A atividade de inteligência tem dupla finalidade pois, além de produzir o conheci- mento propriamente dito, deve salvaguardar as informações que a Polícia Civil tenha interesse em preservar.
A atividade de informações tem por finalidade a produção de conhecimentos que habilitem as autoridades, em suas respectivas áreas de atribuição, a tomada de decisões ou a elaboração de planos de maior amplitude.
Nesse contexto, podemos definir doutrina de inteligência (DI) como o conjunto de
princípios, conceitos, normas, métodos, processos e valores destinados a fundamentar, orientar e disciplinar a atividade de inteligência.
Os princípios devem ser entendidos como proposições diretoras gerais, destinadas a orientar o desenvolvimento do corpo da doutrina de inteligência.
O termo conceito busca a uniformização de descrição de objetos, fenômenos e rela- ções fundamentais previstas pela doutrina. Por sua vez, normas são disposições que visam fixar estritamente as relações propostas pela doutrina de inteligência.
Quanto aos métodos, são orientações práticas e racionais consagradas e utilizadas pela doutrina, com o escopo de atingir os objetivos desejados com o menor dispêndio de
meios e tempo, obtendo o melhor resultado. Já o processo é o conjunto de maneiras de realizar o que está preconizado pelo método ou pelas normas.
Finalmente, a expressão valores é empregada com o intuito de indicar condutas cultuadas pela sociedade e, necessariamente, respeitadas pela doutrina.
Basicamente, podemos apontar as seguintes características na doutrina de inte- ligência (DI): a) normativa, porque exprime preceitos orientadores; b) dinâmica, pois tem caráter evolutivo; c) adogmática, já que deriva de fundamentos racionais e realísticos; d) consensual, por ter livre aceitação entre os profissionais de inteligência; e) unitária, já que busca uma uniformização de pensamentos, procedimentos e linguagem.
3.1. Conhecimento
Como processo, o conhecimento é a formação na mente humana de uma imagem, que pode decorrer da observação pessoal, do relato oral e/ou da leitura de documentos. Como produto, é a representação oral ou escrita da imagem fornecida.
Na produção de informações o que se busca é o conhecimento científico que se fundamente na objetividade e na evidência dos fatos de modo sistemático – metódico e ordenado- e verificável de modo a ensejar a comprovação das hipóteses indicadas.
Nesse ponto, termos específicos apresentam interesse:
1) conhecimento informe é o resultante de juízos formulados por um profissional de inteligência e que expressa seu estado de certeza ou de opinião em relação à verdade sobre fato ou situação passada ou presente. Consiste, basicamente, na descrição de fatos que sejam úteis ao usuário, sem uma conclusão;
2) conhecimento informação, mais completo, resulta de raciocínio elaborado pelo profissional de inteligência e expressa o seu estado de certeza em relação à ver- dade sobre fato ou situação passada ou presente. Requer um relato detalhado
e conclusivo do qual, via de regra, constam expressões como “foi”, “é”, “acon-
teceu” etc.;
3) conhecimento apreciação é o resultante de raciocínios elaborados pelo profis- sional de inteligência e expressa o seu estado de opinião em relação à verdade sobre fato ou situação passada ou presente;
4) conhecimento estimativo, resultado de raciocínios elaborados pelo profissional de inteligência que expressa o seu estado de opinião em relação à verdade sobre a evolução futura de um fato ou de uma situação.
Nesse contexto, não seria exagero afirmar que, um plano de inteligência contempla, em seu sumário, algo semelhante a verdadeiro plano de governo.
3.2. Situação de produção
A produção de conhecimentos pode ser conseqüência de estímulo externo, que ocorre quando o órgão de inteligência é acionado por um particular ou outro congênere, ou de
atividade espontânea, que se verifica quando o próprio órgão decide que usuário ou outra
MANUAL OPERACIONAL DO POLICIAL CIVIL
3.3. Metodologia para a produção do conhecimento
Existem determinados procedimentos para que o conhecimento seja produzido que podem ser esquematizados da seguinte forma:
Planejamento > Reunião > Análise e Síntese > Interpretação > Formalização e Difusão
3.3.1. Planejamento
Primeiro é necessário um planejamento onde fique estabelecido o tema a ser abor- dado, partindo do assunto mais amplo para o mais específico, como na hipótese de pro- dução de informação sobre o crime organizado. Neste caso, devemos indagar em qual modalidade delituosa a coleta de informações deve se concentrar e qual o do tempo disponível para produzi-las, buscando sempre resposta às tradicionais perguntas: quem?
como? quando? onde? por quê?
Igualmente relevante selecionar quais as informações de interesse da pessoa a quem se destina o conhecimento, evitando complexidades desnecessárias, procurando utilizar termos técnicos somente quando o destinatário os domine.
Outro aspecto essencial da fase de planejamento é a formulação das informações de forma relevante para o usuário.
Portanto, sinteticamente, temos, como etapas do planejamento do conhecimento: 1. delimitação do tema com seus aspectos essenciais, conhecidos e a conhecer; 2. definição do objetivo, estabelecendo qual o resultado que se pretende com o texto,
aquilo que se busca que o leitor compreenda;
3. seleção de idéias capazes de sustentar o texto, já que podemos utilizar vários recur- sos para fundamentar a exposição como argumentos, exemplos, comparações etc. Exemplo:
Tema: crime organizado
Delimitação do tema: tráfico de entorpecentes no Estado de São Paulo. Objetivo: informar ao Denarc e as Dise’s sobre a incidência desses delitos. Idéias de desenvolvimento: abordagem comparativa com dados de outros Estados,
coleta de subsídios para mapeamento e estatística. 3.3.2. Reunião
Nesta fase busca-se a coleta de material e de dados, que pode ser feita de diversas formas:
1) consulta aos arquivos do órgão de inteligência;
2) pesquisas de dados através de contatos, quando os dados são obtidos através de outra pessoa; estudos e ligações, que ocorrem quando o profissional de inteli- gência busca informações junto a uma congênere, através de pedido de busca (PB) dos conhecimentos constantes de seus arquivos;
3) acionamento do elemento operacional, por intermédio de solicitação a colegas que produzam relatório com as informações requeridas.
Nessa fase, o início das buscas deve dar-se a partir dos meios mais simples para os mais complexos, dando preferência ao uso dos de menores custos para os mais dispendiosos e dos mais seguros para os mais arriscados.
3.3. 3. Análise e síntese
A análise de informações é inerente à atividade policial. A avaliação de dados é o processo a que são submetidos os dados de interesse para o exercício da atividade de inteligência, compreendendo o julgamento da fonte e do conteúdo dos dados obtidos. Nessa fase se procede à estruturação daquilo que foi escolhido como assunto, para sua integração em um conjunto coerente e ordenado. Inicialmente, deve-se examinar os conhecimentos e dados obtidos, decompondo-os em frações significativas e, em seguida, estabelecer a credibilidade das informações por ocasião de sua formalização, através de recursos de linguagem que expressem o estado de certeza ou de opinião do profissional de inteligência.
Assim, devem ser analisados e processados os elementos que se seguem:
a) pertinência, ou seja, o exame dos conhecimentos e dados disponíveis, que devem ser decompostos em frações significativas;
b) credibilidade, que implica no estudo das frações contidas no conhecimento e na aplicação das técnicas de avaliação de dados, com a comparação de frações; c) integração, que consiste no conjunto coerente e ordenado das frações de dados
trabalhadas. 3.3.4. Interpretação
Fase de produção de conhecimento na qual se estabelece o real significado do assunto tratado.
3.3.5. Formalização e difusão
Período onde ocorre a elaboração de um relatório de inteligência e sua remessa ao destinatário.
4. RELATÓRIO DE INVESTIGAÇÃO
A idéia básica na qual se apóia a informação deve expressar-se numa frase simples ou no menor número de palavras possível, a fim de facilitar sua memorização e compreen- são pelo destinatário.
Nesse contexto, o uso de descrições simples e o cuidado em evitar termos excessi- vamente técnicos é essencial. Definições claras ajudam o processo ideativo e a concen- tração nos pontos realmente necessários, evitando mal entendidos.
Quando se elabora um relatório, deve-se ter em conta a possibilidade de eventuais mudanças nas condutas ou ações descritas. Por isso, apontar tendências no desdobra-
MANUAL OPERACIONAL DO POLICIAL CIVIL
mento dos fatos é tão relevante. Por exemplo, em um relato sobre homicídios ocorridos no município de Sorocaba, pode ser importante considerar se a taxa da criminalidade está aumentando ou diminuindo, bem como se tal progressão tende ou não a permanecer.
Normas e procedimentos abaixo arrolados, devem ser observados quando da elabo- ração de um relatório de investigação:
1) confecção dos relatórios pelo agente principal, quando se tratar de equipes; 2) confecção de um relatório a cada ação isolada ou operação, evitando períodos
longos e pormenores excessivos, com ordenação de idéias numa seqüência lógica (início, meio e fim);
3) padronização da linguagem nos relatórios escritos, eliminando termos desgastados e rebuscados como “nominado”, “supracitado”;
4) caso inevitável o uso de expressões técnicas, colocar entre parênteses seu signi- ficado;
5) a circulação do relatório deve restringir-se ao âmbito interno do órgão de infor- mações, já que não é documento hábil para a difusão;
6) rascunhos sobre operações ou ações realizadas não devem ser mantidos, evitan- do-se a criação de arquivos paralelos. Os relatórios do agente, acompanhados de seus rascunhos e anotações, após transformados em informes, serão destruí- dos. Somente os relatórios relativos às operações em andamento permanecerão arquivados até seu encerramento;
7) o profissional de informações deve sempre rever o que foi escrito antes de dar por terminada a redação;
8) o relatório deve ser útil e primar pela objetividade, clareza, precisão, oportunida- de, simplicidade, imparcialidade e segurança, não colocando em risco o agente ou órgão a que pertence.
4.1.Relatório de missão
O relatório de missão precede o relatório de inteligência e é confeccionado por agentes, após uma missão, para o encarregado de caso. Pode ser apresentado por escrito ou oralmente e de forma individual ou coletiva. Pode ser periódico ou final. O relatório periódico é aquele apresentado em espaços de tempo pré-determinados pelo encarregado de caso e, o final, somente quando a operação está encerrada.
O relatório padrão divide-se em 4 (quatro) partes:
1) cabeçalho, que inicia o relatório e é composto de data, assunto, referência e menção a eventuais anexos;
2) parte operacional, onde são indicadas:
a) circunstâncias que cercaram a obtenção dos resultados e técnicas utilizadas para a obtenção dos dados v.g., vigilância, infiltração etc.;
b) nome do agente que obteve os dados e o grau de confiabilidade da fonte que os forneceu, mesmo sem identificá-la;
c) ocorrência de eventuais fatores adversos, que não poderiam ser previstos e dificultaram ou interromperam a operação, v.g., colisão de veículos.
3) parte informativa, onde os fatos são elencados de forma simples, sem inferências e em ordem cronológica procurando responder todas aquelas clássicas indaga- ções: quem? como? quando? onde? por quê?
4) comentários, espaço destinado a registrar tudo o que possa auxiliar no planeja- mento e na execução de futuras operações e, quando cabível, considerações e opiniões do agente em relação à situação e aos fatos.
MODELO
RELATÓRIO Nº ... / 2002 DATA: ... (data da confecção de relatório)
ASSUNTO: ... (geralmente é tratado em código, v.g. “Operação Tigre”) REFERÊNCIA: ... (exemplo: Plano de Operações nº .../Ordem de Busca nº ...) ANEXOS: ... (indicar fotos, croqui, escritos, panfletos anexados, etc. identifican-
do-os com letra ou número. Exemplo: Anexo A, foto de...,
Anexo B, croqui do local).
... ... ... ... ... ... ...