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Qualquer investigação concretiza-se a partir de uma matriz concetual, de um paradigma que define as características do objeto de investigação, do tipo de problemas a colocar e a resolver, da própria essência dos processos de investigação, das estratégias e das técnicas e instrumentos que se consideram mais adequados à concretização da investigação (Pérez Gómez, 2002). Nesta linha de pensamento, recordamos Pérez Serrano (1994) para quem “es evidente que el paradigma que se adopte condiciona los procedimentos de estúdio que rijan la investigación, pues cada paradigma mantiene una concepción diferente de lo que es: como investigar, quê investigar y para que sirve la investigación” (p. 13). E socorremo-nos novamente de Pérez Gómez (2002) que reconhece que a analogia estabelecida entre o modelo metodológico adotado e a concetualização do objeto de estudo é visivelmente dialética, exigindo:

Por una parte, el concepto, siempre provisional, que se tiene de la realidad estudiada determina la elección de los procedimientos de investigación. Por otra, la utilización de unas estrategias metodológicas conduce a un tipo de conocimiento de la realidad estudiada, y a medida que lo incrementamos, vamos exigiendo y depurando los procedimientos de investigación y, como consecuencia, incrementando y depurando también el conocimiento de la realidad (p. 116).

Uma investigação é um processo de procura, de averiguação e questionamento com o qual se procura fazer avançar o conhecimento através da aplicação de um pensamento racional (Pérez Serrano, 2004). E, não é em vão que qualquer investigação se inicia sempre com a curiosidade que todo o ser humano sente ao perguntar-se o porquê das coisas e isto implica uma ânsia de saber e de descobrir que se constitui como um ponto de partida fundamental em qualquer trabalho de pesquisa. Silverman e Marvasti (2008) referem que a curiosidade e a vontade em conhecer mais sobre um determinado assunto são as principais razões na seleção de um tópico de estudo. Assim, e como nos identificamos integralmente

com esta perspetiva, foi a partir de uma vontade em conhecer melhor o assunto sobre o qual este trabalho investigativo se baseia, que partimos para esta pesquisa.

Face aos objetivos que definimos, e aqui recordamos, de novo, Pérez Serrano (2004) que considera que é o objetivo da investigação que determina o paradigma a adotar, a opção recaiu numa metodologia de natureza qualitativa.

A metodologia qualitativa é, segundo vários autores, nomeadamente Lessard- Hérbert, Goyette e Boutin (1994), a adequada para a compreensão dos problemas do ensino e porque, de acordo com Bogdan e Biklen (1994), uma investigação qualitativa caracteriza-se por contemplar “uma metodologia de investigação que enfatiza a descrição, a indução, a teoria fundamentada e o estudo das percepções pessoais” (p. 11), por descobrir o sentido e o significado das ações sociais (Sierra Bravo, 1995). E, também, por consistir em descrições detalhadas de situações, acontecimentos, pessoas, interações que são observáveis, incorporando o que os indivíduos dizem, as suas experiências, atitudes, crenças, reflexões, tal como são expressos por eles mesmos (Pérez Serrano, 1994). Ainda segundo esta autora, o paradigma qualitativo surge assim como um estilo de investigação mais próximo da vida dos sujeitos. Investigar de maneira qualitativa significa atuar com símbolos linguísticos com o objetivo de reduzir a distância entre a teoria estabelecida e os dados recolhidos, entre o contexto e a ação. Ou seja, e ainda de acordo com Pérez Serrano (ibid.), o objetivo da investigação qualitativa é o desenvolvimento de conceitos que ajudem a compreender os fenómenos sociais em meios naturais, atribuindo a importância necessária às intenções, experiências e opiniões dos participantes. Acrescentamos que, tal como defende Pérez Goméz (2002), o problema da investigação em educação reside na singularidade do objeto de conhecimento (os fenómenos educativos) com características subjetivas e complexas que requerem uma metodologia de investigação que respeite essas mesmas particularidades.

Salientamos, ainda, a opinião de Flick (2009b) para quem a pesquisa qualitativa “is oriented towards analyzing concrete cases in their temporal and local particularity and starting from people’s expressions and activities in their local contexts” (p.21). Neste sentido apontam, igualmente, Latorre, Del Rincón e Arnal (1996) quando referem que a pesquisa qualitativa “se interesa por el estudio de los significados e intenciones de las acciones humanas desde la perspectiva de los próprios agentes sociales. Se sirve de las

palabras, de las acciones y de los documentos orales y escritos para estudiar las situaciones tal como son construidas por los participantes” (p. 199).

Para Jovanovic (2011), a pesquisa qualitativa é “much more than just methods, procedures and techniques. It is in fact an entire world view. Qualitative research thus may entail an understanding of human beings and the world that is fundamentally different from quantitative research” (p. 20). Ou, como defendem Brinkmann, Jacobsen e Kristiansen (2014) “qualitative research does not represent a monolithic, agreed-upon approach to research but is a vibrant and contested field with many contradictions and different perspectives” (p. 17).

Também Denzin e Lincoln (1994) indicam uma possível definição de investigação qualitativa, considerando-a, no entanto, como muito genérica:

qualitative research is multimethod in focus, involving an interpretative, naturalistic approach to its subject matter. This means that qualitative researchers study things in their natural settings, attempting to make sense of, or interpret, phenomena in terms of the meaning people bring to them. (p. 2)

Nesta linha de pensamento, a nossa preferência pela abordagem qualitativa esteve relacionada, também, com as características expostas por vários autores como identificativas deste tipo de estudos e que julgamos poderem aplicar-se à investigação que se pretendia desenvolver: (i) na investigação qualitativa a fonte direta de dados é o ambiente natural (Yin, 1994), sendo que o investigador é o instrumento principal de recolha de dados. A este propósito, lembremos o que dizem Sacristán e Gómez (1985): “el investigador se utiliza a sí mesmo con sus capacidades de análisis, crítica y empatía como instrumento de investigación, es decir, de observación, asociación e interpretación” (p. 92). No mesmo sentido, aponta Mucchielli (2007) quando afirma que “dès le recueil des données, le chercheur est en première ligne. Ce recueil dépend de lui. Ses qualités d’enquêteur et d’observateur sont mises à l’épreuve […] en recherche qualitative, l’instrument premier de la recherche est le chercheur” (p. 25). Com efeito, os dados recolhidos em ambiente natural (no agrupamento de escolas em questão) constituíram-se como fundamentais para esta investigação, pois a recolha direta de informação pode contribuir para que as ações e palavras sejam melhor compreendidas quando confrontadas com as visões e perspetivas dos seus atores; (ii) a investigação qualitativa é descritiva e só secundariamente os dados são analisados. Para a compreensão do seu significado os dados deverão ser recolhidos na forma de palavras, dando origem a uma investigação com

resultados escritos. Contendo citações recolhidas para ilustrar a construção de uma visão sobre a problemática investigada, emerge, deste modo, uma apresentação dos resultados rica em pormenores descritivos, constituindo-se este ponto como fundamental na ótica de Merriam (2009) para quem o produto de uma investigação qualitativa “is richly descriptive” (p. 14). Neste sentido aponta também Bell (2008) quando menciona que “os investigadores que adoptam uma perspectiva qualitativa estão mais interessados em compreender as percepções individuais do mundo. Procuram compreensão em vez de análise estatística” (p. 20); (iii) os investigadores qualitativos interessam-se sobretudo por todo o processo, ou seja, pelo que aconteceu e como aconteceu e não unicamente pelos resultados ou produtos conseguidos (Bogdan & Biklen, 1994; Merriam, 2009); (iv) os investigadores qualitativos analisam os seus dados de forma indutiva (Merriam, 2009), como se “reunissem, em conjunto, todas as partes de um puzzle” (Tuckman, 1994, p. 508), tentando, deste modo, construir um quadro, cuja compreensão seja de fácil perceção para todos. Segundo Latorre, Del Rincón e Arnal (1996) o foco da investigação qualitativa é indutivo porque as categorias, padrões e interpretações constroem-se a partir da informação obtida e não a partir de teorias ou hipóteses previamente estabelecidas. Aliás, estes autores consideram o processo de investigação como algo de interativo, progressivo e flexível; (v) o significado das coisas é de importância vital, ou seja, importa, sobretudo, o que os indivíduos pensam e sentem, devendo os investigadores fazer questão de se certificarem de que estão “a apreender as diferentes perspectivas adequadamente” (Bogdan & Biklen, 1994, p. 51).

Moreira (2007) considera que uma abordagem qualitativa “parte, precisamente, do pressuposto básico de que o mundo social é um mundo construído com significados e símbolos, o que implica a procura dessa construção e dos seus significados” (p. 49). E, como forma de completar esta ideia, este autor enumera alguns objetivos dos métodos qualitativos, que passamos a transcrever:

(i) entrar dentro51 do processo de construção social, reconstruindo os conceitos e ações da situação estudada;

(ii) descrever e compreender em detalhe os meios através dos quais os sujeitos empreendem ações significativas e criam um mundo seu;

(iii) conhecer como se cria a estrutura básica da experiência, o seu significado, manutenção e participação através da linguagem e de outras representações simbólicas;

(iv) recorrer a descrições em profundidade, reduzindo a análise a âmbitos limitados de experiência, através da imersão nos contextos em que ocorre;

(v) deixar para segundo plano (ou mesmo completamente de lado) as pesquisas comparativas estandardizadas, os experimentos, dada a necessidade sentida pelo investigador de se tornar particularmente sensível ao facto de que ‘o sentido nunca pode dar-se por adquirido’ e que ‘está ligado essencialmente a um contexto’.

Reforçando esta linha de pensamento, salientamos a opinião de Coutinho (2006): inspirados no paradigma interpretativo da investigação educativa, os estudos qualitativos abrangem todas as situações em que as preocupações do investigador se orientam para a busca de significados pessoais, para o estudo das interacções entre as pessoas e contextos, assim como formas de pensar, atitudes e percepções (p. 5).

Parece, pois, ser consensual que a subjetividade do objeto de estudo das ciências sociais, tal como já anteriormente referimos, e muito em particular da educação, requer uma metodologia que respeite essa sua natureza subjetiva, criativa e muito peculiar (Riehl, 2001; Pérez Gómez, 2002; Brage, 2004, Coutinho, 2014). Esta metodologia implica, por tudo o que já referimos, um trabalho de campo em que o investigador surge comprometido e participante, pois tal como refere Mucchielli (1991) “on commence à concevoir que l’extériorité objective et totalement neutre est difficile sinon impossible” (p. 12), acrescentando que:

toute «explication» d’un phénomène social peut être entachée de nombreux «biais» venant de l’observateur et de l’analyste, On admet qu’il vaut mieux «comprendre», en acceptant de rentrer dans la logique propre des acteurs sociaux, en prise avec le phénomène à étudier (ibid.).

No que concerne ao design de investigação, recordemos o que nos dizem Sacristán e Gómez (1985):

la observación participativa, el estúdio de casos, la investigación en la acción, son estratégias metodológicas consecuentes com los presupuestos de la investigación cualitativa. Se apoyan en la presencia prolongada del investigador en el contexto de investigación como procedimiento metodológico más apropriado para captar e interpretar el flujo de significados e interacciones que se generan, intercambian y negocian en la vida compleja y fluida del aula (p. 92).

Numa investigação de cariz qualitativo podemos, então, recorrer a inúmeras técnicas de recolha de dados (Yin, 1993; Denzin & Lincoln,1994; Latorre et al., 1996; Wolcott, 2001; Riehl, 2001; Cohen, Manion & Morrison, 2007; Silverman & Marvasti, 2008; Fick, 2009a), pois tal como referem Silverman e Marvasti (2008) “research methods should be

chosen based on specific task at hand” (p. 23), devendo o investigador assegurar-se que as informações recolhidas ao longo do estudo são as mais pertinentes e necessárias, pois as conclusões serão mais convincentes já que advêm de um conjunto de corroborações. Além disso, os potenciais problemas de validade de construto poderão estar salvaguardados uma vez que as descobertas, nestas condições, são validadas através de várias fontes de evidência.

Guba (1985) apresenta-nos um modo segundo o qual os investigadores qualitativos, que ele apelida de “naturalistas”52 tentam ultrapassar as questões de credibilidade e validade que inúmeras vezes se lhe colocam quer no decurso da investigação quer no seu término. Para o autor (cf. Quadro 4.1.1) a investigação pode ser afetada por vários fatores (indicados na primeira coluna), que produzem determinados efeitos (apresentados na segunda coluna), cabendo ao investigador encontrar as melhores soluções com o objetivo de atingir resultados credíveis, aceitáveis, relevantes, estáveis e independentes do investigador.

Quadro 4.1.1 – Modo naturalista de credibilidade

MODO NATURALISTA DE CREDIBILIDADE

A INVESTIGAÇÃO PODE SER AFETADA POR: QUE PRODUZEM OS EFEITOS DE:

PARA ULTRAPASSAR ESTES

PROBLEMAS OS INVESTIGADORES: COM A ESPERANÇA DE

CONSEGUIR: E PRODUZIR CONHECIMENTOS QUE SEJAM: DURANTE DEPOIS fatores que ocultam e interatuam dificuldades de interpretação trabalham durante um período de tempo prolongado utilizam a triangulação recolhem material de adequação referencial fazem comprovações entre os participantes estabelecem a corroboração estrutural estabelecem a adequação referencial provocam a comprovação dos participantes credibilidade aceitáveis não repetibilidade dificuldades de recolhem minuciosos dados desenvolvem descrições não repetibilidade da situação dificuldades de comparação

52 Salientamos que o termo ‘naturalistas’ é inúmeras vezes utilizado no âmbito dos estudos qualitativos dado os problemas serem estudados no ambiente em que ocorrem naturalmente, sem qualquer manipulação intencional do investigador (Bogdan & Biklen, 1994).

da situação comparação descritivos fazem amostragem teórica minuciosas mudanças de instrumentos instabilidade utilizam métodos que se complementam elaboram pistas de revisão verificam as

pistas de revisão dependência estáveis

preferências do investigador prejuízos utilizam a triangulação praticam a reflexão epistemológica. constatama confirmabilidade confirmabilidade independentes do investigador Adaptado de Guba (1985, p. 156)

Tendo como fundamento todos os fatores que acabámos de referir, e atendendo a que “o estudo de caso consiste na observação detalhada de um contexto ou indivíduo” (Bogdan & Biklen, 1994, p. 89) considerámos que este seria a melhor estratégia de pesquisa a seguir nesta investigação. Além disso, levámos em conta que o estudo de caso, tal como refere Morgado (2012) “apresenta maleabilidade suficiente para se assumir como uma mais-valia no campo da investigação em educação” (p. 79), a par do facto de quando o que nos interessa é a particularização e não a generalização de resultados, situamo-nos no estudo de caso dado que nos oferece uma perspetiva contextualizada (Munõz Serván & Munõz Serván, 2004). Salientamos, ainda, a ideia de Amado e Freire (2014):

Nos estudos de caso de investigação, a intenção do investigador vai para além do conhecimento desse valor intrínseco do caso, visando concetualizar, comparar, construir hipóteses ou mesmo teorizar; contudo, o ponto de partida desses processos é a compreensão das particularidades do caso ou dos casos em estudo (p. 124).