argumentação de que as empresas têm que estar incessantemente lutando para não perder capacidade competitiva frente às concorrentes, e o principal instrumento nesta luta é a inovação: competição potencial é elemento disciplinador do mercado.