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Inovar com as tecnologias de informação e comunicação

Julgamos que não será exagero afirmar que a chegada das tecnologias de informação e comunicação (TIC) à escola constituiu-se como uma das principais, janelas de oportunidade à inovação, nas últimas décadas.

Falar de inovação é, sem dúvida, falar de mudança, mas nem toda a mudança é inovação, pois para que esta aconteça é necessário um elemento voluntário, deliberado e intencional. E, se esse elemento se encontra presente em inúmeras situações, outras, e são em grande número, encontram-se completamente arredadas daquilo que consideramos inovação, pois trata-se de algo antigo, mas restaurado para parecer novo.

Nas últimas décadas, são várias as mudanças que se têm verificado na escola, na sua esmagadora maioria resultantes de reformas ‘decretadas’, ou seja, emanadas, top-down, pela tutela da educação. Algumas dessas mudanças estão, de alguma forma, ligadas às tecnologias digitais, mas serão, por isso, inovações? E será que levar as tecnologias para a sala de aula, e utilizá-las no ensino e na aprendizagem, é per se inovar? Santos e Gaspar (2012) dão-nos a resposta:

Apesar da vulgaridade com que nos discursos académicos e nos debates escolares se afirma que a utilização das novas tecnologias em sala de aula contribui para a inovação da prática educativa, a realidade demonstra a clara inexpressividade que esta afirmação tem nas práticas educativas reais das nossas escolas (p. 1858);

Já em 1999, num artigo escrito para a OCDE, Cros referia que “introduire l’internet dans une classe ne garantit pas nécessairement la présence d’une innovation. On peut se

servir d’outils modernes pour une pédagogie extrêmement traditionnelles. Le nouveau ne peut, à lui seul, suffire pour qualifier l’innovation” (p. 73).

Neste mesmo sentido, salientamos a afirmação proferida num outro estudo da OCDE (2017) sobre a inovação em ambientes de aprendizagem que enfatiza que o mero uso e presença das tecnologias em sala de aula pode limitar-se a trazer mais do mesmo, ou seja novas roupagens debaixo de um mesmo chapéu:

the mere presence of technology is not by it self sufficient to innovate learning environments. Nor should innovation be assumed to be synonymous with going digital, as this may only be reproducing traditional methods and pedagogies with a different format (p. 46).

Também Pedró (2018) defende algo muito semelhante:

La tecnologia, en sí, no es más que una ventana de oportunidad para la innovación. Es evidente que los usos innovadores de la tecnología en el aula no conducen siempre necesariamente al desarrollo de metodologías innovadoras, dado que posibilitan igualmente la consolidación del modelo pedagógico tradicional (p. 84).

E, esta é uma problemática que continua muito atual, pois ainda constatamos que inúmeras vezes as tecnologias, ao invés de trazerem consigo diferentes metodologias de ensino e aprendizagem centradas na participação ativa do aluno e na aprendizagem colaborativa, limitam-se a servir formas tradicionais de exposição, com o professor no centro de todo o processo de ensino e aprendizagem, não contribuindo para que algo de diferente e inovador aconteça nas salas de aula.

A presença, e a relevância das novas tecnologias, parece, então, ser um facto indiscutível na atual, e futura, sociedade, pois julgamos que nenhum setor social, incluindo a escola, pode esquivar-se à incorporação das mesmas de forma a aproveitar as vantagens intrínsecas que daí poderão advir.

Sebarroja (2001) considera que a integração, e o domínio, das tecnologias de informação e comunicação devem impor uma relação diferente entre alunos e docentes, mais interativa de modo a poderem compartilhar de uma forma mais eficiente e duradoura o acesso, a seleção e a crítica do conhecimento. Este autor refere mesmo que “na função docente, a mera transmissão torna-se cada vez mais caduca e requer-se mais orientação e acompanhamento do que nunca para optimizar as possibilidades que oferecem de motivação, descobrimento e criatividade” (p. 62). Contudo, e ainda segundo o mesmo autor, não se julgue que a figura do professor poderá perder poder, ou desaparecer, pois ele

será cada vez mais necessário “não apenas para fazer um uso inovador, criativo e inteligente das novas tecnologias, mas principalmente para trabalhar os valores e as condutas morais que estão subjacentes na informação e no conhecimento” (p. 63).

Parecem não restar dúvidas que as tecnologias podem constituir-se como uma inovação na educação através do reconhecimento de uma inversão radical no papel do estudante, que passa de objeto para sujeito da sua aprendizagem, passando de reprodutor a autor, e no papel do professor, que vai mais além das quatro paredes da sua sala de aula, podendo criar comunidades de aprendizagem e a partilha de conhecimentos e práticas. E esta mudança pode fazer imensa diferença se for acompanhada de uma contextualização e atualização de conteúdos e programas, podendo, igualmente, ajudar na desburocratização do ensino e nas relações interpessoais. Ou seja, a tecnologia poderá ser inovadora na educação se permitir e ajudar na transformação das dimensões de espaço/tempo e nos relacionamentos humanos na comunidade educativa, se conseguir favorecer a criatividade, o pensamento crítico, as aprendizagens significativas e, desta forma, ajudar a construir cidadãos mais participativos, críticos e reflexivos. Tal como refere Jonassen (2007), “as formas como utilizamos as tecnologias na escola devem sofrer uma alteração, ou seja, o papel tradicional da tecnologia como professor deve dar lugar à tecnologia como parceira no processo educativo” (p. 20). Neste mesmo sentido, salientamos o que menciona Fullan (2011), para quem as tecnologias em sala de aula nunca poderão trazer nada de novo, ou mesmo de produtivo para a aprendizagem dos alunos, se a pedagogia não estiver presente e não for considerada como fundamental em todo esse processo:

The good news (mostly) is that the further development of technology has a life of its own. It will get more and more powerful, cheaper and more available. In the latest work, learning and instruction become the driving forces, so that we will ride the technology wave instead of being at the mercy of a powerful but intrinsically aimless phenomenon. (p.16)

Bento e Lencastre (2014) consideram que “quando analisamos a sociedade em que vivemos, vemos que esta se insere num novo paradigma, sendo cada vez mais tecnológica” (p. 1043). E daí a necessidade de a escola ter que “adaptar-se às novas realidades e aos novos contextos educativos […] alterar hábitos, métodos e pedagogias, porque a inovação já é a nova tradição” (Id., ibid.). Ou seja, as TIC podem “instituir uma escola que já não é a escola tradicional, mas uma escola que se aproxima do mundo, não por o replicar, mas porque tem incorporado o gene informático que marca o código genético do nosso tempo” (Santos, 2018, p. 67).

Consideramos, então, que se impõem algumas questões sobre como estamos a inovar no que respeita a quatro variáveis fundamentais: (i) professores/educadores; (ii) recursos; (iii) conteúdos e (iv) alunos. Na figura 3.4.1, podemos observar algumas das perguntas colocadas pela OCDE num estudo que já mencionamos. Julgamos que as respostas poderão ser reveladoras quanto ao estádio em que se encontra o trabalho com as tecnologias nas nossas escolas.

Adaptado de OCDE (2017, p. 54)

Figura 3.4.1 – Questões sobre como inovar elementos pedagógicos centrais