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2 L EIS E P RINCÍPIOS DO J OGO DE F UTSAL

QUADRO 16 Fases da defesa em futsal

2.5.2 Fundamentos táticos defensivos

Para Bayer (1994, p.101), há três maneiras de agir (regras de ação) na defesa que se constituem “[...] essenciais a adquirir e respeitar a todos os níveis68 [...] que vão subentender a todo momento as atitudes do defensor”: (1ª) a marcação deve ser ativa, isto é, o defensor deve impor-se ao atacante e, em hipótese alguma, sofrer passivamente as ações do adversário; (2ª) a marcação deve agir continuamente, ou seja, não pode distrair-se. Ao contrário, deve ter sempre algo a fazer em função da coleta permanente de informações; (3ª) a marcação deve prestar-se à ajuda, isto é, deve se integrar aos planos coletivos, se articular com os demais.

Embora pertinentes, porque explicam a necessidade de os jogadores serem ativos e cooperativos quando da defesa, as regras de ação de Bayer, ao nosso juízo, são insuficientes para dar conta da complexidade de atitudes inerentes a essa fase do jogo de futsal. Isso nos leva a acrescentar um conjunto de ações responsáveis pelo desenvolvimento defensivo individual e coletivo. Este coletivo de atitudes representaria os fundamentos táticos de defesa, isto é, aquelas ações “[...] da defesa que executadas tentam obstaculizar ou impedir a progressão da bola e sua recuperação” (CHAVES CHAVES; RAMÍREZ AMOR, 1998, p. 125).

QUADRO 17

Fundamentos táticos defensivos em futsal

Autores Datas Tipologia

Lozano Cid 1995 Retorno, ajuda e cobertura, dois contra um, temporização, permutas. Fonseca 1997 Visualizar bola e jogador, respeitar a linha da bola, voltar para

ajudar, pressionar a bola.

Chaves Chaves e Ramírez Amor 1998 Retorno, temporização, vigilância, cobertura, permuta, deslizamento, pressão, interceptação, antecipação, carga, entrada.

Saad e Costa 2001 Respeitar a linha da bola, manter marcador e bola no campo visual, cobertura, cercar o adversário

Fonseca e Silva 2002 Linha da bola, perseguição, cobertura, troca de marcação. Santana 2004a Trocas de marcação, marcação de retorno, encaixe da marcação Silva e Calado Filho 2005 Retorno e temporização (ações de transição defensiva); ajuda,

cobertura e permuta (ações de suporte e apoio); marcação, pressão, carga e entrada (ações de marcação); interceptação e antecipação (ações de corte da bola);

Santana 2006b Marcar atrás da linha da bola, manter o adversário no campo visual, retorno, cobertura.

Futsal 2006 Postura básica, acompanhamento, interceptação ou antecipação, aproximação, abordagem, bloqueio de passes e chutes, troca de marcação, cobertura, ajuda, dobra.

Ferretti 2006 Triângulo, atrás da linha da bola, desarme, acompanhamento, equilíbrio e retomada de equilíbrio.

Andrade Junior 2007 Aproximação e abordagem, indução do passe, retorno, encaixe da marcação, dobra, cobertura, antecipação, marcação atrás do pivô.

Lucena (1994) foi o primeiro autor a abordar a relevância de os jogadores adotarem os fundamentos aproximação e abordagem. A aproximação exige que o jogador se aproxime do seu marcador buscando o equilíbrio adequado para exercer a abordagem, isto é, para tomar-lhe a bola, o que consistiria um tipo de desarme (FERRETI, 2006), ou atrapalhar o passe, cooperando com os outros colegas defensores. Santana (2004a, p.76) explica que o jogador deve se aproximar do adversário simultaneamente ao passe, isto é, “[...] o tempo que a bola leva para chegar ao adversário é o tempo que o marcador deve levar para vencer o espaço que o separa daquele”.

FIGURA 56 − Aproximação defensiva simultânea ao passe Fonte: Adaptado de SANTANA, 2004a.

Andrade Junior (2007) acrescenta que a abordagem pode ser agressiva ou passiva. No primeiro caso, o marcador atacará o adversário, diminuindo o espaço para lhe tomar a bola. No segundo caso, o marcador se restringe a cercar o adversário. Ainda para o autor, a abordagem pode ter o objetivo de induzir o adversário a passar ou conduzir a bola por um local onde a sua ação de ataque seria mais difícil ou para cima de uma cobertura.

FIGURA 57 − Abordagem que induza a trajetória de ação do adversário Fonte: Adaptado de ANDRADE JUNIOR, 2007.

A linha da bola se trata de uma linha imaginária que passa sobre a bola em sentido perpendicular à quadra (SAAD; COSTA, 2001). Para Fonseca e Silva (2002, p. 24), este fundamento favorece defender, “[...] principalmente possibilitando ao atleta, durante a função de marcação, observar a bola e o jogador a ser marcado por ele”. Para Santana (2006b, p. 2), “[...] quem está atrás da linha da bola ocupa espaços preciosos, que seriam ocupados pelo adversário”.

FIGURA 58 − Marcar atrás da linha da bola Fonte: FONSECA; SILVA, 2002, p.24.

O fundamento de manter o adversário e a bola no campo visual (FONSECA, 1997; SAAD; COSTA, 2001) é chamado de triângulo por Ferretti (2006) e por Luis Gallego e José García (2006), de triângulo defensivo. Segundo estes últimos, o importante nessa atitude é estar atento ao jogador que está com a bola e a quem se marca. Explicam ainda que a distância que se deve manter de quem se marca deve ter relação com o jogo, isto é, quanto maior a possibilidade de o atacante receber a bola, mais próxima será a marcação.

FIGURA 59 − Triângulo defensivo

Fonte: LUIS GALLEGO; JOSÉ GARCÍA, 2006, p.81.

É importante acrescentar que se o atacante passar a bola e se deslocar pela quadra, o marcador deve atentar para este último e não para a bola69 (LUCENA, 1994; SAAD; COSTA, 2001; SANTANA, 2006b), acompanhando-o. Este acompanhamento exige que o marcador mantenha o adversário no campo visual (SANTANA, 2004a), que se posicione entre aquele e o seu gol e que leve em consideração o posicionamento da defesa como um todo, a fim de estar disponível a ajudar seus companheiros (FUTSAL, 2006). Essa disponibilidade visual e comportamental do defensor denomina-se vigilância (CHAVES CHAVES; RAMÍREZ AMOR, 1998). Uma vez recuperado o equilíbrio, o triângulo defensivo volta a ser exercido.

Silva e Calado Filho (2005) argumentam que quando da marcação propriamente dita, o defensor deverá decidir-se por agir mais ativamente, impedindo que o adversário receba a bola ou menos ativamente. Neste caso, impedindo que aquele avance com a bola que já possui. Naquele caso, deverá posicionar-se na frente do atacante e na trajetória da bola, o que caracterizaria uma marcação de interposição, como se segue.

FIGURA 60 − Marcação de interposição (mais ativa) Fonte: Adaptado de SILVA; CALADO FILHO, 2005.

Diferentemente, quando da marcação de contenção, o jogador deverá posicionar-se entre o adversário e o seu gol.

FIGURA 61 − Marcação de contenção (menos ativa) Fonte: Adaptado de SILVA; CALADO FILHO, 2005.

O retorno defensivo70 se trata dos movimentos “[...] de retrocesso que realizam os jogadores de uma equipe que perdeu a posse da bola, a fim de voltar às suas posições de origem ou defensivas” (LUIS GALLEGO; JOSÉ GARCÍA, 2006, p.71). Junto com a temporização, que é a atitude de retardar o ataque rival a fim de que os outros jogadores de defesa possam se organizar (LOZANO CID, 1995), constituem os chamados fundamentos de transição defensiva.

Lozano Cid (1995, p. 35) reputa à cobertura a ação de “[...] assistir ao companheiro que pode ser superado pelo contrário que controla a bola”. Portanto, esta exigirá que o marcador abandone sua zona de conforto e saia ao encontro de um adversário que venceu seu companheiro. Andrade Junior (2007, p. 62) acrescenta que a cobertura exigirá que o jogador esteja “[...] sempre bem posicionado cobrindo os espaços de infiltrações, principalmente quem está do lado oposto71 de onde está a bola”. Não pode passar despercebido que marcar atrás da linha da bola tende a facilitar coberturas.

70 O retorno defensivo e a temporização foram exemplificados no item 2.5.2.

71 Luis Gallego; José García (2006) referem que o lado oposto ao lugar onde se encontra a bola se trata do “lado débil”, isto é, o espaço de quadra em que a densidade defensiva é baixa. Por oposição, o lado onde se encontra a bola se chama “lado forte”, na medida em que a densidade defensiva é alta.

FIGURA 62 − Cobertura

Fonte: Adaptado de LOZANO CID, 1995.

Em geral, um fundamento que vem associado à cobertura é a permuta, que consiste “[...] em que um jogador, uma vez que tenha sido superado pelo rival que possui a bola, ocupe a posição de um companheiro que o ajudou quando da cobertura” (LOZANO CID, 1995, p.39).

FIGURA 63 − Permuta

Fonte: Adaptado de LOZANO CID, 1995.

O fundamento da dobra (ou dois contra um) exige que o defensor abandone quem marca e vá “[...] ajudar seu companheiro que está marcando outro jogador que tem a posse da bola, fazendo a situação de dois contra um (ANDRADE JUNIOR, 2007, p.62)”. Lozano Cid (1995) explica que a dobra, em virtude do risco iminente em caso de fracasso, deve ser um movimento muito rápido e agressivo, coordenado, realizado preferencialmente longe da meta que se defende e sobre o jogador de ataque mais fraco.

FIGURA 64 − Dobra

O fundamento troca de marcação acontece quando “[...] um jogador percebe que é possível deixar o seu marcador e passar a marcar outro sem que isso implique desvantagem para a sua equipe” (SANTANA, 2004a, p.65). Fonseca e Silva (2002, p.26) explicam que essa ação é indicada quando “[...] ocorre troca de posição, clara e previsível, entre os atacantes”. Isso evitaria o desgaste dos defensores na medida em que estes permaneceriam no mesmo espaço de quadra. Tal fundamento reclama que o defensor com melhor visão dos atacantes comunique verbalmente o seu companheiro quando do melhor momento para realizar a troca (FUTSAL, 2006).

FIGURA 65 − Troca de marcação Fonte: FONSECA; SILVA, 2002, p.26.

O encaixe da marcação se trata de uma movimentação defensiva na qual o defensor “[...] aborda seu marcador, impedindo-o que receba a bola” (ANDRADE JUNIOR, 2007, p.62). Para Santana (2004a, p.68), isso exigirá que os jogadores, de forma coordenada, encaixem-se (aproximem-se) dos adversários, “[...] de modo que se dificultem as linhas de passe e sua progressão na quadra”. É importante que essa atitude seja acompanha de pressão na bola. Logo, em dada medida, esse fundamento se equivale à pressão72, pois nesta ação defensiva, que pode ser realizada individual e coletivamente, se pressiona o rival que está com a bola e o que não está e, inclusive, a trajetória do passe, de modo que a bola seja recuperada ativamente.

FIGURA 66 − Encaixe de marcação/pressing Fonte: SANTANA, 2004a, p.86.

72 Chaves Chaves e Ramírez Amor (1998) explicam que se faz pressão (a) sobre o atacante que tem posse de bola a fim de impedir que este desenvolva suas ações livremente, (b) sobre o atacante sem posse de bola, para dissuadi-lo a não receber a bola e (c) sobre as linhas de passe para, efetivamente, interceptar a bola.

A carga se constitui num fundamento que reclama contato físico. Seria “Aquela ação sobre o jogador possuidor da bola que se realiza com o ombro e parte do dorso na luta pelo controle da bola” (CHAVES CHAVES; RAMÍREZ AMOR, 1998, p.135). Semelhante à carga é a entrada. Porém, neste caso, se usam os pés e as pernas para recuperar a bola.

A interceptação e a antecipação constituem-se ações muitas vezes encaradas, de forma errônea, como equivalentes. Interceptar resume-se a cortar um passe/interromper a trajetória da bola, muito comum quando o jogador marca a bola. Por sua vez, a antecipação reclama que o defensor se adiante (tome a frente) do atacante que a receberia. Ambas as ações são bastante usadas quando a marcação é mais ativa (interposição) e podem ser realizadas mediante o desvio, o despejo ou a recuperação da bola (SILVA; CALADO FILHO, 2005).

A ajuda não se materializa para suprir uma ação deficiente da defesa (à semelhança da cobertura), mas sim para criar uma situação de superioridade numérica (como a dobra) (FUTSAL, 2006). Porém, diferencia-se desta pois ocorre mais próxima do gol que se defende, enquanto aquela acontece mais distante deste e exige que o marcador, quando do passe do atacante, acompanhe a trajetória do passe e se “lance”, isto é, continue o movimento para cima do receptor. Em geral, a ajuda é aplicada quando há um passe em profundidade para alguém de costas para o gol. Neste instante, o defensor retornaria para ajudar seu companheiro, fazendo 2x1.

FIGURA 67 − Ajuda

Fonte: SANTANA, 2004a, p.88.

Não obstante essa especificidade, Luis Gallego e José García (2006, p.34) referem que a ajuda se trata mais de um princípio de colaboração entre os jogadores do que de um fundamento, constituindo-se como “[...] toda solução favorável que seus companheiros oferecem a um jogador durante o jogo, em qualquer momento e circunstância”. Portanto, seria difícil excluir qualquer fundamento defensivo desse conceito. Silva e Calado Filho (2005) reportam que há ajuda, por exemplo, quando se faz um 2x1 (dobra), quando se faz uma pressão sobre a bola ou quando se pressiona a trajetória do passe.

Neste tema, destaca-se a divisão proposta por Silva e Calado Filho (2005), contemplada no quadro 18.

QUADRO 18

Finalidades dos diferentes fundamentos defensivos

Fundamentos Finalidades

Retorno e temporização Facilitar a transição defensiva Ajuda, cobertura e permuta Dar suporte e apoio

Marcação, pressão, carga e entrada Marcar o adversário Interceptação e antecipação Cortar ou recuperar a bola Fonte: SILVA; CALADO FILHO, 2005, p.79.

No que pese as ações defensivas que alicerçam o comportamento individual, é indispensável atentar para o fato de que a defesa é coletiva, isto é, quando se trata de defender “[...] estamos em ‘conjunto’, e jogamos ‘com’, tem-se em conta as dificuldades e as acções empreendidas pelos companheiros, para se articular com eles e ajustar o seu próprio comportamento às contingências do desenvolvimento do jogo” (BAYER, 1994, p.101).

O que, de fato, acontece, é que os jogadores, ao defender, são levados, inevitavelmente, a integrar as suas atitudes às de seus companheiros, segundo as demandas circunstanciais do jogo. Isso se realiza, por exemplo, quando um jogador é superado e outro tem de sair à cobertura, e o que foi superado corre para ocupar o lugar do que lhe cobriu (permuta); ou quando um defensor pressiona o portador da bola (pressão) e outro se aproxima de quem, possivelmente, receberia o passe, de modo a interceptar a sua trajetória (interceptação), podendo, para tanto, tomar a frente do seu adversário (antecipação). À coordenação de ações defensivas, Chaves Chaves e Ramírez Amor (1998, p.125) denominam de procedimentos defensivos, isto é, “[...] a combinação de duas ou mais ações defensivas que coordenadamente executam os componentes de uma equipe em defesa para conseguir a neutralização de um ataque”.

Os fundamentos defensivos e suas combinações (procedimentos) se manifestarão dentro do que se chama “defesa em sistema” ou tipos de defesa.