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CAPÍTULO 3 RESPONSABILIDADE DO ESTADO-JUIZ

3.3 Elemento Objetivo da Responsabilização pelo Exercício da Atividade Jurisdicional

3.3.3 Funcionamento Anormal da Atividade Jurisdicional

O funcionamento anormal de atividade jurisdicional deve ser relacionado ao descumprimento das normas jurisdicionais, pela omissão de seu agente, ou em razão da falta ou má estrutura dos órgãos competentes para seu exercício, que segundo DERGINT (1994, p. 226), consiste na negação do Estado-Juiz em oferecer a devida proteção aos direitos de seus cidadãos, mediante a prestação da tutela jurisdicional.

Podemos assim, dividir os casos de funcionamento anormal da atividade jurisdicional em dois grandes grupos: Anormal funcionamento singular (casos em que o processo é atingido isoladamente, nas hipóteses, por exemplo, da demora excessiva da prolação de uma decisão; em razão da indevida paralisação da demanda, e finalmente, em razão do extravio de atos ou de autos, sendo que em regra, isto se dá em razão da omissão do julgador ou dos servidores da justiça); e o Anormal funcionamento estrutural (que pode ser causado, por exemplo, pela falta de equipamento e excesso de processos). Isto importa-nos, visto que no primeiro podemos encontrar hipóteses de responsabilidade do Juiz e do Estado, e no segundo, será normalmente, exclusiva do Estado.

3.3.3.1 A Tutela Jurisdicional Tardia

É sem dúvida alguma a demora da prestação jurisdicional a grande angústia que aflige os jurisdicionados, em especial os brasileiros. Considerando o Estado detentor, em regime de monopólio, de tal prestação, este deveria agir no sentido de garantir a efetiva tutela dos direitos subjetivos, cumprindo os prazos estabelecidos na legislação; pressupondo uma Justiça célere e acessível, apta a solucionar rapidamente os interesses em conflito.

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O STF tem decidido que, se a lei inconstitucional comprovada causou dano ao particular, a responsabilidade do Estado é cabível (RDA. 189/305 e 191/175).

Constitui o tempo no grande inimigo de quem, não podendo fazer a justiça com as próprias mãos, espera do Estado a solução para um direito violado ou ameaçado de lesão. Em contrapartida, encontram-se os mal intencionados demandados que, cientes da morosidade do processo, utilizam o tempo para postergar o cumprimento das obrigações, desestimulando o exercício do direito de acesso ao Judiciário.

Impossível ignorarmos a lentidão de nossa justiça; mesmo a criação de alguns mecanismos – como os Juizados Especiais – não bastaram para que o entrave findasse. Essa demora excessiva frustra a reparação dos direitos lesados, transformando o Estado-Juiz em um ente desacreditado, alvo de críticas e deboches.

A sociedade sofre como um todo: alguns segmentos, localizados em distantes regiões amargam uma prestação deficiente – e até calamitosa – pela falta de juizes, promotores e demais agentes judiciários76; do outro lado, grandes centros urbanos, onde há relativa proporcionalidade infra-estrutural e recursos humanos, enfrentam graves problemas sociais – como a macrocefalia e o crescimento desenfreado da violência – travando, por excessos de feitos, a máquina judicial. Tanto em um caso quanto em outro, tal situação reflete a lacuna da estrutura econômica e social do Brasil.

Podem ser elencados com fatores responsáveis (ou que contribuem) para esta demora jurisdicional: a) a falta de recursos humanos para normal desempenho da função jurisdicional (como constante ausência de juiz, promotor e pessoal auxiliar); b) complexidade e excesso de formalismo de nossa legislação; c) exaustiva possibilidade de recursos e atos protelatórios perfeitamente evitáveis – levando a eternização das demandas; d) a deficitária e obsoleta infra- estrutura da Justiça, que clama por modernização, principalmente respaldada na informatização cartorária.

De acordo com MASSARENTI (2001, p. 204):

[...] se o Estado-Juiz se defronta com a impossibilidade de cumprir a lei, a solução deveria consistir na sua modificação, adequando-a à realidade. O acúmulo de serviço a cargo dos juízes é séria ameaça para a segurança de uma boa decisão, também contribuindo para a tardia prolação. Aliás, freqüentemente as sentenças prolatadas com atraso são justificadas pela sobrecarga de trabalho, não podendo, em tal hipótese o juiz ou tribunal ser responsabilizados direta ou regressivamente, se comprovada a ausência de dolo ou culpa. Contudo, esta perplexidade caracteriza o funcionamento anormal, decorrendo a responsabilidade do Estado pela omissão em não prover o bom funcionamento da máquina judiciária, havendo falha no serviço público.

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Pode ser citado, como exemplo, os conflitos nas áreas rurais, principalmente referente a disputas de terras, onde o Poder Público é relutante na instauração de Varas Agrárias.

Assim, sendo o judiciário um serviço público, ao apresentar falhas, funcionar mal, não funcionar ou funcionar tardiamente, resultando em danos ao administrado, conduz a responsabilidade na modalidade abarcada pela teoria da falta du service.

Segundo o professor CRETELLA JÚNIOR (1970b, p. 61), em seu Tratado Administrativo de “[...] o serviço público em tese, tem de apresentar-se perfeito, sem a menor falha, para que a coletividade se beneficie no mais alto grau com seu funcionamento. Não pode funcionar mal, deve funcionar de maneira contínua, não se deve atrasar.”

Assegurado o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional77, através do devido processo legal78, observando-se os princípios processuais – aqui, notadamente referente aos prazos artigo 189 CPC – é insofismável a obrigação de prestação a jurisdição com eficiência e rapidez.

E arremata MASSARENTI (2001, p. 206-208):

[...] deriva daí que, se o Estado se omite na prestação jurisdicional, o faz tardiamente ou de forma manifestamente injusta, é integralmente responsável pelos danos causados, se lhe forem imputadas as deficiências, mas ao revés, se o retardo for oriundo de culpa ou dolo do juiz, deve este responder por via regressiva, ou ser acionado direta ou simultaneamente com o Estado [...] Para vencermos a morosidade da justiça, é necessário que o juiz saiba que, o direito das partes é a maior preocupação do verdadeiro juiz. Nesta linha, um dos pontos que o juiz deve lançar mão em seu mister é o “diga-diga”, no transcorrer do processo, procrastinando-o ainda mais.

Neste sentido, o brilhantismo do dizer de BENETI (2000, p. 34): “[...] não mandar ninguém dizer inutilmente. Isso é óbvio; atrasa o desfecho, irrita as partes e advogados, atrai para o juiz a pecha de preguiçoso e acarreta complicações para o procedimento.”

Para sanar esta desastrosa e catastrófica ineficiência, que ao nosso ver, é uma das piores formas de engano ao administrado, visto que em face de estar a demanda sob judice acredita que terá uma solução satisfatória em face seu direito, necessitamos de uma justiça ágil, séria, célere. Não pretende-se um juiz perfeito – pois sabidamente não o é – mas que este dedique com afinco à busca da realização da Justiça.

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Artigo 5, XXXV CF 88 “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”.

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