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CAPÍTULO 4 Criminologia nos Juizados Especiais Criminais

4.2 Estudos de casos:

O primeiro caso diz respeito a um Termo Circunstanciado em que a vítima permaneceu casada com o autor do fato por 16 anos, tendo se separado do mesmo há dois anos; a separação ocorreu porque a vítima estava já cansada de ser maltratada e humilhada, além de ser submetida constantemente a “surras de mangueira”. O caso desperta a atenção pelos seguintes fatos:

1°) mesmo após dois anos de separação a vítima continua sendo perseguida, ameaçada e agredida pelo autor do fato, o que foi confirmado pelo mesmo na delegacia e em juízo;

2°) a testemunha de defesa, tio da vítima, narrou que a mãe da vítima também era agredida por seu marido, pai da vítima, culminando com seu suicídio, por enforcamento; é notório nesses casos que agressores e vítimas reproduzem o comportamento de seus pais, vivenciado durante a infância;

3°) cada agressão gerou uma nova ocorrência, que por sua vez gerou um novo Termo Circunstanciado, de tal sorte que tramitavam, à época, vários processos envolvendo as mesmas partes;

4°) a vítima comparecia às audiências completamente desalentada e descrente de que a Justiça poderia resolver seu problema;

5°) de fato, o sistema jurídico-penal previa, como ainda porevê, apenas a possibilidade de oferecimento de proposta de transação penal, consistente em pena pecuniária ou prestação de serviços à comunidade, ou, quando muito, a condenação do réu a poucos meses de detenção, em regime semi-aberto, no máximo;

6°) o comportamento do agressor tinha requintes de crueldade; em um dos casos, após ameaçar a vítima apontando-lhe uma arma de fogo que foi municiada à sua frente, o acusado ateou fogo em seu próprio veículo, na frente da casa da vítima; esse fato ensejou a instauração de incidente de insanidade mental, cujo diagnóstico foi no sentido de que o acusado tinha perfeita compreensão dos fatos e não possuía nenhum problema mental; conclusão: o agressor praticava todos esses fatos movidos por pura perversão; segundo os psicólogos, o portador de uma perversão também pode ser tratado, todavia não existe nenhum ambulatório, ou hospital, que faça esse tipo de tratamento; o ideal seria que o juiz, diante desses casos, pudesse determinar que o autor do fato se submetesse a esse tipo de tratamento, pois é certo que as penas alternativas disponíveis não solucionarão o problema;

7°) a vítima não quis ir para a casa-abrigo, porque acabaria perdendo seu emprego e faltaria a muitas aulas na faculdade;

8°) também não nos pareceu justo privar a vítima de sua liberdade, enquanto o autor do fato respondia livremente a inúmeros termos circunstanciados;

9°) assim sendo, foi decretada a prisão preventiva do autor do fato, como forma de assegurar a vida e a integridade física e psicológica da vítima, sendo que à época, por

desconhecimento da CEDAW e da Convenção de Belém do Pará, a decisão que decretou a medida extrema não estava fundamentada nesses instrumentos internacionais; ainda assim, o autor do fato permaneceu preso por três meses, tempo suficiente para a tramitação dos Termos Circunstanciados e a condenação do agressor; cerca de dois meses após sua soltura, o acusado fora vítima de homicídio por parte de um desafeto;

10°) a filha da vítima com o agressor também era vítima em outros termos circunstanciados, que noticiavam que a mesma era ameaçada e agredida fisicamente por um conhecido traficante da cidade, de quem estava grávida, o que corrobora, mais uma vez, a tese de que há uma reprodução do comportamento pelos filhos que vivenciam violência de gênero intrafamiliar: as meninas tendem a se tornar vítimas e os meninos, agressores.

Segue o Relatório do Termo Circunstanciado, com a narrativa dos fatos em tela:

POLÍCIA CIVIL DO DISTRITO FEDERAL 14ª DELEGACIA POLICIAL DO GAMA POSTO POLICIAL DE ATENDIMENTO À MULHER

Relatório nº : 631/2000 Gama- DF, 26 de Setembro de 2000 Referente ocs: 4261 e 4773/2000

Senhor Chefe,

Em atendimento ao despacho exarado por V. Sª,nas ocorrências supracitadas, que versam sobre “ Ameaça “, fatos ocorridos em 10.08.2000, às 10:30 h, e 03.09.2000, ás 15:30 h, na [...]Setor Central Gama-DF, passo a relatar que:

DA VÍTIMA

Compareceu nesta Delegacia de Polícia XXX, Brasileira, separada judicialmente, nascida aos [...], natural de [...], filha de [...], Professora, RG nº [...], residente á [...], Setor Central Gama-DF, informando que foi casada com o autor durante 16 anos, que está separada do mesmo há 02 anos, que resolveu separar-se porque quando estava casada com ele a humilhava, maltratava e aplicava constantes surras de mangueira, que depois que

tomou essa decisão de separar não está tendo paz para trabalhar e nem para viver pois este a persegue constantemente, que fica escondido atrás de postes, de árvores e espera a vítima chegar em casa para fazer ameaças, que já registrou diversas ocorrências nesta Delegacia de números, 500,884, 534, 1702 e 1955/2000, que foi orientada pelo promotor de justiça do Fórum do Gama, que todas as vezes que for ameaçada por ele registrar, que todas essas ocorrências foram apuradas e encaminhadas para justiça, porém o autor não a deixa em paz. No dia 10.08.2000, o autor foi até a residência da vítima, mostrou o dinheiro que estava no bolso e disse: “Eu vou comprar uma arma pra te matar, que desse ano você não passa”. No dia 03.09.2000, estava vindo do Supermercado Frota do Setor Central, juntamente com seu tio, que lhe ajudava com algumas compras, quando foi surpreendida pelo autor que já lhe esperava em frente a sua casa e insistia para entrar, diante da negativa da vítima este mostrou- lhe a arma e algumas munições e disse: “ já comprei a arma, o próximo passo é te matar, que a vítima disse que iria chamar a Polícia e este respondeu: “Eu já te falei inúmeras vezes que não tenho medo de Polícia e nem de Juiz, pois já fui intimado diversas vezes e nada acontece comigo, você que fica como palhaça. Esclareceu que depois desses fatos, o autor voltou a sua casa e fez outras ameaças, que no dia 13.09.2000, ele mais uma vez ameaçou-a e foi levado para DRPI ( Delegacia Regional de Pequenas Infrações), de onde fugiu.

DA TESTEMUNHA

Compareceu nesta Delegacia de Polícia XXX, Brasileiro, solteiro, nascido aos [...], natural de [...], filho de [...], RG Nº [...], Comerciante, residente à [...] Gama-DF, fone [...], confirmou o depoimento apresentado pela vítima e acrescentou que teme muito pela segurança da vítima, ou que a mesma possa fazer algo contra sua pessoa devido a essa tortura psicológica que vem sofrendo, uma vez que a mãe da vítima passou por esse mesmo problema com o marido que a maltratava, até que um dia resolveu colocar um ponto final na sua vida chegando a suicidar-se com uma corda no pescoço, pois a vítima está tendo problemas seríssimo com a filha, pois a mesma está apresentando um comportamento e atitudes inadequadas, que tudo isso é atribuído ao pai/autor.

DO AUTOR

Compareceu nesta Delegacia de Polícia XXX, Brasileiro, casado, nascido aos [...], natural de [...], filho de [...], RG Nº [...], Motorista Oficial, residente à [...], fones [...] confirmou todas as acusações que lhe foram imputadas. É o relatório.

O segundo caso diz respeito a um Termo Circunstanciado em que a vítima teve um envolvimento amoroso com o agressor e durante esse período fora ameaçada e agredida verbal e fisicamente por várias vezes, inclusive quando se encontrava gestante, o que chegou até mesmo a ocasionar aceleração do parto. O caso chama atenção pelos seguintes fatos:

1°) as agressões físicas eram praticadas pelo autor do fato mesmo estando a vítima gestante;

2°) a vítima, gestante, encontrava-se em estado de dependência psicológica e emocional do autor do fato, razão pela qual somente terminou o relacionamento após o nascimento da criança, o qual, por sinal, foi antecipado em razão de uma agressão física;

3°) mesmo após o rompimento do relacionamento a vítima continua a ser agredida e ameaçada pelo autor do fato, o qual não nega tais agressões e tenta se justificar no sentido de que é provocado pela vítima quando quer visitar a filha;

4°) a vítima sempre deixava de oferecer representação contra o autor do fato, temendo prejudicá-lo, uma vez que o mesmo estava sob liberdade condicional; todavia, nessa última audiência, representou contra seu agressor, o qual foi denunciado e condenado.

Eis o relatório do Termo Circunstanciado:

POLÍCIA CIVIL DO DISTRITO FEDERAL 20ª DELEGACIA DE POLÍCIA DO GAMA SAV- SEÇÃO DE ACIDENTES DE VEÍCULOS

Informação nº 466/01-SAV Gama, 22 de novembro de 2001 Ref.: Ocorrência nº 3.251/01- 20ª DP

Senhora Chefe,

Cumprindo determinação de V.Sª, no sentido de apurar e informar a ocorrência supracitada, cujo fato se deu aos 05/11/01, por volta da 20 horas, na [...] Setor Oeste-Gama- DF, onde XXX, solteira, cabelereira, nascida aos [...], natural de Brasília-DF, filha de [...], RG nº [...], residente na [...] Gama, fone [...], disse ter sido vítima de ameaça pela pessoa de XXX, vulgo “XXX”, solteiro, desempregado, 1º grau incompleto, nascido aos [...], natural de Brasília-DF, filho de [...], RG nº [...], residente na [...] Gama, fone: [...], informo o que se segue:

A vítima declarou que teve envolvimento com XXX, com quem tem uma filha e este não aceita o fim do relacionamento, motivo pelo qual, sofre constantes ameaças de morte e agressão física. No dia do fato XXX pediu para ver sua filha e perguntou se a declarante estava namorando alguém e quando negou, o autor quis reatar o namoro e diante de sua recusa, o mesmo disse-lhe que se quisesse ser piranha e vagabunda, que fosse longe dele e disse ainda, que se visse sua filha nos braços de algum homem, iria matá-la, bem como, a seu

namorado. Durante a gravidez foi agredida várias vezes por XXX, dentre elas, quando estava grávida de 4 meses, quando o mesmo a viu num telefone público e por ciúmes, deu uma cabeçada em sua boca, causando quebramento de um dente; aos 6 meses de gestação, foi agredida a socos, chegando a ficar internada no HRG e aos 9 meses foi agredida novamente, causando antecipação do parto, motivo pelo qual, não vê outra alternativa para XXX deixá-la viver dignamente, senão representar criminalmente contra o mesmo, pois já registrou outras ocorrências contra o autor e sempre pedia arquivamento, devido o mesmo já responder outro processo e estar em liberdade condicional, por ter sido incurso no Artigo 157 do CPB.

XXX, por sua vez, declarou que aceitou o fim do relacionamento, mas procura XXX para ver sua filha, o que ela não permite, devido o declarante não pagar a pensão alimentícia. No dia do fato, XXX permitiu que o declarante visitasse a criança, contudo, iniciaram uma discussão e a vítima arremessou um tamanco em seu braço. Não revidou e nega que tenha feito ameaças a ela. Disse que XXX o provoca, porque sabe que está cumprindo prisão domiciliar, incurso no artigo 157 do CBP, inclusive, sempre que discutem, a mesma o incita a agredi-la para prejudicá-lo.

Seguem anexos os termos inerentes à lei 9.099/95.

É a informação.

O terceiro e último caso exemplifica um dos procedimentos adequados a ser tomado nos casos de violência de gênero intrafamiliar, especialmente quando o casal não deseja romper o relacionamento e há notícia de alcoolismo. Neste caso, o Núcleo Psicossocial já havia começado a prestar atendimento às partes encaminhadas pelos Juízes de Juizados Especiais Criminais, fazendo um relatório minucioso sobre os pontos mais problemáticos do relacionamento e, ao final, sugerindo ao Promotor e ao Juiz encaminhar as partes para algum tipo de tratamento.

TERMO CIRCUNSTANCIADO Nº 1516/02 Ocorrência : 1331/02 - DEAM

Relatório : 1268/02 - SI

Natureza Jurídica : VIAS DE FATO e AMEAÇA (Art. 21 da LCP e Art. 147 do CP) Local do fato : Santa Maria - DF

Data do fato : 04/05/02 e 19/05/02 – 23h30 min e 08h30 min Autor(es) : XXX

Vítima(s) : XXX

MM. Juiz de Direito do Juizado Especial Criminal,

Consoante Artigo 69 e seguintes da lei nº 9.099/95, passo a expor: XXX, devidamente qualificada na Ocorrência Policial em referência, informou que em data/hora e local supramencionados, no dia 04/05/02, o autor chegou em

casa, aparentando estar alcoolizado e começou a quebrar os moveis, em seguida foi ao banheiro e ao quebrar o espelho, se lesionou, irritado, acusou a vítima de tê-lo ferido e partiu em direção a ela, agredindo-a com empurrões. Os filhos defenderam-na das agressões do autor e este ameaçou a todos, principalmente a vítima dizendo que iria matá-la. No dia 10/05/02 , por volta das 08h30min, o autor, ao levantar-se , começou a discutir com a vítima por causa desta ter saído no dia anterior. Durante a discussão, o autor ameaçou a vítima dizendo que se ela não ficasse quieta, ele iria agredi-la. O autor compareceu a esta Especializada e confirmou as declarações da vítima. Consultado o PROCED, nada consta contra ele.

Pelo exposto, na forma da lei, encaminho à Vossa Excelência o presente termo e peças que o instruem.

Brasília-DF ,03 de julho de 2002 Delegada de Polícia

POLÍCIA CIVIL DO DISTRITO FEDERAL DEPARTAMENTO DE POLICIA ESPECIALIZADA

DELEGACIA ESPECIAL DE ATENDIMENTO À MULHER-DEAM

RELATÓRIO Nº: 1268/02 Brasília-DF, 12 de junho de2002 OCORRÊNCIA Nº: 1331/01

Senhora Chefe,

Em atendimento ao despacho exarado pela autoridade policial na Ocorrência que versa sobre VIAS DE FATO e AMEAÇA, fato ocorrido no dia 04/05/02 às 23h30min, na [...] Santa Maria/DF, tenho a relatar o que se segue:

DA VÍTIMA:

XXX, Brasileira, viúva, Operadora, nascida aos [...] em [...], residente na [...] Santa Maria/DF, fone [...] portadora da CI/RG nº [...]. Compareceu a esta Especializada informando o que consta na ocorrência em questão.

DO AUTOR:

XXX, brasileiro, solteiro , aux. limpeza, nascido aos [...]em [...], filho de [...], residente em [...] Santa Maria/DF, portador da CI/RG nº [...],. Compareceu a esta Especializada e informou que não se lembra bem dos fatos, pois estava alcoolizado, porém acredita que tenha acontecido como a vítima declarou, pois ela não tem motivos para inventar nada sobre ele. Disse que está fazendo tratamento para parar de beber.

Segundo pesquisa ao SIP, nada consta contra o envolvido.

Em anexo cópia da Ocorrência Policial, Termo de Representação Criminal e ficha de antecedentes e conduta social do envolvido.

É o relatório.

Termo Circunstanciado : 1.516/2002 , da DEAM Processo nº 7987-6

Artigo 21 DA LCP e art. 147 do CPB Autor do fato: XXX

Vítima: XXX

TERMO DE AUDIÊNCIA

Na quarta feira, 9 de outubro de 2002, ás 14h43min, designada, nesta cidade do Gama/DF, e, em sala de audiências da 2ª vara do Juizado Especial Criminal, presente o MM. Juiz, Dr. , comigo, Escrivão ao final declarado, foi aberta a Audiência de Conciliação nos autos de número 7987-6, do Termo Circunstanciado Nº 1.516/2002, da DEAM, em que figuram como autor(a)(es) do fato XXX e vítima(s) XXX, por infração ao(s) artigo(s) 21 DA LCP e art. 147 do CPB. Feito o pregão, a ele responderam o (a) Dr.(a) , Promotor(a) de Justiça e o (a) Dr. (a) . Feito o pregão, presentes o autor do fato e a vítima. A vítima manifestou interesse no prosseguimento do feito. O ministério Público assim se manifestou: MMª Juíza, o ministério Público oficia pela suspensão do procedimento pelo prazo de 90 dias e o encaminhamento do casal ao Núcleo Psicossocial do Juizado Central, a fim que sejam entrevistados no prazo de suspensão pelo número de sessões que for considerado necessário pela psicóloga. A psicóloga deverá confeccionar relatório. O casal assumiu o compromisso de comparecimento às sessões no Núcleo Psicossocial do Juizado Central. Após este prazo, este MP requer nova audiência entre as partes. Pelo MM Juiz foi dito: “Tendo em vista o parecer ministerial, bem como, a concordância das partes, no sentido de submeterem a atendimentos no NUPS, SUSPENDO o processo pelo prazo de 90(noventa) dias. Encaminhem-se imediatamente o casal ao setor PSICOSSOCIAL do Juizado Central Criminal a fim de que se submeta(m) a entrevistas naquele período pelo número de sessões que for considerado necessário pelo (a) psicólogo, devendo esta ao final elaborar relatório circunstanciado a respeito do caso, com parecer conclusivo anexando-o aos presentes autos. Após o prazo de suspensão, designe-se nova audiência preliminar”. Intimados os presentes. Nada mais, eu, acspc, o digitei. Gama-DF, 09/10/2002 15:04:30.

RELATÓRIO

Caso nº 371/02

Relatório Técnico nº 34/03 Processo nº 7987-6

Segundo Juizado de Competência Geral do Gama Autor: XXX

Vítima: XXX

II - PROCEDIMENTOS: 14/08/02 – Acolhimento;

23/10/02 – contato telefônico com a Sra. XXX agendando atendimento; 11/11/02 – Atendimento à Sra. XXX e o Sr. XXX;

13/11/02 – Terapia Comunitária;

27/11/02 – O casal Faltou à Terapia Comunitária; 11/12/02 - O casal Faltou à Terapia Comunitária; 26/12/02 – Atendimento à Sra XXX e o Sr. XXX; 07/02/02 - Atendimento à Sra XXX e o Sr. XXX; III – ANÁLISE PSICOSSOCIAL

O Sr. XXX e a Sra. XXX têm três filhos: J., L., e M.; 18 17 e 15 anos de idade, respectivamente. A Sra. M. tem um filho de um primeiro relacionamento: N., com 22 anos de idade.

Percebemos que o Sr. XXX tem uma forma de beber problemática, o que consideramos como um dos fatores determinantes dos conflitos familiares.

O Sr. XXX vivenciou em sua família de origem vários conflitos decorrentes do abuso de álcool pelos seus pais, o que, certamente, influenciou na relação que o mesmo estabelece hoje com a bebida. Embora o beber excessivo tenha múltiplas determinações, os estudos comprovam que o ambiente familiar onde existe a disponibilidade e aceitação do consumo de álcool pode influenciar em grande medida a forma de beber dos filhos.

A Sra. XXX reconhece que desde o início da convivência conjugal o Sr. XXX já apresentava problemas com a bebida, contudo o casal identifica nos últimos cinco anos um agravamento do problema, principalmente no que se refere ao relacionamento familiar.

Percebemos que o período referido pelo casal coincide com a ocorrência de alguns eventos de vida da família (doença da filha caçula e desemprego do Sr. XXX), que podem ter funcionado como estressores para o Sr. XXX, contribuindo, assim, para o agravamento do seu beber problemático. Embora a existência de um problema na família não seja fator determinante para um beber problemático (relação causa-efeito), é importante considerarmos que existe uma “crença” na sociedade de que o álcool pode aliviar a ansiedade, o que na verdade pode aumentar, favorecendo um beber excessivo ou até a instalação de um quadro de dependência.

O casal foi encaminhado para a Terapia Comunitária, no NUPS, na expectativa de que o mesmo refletisse sobre a relação do abuso de bebida alcoólica com a prática de atos violentos e suas possibilidades de mudanças, voltadas para a valorização pessoal, resgate de auto-estima e fortalecimento ou reconstrução de vínculos familiares.

O Sr. XXX e a Sra. XXX compareceram a apenas uma terapia Comunitária. O Sr. XXX voltou a freqüentar o Programa para tratamento do Alcoolismo no HUB, conforme declaração

datada de 28/01/03, contudo, demonstra claramente a sua indisposição para esse tipo de trabalho.

IV – CONCLUSÃO

Ao longo dos atendimentos, observamos que o Sr. XXX, embora reconheça os problemas decorrentes do seu beber excessivo, não se mostra comprometido com um processo de mudanças, o que não significa que o mesmo esteja impossibilitado de mudar. O êxito dos trabalhos com pessoas que abusam de bebida alcoólica ou estão em situação de dependência, é influenciado, significativamente, com a percepção que essas pessoas têm de seus problemas e das metas estabelecidas, ou seja, uma reflexão sobre sua forma de beber pode ser muito positiva para um indivíduo que estava num estágio de negação dos problemas decorrentes do abuso do álcool, assim como a redução do consumo pode ser significativa para um indivíduo em situação de dependência.

Sendo assim, sugerimos que o Sr. XXX permaneça vinculado a trabalho do HUB, por entendermos que a psicoterapia, que é parte do programa, poderá motivá-lo a buscar razões para mudar.

Este é o relatório que submetemos à apreciação de Vossa Excelência.

Foi marcada uma nova audiência preliminar, em que o autor do fato se dispôs a comparecer ao programa de tratamento de alcoolismo do Hospital Universitário de Brasília, o que de fato ocorreu, fazendo com que a vítima desistisse de representar contra o autor do fato.

Esse procedimento encontra-se em consonância com o adotado pela grande maioria dos países, inclusive aqueles da América Latina e Caribe, que já possuem legislação específica sobre violência intrafamiliar; no Brasil, contudo, como não há lei prevendo obrigatoriamente esse procedimento, não há profissionais habilitados em número suficiente, ou instituições, que possam fazer esse tipo de atendimento.

CONCLUSÃO

A pessoa humana (compreendendo tanto o homem quanto a mulher) foi beneficiada, no Século XX, pela criação de instrumentos internacionais para proteção de seus direitos; o princípio da igualdade, incluindo-se a igualdade de direitos entre homens e mulheres, foi inserido nas Constituições de diversos países e, como princípio que é, passou a nortear a aplicação das leis, devendo o juiz considerar a prevalência dos princípios constitucionais para daí então oferecer a solução mais eficaz ao caso concreto, objetivando, portanto, a eficácia dos direitos fundamentais como conditio sine qua non para se alcançar a justiça.

Todavia, o Poder Judiciário não tem atendido às expectativas de muitos cidadãos, impondo-se indagar quais são as possíveis causas desse problema; para tanto, é necessário que o juiz adote uma posição mais crítica e eficiente, o que tem sido denominado ativismo judicial.

Pari passu, homem e mulher chegam ao Século XXI com modelos, papéis sociais e valores em crise, necessitando de novos paradigmas; a mulher, antes limitada à esfera privada, inclui-se na esfera pública, lado a lado com o homem; essa mudança de papéis acarreta uma outra forma de criar o direito, de interpretá-lo e de aplicá-lo, em se tratando de garantir às mulheres seus direitos humanos.