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Falar de inovação remete-nos invariavelmente para um terreno de imprecisões, pois o seu carácter polissémico impede-nos uma definição unívoca, precisa e facilmente aceite por todos. É, sem dúvida, um tema complexo e as múltiplas interpretações, conforme o contexto, a época e a situação em que nos situamos são, disso, reveladoras.

Fazendo uma abordagem ao conceito de inovação, Cros (1996) constata que a temporalidade e a historicidade constituem-se como dois elementos fundamentais no conceito de inovação, já que esta não é reprodutível nem repetível stricto sensu, ou seja, a inovação é sempre singular e só adquire sentido em contexto e na vontade individual e coletiva dos implicados. Sendo uma praxis o seu significado será diferente consoante a época, os intervenientes e o contexto a que essa inovação se encontra associada e é colocada em prática.

O termo inovação pode, então, ser considerado um vocábulo com muitas faces, um autêntico poliedro. Cros (1999a) refere que a noção de inovação é voluntariamente polissémica pois faz parte da linguagem comum e a palavra em si é difícil de definir. Aliás, para alguns autores (Cros, 1999b; OCDE, 2009; Pedró, 2018), não se trata de uma falta de definições, mas sim de uma definição que reúna consenso, pois parece que nenhuma seja, por si só, satisfatória e adequada.

No entanto, e como constataremos de seguida, todos esses diferentes sentidos contêm algo em comum, um determinado significado que os une e que acabam por justificar que lhes seja aplicada a mesma palavra.

Fazendo uma breve incursão por alguns dicionários, verificamos que todas as definições encontradas nos remetem para “algo de novo, introdução de novidade; renovação41”. No Dicionário da Porto Editora42encontramos três significados possíveis: i)

ato ou efeito de inovar; ii) introdução de qualquer novidade na gestão ou no modo de fazer algo; mudança; renovação e iii) criação de algo de novo; descoberta.

No campo educativo, este vocábulo tem sido utilizado, atrevemo-nos a dizer, até à exaustão, sempre que algo de diferente, novo ou reconfigurado é introduzido no quotidiano das escolas. Cros (1999a) defende que, apesar de tudo o que foi dito e escrito sobre inovação, este assunto continua a ser uma questão delicada e complexa de tratar, o que ademais a torna ainda mais cativante, pois consegue reunir à sua volta quase todas as grandes questões que se colocam no domínio da educação.

Nogaro e Battestin (2016) referem que vários textos “apresentam a palavra ‘inovação’ quando desejam adjetivar práticas ou processos educacionais com roupagens ou até conteúdos que se oponham a posições conservadoras” (pp. 358-359).

Cardoso (1997) considera que este termo, tantas vezes utilizado, nem sempre é usado na sua aceção mais correta, pois é reiteradamente empregue como sinónimo de renovação, de mudança ou de reforma, apesar de se tratar de realidades diversas. Contudo, esta autora refere que inovação não poderá ser sinónimo de uma mudança qualquer, pois deverá ter sempre um carácter intencional e conscientemente assumido, devendo ter como objetivo primordial uma melhoria da ação educativa. Inovação também não pode ser encarada como uma simples renovação, pois traz sempre consigo uma rutura com a situação que se encontra em vigor. Inovar traz, então, à realidade educativa algo realmente novo, ao contrário de renovar que implica fazer aparecer algo sob um aspeto novo, não modificando aquilo que é essencial. Cros (1999b) considera que reforma e inovação se referem a mudança. Contudo, a distinção entre as duas encontra-se no movimento que origina essa mudança:

La réforme est un changement voulu par les autorités hiérarchiques, par les décideurs centraux. La réforme se manifeste par des lois et des décrets. Elle apporte des éléments nouveaux mais elle les impose à ceux qui doivent les mettre en œuvre. La réforme est un changement voulu par ceux qui détiennent les règles, et l'innovation est un changement par ceux qui n'ont pas la maîtrise des règles (p. 130).

Nesta linha de ideias, recordamos Messina (2001) para quem inovação e mudança não se constituem como categorias equivalentes, não só porque inovação surge como um tipo de mudança intencional e sistemática, ultrapassando largamente o conceito de reforma

42 In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2014. Disponível em http://www.infopedia.pt/pesquisa.jsp?qsFiltro=0&qsExpr=inova%C3%A7%C3%A3o>.

que surge como algo de exterior à escola, instituída e não assimilada. Também segundo Cros (1993) “une innovation n’est ni une réforme, ni une rénovation. Réforme et rénovation correspondent plus au modernisme qu’à la nouveauté” (p. 34). E, acrescentamos, no mesmo sentido, a opinião de Oliveira e Courela (2013) que consideram que “no campo da inovação em educação é habitual considerar três termos - inovação, mudança e reforma - que, embora surjam interligados, definem realidades diversas” (p. 99). Também Foray e Raffo (2012) apontam neste sentido quando referem que em educação as mudanças são, normalmente, propostas vindas de fora das escolas e depois disseminadas pelos reformadores para o seu interior, não se constituindo, estas mudanças, como inovação, mas sim como reformas.

Considerada pelo próprio autor como uma significação prática porquanto engloba um grande conjunto de sentidos, a definição: “une innovation est une amélioration mesurable délibérée, durable et peu susceptible de se produire fréquemment” (Huberman, 1973, p. 7) serviu de inspiração a muitas das aceções de inovação que se encontram no estado da arte. Huberman (ibid.), contudo, desvincula inovação de mudança propriamente dita quando a caracteriza como mais deliberada, voluntária e mais planificada que espontânea, acabando por circunscrever o papel da inovação a uma operação cujo objetivo é fazer instalar, aceitar e utilizar uma mudança. Uma inovação deve ter uma duração no tempo, ser largamente utilizada e não perder as suas características iniciais.

Cros (1996) refere que a inovação resulta de uma intenção deliberada e coloca em prática uma ou mais ações que visam mudar ou modificar algo (um estado, uma situação, uma prática, métodos, um funcionamento), a partir de um diagnóstico que deteta uma insuficiência, uma inadaptação ou insatisfação relativamente aos objetivos a atingir ou aos resultados alcançados. Van der Maren (2004) considera que a inovação é uma ação sobre si mesmo ou sobre o seu próprio meio e acrescenta que

en tant que rupture, création, changement radical par rapport à des routines ou à des pratiques jugées traditionnelles, conservatrices et étouffantes, elle permet à son acteur et à ses collaborateurs de se réaliser dans un nouveau développement, au-delà d’une situation qui les bloquait (p. 67).

Já Adamczewski (1996) ao analisar as inúmeras definições da palavra inovação conclui que desde 1830 esta surge descrita como a introdução de uma novidade, com mais ou menos variações e aplicações em campos muito diversos. Relevante é o facto de a inovação ser entendida sempre como uma ação, transportando-nos ao seu resultado, ao seu

produto. A inovação surge como um processo e não como uma simples ação ou o resultado de uma simples ação, assenta no conflito e avança porque alguns atores encontram vantagens na sua difusão e opõem-se a outros. A inovação vive de incertezas e de espaços de jogo (Cros, 1997). Espaços estes onde se desenrola aquilo que podemos considerar como um certo confronto e se defrontam os atores defensores da sua concretização e aqueles para quem a inovação surge como algo de perturbador e fonte de inquietações.

Cros (1993) defende também que a inovação, encarada como mito de renovação, teria o poder de abertura, de curiosidade, de imaginação, de criatividade, de descoberta. Para esta autora, a inovação preencheria as funções associadas ao progresso como um bem da humanidade. Assim,

Innover serait faire mieux, toujours mieux, de manière outre, offrir du neuf, du jamais vu, quelque chose qui serai cependant à notre portée, qui calmerait nos envies profondes, et dont on oserait rêver (ou peut-être trop). Innover serait toujours positif. L’innovation réussit toujours sinon elle n’est pas innovation (p. 17).

Cardoso (2002) destaca quatro atributos internos que considera fundamentais nas definições normalmente apresentadas deste termo: “a ideia de novidade, de mudança, de processo e de melhoria” (p. 21). Será, também, em redor destas particularidades que os pontos seguintes serão desenvolvidos.