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EXERCÍCIO ABUSIvO DO PODER DE POLÍCIA – INTIMAÇãO DEMOLITÓRIA

No documento Revista V. 106 n. 2 (páginas 176-179)

A ADMINISTRAÇãO PÚBLICA NãO PODE ORDENAR A DESTRUIÇãO DE MURO DE CERCAMENTO CONSTRUÍDO POR PARTICULAR QUE DETÉM O DIREITO REAL DE USO DE ÁREA PÚBLICA DERIvADO DE CONTRA- TO DE CESSÃO FIRMADO COM A UNIÃO, CONFIGURANDO-SE, DESSE MODO, EXERCÍCIO ABUSIVO DO PODER DE POLÍCIA E ENSEJANDO A REPARAÇãO PELOS DANOS MATERIAIS OCASIONADOS

efetivada a demolição do muro que cercava área cedida pela união, a central das cooperativas de materiais Recicláveis do Distrito Federal − cenTcOOPDF ajuizou ação judicial em desfavor da Agência de Fiscaliza- ção do Distrito Federal − AGeFIS, objetivando a declaração de nulidade dos autos de apreensão de bens e da intimação demolitória, a determinação para que a ré se abstenha de impedir a construção de novo muro no local e a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais).

Julgado procedente o pedido pelo Juiz de primeiro grau, a AGeFIS interpôs recurso de apelação, sustentando a legalidade dos autos de em- bargo e da intimação demolitória, na medida em que foram lavrados por não ter sido apresentada a documentação necessária, já que se trata de área de domínio público. Afirmou que os referidos atos administrativos consubstanciam regular exercício do poder de polícia e que, ante a ino- corrência de interposição de recurso administrativo, a desídia da autora teria dado causa à demolição. Também reclamou do valor arbitrado a título de danos materiais, porquanto não apresentada documentação apta a de- monstrar o alegado prejuízo.

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Inicialmente, destacou a ilustre Relatora, Desembargadora maria de Lourdes Abreu, que a autora/apelada celebrou com a união um contrato de concessão de direito real de uso resolúvel gra- tuito, para a utilização de parte do imóvel intitulado Fazenda Sucupira, no Riacho Fundo. O pacto foi celebrado com prazo de vigência de 20 anos, destinando-se à construção e instalação de centros de triagem e reciclagem do lixo oriundo da coleta pública realizada no Distrito Federal.

Ressaltou a e. Relatora que os atos administrativos impugnados tiveram por objeto o muro que cercava a área cedida pela união e que, consequentemente, se encontrava acobertado pela ex- ceção prevista no inciso II do art. 33 da Lei Distrital nº 2.105/1998, que admite a construção de muro, desde que não seja de arrimo, sem a apresentação de projeto e de licenciamento.

Desse modo, asseverou não assistir razão à apelante, ao afirmar que a demolição do muro teve como fundamento a ausência de comprovação de propriedade por parte da apelada. Assim enfatizou a i. Relatora:

Ora, tendo em vista que o contrato de cessão foi lavrado no Livro de Registro de Atos relativos a aquisição, alienação, cessão, aforamento e outros, concernentes a imóveis do patrimônio da união, da Superintendência do Patrimônio da união no Distrito Federal, é inconteste que a parte-apelada deu, desde dezembro de 2010, publicidade ao ato que lhe concedeu direito real de uso da área pública.

Portanto, seu direito real é oponível a terceiros e, com muito mais razão, deve ser respeitado e conhecido pela própria Administração, uma vez que se trata de área por ela mesma cedida, com o intuito de que determinado serviço fosse prestado pela outorgada, o que torna inad- missível a argumentação de que a parte deu causa à demolição por não ter apresentado docu- mentação de propriedade (TJDFT, 5ª Turma cível, Acórdão nº 862889, APc20130111257677, Relatora Desembargadora maria de Lourdes Abreu, DJe 29/04/2015, p. 674).

no mesmo sentido, apontou julgado deste egrégio Tribunal de Justiça, da 1ª Turma cível, o Acórdão nº 609611, APc201200111533312, da relatoria do Desembargador Teófilo caetano, DJe de 16/08/2012, p. 83.

Salientou, também, a comprovação de que a apelada requereu administrativamente a nuli- dade do auto de intimação demolitória, em contrariedade à alegação firmada pela Agência Fiscaliza- dora de que a autora/apelada teria agido de maneira desidiosa após ter recebido a referida intimação. Assim, inferiu a e. Relatora que a Administração efetivamente exerceu o poder de polícia de forma abusiva, sendo devida, portanto, a indenização pleiteada.

Pontificou que o poder de polícia não é ilimitado e deve observar os direitos individuais do cidadão, o que acarreta a responsabilização objetiva do estado em caso de abuso de direito. Sobre o tema, enalteceu o escólio de Hely Lopes meirelles:

Os limites do poder de polícia administrativa são demarcados pelo interesse social em conciliação com os direitos fundamentais do indivíduo assegurados na constituição da República (art. 5º). vale dizer, esses limites decorrem da constituição Federal, de seus princípios e da lei. Do absolutismo individual evoluímos para o relativismo social. Os es- tados Democráticos, como o nosso, inspiram-se nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana. Daí o equilíbrio a ser procurado entre a fruição dos direitos de

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cada um e os interesses da coletividade, em favor do bem comum (Direito Administrativo Brasileiro. 39. ed., São Paulo: malheiros editores, 2013, p. 143-144).

Dessa forma, concluiu que o exercício abusivo do poder de polícia acarretou prejuízo indi- vidual à parte apelada e, também, aos interesses sociais, uma vez que a atividade a que se destina a cessão de direito real da área pública não pôde ser desempenhada em virtude dos autos administra- tivos impugnados, impondo-se o dever de indenizar.

considerando adequada a fixação do quantum indenizatório, bem como dos honorários ad- vocatícios, a eminente Desembargadora maria de Lourdes Abreu pronunciou-se pelo não provi- mento do recurso.

Após o voto do i. Revisor, Desembargador Sandoval Oliveira, acompanhando a e. Relatora, o i. vogal, Desembargador Angelo Passareli, solicitou vista dos autos.

em seu voto, o e. vogal externou entendimento divergente apenas no tocante ao valor con- cedido à apelada como compensação pelos danos materiais.

Afirmou o i. vogal que não houve comprovação do valor exato dos danos reclamados pela apelada e que, ao contrário do alegado pelo magistrado sentenciante, a Agência Fiscalizadora im- pugnou o pleito referente à indenização pelos danos materiais, defendendo a sua improcedência com base na ausência de ato ilícito. Por conseguinte, a seu sentir, o valor da indenização deveria ser calculado em sede de liquidação de sentença por arbitramento.

Assim, a egrégia 5ª Turma, por maioria, negou provimento ao recurso interposto pela AGe- FIS, mantendo inalterada a sentença recorrida.

R EVI STA DE D OUTRI NA E J URI SPRUD êNCI A . 50. B RAS íLI A . 106 (2). JURI SPRUD êNCI A / JAN- JUN 2015 Acórdão 856198 Juiz Luís Gustavo B de Oliveira Relator – 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal

EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO

No documento Revista V. 106 n. 2 (páginas 176-179)

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