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2. REVISÃO DA LITERATURA

2.6 Equilíbrio financeiro de médio longo prazo estrutura financeira

2.5.5 Estrutura de capital – Teorias

No âmbito das finanças empresariais a procura por uma estrutura de capital ótima representa um dos temas que mais interesse tem suscitado, facto comprovado pelo surgimento de diversos estudos e teorias explicativas sobre a matéria ao longo dos tempos. Entende-se por estrutura de capital a forma pela qual uma empresa se financia, ou seja, como as fontes de recursos estão distribuídas entre capitais próprios e capitais alheios. O desafio da procura pela estrutura ótima de capitais tem o objetivo principal de encontrar a combinação ótima entre recursos internamente gerados e recursos alheios que minimize o custo de capital e o risco de incumprimento das obrigações financeiras, e ao mesmo tempo, maximize o valor da empresa para os acionistas/sócios (Silva & Queirós, 2009).

Modigliani e Miller (1958) foram dos pioneiros na investigação sobre as determinantes que influenciam a estrutura de capital das empresas, publicando esse estudo através do artigo clássico «The Cost of Capital Corporate Finance and Theory of Investment». Nesse estudo, os autores contrariam a visão tradicional que defendia a existência de uma estrutura de capital ótima, negando a existência de uma combinação ideal entre capitais próprios e capitais alheios que maximiza o valor da empresa e minimiza o custo do capital, alegando que a forma como a empresa se financia é irrelevante para o seu valor e para o custo do capital. O estudo foi desenvolvido num contexto de mercados de capitais perfeitos, caraterizados pela ausência de impostos, inexistência de custos de agência, de falência e de transação, e ainda a inexistência da assimetria de informação.

38 A investigação de Modigliani e Miller conduziu à obtenção de três proposições:

 Proposição I – Tanto o custo médio ponderado do capital como o valor de mercado das empresas são independentes da estrutura de capital;

 Proposição II - o custo do capital próprio de uma empresa endividada é igual ao custo do capital próprio de uma empresa não endividada, acrescido de um prémio de risco financeiro;

 Proposição III - um investimento só será aceite se a sua taxa de rendibilidade for superior à taxa de desconto adotada pelas empresas, em conformidade com o grau de risco, independentemente da forma escolhida para o financiamento.

Contudo, observando a particularidade dos pressupostos em que o modelo acima exposto se apoia, a simplificação em adotar um mercado de capitais perfeito, verificou-se que apesar da criação de um modelo teórico que concorresse com a visão tradicional, a verdade é que na prática o modelo apresentava algumas limitações.

Na tentativa de ultrapassar essas limitações, os mesmos autores voltaram a publicar um novo artigo em 1963, denominado «Corporate Income Taxes and the Cost of Capital: A Correction», onde reconheceram que a não consideração dos impostos resultava numa falha. Documentaram os autores que as vantagens dos benefícios fiscais do endividamento são maiores do que eles haviam sugerido, reconhecendo que por motivos de ordem fiscal as empresas são motivadas a utilizar o capital alheio na sua estrutura de capital.

Ainda assim, apesar das alterações implementadas no segundo trabalho de Modigliani e Miller, e embora os dois trabalhos proporcionassem uma irrecusável contribuição para o desenvolvimento da teoria da estrutura de capital, segundo Palenzuela e Hidalgo (1990), estes estabelecem proposições que apesar da sua coerência e do seu rigor analítico, não nos proporcionam uma explicação satisfatória das políticas de financiamento observadas no mundo real.

No decorrer das críticas à teoria defendida por Modigliani e Miller, desenvolveram-se diversas outras teorias onde se destacam principalmente a teoria do trade-off e a teoria do pecking order, sendo as teorias que ainda hoje dominam a discussão sobre a estrutura de capital.

A teoria do trade-off foi desenvolvida por Miller (1977), defendendo a existência de uma estrutura de capital ótima que maximiza o valor de mercado das empresas, resultante de

39 um trade-off entre benefícios fiscais e os custos de insolvência financeira associados ao endividamento.

Assim sendo, esta teoria desenvolve-se assente em duas bases:

 O reconhecimento do endividamento como fator gerador de vantagens para a empresa, resultantes da poupança fiscal, caso a empresa tenha capacidade de produzir resultados que permitam usufruir deste benefício fiscal;

 A noção de que apesar do endividamento produzir vantagens através da poupança fiscal, a partir de um certo nível, o endividamento leva a uma elevação do risco de insolvência financeira da empresa e, consequentemente, dos custos de insolvência, influenciando negativamente o valor da empresa.

Segundo Mira e Garcia (2003), o endividamento possibilita também o surgimento de custos de agência da dívida, resultantes da relação conflituosa entre acionistas e credores, incluindo, entre outras fontes, os gastos em que incorrem os credores com a vigilância dos acionistas, com o intuito de salvaguardar os seus interesses.

Para Antão e Bonfim (2008), as principais conclusões desta teoria sobre o nível de endividamento estão relacionadas com a rendibilidade das empresas, sendo que esta terá um impacto positivo sobre o rácio de endividamento devido a três razões:

 Em primeiro lugar, à medida que a rendibilidade aumenta, os custos de falência diminuem, possibilitando que as empresas acumulem níveis de dívida mais elevados;

 Em segundo lugar, segundo DeAngelo e Masulis (1980) apud Antão e Bonfim (2008), as empresas mais lucrativas enfrentam taxas de imposto mais elevadas do que as empresas menos lucrativas, sendo que esta tributação assimétrica faz com que as empresas mais lucrativas tenham níveis de dívida mais elevados, devido à existência de maiores benefícios fiscais;

 E por último, as empresas mais lucrativas tendem a ter maiores fluxos de caixa após a realização de todos os projetos de investimento lucrativos (free cash flow), de modo que o endividamento torna-se necessário na medida em que gera a necessidade de cumprimento de obrigações financeiras (pagamentos de dívida), que por sua vez é importante para monitorizar e limitar as ações do gestor, através da redução do excesso de dinheiro em caixa.

40 Este último ponto decorre dos modelos da teoria de agência de Jensen e Meckling (1976) e Jensen (1986), que consideram que na medida em que os interesses dos acionistas e dos gestores não se encontram alinhados, nas empresas mais lucrativas os gestores tendem a utilizar os free cash flow em benefício próprio, existindo uma maior probabilidade de desperdiça-los em bónus ou em maus investimentos.

Segundo a teoria do trade-off, para além da rendibilidade, uma outra caraterística das empresas que ajuda a explicar a procura por rácios ótimos de endividamento é a tangibilidade dos ativos. Então, espera-se que os custos de falência sejam inferiores em empresas que possuam mais ativos tangíveis, pois estes podem ser utilizados como garantia na contratação de dívida, por oposição às empresas que possuam mais ativos intangíveis. Para além disso, a existência de despesas de amortização ajuda a explicar porque algumas empresas apresentam um menor rácio de endividamento, dados que estas despesas resultam em benefícios fiscais.

Outra das argumentações de maior relevo no que diz respeito à estrutura de capital é a teoria do pecking order desenvolvida por Myers (1984) e Myers e Majluf (1984). Esta tese, ao contrário da teoria do trade-off, rejeita que as empresas procurem uma estrutura de capital ótima que maximize o seu valor. Antes disso, a teoria do pecking order declara que as empresas obedecem a uma hierarquia de preferências aquando da escolha das suas fontes de financiamento.

Desta forma a escolha da composição da estrutura de capital obedece a seguinte disposição:

 Autofinanciamento;

 Financiamento através do recurso a capitais alheios;  Financiamento através da emissão de capital.

Assim as empresas preferem financiar seus investimentos numa primeira instância com recursos internos (cash flow operacional, retenção de dividendos, lucros acumulados etc.). No caso de tais recursos serem insuficientes para financiar a totalidade dos projetos financeiros, as mesmas recorrem ao financiamento externo para cobrir a necessidade de capital, e só em última instância, face à insuficiência de fundos gerados internamente e do financiamento através de recurso a capitais alheios, as empresas recorrem ao financiamento através da emissão de novas ações.

41 A teoria do pecking order é sustentada pela teoria da assimetria de informação, que defende a existência de uma assimetria entre as informações detidas pelos gestores e aquelas disponíveis para o mercado em geral. Então geralmente os gestores contam com informações privilegiadas sobre o valor dos ativos da empresa, a caraterística dos seus retornos e as oportunidades de investimento, informações estas que nem sempre são divulgadas para o conhecimento dos investidores, dos credores e do mercado em geral, de modo que as ações das empresas tendem a ser imperfeitamente avaliadas pelo mercado em termos de valor. Assim, ao necessitar de recursos, as empresas não devem optar por emitir ações, já que as mesmas poderão ser subvalorizadas pelos investidores, que não dispõem de informações suficientes para definir o seu preço justo.

Myers (1984) constatou ainda que as empresas mais rentáveis são as que recorrem menos ao financiamento externo, documentando a partir daí que as empresas com rendibilidades elevadas tendem a ter baixos níveis de capitais alheios, dado que os fluxos gerados internamente são suficientes para financiar os seus investimentos. Por outro lado, as empresas com rendibilidades baixas e cujos fluxos gerados não são suficientes para financiar os seus investimentos, apresentam níveis de endividamento superiores, financiando os seus investimentos através de recursos externos.

Assim sendo, a principal contribuição da teoria do pecking order consiste na identificação de uma ordem de fontes de financiamento adotada pelas empresas, resultante da existência da assimetria da informação. Em outras palavras, o facto dos insiders e o mercado possuírem informações diferentes sobre as empresas, faz com que as mesmas optem por seguir uma hierarquia de fontes de financiamento para que a assimetria de informação não seja prejudicial à organização (Matias, 2007).

Embora existam teorias diversas a cerca da estrutura de capital das empresas como podemos constatar ao longo deste subcapítulo, a realidade e o comportamento das empresas nem sempre conseguem ser explicadas convenientemente pelas teorias financeiras, de forma que não há um consenso geral sobre esta matéria em termos teóricos. Apesar disso, salienta-se que as diferentes teorias aqui mencionadas vieram fornecer uma importante contribuição para o desenvolvimento das investigações sobre a estrutura de capital, acabando por complementarem-se umas às outras, como teremos a oportunidade de confirmar no próximo ponto.

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