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3.4 A presença do Outro

3.4.1 Exemplo

Para exemplificarmos o dano de uma palavra vinda do outro, iremos apresentar um caso noticiado não somente pelas redes sociais, mas também pela mídia jornalística e televisiva, de uma mulher que morreu após perder 45 quilos.

Conforme o site de notícias do jornal Extra40 do dia 14 de julho de 2015, Cintia

Cunha, 37 anos, após ter sido humilhada devido ao seu peso por um desconhecido nas redes sociais, ela se desequilibrou emocionalmente e, em fevereiro de 2015, pesando 115 quilos, Cintia Cunha procurou uma nutricionista, mas percebeu que os resultados do emagrecimento iriam demorar. Começou por conta própria uma dieta diária de 400 calorias. No decorrer da dieta, em março, já com a imunidade baixa, foi diagnosticada com anemia e, ao longo do tempo, de março até julho, chegou a ser internada várias vezes. Foram diagnosticadas além da anemia, infeções, pneumonia, problemas no fígado e no coração. Em abril, Cintia chegou a fazer um vídeo enquanto tomava uma bolsa de sangue no hospital e publicá-lo em sua rede social, e nele dizia assim:

Um dia, uma pessoa me falou que eu não seria ninguém se fosse gorda. E aí o que aconteceu? Emagreci 45 quilos em menos de seis meses. E o resultado é esse: vivo internada na UTI, doente e com risco de vida. Temos que procurar nos amar como somos. Se alguém quer emagrecer, acho que tem que fazê-lo por causa da saúde, e não motivado pela opinião alheia. (CUNHA, 2015)                                                                                                                          

 

40 http://extra.globo.com/noticias/brasil/mulher-morre-apos-se-submeter-dieta-radical-perder-45-quilos- em-menos-de-seis-meses-16753502.html

Cintia Cunha veio a falecer dia 12 de julho de 2015 por falência múltipla dos órgãos. Cintia era usuária das redes sociais, era seguidora de algumas blogueiras que falam sobre a aceitação do corpo e frequentava grupos sobre emagrecimento saudável e grupos de autoestima para pessoas que estão acima do peso e um dos motivos que impulsionou a repercussão da notícia dentro das redes foi o fato dela ser conhecida em alguns grupos.

Keka Demétrio postou em sua fanpage dia 17 de julho a seguinte chamada para o artigo em seu blog: “Estar fora de um padrão que se julga aceitável pela sociedade pode criar feridas que talvez nunca se curem de fato.”

No artigo do blog Tempo de Mulher da Keka Demétrio intitulado “o preconceito mata”, o outro o tempo todo se faz presente, principalmente na citação acima. O outro pode ser então a sociedade, também é a pessoa que falou tais palavras que marcaram a vida de Cintia. Por mais que se lute em ser aceito, feridas são feitas ao longo do tempo, elas cicatrizam, mas ficam marcas. Keka Demétrio comenta em seu texto no blog “Tempo de Mulher” sobre a corpolatria e que atualmente é um dever fazermos dieta e praticarmos exercícios físicos. E que a sociedade mais cedo ou mais tarde “nos cobra com juros e correção monetária” pelo fato de não seguirmos o padrão de corpo, e que ser magro é a receita para sermos felizes e bem-sucedidos, conforme dissemos no primeiro capítulo desta dissertação ao citarmos Prado (2013) em relação aos “mapas rumo ao sucesso”. “Grande engano”, comenta Keka, "O mais terrível disso, é que essa cultura tem feito aumentar os casos de transtornos alimentares. Nunca antes se falou tanto em obesidade, compulsões, anorexia e bulimia. Perde-se peso e a saúde física e emocional." (DEMÉTRIO, 2015)

A questão de cuidar do corpo passou a ser parte do cotidiano social, e devido aos meios de comunicação como revistas, o corpo magro tornou-se o padrão social de beleza. O olhar e a palavra do outro fere, pois quem é gordo deixa de frequentar determinados lugares pelo simples fato de estarem acima do peso, pois, como diz Keka, um simples “olhar de desaprovação é um dedo apontando na cara berrando o quanto eles te chamam de preguiçoso, desleixado, feio e indisciplinado”. Nesse parágrafo vemos o quanto a sociedade atual é preconceituosa com o gordo, isso sem exageros, pois é exatamente assim que é visto o corpo gordo, conforme Vigarello diz em seu livro, é mais um estigma que o corpo gordo sofre diante a sociedade, de “viver com um corpo rejeitado” (VIGARELLO, 2012, p. 341). Pois nesta obra é mostrado que o sofrimento e a impotência

de ter um corpo excluído pela sociedade fez com que o gordo perdesse até mesmo a sua identidade pelo fato de sua condição corporal não se encaixar em padrões sociais não somente de nossa época, mas sim de uma construção que vem se formando de séculos anteriores.

Como podemos exemplificar com o texto de Keka Demétrio que termina com os seguintes dizeres: "Ser forte o suficiente para assumir seu corpo e cuidá-lo como bem entender deveria ser regra, mas a sociedade faz questão de tomar para si esse papel e ir, aos poucos, adoecendo seus gordos com doses homeopáticas de preconceito." (DEMETRIO, 2015)

Ao se tratar do caso da Cintia em si, questionando a citação de Keka, não sabemos desde quando Cintia sofria com seu peso, a questão é que ela foi forte para aguentar o preconceito da sociedade que não vem em doses homeopáticas, e sim cavalares. Cintia foi forte em querer lutar, mesmo de maneira errada ela reagiu de alguma forma. Desde a adolescência sofrendo bullying, dificuldade em arrumar namorado, dificuldade em conseguir roupa e trabalho já é o suficiente para ser forte em uma sociedade discriminante.

A professora em sociologia e militante feminista contra a gordofobia, Bruna Giorjiani de Arruda, 30 anos, que fundou a fanpage Senhorita Gorda com 5772 seguidores, já foi vítima de um caso que repercutiu na mídia sobre ter sido reprovada em um exame médico adicional para o cargo de professora por ser obesa. Também escreveu em sua página na rede social sobre o caso de Cintia em um texto intitulado “Gordofobia

mata!”

Assim como tantos outros preconceitos, a gordofobia também mata. Quando Cintia desenvolveu seu transtorno alimentar (tratado pela mídia apenas como regime radical), certamente foi tratada como vitoriosa. Imagino que ao emagrecer 45 quilos foi parabenizada muitas vezes, afinal vencedor é aquele que consegue emagrecer. (ARRUDA, 2015)

Percebemos que, no discurso de Bruna, fica claro que a mídia tenta amenizar a situação trocando as palavras transtorno alimentar para regime radical para deixar mais “leve” o assunto. Pois a questão do transtorno alimentar é considerado como uma doença causada por distúrbios psiquiátricos.

A questão de ser tratada “como vitoriosa” por ter perdido peso tão rapidamente e tentar se adequar ao modelo de padrão em nossa sociedade é motivo de elogios, superação de limites, como se fosse uma atleta que vence seus desafios.

A morte de Cintia, assim como a morte de tantas adolescentes (a primeira causa de morte entre meninas de 15 a 24 anos são os transtornos alimentares) é alarmante. Não representam senão a morte pela futilidade, a morte pelo padrão. A morte injusta de quem não bastou por si só para a existência e teve que dar a própria vida em nome do que deseja a sociedade. (ARRUDA, 2015)

A informação que Bruna transcreve em seu texto sobre a primeira causa de morte sobre transtornos alimentares em adolescentes é um dado universal, mas não é uma referencia brasileira. Quando ela fala sobre transtorno alimentar, isso significa anorexia, compulsão alimentar, bulimia, orthoxia, vigorexia. Sobre afirmar que é a principal causa de morte são esses transtornos alimentares, acreditamos que Bruna se baseia em dados internacionais, conforme nossa pesquisa esse dado é do Centro Nacional de Informações

sobre Transtornos Alimentares do Canadá (Nedic41, na sigla em inglês) que indicam que

as incidências mundiais de mortes relacionadas à anorexia em mulheres entre 15 e 24 anos é 12 vezes maior que qualquer outra causa nessa faixa etária (MORGAN, 2009). No Brasil, as maiores causas de morte entre meninas e adolescentes nesta faixa etária de idade são: acidentes e homicídios (morte violenta) e suicídio, conforme pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública (FSP), da USP 2011, conforme informação abaixo.

Acidentes e violência corresponderam a 15,4% dos óbitos. No Norte, 12%, e Centro-Oeste (18,9%). Em 57,3% das ocorrências, a mulher tinha menos de 30 anos. Nordeste e Sudeste destacaram-se neste tipo de óbito, e em todas as capitais o total ficou em 39,3%. Em 44,6% dos casos, as mortes ocorreram entre 15 e 24 anos. (JANES, 2011)

A socióloga Bruna continua seu texto comentando sobre a luta contra o estigma que o corpo gordo traz, ou seja, a gordofobia. Comenta sobre a autoaceitação e que ser gordo não é doença. Ela conclui seu raciocínio dizendo que hoje as pessoas só são aceitas pela sociedade se emagrecerem e que o gordo que emagrece é vitorioso e que isso só fomenta mais a discriminação contra os gordos.

Crer que uma pessoa gorda só se mostrará responsável e vitoriosa após emagrecer é manter um ciclo de injustiças e discriminações que colocam grande parte da população como inferior pelo simples capricho dos que desejam que todos sejam iguais. Meu corpo, minhas regras. (ARRUDA, 2015)

                                                                                                                           

Na Fanpage Precisamos falar de Gordofobia, com 7.167 seguidores, Thalita Braga Martins de Paiva, 28 anos, uma das administradoras da fanpage e admiradora do estilo prosa poética fez uma homenagem a Cinta em forma de poesia:

Cíntia era gorda. Cíntia era positiva. Cíntia era bem resolvida.

Cíntia tinha uma autoestima de dar inveja a muita gente.

Cíntia ouviu de um homem que não conseguiria nada na vida sendo gorda. Quando Cíntia decidiu emagrecer, ela tinha o mesmo peso que eu tenho hoje.

Cíntia tinha problemas de saúde antes de tentar emagrecer. Era hipertensa e diabética. E poderia ter emagrecido de forma saudável, se seu objetivo fosse tratar sua saúde. Mas seu objetivo era emagrecer pra ser alguém, porque disseram a ela que, sendo gorda, ela não poderia ser alguém.

Gorda não pode ser alguém. Gorda não pode ser.

Gorda não pode. Gorda não.

Cíntia morreu antes de nós e depois de muitas. Cíntia morreu pelo que nos matará um dia e pelo que já matou muitas. Porque gordofobia humilha, dilacera e mata.

Tha Lita

Percebemos um desenho estético da poesia, começando com palavras pequenas e depois maiores, e ao final faz o mesmo desenho ao contrário de palavras grandes a pequenas. Houve da parte de Tha Lita um reconhecimento pessoal com o caso da Cintia quando ela disse que ela tem o mesmo peso que ela quando resolveu emagrecer. Isso aponta também que o discurso do outro poderia ter afetado ela, já que Cintia, como Tha Lita, tinha autoestima e eram bem resolvidas. O que levanta dúvidas é que se Cintia fosse realmente bem resolvida, positiva e tivesse a autoestima de dar inveja, será que iria se deixar abalar por um comentário de uma pessoa que não a conhecia e ser tão determinada a emagrecer a ponto de encarar uma maratona de dieta pesada para mostrar para ou outro que ela é capaz de emagrecer e ser alguém?

Ao final do poema Tha Lia diz que “Gorda não pode ser” e diz que o que matou Cintia foi o preconceito e que a gordofobia fez mais uma vítima e fará outras.

No Blog Não Sou Exposição comenta o caso de uma maneira mais suave. O texto foi replicado na fanpage Coletivo Anti-gordofobia que aborda a gordofobia e o ativismo Gordo dentro do feminismo.

Não são raras as histórias de pessoas que comprometeram a saúde em nome de um emagrecimento repleto de riscos e de modo abrupto. A Cintia sofreu danos físicos… Mas praticamente diariamente recebo relatos de pessoas que sofrem riscos emocionais e mentais muito graves por causa de um comentário, por conta da opinião das outras pessoas, porque foram rejeitadas pelos parceiros, porque sofreram pressão dos pais, porque não conquistaram uma vaga de emprego unicamente por não serem MAGRAS como a sociedade dita, cobra, insiste que sejamos... Você acha que você é o seu corpo e que seu valor reside na sua aparência? (NÃO SOU EXPOSIÇÃO, 2015)

Percebemos que o comentário fala sobre a rejeição social por não ter um corpo que a “sociedade dita”. Muitas pessoas sofreram e sofrem emocionalmente por isso e Cintia, após os danos emocionais, também sofreu danos físicos. Fica clara a tentativa de suavizar uma situação limitando-a em danos físicos, os quais levaram ao óbito da Cintia. Para Cintia chegar ao ponto da decisão em fazer uma dieta restrita de 400 calorias à base de sucos que prometem desintoxicar o organismo, o “emocional” e o “mental” dela já deveriam estar bem abalados.

Nota-se também que Paola foi a única que no texto não comentou sobre a “gordofobia” propriamente dita, mas sobre temas que envolvem esse tipo de preconceito, como, por exemplo, a rejeição familiar e a rejeição social, principalmente a questão da empregabilidade de pessoas gordas. Tudo por causa da questão estética, da aparência física.

Claudia Ferreira, produtora da “A mais Bela Gordinha do Brasil” com o total de 14.588 seguidores em sua fanpage comenta o caso de Cintia:

Quando fazem as piadinhas maldosas ninguém se importa se vai afetar ou não a pessoa!!! Pra começar, a cobrança já parte de dentro de casa, na maioria das vezes, mas ninguém pára e pergunta ou quer saber, pq a pessoa engorda tanto. É só comida????? Não!!! Tenho certeza que não!!! Parece que o amor e o respeito ao próximo a cada dia acaba. As pessoas estão cada vez mais egoístas!!! Só pensam em si e o resto que se dane!!! É triste ter que se deparar com histórias trágicas como esta e ao mesmo tempo revoltante por saber que um ser indigno lançou a mensagem negativa/preconceituosa para esta jovem linda!!!! Eu sou uma Gorda Forte o suficiente para aguentar qualquer tipo de piadinhas idiotas, mas nem todas são e por isso eu temo que minhas Gordinhas deparem como pessoas assim, tão vazias. É lamentável o ocorrido. Espero que as pessoas pensem muito bem antes de lançar as INFELIZES PIADAS, seja qual for o tipo de preconceito... Se gorda, gordo, magro, negro, enfim, PAREM! Chega!!!! #GordasUnidasJamaisSeraoVencidas (FERREIRA, 2015)

Claudia Ferreira faz parte do movimento Plus Size, apesar de não ser explicitamente militante da causa antigordofobia, mas agir de forma a favorecer e lutar pela autoestima da mulher gorda. Sua narrativa é mais leve e suave, sem falar especificamente de preconceitos. Ela realça a presença da fala do outro em nossas vidas. Como as pessoas precisam estar emocionalmente preparadas e fortes para ser gordas em uma sociedade que tem dificuldade em aceitar um corpo diferente do midiático. Claudia deixa clara a presença do outro, a alteridade na fala em relação às “piadas maldosas” já que se enfrentam problemas dento da própria família e fora dela. A falta de respeito entre os outros. Claudia fala mais abertamente e aponta um problema social de uma pessoa não conseguir aceitar outra pelo fato de ser diferente. E o fato de umas serem mais fortes que as outras para poder suportar este peso emocional que é ser diferente.

Quésia Almeida, 26 anos, com 20.664 seguidores, publicitária e modelo plus size. Dona de uma autoestima imensurável – ela se intitula diva. Ela defende muito a autoestima e o amar-se em qualquer situação. Sobre o caso da Cintia, Quésia fez um vídeo de aproximadamente 6 minutos que, até o dia 11 de agosto de 2015, teve 145.541 visualizações, dando maior enfoque a amar-se e não dar ouvidos ao que os outros falam, de como superar dificuldades enfocando principalmente a autoestima.

Diferente dos discursos anteriores que falam sobre gordofobia, Quésia estimula suas seguidoras a não dar ouvidos ao que os outros dizem e também fala no depoimento sobre sua história. Ela comenta sobre bullying e preconceito, mas os focos principais em sua fala são de superação, de se amar e respeitar os limites. Já que Cintia veio a óbito pois não respeitou os limites de seu corpo.

Quésia diz em seu discurso:

você pode ser o que você quiser independente do seu estado físico. Gorda, magra, loira, branca negra, careca, aleijada, cega [...] Você pode ser o que você quiser, basta você querer [...] Tudo está dentro de você. Isso aqui (referindo-se ao corpo) é só uma pele, uma capa. [...] Não deixe que ninguém venha falar palavras para te ofender.

Então você se ame, se valorize. Corre atrás de você! Corre atrás, corre atrás!! Corre atrás se abrace, se ame! Se ame!! Você tem que se amar! Por que se você não se amar, ninguém vai fazer isso por você, não! Só Deus que te ama, só Deus. Então se ame, se aceite, se respeite. Respeite seu corpo. Respeite seu limite. Se ame! Se ame! Se aceite! [...] Cuide da sua autoestima, cuide do seu eu. Cuida do seu eu. Pare de dar ouvido as pessoas que ficam falando [...] besteira. Eu sou gorda sim.

EU SOU DIVA, meu bem! Eu sou maravilhosaa!! Como muito outras gordinhas maravilhosas que existem neste mundo! Então flor, se ame! E eu espero que este vídeo da Cintia que ela fez sirva de exemplo para vocês, tá? Por que assim: é muito triste você ver uma pessoa tão linda, sabe, uma pessoa tão maravilhosa indo embora por preconceitos, né? Muitas pessoas dizem que bullying é palhaçada, né não!!! É isso aí que acontece. Né não, né não

Então eu espero que sirva de exemplo para você e para muitas pessoas aí que não se cuidam, né e não se amam o suficiente para procurar um nutricionista, um médico, então você tem que se amar e se cuidar e primeiramente se respeitar. Respeite o seu limite, tá bom? Um beijo plus pra vocês, fiquem com Deus e até mais. (ALMEIDA, 2015)

O que percebemos em todos esses discursos são as variações sobre o mesmo tema mas com enfoques diferentes: Keka Demétrio tem um discurso mais focado em um padrão social em relação ao culto ao corpo que é a corpolatria, ser forte para superar a questão do preconceito da sociedade em relação ao corpo gordo. A socióloga Bruna Arruda focou na questão da gordofobia (preconceito): somente é vitorioso aquele que se encaixa nos padrões sociais. Tha Lita comenta poeticamente sobre a baixa autoestima, a identificação entre ela e o biótipo de Cintia e o fato de que socialmente não se pode ser gorda. Paola se refere aos danos físicos e danos emocionais e sobre como as pessoas lidam com a sociedade. Claudia Ferreira comentou ser uma “Gorda Forte” ou seja, a autoestima forte para poder aguentar piadas debochadas. E para finalizar, Quésia deixou claro em todo o seu discurso uma história de superação e amar-se acima de qualquer coisa para manter a autoestima alta.

Colocamos em reflexão exatamente essas narrativas que não foram suficientes para que Cintia fosse forte e capaz de não dar ouvido a um comentário que quem é gordo sempre ouve: “Você não vai ser ninguém se for gordo”, ouvir comentários assim e outras indiretas fazem parte do discurso de pessoas que não acreditam que uma pessoa gorda é capaz.

Percebemos vários pontos que não foram abordados pelas blogueiras. Podemos tentar analisar o poder da palavra proferida através dos discursos das blogueiras e uma palavra proferida do outro ter mais “persuasão” para influenciar ou mover sentimentos. Não podemos exigir da Cintia ou de qualquer outra pessoa essa “fortaleza” implícita nos discursos de autoestima. “Não deixar se abalar por palavras”. Não sabemos que tipo de representação tinha esse outro na vida dela. O quanto ele era importante (ou não) para abalar o emocional de Cintia, não podemos julgá-la de não ser forte, de não ter a autoestima elevada pois não sabemos nada sobre o estado emocional dela. Não sabemos de nada sobre Cintia, aqui analisaremos somente a repercussão do caso entre as blogueiras, seus discursos e de quais formas iremos abordá-los. Sabemos portanto que a palavra do outro sobre Cintia teve mais poder do que as palavras das blogueiras.

Conforme Foucault fala em “O Governo de Si e dos Outros”, todos têm liberdade de oratória – o que ele chama de parrésia – mas esse poder avassalador que a palavra tem

pode ser cruel, o que coloca em análise o poder das palavras das blogueiras e o poder da palavra do outro.

“O exercício de uma palavra que persuada os que são comandados e que num jogo agonístico dê liberdade aos outros que também querem comandar é, a meu ver, o que constitui a parrésia.” (FOUCAULT, 2010, p. 98) Podemos perceber o jogo entre as palavras das blogueiras versus a palavra do outro (podemos interpretar este outro como uma pessoa, as influências da mídia e a influência social em cima de um corpo). Amar seu corpo fora dos padrões e lutar pelo seu espaço ou ter um corpo dentro dos padrões