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Fechamento para a abertura: a pesquisa sobre a ambientalização

Aqui pretendo construir um fechamento para este capítulo, de modo a organizar algumas considerações sobre as pesquisas registradas nos bancos de teses e dissertações da CAPES e da BDTD/IBICT nos levantamentos realizados em 2015 e em 2017. Esse fechamento tem como objetivo sistematizar, de maneira geral, aspectos observados nesses trabalhos, o que será importante para a abertura das reflexões que seguem nos próximos capítulos, principalmente quando emergem as observações dos trabalhos de campo realizados nas escolas.

Sobre as pesquisas realizadas nas escolas, cabe ressaltar novamente que todas foram conduzidas em instituições das redes de ensino público. Dessa forma, percebe-se que há pouco desenvolvimento no campo de investigação das escolas privadas, mas o mesmo não se pode afirmar com relação às instituições de Educação Superior. Apesar do maior número de

registros serem de pesquisas realizadas em instituições públicas, houve o registro de trabalhos desenvolvidos em instituições privadas.

As teses e dissertação classificadas nas categorias Educação Básica/Currículo resultam de pesquisas que objetivaram compreender como o currículo das escolas se apresentou com relação à temática ambiental, desde as práticas pedagógicas, passando pelas percepções e representações dos atores da instituição, até os documentos oficiais e avaliações do Estado. Muitos autores observaram a incorporação dos temas ambientais e da educação ambiental na escola, mas ainda verificam a necessidade de problematizar conceitos como democracia, autonomia, qualidade de vida, equilíbrio ambiental sustentável, sociedade e natureza. Também foram recorrentes os argumentos que divergiam sobre a constituição de uma disciplina curricular de educação ambiental e sobre a transversalidade da temática nos currículos.

As pesquisas realizadas na Educação Superior buscaram, principalmente, compreender como ocorria a inserção da temática ambiental na organização dos currículos em diferentes cursos de graduação, sejam de formação de professores ou de bacharéis. Para tanto, analisaram os documentos curriculares das instituições, ouviram discentes, docentes e gestores e relacionaram a investigação às políticas públicas brasileiras, entre outros aspectos.

Ao analisar as pesquisas, ainda que ressalvando o recorte metodológico desse levantamento, é possível notar que há um grande número de teses e dissertações sobre educação ambiental nos últimos anos e que essas se distribuem em diversas áreas de conhecimento. Como já mencionado, acredito que tais características se devam ao próprio histórico da educação ambiental no Brasil, que se desenvolveu principalmente nas últimas duas décadas, e pela sua caracterização como tema transversal e interdisciplinar. Nesse sentido, tanto os documentos oficiais sobre o currículo quanto as pesquisas aqui descritas apontam para a necessidade de abordar as questões ambientais a partir de uma perspectiva mais ampla, ou seja, contemplando não só aspectos biológicos, mas sociais, políticos, econômicos e éticos.

Outro dado que chama a atenção, especificamente com relação ao levantamento realizado em 2015, é de que apenas cinco trabalhos tinham “ambientalização” como título, ou seja, apenas 15% dos trinta e três trabalhos encontrados. Já no levantamento de 2017, 11 das 18 pesquisas (61% do total) destacaram o conceito no título. Se analisados conjuntamente, os

dados dos dois levantamentos mostram a presença da ambientalização no título em 23,5% dos trabalhos sobre a Educação Superior e em cerca de 8% das investigações com foco na Educação Básica.

De maneira geral, posso observar que o campo da pesquisa, no que se refere à produção de teses e dissertações, tem se dedicado mais a estudos que exploram a ambientalização curricular nos últimos anos que em momentos anteriores. Outro fato é a maior frequência de trabalhos sobre a ambientalização na Educação Superior com relação à Educação Básica. Contudo, como já mencionei antes, o banco de dados da CAPES não se encontrava atualizado na busca realizada em 2015, o que pode ter invisibilizado trabalhos com essa abordagem em períodos anteriores.

Das teses e dissertações resultantes do levantamento nos bancos de dados em 2017, cabe destacar a predominância de pesquisas desenvolvidas no Programa de Pós-Graduação em Educação da PUCRS por estudantes ligados ao grupo SobreNaturezas. Dos 18 trabalhos registrados, seis foram desenvolvidos nesse Programa.

Dentro do grupo de investigações sobre ambientalização, observa-se que um maior número de trabalhos resulta de estudos decorridos na Educação Superior, nos dois levantamentos realizados. De acordo como descrevo em outro trabalho, tal fato pode ter relação com a formação de redes de pesquisadores que têm buscado diagnosticar a inserção da temática ambiental nos currículos universitários, a exemplo da Rede ACES (FRIZZO, 2017). A convergência de pesquisas sobre a ambientalização das universidades tem gerado publicações e eventos científicos, tais como a publicação “Ambientalização nas Instituições d e E n s i n o S u p e r i o r n o B r a s i l : c a m i n h o s t r i l h a d o s , d e s a f i o s e possibilidades” (RUSCHEINSKY et al., 2014), o “IV Seminário Sustentabilidade na Universidade: Desafios à Ambientalização nas Instituições de Ensino Superior no Brasil”, realizado em Porto Seguro, Bahia, em 2013, e o “Visões e experiências ibero-americanas de sustentabilidade nas universidades”, que ocorreu em São Carlos, São Paulo, em 2011.

A fim de situar os levantamentos que realizei em 2015 e em 2017, abrangendo teses e dissertações disponíveis nos bancos de dados da CAPES e da BDTD/IBICT entre 2011 e

2017, com relação a outros períodos, destaco aqui os trabalhos de Rink (2014), de Carvalho e Farias (2011) e de Mota (2017) . 33

A pesquisa de Rink (2014) tinha como objetivo analisar os processos de ambientalização curricular que foram investigados em estudos sobre a formação de professores e educadores ambientais, os quais que resultaram em teses e dissertações no período compreendido entre 1897 e 2009, de acordo com registros no banco de dados da CAPES. Os resultados apresentados pela autora revelaram uma série de características desse conjunto de dados, muitas das quais permaneceram ao longo do tempo, considerando que o levantamento feito para esta tese se refere a um momento posterior ao pesquisado por Rink (2014). A autora faz os seguintes apontamentos: o aumento do número de trabalhos ao longo do tempo, mais visivelmente no início dos anos 2000 (no mesmo período de estabelecimento de marcos históricos e regulatórios que incentivaram a ambientalização na Educação Superior); a predominância de trabalhos realizados em universidades federais do Sudeste e Sul do país, principalmente nos estados de São Paulo e Rio Grande do Sul; a maior abrangência de pesquisas sobre cursos de formação de professores, em especial de Ciências Biológicas e Pedagogia; um maior número de pesquisas voltadas para o diagnóstico curricular dos cursos, sendo eventual a análise sobre disciplinas específicas; a observação de poucos estudos que buscam implementar e avaliar propostas de ambientalização curricular; a maioria dos trabalhos relacionados às tendências conservadora e pragmática de educação ambiental, sendo incipiente a presença da perspectiva crítica; e a concepção tradicional de currículo, de estrutura pouco flexível, na maioria dos documentos. Assim como na presente pesquisa, Rick (2014) também observou a presença do debate sobre a disciplinarização da educação ambiental.

O levantamento realizado por Carvalho e Farias (2011) teve como foco os trabalhos apresentados nas Reuniões da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), nos Encontros da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade (ANPPAS) e nos Encontros de Pesquisa em Educação Ambiental (EPEA) entre 2001 e 2009, o que permite ampliar a reflexão para além dos dados registrados

Cabe observar que os trabalhos de Carvalho e Farias (2011) e de Mota (2017) se referem à educação 33

ambiental e não especificamente à ambientalização, o que não fere a comparação para fins de contribuir com o estado do conhecimento. A carência de trabalhos sobre ambientalização no levantamento de dados realizados em 2015 também foi um fator que me levou a considerar os estudos sobre educação ambiental.

sobre teses e dissertações produzidas no Brasil até 2009. Assim como observado por Rick (2014) com relação às teses e dissertações, as autoras também registraram uma predominância de trabalhos oriundos de instituições públicas de Ensino Superior, assim como apontaram as regiões Sudeste e Sul do Brasil como locais de maior representatividade de pesquisas. Essa constatação é justificada por Carvalho e Farias (2011) pelos regimes de trabalho de Dedicação Exclusiva, com atribuições de pesquisa ao professor, e pela existência de Programas de Pós- Graduação bem consolidados nas universidades públicas.

As autoras sintetizaram os temas que apareceram com maior frequência nos eventos pesquisados, a saber: a discussão teórico-metodológica sobre os fundamentos da educação ambiental na ANPED, a educação ambiental popular e comunitária na ANPPAS e a educação ambiental no ensino formal nos EPEAs. Elas também observaram, ao analisar os eventos conjuntamente, que o tema “EA no ensino formal” foi o mais constante, compondo 225 dos trabalhos analisados. Outra questão investigada na pesquisa foi o perfil dos pesquisadores, o que revelou uma predominância de mulheres com relação aos homens, fato historicamente construído no campo da educação como um todo, o qual se repete no subcampo da educação ambiental.

O trabalho de Mota (2017) analisou as tendências temáticas e metodológicas predominantes em artigos científicos sobre educação ambiental no Brasil a partir do levantamento de publicações registradas na base de dados “Scielo” e apresentadas nas reuniões da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), no Grupo de Trabalho 22, entre os anos de 2009 e 2014. Após a seleção dos artigos e utilizando categorias pré-determinadas, o autor encontrou cinco trabalhos sobre “Pesquisa do tipo Estado da arte”, oito referentes à “EA na formação de professores”, seis sobre “Programas e Políticas Públicas em EA”, oito sobre as “Concepções, percepções e/ou Representações sociais” e seis relacionados à “Inserção da EA na educação, currículo e/ou práticas docentes”. O motivo da exclusão dos demais trabalhos deu-se pelo fato de não se enquadrarem especificamente nas categorias a priori estabelecidas pelo autor.

Com relação às tendências metodológicas, Mota (2017) observou que todos os artigos optaram pela pesquisa qualitativa para a realização dos estudos, destacando-se as pesquisas do tipo bibliográfica e documental, seguidas das pesquisas exploratórias e participantes. Quanto

aos métodos, concluiu que predominava a análise documental, seguida por entrevistas e questionários semiestruturados.

Nos trabalhos resultantes dos dois levantamentos que realizei, organizados nos quadros 4, 5 e 6, apenas um menciona uma combinação de pesquisa qualitativa e quantitativa, sendo todos os demais resultantes de pesquisas qualitativas. Os mesmos métodos observados por Mota (2017) apareceram como estratégias de investigação dos trabalhos que analisei. Grande parte das teses e dissertações não explicitava a tipologia de pesquisa realizada, porém não foi meu objetivo classificá-las. Das que fizeram essa referência de forma direta, cinco optaram pela abordagem etnográfica, quatro por estudos de caso, duas referiram a realização de pesquisa-ação, uma pesquisa de estado da arte e uma por uma pesquisa que chamou de “explicativa”.

Finalmente, as considerações feitas ao longo deste capítulo pretenderam apresentar uma ideia do estado do conhecimento sobre as pesquisas a respeito da ambientalização do currículo no Brasil. Ainda que esta tese tenha como foco a Educação Básica, as investigações sobre as investigações na Educação Superior foram mantidas como referência de estudos que têm sido cada vez mais frequentes. Assim, entendo que é importante investir ainda mais em pesquisas que abordem a ambientalização na Educação Básica, o que pode contribuir com o desenvolvimento de ações que promovam a inclusão da temática ambiental de forma integrada, permanente e crítica, visando a construção de um currículo ambientalizado nas escolas.

4 VIOLÊNCIA, LIXO E CARRAPATO-ESTRELA: OS DESAFIOS DA AMBIENTALIZAÇÃO DO CURRÍCULO NA ESCOLA

A relação homem-natureza é de coautoria, e não de dominação ou submissão. (LATOUR, 2004, p. 48)

Neste capítulo vou apresentar os caminhos iniciais que trilhei a fim de conhecer as possibilidades e os processos de ambientalização do currículo nas escolas visitadas no primeiro período da pesquisa de campo. Os relatos que apresentarei, articulados à emergência – ou não - de preocupações relacionadas às questões ambientais e às unidades de conservação, são resultantes de visitas que realizei em escolas localizadas em Viamão ou em Porto Alegre, próximo ao Refúgio de Vida Silvestre Morro Santana, ao Parque Marechal Mascarenhas de Moraes, à Reserva Biológica do Lami José Lutzenberger e ao Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos, entre fevereiro e outubro de 2015.

Partindo dessas experiências, neste capítulo busco refletir sobre questões relacionadas ao “lixo” , à violência e à presença de uma epidemia como agentes que podem influenciar a 34 ambientalização ou que se constituem como desafios para a ambientalização das escolas visitadas.