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A pesquisa no campo da Educação sempre esteve entremeada pelos desafios éticos, o que é partilhado pelas demais áreas cujos estudos estão relacionados aos seres humanos. Na tentativa de regulamentar a ética na pesquisa, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) elaborou resoluções em 1996 e em 2012 que ainda não contemplavam as necessidades das investigações desenvolvidas nas Ciências Humanas. Ambos os documentos se inscrevem no campo epistêmico da ciência biomédica, voltando-se às necessidades da pesquisa em humanos. No entanto, ao pesquisar com humanos e não em humanos, como pretende uma abordagem etnográfica, por exemplo, diversas dificuldades se apresentam. Nos últimos anos, ações da comunidade acadêmica, ligada à Antropologia há mais tempo e, mais recentemente, à Educação, colocaram em pauta a necessidade do reconhecimento das peculiaridades das Ciências Humanas no que se refere à ética nas pesquisas. Apenas em 2016, o CNS emitiu uma norma que considerava as particularidades da pesquisa em Ciências Humanas, a Resolução Nº 510/2016 (BRASIL, 2016b). No entanto, esclareço que, tendo a presente investigação iniciado em 2014, submeteu-se à legislação anterior à resolução de 2016. Assim, busquei adequar a pesquisa aos termos éticos vigentes no período do estudo.

Inicialmente, ao entrar em contato com escolas de Porto Alegre, as quais participaram do primeiro período da pesquisa, acordei diretamente com os gestores e com os professores, de forma verbal, minhas visitas e conversas com os interlocutores. Desde então, sempre que estabelecia os primeiros contatos nas escolas, nas unidades de conservação e nos encontros com as comunidades, me apresentava como pesquisadora e informava sobre os propósitos e os procedimentos do estudo, alertando para a preservação da identidade dos interlocutores.

Nas escolas de Viamão, foi solicitado que eu obtivesse uma autorização junto à Secretaria Municipal de Educação (SME) para a realização da pesquisa. Assim, elaborei, junto à minha orientadora, uma carta de apresentação e fiz uma visita à referida Secretaria, onde expus os objetivos e a metodologia da pesquisa. A pesquisa foi autorizada pela assessora da SME que me recebeu, sendo entregue (na forma de cópia e apresentação do documento original) às escolas de Viamão. O documento encontra-se como anexo A.

Para o período inicial da pesquisa, além da identidade dos interlocutores, optei por preservar também a das escolas, utilizando nomes fictícios. No caso das escolas, escolhi

nomes de Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANCs), movida pelo tema de uma oficina que participei no Assentamento Filhos de Sepé, em Viamão. Estive na atividade por meio do contato com a comunidade que vive próximo ao Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos, no ano de 2015.

Minha ideia inicial era preservar a identidade de todas as escolas, mas o mesmo não ocorreu em Itapuã. A escola Frei Pacífico destaca-se por seu histórico e sua participação relacionada às questões ambientais e ao Parque Estadual de Itapuã, tendo constituído um referencial para práticas que possam ocorrer no futuro. Sendo assim, explicitei essa possibilidade em reunião de gestores e professores na escola, quando obtive a licença verbalmente para utilizar o nome da instituição. As demais escolas de Itapuã foram identificadas por já estarem citadas na literatura de referência ou nas redes sociais de divulgação das atividades descritas no presente trabalho.

Na segunda etapa da investigação foi solicitada, por parte do PEI, uma autorização formal de pesquisa junto à Secretaria do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMA)que foi obtida e está inserida no anexo C.

Para a realização das entrevistas, foi apresentado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o qual foi assinado pelos colaboradores (anexo B). As informações obtidas junto aos demais interlocutores das escolas, das unidades de conservação e das comunidades foram licenciadas por meio de consentimento verbal. Uma das professoras com quem tive contato preferiu não participar da pesquisa, o que me foi indicado pela da diretora da escola. Dessa forma, não considerei suas falas e participações nas reuniões ou em outros momentos do estudo.

2. POLÍTICAS PARA A NATUREZA: A REGULAÇÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO, DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL E DA SUSTENTABILIDADE NO BRASIL

O objetivo desse capítulo é apresentar, de forma breve, eventos que contribuíram para a constituição das políticas para a natureza no Brasil, no que se refere à regulação das unidades de conservação, da educação ambiental e da sustentabilidade. Nesse caso, falo em políticas “para” a natureza e não “da” natureza, como referido por Latour (2004).

As políticas “para” a natureza são produzidas em um paradigma que Latour (1994) chamou de “Constituição”, ou seja, a partilha moderna que separa natureza e política. Há, nessa constituição, duas câmaras: a da sociedade (ou da política), que representa a totalidade dos humanos falantes e submissos à verdade científica, e a da natureza, constituída pelos não humanos que formam a “mobília do mundo” e não têm voz.

De acordo com o autor, a modernidade se fundou na constituição de uma grande divisão entre ciência e política, na qual somente os cientistas tinham a autoridade para descrever a natureza, enquanto que apenas os políticos ou, no máximo, os cientistas políticos, poderiam fazer o discurso pela política. Consequentemente, outro dualismo que pode ser aqui elencado é a separação entre sociedade e natureza. De fato, sociedade e natureza não são duas zonas ontológicas distintas, o que provoca a necessidade de um contínuo esforço de purificação para a manutenção do princípio constitucional da grande divisão. Sendo assim, o projeto da modernidade nunca se efetivou, então “jamais fomos modernos” (LATOUR, 1994). A proposta que o autor faz, em contrapartida, é de uma “Constituição não moderna”, na qual a democracia seria estendida também aos não humanos, propondo assim dissolver a separação entre natureza e sociedade. No entanto, as políticas que se constituíram no Brasil e no mundo foram regidas pelo paradigma da “Constituição”, o que me permite, neste capítulo, apresentar as políticas elaboradas pelos humanos “para” a natureza, ou seja, formuladas a partir da ideia sustentada pela partilha moderna que separa natureza e política.

O primeiro tópico desse texto trata das políticas públicas elaboradas para as unidades de conservação, para a educação ambiental e para a sustentabilidade no Brasil. Após, são discutidos dois pontos, principalmente relacionados à educação ambiental: o primeiro referente aos ditos de muitas dessas políticas, que convergem na proposição de uma educação

ambiental transversal, obrigatória e para todos, e o segundo pensando sobre o silêncio da educação ambiental no atual Plano Nacional de Educação e na Base Nacional Comum Curricular. Essas reflexões se inserem no contexto da pesquisa desde que pude observar como as proposições das políticas públicas eram materializadas nas escolas que visitei.

2.1. A constituição das políticas públicas para as unidades de conservação, a educação