Problema 2.8‐ Um elétron, partindo do repouso, é acelerado por um
3.1 O Fluxo de Campo Vetorial
Uma forma de entendermos o significado de fluxo é imaginarmos que estamos às margens de uma auto ‐ estrada e realizando a contagem da quantidade de carros que cruzam a via em determinado ponto durante certo tempo. Ao fazer isto estamos calculando o fluxo de carros na estrada naquele ponto. Se associarmos um vetor velocidade a cada carro que ocupam a via teremos vários vetores velocidade espacialmente distribuídos, compondo o que denominamos campo vetorial de velocidades .
Para uma análise quantitativa do fluxo vetorial consideremos o escoamento de um fluido em regime estacionário, representado pela especificação do vetor velocidade em cada ponto (ver Fig.3.1). Na Fig.3.1a colocam‐se um fio retangular de modo que seu plano seja perpendicular ao vetor velocidade, , associado ao fluxo do fluido que
escoa ao longo de um canal. Definindo‐se o fluxo do campo de velocidades de modo que seu valor absoluto seja dado por
| | , (3.1) onde v é a intensidade da velocidade no local em que está posicionado o fio retangular. A unidade do fluxo do fluido é m3/s, que é o mesmo que a vazão do fluido que passa através da área A delimitada pelo fio retangular. Em termos do conceito de campo, podemos considerar o
fluxo como uma medida do número de linhas de campo que
Figura 3.1: (a) Fio retangular em um fluido com área normal ao vetor velocidade. (b) Fio retangular com área formando um ângulo Ф com o vetor velocidade.
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atravessam a área do fio retangular. Se inclinarmos o fio retangular de
forma que o seu plano não seja mais perpendicular à direção do vetor velocidade (ver Fig. 3.1b), o número de linhas do campo de velocidade atravessando a área, A, do retângulo não será mais o mesmo e diminuirá. Para calcular o fluxo do fluido observemos que o número de linhas do campo de velocidade que atravessam a área, A, na forma inclinada é o mesmo número de linhas que atravessam a área projetada, Acosφ, perpendicularmente às linhas de . Assim, a intensidade do fluxo correspondente a situação retratada na Fig. 3.1b é
|Φ| vA cos . (3.2) Se o fio retangular for girado de modo que sua área seja paralela ao vetor velocidade (φ=90°), nenhuma linha de velocidade atravessará a área e o fluxo de velocidades é nulo (| | 0 . Podemos dar uma interpretação vetorial à Eq.(3.2), introduzindo o vetor área, , que emerge perpendicularmente (normal) à superfície de área A do fio retangular:
· . 3.3 Observe que esta definição nos coloca diante da possibilidade de um fluxo de positivo ( 0 90°), bem como um fluxo de negativo ( 0 90°). Assim, no caso de uma superfície aberta deve‐se escolher um sentido para a normal à superfície em questão. No caso de uma superfície fechada, na qual se refere a lei de Gauss, adota‐se o sentido do vetor área, , como sendo o sentido da normal saindo da superfície. Dessa forma, o fluxo associado a um campo vetorial que atravessa a superfície e deixa o volume será um fluxo positivo (fonte de linhas de campo), caso contrário o fluxo será negativo (sumidouro de linhas de campo). Podemos estender a definição acima para uma superfície qualquer considerando que a mesma é formada de um número muito grande de superfícies retangulares de área, , elementares, cujo fluxo de linhas de através da superfície de área ΔA será · . Em seguida somamos e tomamos o limite de | | tendendo a zero,
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lim · . . . , (3.4) onde é o vetor unitário normal à superfície de área elementar dA no ponto considerado. 3.2 – O Fluxo do Campo Elétrico e a Lei de GaussO fluxo do campo elétrico, , é análogo ao fluxo de , resultando em expressão idêntica quando substituímos por em todas as etapas da dedução. A Fig. (3.2) mostra as linhas de campo elétrico não uniforme e o elemento de área . Tomando os devidos limites o fluxo elétrico,
ΦE, será dado por
. (3.4) Esta integral indica que a superfície em questão deve ser dividida em elementos infinitesimais de área , que é atravessado por um campo
elétrico, , e que a quantidade escalar . deve ser calculada para cada elemento e somada, contemplando‐se toda a área da superfície. No caso da lei de Gauss, a superfície considerada é fechada, sendo a Eq.(3.4) modificada para . , onde o círculo na integral sinaliza que a mesma é fechada. Figura 3.2: Linhas de campo atravessando uma superfície S.
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Dissemos acima que o fluxo de através de uma superfície éuma medida do número de linhas de campo que atravessam a mesma, ou que é uma medida da vazão do fluido. Podemos dar uma interpretação análoga para o caso do campo elétrico, dizendo que o fluxo elétrico é uma medida do número de linhas que atravessam uma superfície. Como não existem linhas de campo sem cargas elétricas, podemos dizer que para uma superfície fechada o fluxo elétrico está diretamente ligado à carga elétrica envolvida por esta. Imagine uma superfície fechada, que chamaremos a partir de agora de superfície
gaussiana, contendo uma certa quantidade de carga q (discreta e/ou
contínua). A lei de Gauss afirma que o fluxo elétrico através desta superfície fechada é proporcional à quantidade de carga q envolvida:
, ou
. =q. (3.5) A Eq. (3.5) contabiliza o número de linhas que atravessam a superfície gaussiana ou a quantidade total de cargas internas a esta superfície. Embora a escolha da superfície gaussiana seja arbitrária e não altere o resultado da integral na Eq. (3.5), deve‐se fazer uma escolha que explore a simetria da distribuição de cargas. A lei de Gauss estabelece uma relação entre grandezas (o fluxo elétrico e a carga total q envolvida pela superfície S) que, em princípio, não são definidas para um ponto, pelo menos na forma como está expressa na Eq. (3.5). Assim sendo, não é de se estranhar que a mesma não sirva para calcular o módulo do campo elétrico de uma distribuição qualquer. Na próxima seção vamos mostrar que a lei de Gauss pode ser útil no cálculo do campo elétrico (que é uma grandeza local) de um número relativamente reduzido de distribuições de cargas que geram campos elétricos com determinadas simetrias, desde que se faça uma escolha apropriada da superfície gaussiana.
A lei de Gauss e a lei de Coulomb são formas diferentes de abordar o mesmo problema, e conseqüentemente fornecem a mesma resposta. Então, quando e por que usar uma ou outra lei? O uso de uma ou outra lei é determinado pelas seguintes circunstâncias: (a) se a distribuição de
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cargas apresenta um alta simetria a resposta é obtida mais facilmenteusando a Lei de Gauss, (b) Entretanto se a distribuição de cargas apresenta um baixa grau de simetria a Lei de Coulomb é a mais adequada.
3.3 – Aplicações da Lei de Gauss
(a) Carga Puntiforme e a Lei de Coulomb
Por argumentos de simetria conclui‐se que o campo de uma carga puntiforme tem simetria esférica (campo é o mesmo para qualquer ponto sobre uma esfera de raio r e é perpendicular a superfície da esfera). Assim, ao escolhermos como superfície gaussiana uma esfera de raio r com a carga q em seu centro (Fig.3.3) teremos a possibilidade de obter o campo elétrico da carga Q. Como é paralelo a em qualquer ponto sobre a Gaussiana, o produto escalar destes dois vetores na superfície da esfera gaussiana será sempre · =EdA. Tomando a lei de Gauss temos, · 4 / , ou , (3.6) que é a eq. 2.3, o campo de uma carga puntiforme. Figura 3.3: Carga pontual Q envolvida por uma superfície esférica de raio r.
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Figura 3.4: Linha de carga positiva envolvida por uma superfície gaussiana cilíndrica de raio r e comprimento l.
No cálculo da integral fechada sobre a superfície esférica tiramos o módulo do campo de baixo do símbolo da integral porque o mesmo é constante.
(b) Linha Infinita de Cargas
Considere uma linha infinita de carga com densidade linear, positiva e constante λ, conforme mostrado na Fig.3.4. Deseja‐se calcular o campo elétrico a uma distância perpendicular r da linha de carga. Por considerações de simetria conclui‐se que as linhas de campo são radiais. Ou seja, o campo elétrico, , é perpendicular à linha de carga. A
superfície gaussiana mais apropriada para o cálculo do campo elétrico é uma superfície cilíndrica de raio r, comprimento l, com a linha de carga passando pelo seu eixo. Observe que é constante ao longo de toda a superfície cilíndrica e perpendicular a ela. O fluxo de através desta superfície é
· · · · / .
Como para as superfícies S1, S2 e S3 o campo elétrico e o elemento de área mantém as respectivas relações , , que darão produto interno não‐nulo somente para a integral na superfície S1. Assim, usando q=λl temos,
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Figura 3.5: Superfície gaussiana cilíndrica envolvendo uma parte da carga de um plano infinito de carga uniforme contida na área A. 2 / ou . (3.7) (c) Plano Infinito de Cargas A Fig. 3.5 mostra parte de uma placa fina, não‐condutora e infinita, com densidade superficial de carga σ (carga por unidade de área) constante e positiva. Deseja‐se calcular o campo elétrico em pontos próximos à placa. Devido à simetria retangular da placa o campo é perpendicular a superfície da mesma. A superfície gaussiana adequada é um pequeno cilindro de comprimento 2r e área A, como ilustrado na Fig.3.5. Da simetria, o campo tem a mesma intensidade nas extremidades do cilindro. Assim, da lei de Gauss temos . , ou . Isolando E temos (3.8)
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Figura 3.6: Casca esférica com distribuição uniforme de carga. Ilustração da superfície gaussiana esférica de raio r>R.
(d) Casca Esférica de Carga
A Fig.3.6 mostra uma casca esférica fina de raio R, com uma carga q uniformemente distribuída em sua superfície. A casca está envolvida por uma superfície esférica de raio r. Dos estudos anteriores sabe‐se que o campo tem somente a componente radial. Deseja‐se encontrar o campo elétrico para pontos em que r>R e r<R. Aplicando‐se a lei de Gauss à superfície esférica de raio r>R, obtém‐se
4 ,
ou
(casca esférica, r>R) (3.9) • Uma casca esférica uniformemente carregada comporta‐se
como uma carga pontual para todos os pontos exteriores a ela.
Se considerarmos que a superfície gaussiana tem um raio r <R, ao aplicarmos a lei de Gauss encontraremos
. 0,
pois não há nenhuma carga interna à superfície. Como a carga está distribuída uniformemente sobre a superfície esférica conclui‐se que 0 para qualquer ponto interno à casca esférica de raio R. Resumindo,
0, (casca esférica com σ uniforme e r<R) (3.10) • Uma casca esférica uniformemente carregada não exerce
nenhuma força elétrica em uma partícula carregada localizada em seu interior, em qualquer ponto, pois Er=0.
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Figura 3.7: Comportamento do campo elétrico de uma casca esférica em função do raio.
Figura 3.8: Esfera carregada uniformemente. Superfície gaussiana esférica com (a) raio r>R e (b) r<R.
A Fig.3.7 descreve o comportamento gráfico do campo em função do raio desde r=0 até r infinito.
(e) Distribuição de Carga com Simetria Esférica
A Fig.3.8 mostra uma esfera de raio R uniformemente carregada com densidade volumétrica de carga positiva ρ (coulombs por metros cúbicos) ao longo de todo o seu volume esférico. Pergunta‐se pelo campo elétrico para pontos interiores ou exteriores à esfera. Tomando‐ se uma superfície gaussiana de raio r>R (Fig.3.8a) (análogo ao caso (d)) e usando a lei de Gauss temos,
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Figura 3.9: Comportamento gráfico do campo elétrico da esfera uniformemente carregada da figura 3.8. . ou (esfera de carga q, r>R). Ou seja, a carga distribuída uniformemente por todo o volume da esfera comporta‐se como uma carga pontual localizada no centro da esfera. No caso da Fig.3.8b a superfície gaussiana envolve somente uma carga q’, uma fração da carga total q. Assim, da lei de Gauss temos, ·ou (r<R). Como a densidade de carga ρ é uniforme, podemos escrever q’ em termos de q: , de forma que o campo interno à esfera é
(3.11). Graficamente o módulo do campo elétrico para pontos internos e externos à esfera é dado na Fig.3.9 3.4 – Usando a Lei de Gauss para Discutir o Campo Elétrico em Condutores Pode‐se usar a lei de Gauss para discutir as propriedades de condutores em que circule carga elétrica. Uma das mais interessantes propriedades é a seguinte:
• Uma carga excedente localizada em um condutor isolado
desloca‐se totalmente para a superfície externa do condutor. Nenhuma carga excedente permanece no interior do corpo do condutor.
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O que acontece quando uma quantidade de carga elétrica é armazenadaem qualquer ponto no interior de um condutor isolado? Quando esta carga elétrica (elétrons) é depositada em qualquer ponto do condutor, esta estabelece um campo elétrico no interior do condutor que exerce uma força elétrica entre as cargas, fazendo‐se com que as mesmas se empurrem ao máximo e se redistribuam ao longo da superfície externa. Este processo leva em torno de 10‐9s, levando a um campo interno nulo e ao estabelecimento do equilíbrio eletrostático. Se houvesse algum campo no interior do condutor isolado, haveria uma força elétrica atuando nos elétrons de condução do metal. Um fio transportando uma corrente elétrica não pode ser considerado um condutor isolado, porque este está sob influência de uma ação externa (uma bateria, por exemplo), que estabelece um campo elétrico interno. A lei de Gauss pode ser usada para mostrar que qualquer excesso de carga em um condutor em equilíbrio eletrostático deve estar exclusivamente na sua superfície externa. Para mostrar isso considere a Fig.3.10, onde uma superfície gaussiana é traçada, internamente, bem próxima à superfície do condutor. Se o campo elétrico é nulo em todos os lugares no interior do condutor, este será nulo em todos os pontos da superfície gaussiana, que se encontra totalmente dentro do condutor. Assim sendo, o fluxo total através da superfície gaussiana é nulo. Se o fluxo total é nulo, pela lei de Gauss, conclui‐se que a carga total líquida dentro do condutor é nula.
Deve ficar claro que o campo elétrico nulo no interior de condutor isolado não é devido simplesmente ao fato das cargas estarem na superfície externa, mas também devido à adequada distribuição destas cargas na parte externa deste. Além disso, se o condutor isolado possui uma superfície interna (um buraco, por exemplo), não deve haver carga Figura 3.10: Condutor de forma arbitrária e o seu campo interno.
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Figura 3.11: Campo elétrico imediatamente acima de uma superfície condutora.
na sua superfície interna. Outra característica do campo elétrico na superfície externa de um condutor em equilíbrio eletrostático é que o mesmo é normal a esta superfície. Se existisse uma componente tangencial na superfície externa haveria uma corrente elétrica nesta. Uma vez que o excesso de carga de um condutor isolado permaneça na sua superfície externa deve‐se calcular o campo nas proximidades desta superfície. Para determinar a amplitude do campo próximo à superfície de um condutor usaremos a lei de Gauss aplicada à superfície gaussiana cilíndrica desenhada na Fig. 3.11, cujas superfícies retas são paralelas à superfície do condutor. Parte do cilindro está dentro do condutor e parte fora. Da condição de equilíbrio eletrostático, o campo elétrico é nulo dentro do condutor e perpendicular externamente. O fluxo através do cilindro vem somente da parte externa de sua superfície. Assim,
· ,
Resolvendo para E temos,
, (3.12) Este campo, imediatamente acima da superfície, é normal à superfície do condutor.
Problemas Propostos
Problema 1‐ Uma rede de caçar borboleta está numa região onde existe
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aberta é limitada por um aro de área A, perpendicular ao campo. Calcule o fluxo de E através da rede. Problema 2 ‐ A figura 3.13 mostra parte de dois longos e finos cilindros concêntricos de raios a e b. Os cilindros possuem cargas iguais e opostas, com densidade linear λ. Use a lei de Gauss para mostrar que: (a) E=0 para r<a e (b) que entre os cilindros . Problema 3 ‐ Qual é o fluxo elétrico através de cada uma das superfícies na Fig. 3.14? Dê sua resposta em termos de múltiplos de q/ε0. Figura 3.13: Cilindros concêntricos com cargas iguais e opostas, Figura 3.12: Fluxo elétrico que atravessa uma rede de borboletas.