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4.5.2 Experiências de Economia Solidária na Europa.

Entre as diversas experiências desenvolvidas e consideradas como economia solidária por França Filho e Laville (2004) e Singer (2003), na Europa e América Latina, destacamos o comércio justo, finanças solidárias, cooperativas, associações, empresas sociais, economia sem dinheiro, movimentos sociais articulados a associações produtivas.

A iniciativa do comércio justo tem sua origem, segundo França Filho e Laville (2004), no início da década de 1970, através de ONGs que atuavam em projetos de geração de renda junto a populações de baixa renda, localizadas no hemisfério sul, articuladas à ONGs do hemisfério norte com atuação predominante em ecologia e meio ambiente.

O objetivo da articulação era a comercialização de produtos de origem popular, produzidos de forma ambientalmente sustentável, diretamente a consumidores europeus predominantemente. Tais experiências, hoje, abrem-se para duas vertentes: uma delas, busca a distribuição dos produtos em lojas associativas; a outra, procura distribuir os produtos em grandes cadeias de supermercados.

As experiências de finanças solidárias são conhecidas como micro crédito, poupança solidária, micro finanças, finanças de proximidade. O objetivo principal

de um sistema de crédito popular - possibilitar crédito à população de baixa renda - baseia-se na constatação de que essa população não acessa esse crédito no sistema bancário convencional. Em acréscimo ao objetivo central articula-se a disponibilização de crédito solidário à utilização em projetos de inclusão social, de preservação ambiental, de ações culturais e de desenvolvimento local.

Segundo França Filho e Laville (2004), as experiências européias sobre finanças solidárias são significativas em países como França, Alemanha, Suíça, Bélgica, Inglaterra e Holanda. Neste último país é emblemática a experiência da criação do Triodos, principal investidor de parques ecológicos e financiador de um quarto da alimentação orgânica do país.

O conjunto de experiências desenvolvidas em finanças solidárias resulta, segundo França Filho e Laville (2004), em formas diferentes de organização, sendo que, em algumas experiências, ocorre uma presença mais marcante da economia de mercado, em outras da economia solidária e, por último, forte presença estatal no financiamento das atividades.

O Banco Popular da Mulher4, originalmente denominado Banco do Povo, uma OSCIP, desenvolvida na cidade de Campinas, Estado de São Paulo, é um exemplo desse caso, pois nessa experiência a quase totalidade dos recursos disponibilizados provém da Prefeitura Municipal de Campinas.

A chamada economia sem dinheiro, segundo França Filho e Laville (2004), remonta à década de 1970 na cidade de Vancouver, no Canadá. São experiências que se espalharam por vários países, em especial os Estados Unidos, Inglaterra e Austrália. Caracterizados por um sistema de trocas organizadas por associações de pessoas, diferenciam-se das trocas familiares pela utilização de espaços públicos e de normas reciprocitárias nas trocas.

Nos espaços públicos ocorrem trocas variadas como a guarda de crianças, serviços gerais, objetos usados, produção artesanal, entre outras.

As Empresas Sociais na Europa constituem-se como empreendimentos que não apresentam a maximização do lucro como a razão de sua existência, mas de

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propiciar a produção de bens e serviços com vistas à encontrar saídas para o desemprego e exclusão social.

Fazem parte dessa categoria, segundo França Filho e Laville (2004), as empresas de inserção portuguesas, francesas, belgas e finlandesas, as cooperativas sociais italianas, as cooperativas de trabalho associadas espanholas, as empresas de comunidades locais alemãs, as empresas comunitárias escocesas, as empresas intermediárias inglesas, as cooperativas de serviços sociais suecas, as empresas comunitárias austríacas, as empresas comerciais com finalidade social americanas, movimento comunitário quebequense, grupos comunitários neozelandeses e cooperativas mexicanas.

Embora tais empresas tenham uma diferenciação clara entre empresa privada e pública, elas apresentam um caráter ambíguo ao

...associar a empresa social à questão da inserção. Estas inscrevem-se muito mais numa perspectiva sócio-econômica do que sócio-política, mais próximas, portanto, do registro de uma economia social do que de uma economia solidária (França Filho e Laville, 2004:127).

Outra característica das empresas sociais refere-se ao seu caráter de crescente profissionalização da gestão, decorrente de um interesse dos Estados europeus no fomento a elas através de marcos regulatórios, provocando um certo engessamento em seu desenvolvimento, perda de autonomia institucional, baixa democratização nos processos decisórios, embora estejam associadas à iniciativas de associação de cidadãos, calcadas em princípios de autonomia em relação ao Estado.

Importante destacar que a legislação Italiana de 08 de novembro de 1999 busca reverter essa tendência sobre a prática das cooperativas de solidariedade social na Itália, antes voltadas para objetivos primordialmente econômicos e maximização dos interesses dos associados, para um interesse mais voltado para a comunidade, para a promoção humana e integração social dos cidadãos.

Com um novo marco regulatório, as cooperativas sociais italianas aproximam-se mais das características de empreendimentos solidários, inscrevendo com esta condição a sociabilidade comunitário-pública e a finalidade

multidimensional, características de uma economia solidária segundo conceituado por França Filho e Laville (2004) .

Elas atuam na área de serviços (ajuda em domicílio ou na gestão de centros sociais), atividades agrícolas, industriais, comerciais. Contam hoje com aproximadamente três mil cooperativas, setenta e cinco mil trabalhadores, cento e vinte mil membros, onze mil voluntários, quatrocentos mil usuários e movimentando cerca de um bilhão e duzentos mil euros.

Na França, segundo França Filho e Laville (2004), a figura jurídica da SCIP caracteriza-se como uma forma de legislação de empresa social. Porém, uma grande variedade de experiências associativas (empresas de inserção, associações intermediárias, régies de quartier, associações de ajuda em domicílio, empresas de trabalho adaptado, centros de hospedaria e de readaptação ao trabalho, cooperativas, creches parentais...) conduz a distintas visões sobre a aproximação da empresa social ao conceito de economia solidária.

A empresa social pode ser entendida como uma extensão dos limites atingidos pelas cooperativas, ou como participante de um movimento de consolidação da economia solidária, ou ainda, como uma empresa de mercado com um conteúdo social mais presente.

Essas empresas sociais, ainda segundo França Filho e Laville (2004), ramificam-se em dois tipos principais: o primeiro é a empresa social de inserção econômica, com a missão de promover a inserção social através da geração de trabalho e renda para desempregados; o segundo tem a missão de produzir bens e serviços com uma utilidade social ou coletiva.

Ambas são contempladas com financiamento preponderante de suas atividades pelo poder público, forçando-as a uma profissionalização da gestão, aproximando-as de empresas de mercado enquanto um modo formal de gestão e na necessidade de apresentar resultados quantitativos. Podemos considerar, ainda, que esse processo induz à caracterização das empresas de inserção pelo econômico como pertencentes ao terceiro setor, que, ao longo do tempo, fez crescer a sua influência, levando-as à uma espécie de posto intermediário entre o mercado e o Estado, distanciando-as das características da economia solidária.

Outra vertente da inserção pelo econômico surge na França, Inglaterra, Itália e Canadá, entre as décadas de 1970 e 80, vista pelos autores como uma influência do movimento cooperativista pós-1968, através de trabalhadores qualificados, que se organizam em cooperativas e criam seus próprios empregos, abrangendo diversos segmentos de atividades.

Na seqüência desse movimento surge um outro, que busca a garantia de emprego, em decorrência de falências de empresas e a retomada pelos trabalhadores dessas empresas falidas. A consolidação dessas experiências poderá se dar na lógica da economia solidária, dependendo da capacidade de articulação do movimento de economia solidária com as direções e entidades ligadas à esses empreendimentos.