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Os desenhos táticos: a faceta estática do ataque

2 L EIS E P RINCÍPIOS DO J OGO DE F UTSAL

QUADRO 8 Tipologia do ataque

2.4.2 Os desenhos táticos: a faceta estática do ataque

Os desenhos táticos referem-se à “Distribuição ordenada dos componentes de uma equipe na quadra” (LUCENA, 1994, p. 79); aqueles dispositivos de ataque que ocupam a distribuição do campo (BOTA; COLIBABA, 2001; CHAVES CHAVES; RAMÍREZ AMOR, 1998).

Trata-se da faceta estática do ataque, cujo objetivo seria facilitar a aplicação de um conjunto de movimentos, ou seja, do desenvolvimento do ataque, que se trata, por conseguinte, da faceta dinâmica. Refere-se ao primeiro passo para a organização ofensiva de um ataque posicional (SILVA; CALADO FILHO, 2005).

Diferentemente de um sistema de jogo (mais amplo), que conjuga a faceta estática e a faceta dinâmica de jogo da equipe, o desenho tático é mais restrito. O QUADRO 9

contempla os mais citados na últimas duas décadas.

QUADRO 9

Desenhos táticos do futsal para o ataque posicional

Autores Anos Desenhos táticos ofensivos Lucena 1994 2.2, 2.1.1, 3.1

Valdericeda 1994 2.2, 1.2.1 Luque Hoyos e Luque Tabernero 1995 3.1, 2.2, 4.0, 1.3 Lozano Cid 1995 2.2, 3.1, 4.0 Santana 1996 2.2, 1.2.1, 3.1 Sampedro 1997 3.1, 4.0, 2.2 Saad 1997 2.2, 3.1, 2.1.1, 1.2.2 Fonseca 1997 2.1.1, 3.1

Chaves Chaves e Ramírez Amor 1998 3.1, 2.2, 2.1.1, 1.1.2

Santos Filho 1998 2.2, 3.1, 1.3, 2.1.1, 1.2.1, 4.0 Souza; Leite 1998 2.2, 2.1.1, 3.1, 1.3 Andrade Junior 1999 2.2, 2.1.1, 3.1, 1.3, 1.2.2 Saad; Costa 2001 2.2, 2.1.1, 3.1, 1.3, 4.0, 1.2.2 Voser 2001 2.2, 2.1.1, 1.2.1, 3.1, 1.3, 4.0, 3.2 Voser; Giusti 2002 2.2, 2.1.1, 1.2.1, 3.1, 1.3, 4.0, 3.2 Lozano Cid et al 2002 3.1, 2.2, 1.2.1, 4.0, 1.3 Mutti 2003 2.2, 3.1, 1.3, 1.2.1, 2.1.1, 4.0, 1.4 Tenroller 2004 2.2, 2.1.1, 1.2.1, 3.1, 4.0, 1.3, 3.2 Apolo 2004 2.2, 2.1.1, 3.1, 1.3, 4.0, 0.4 Santana 2004a 2.2, 2.1.1, 3.1, 4.0, 1.2.2, 2.3 ou 2.1.2 Costa Junior, Souza e Muniz 2005 2.2, 2.1.1, 3.1, 1.3, 1.2.1, 4.0, gol linha Silva e Calado Filho 2005 3.1 ou 1.2.1, 2.2, 4.0

Observa-se pelo quadro que os desenhos mais recorrentes são o 2.2, o 3.1, o 2.1.1, o 1.2.1 e o 4.0. Nota-se que a partir do final da década de 1990, em função da alteração na regra que permitiu ao goleiro jogar com os pés fora da área de meta, surgem os desenhos táticos com a participação do goleiro, como o 1.2.2 (ou 3.2 ou 1.4 ou gol linha) e o 2.1.2 (ou 2.3), que se trata de ataques em vantagem numérica.

Historicamente, há indícios suficientes de que o surgimento dos desenhos táticos obedeceu a seguinte cronologia: 2.2 e 2.1.1 (década de 50) → 1.2.1/3.1 (década de 60) → 4.0 (década de 80) → 1.2.2 e 2.1.2 (década de 90) (COSTA JUNIOR; SOUZA; MUNIZ, 2005; LUCENA, 1994; SAAD, 1997, SANTOS FILHO, 1998; SANTANA, 2003; TENROLLER, 2004; VOSER, 2001). Salientamos que os desenhos táticos gozam de longevidade temporal. Ratifica isso, por exemplo, um posicionamento pioneiro como o 2.2, que surgiu na época do futebol de salão (LUCENA, 1994), perdurar até hoje.

Isso posto, faremos uma breve contextualização funcional de cada desenho. O desenho 2.2 exige que dois jogadores se posicionem na meia-quadra defensiva e os outros dois na meia-quadra ofensiva. Em linhas gerais, “[...] as manobras podem ser articuladas com o goleiro, um dos alas ou o fixo, tentando ligar a defesa ao ataque, acionando o pivô ou ala, posicionados ofensivamente” (LUCENA, 1994, p. 82). Silva e Calado Filho (2005, p. 101) explicam que “Os jogadores que ocupam a zona de elaboração, que são simultaneamente fixos e alas, devem ser especialmente habilidosos e rápidos; os dois da zona de finalização, se pode dizer, que atuam como pivôs”.

FIGURA 10 − Desenho tático 2.2 Fonte: ANDRADE JUNIOR, 1999, p. 47.

Embora se parta da premissa de que o desenho exija essa ocupação do espaço, entendemos que os jogadores poderão, dependendo do local de marcação do adversário, se posicionar diferentemente no espaço. Por exemplo, se a marcação estiver recuada, optarem em ocupar apenas a meia-quadra ofensiva.

FIGURA 11 − Desenho tático 2.2 na meia-quadra ofensiva Fonte: SANTANA, 2004a, p. 118.

Caso os defensores marquem a saída de bola, a fim de fugir da pressão, ocuparem apenas a meia-quadra defensiva. Para Lozano Cid et al (2002), esse posicionamento, inclusive, é o mais indicado para a equipe sair da pressão do adversário.

FIGURA 12 − Desenho tático 2.2 na meia-quadra defensiva Fonte: SANTANA, 2004a, p.96.

Valdericeda (1994), Lozano Cid (1995), Sampedro (1997), Chaves Chaves e Ramírez Amor (1998) e Lozano Cid et al (2002) preocuparam-se em listar possíveis vantagens desse desenho. Em linhas gerais: (a) fácil compreensão, (b) indicado para sair de pressão, (c) indicado para enfrentar posturas defensivas excessivamente recuadas, pois “abre a quadra”, isto é, afasta as linhas de defesa, o que permite chutes de meia-distância, (d) transforma-se em vantagem quando a equipe dispõe de um jogador de grande habilidade e segurança com a bola nos pés, pois em caso do duelo de 1x1 se criará uma superioridade numérica, (e) indicado contra equipes que marcam por zona, pois o sistema proporciona espaços nos corredores centrais e laterais, sendo ideal para um jogo rápido e em profundidade; também porque, em particular contra marcações que se posicionam 1.2.1, ao distribuir dois atacantes muito separados, faz uma sobrecarga no último defensor.

De outro lado, para Valdericeda (1994), Lozano Cid (1995) e Sampedro (1997) alguns inconvenientes o acompanham: (a) muito vulnerável quando se apresenta em zonas adiantadas da quadra, favorecendo, no caso de um desarme ou interceptação de passe do

adversário, o contra-ataque, (b) em caso da perda da bola, em função da distância entre os jogadores, há muito espaço para defender, o que dificultas as ajudas e coberturas defensivas, (c) pouca mobilidade, em função de existir entre as duas linhas de ataque (defensores e atacantes) muita distância, o que dificulta as rotações de posições, (d) fica-se em geral com apenas um jogador como apoio à bola. Neste caso, se o adversário pressionar e roubar a bola obriga o último defensor será obrigado a enfrentar o 1x1, (e) falta de espaços livres na zona de finalização, na medida em que concentra jogadores adversários.

Sampedro (1997, p. 76) explica que esse desenho no âmbito do alto rendimento, em função da evolução dos sistemas de ataque, “[...] cada vez se utiliza menos. Prova disso é que somente o temos encontrado em 1% do jogo total”.

O desenho 2.1.1 é uma variação do 2.2 (LUCENA, 1994; SAAD, 1997). Consiste em ter três jogadores posicionados na meia-quadra defensiva (um em cada lado da área de meta e o terceiro na lateral, próximo da linha divisória central) e um na meia-quadra ofensiva, entre os 10 metros e o pênalti. Para Costa Junior, Souza e Muniz (2005, p. 32) se trata de um posicionamento muito utilizado quando de arremessos de meta e “[...] tem a vantagem de confundir o adversário, podendo variar para o 2x2 ou para o 3x1”. Saad (1997, p. 59) acrescenta que é “[...] muito utilizado contra uma marcação pressão do adversário”. Para Lucena (1994, p. 83), o 2.1.1, ao recuar um jogador para o campo defensivo permite tanto o aumento do número de “[...] opções para que se articulem as ações de ataque com o pivô [como] [...] começa a se configurar a formação básica para o 3.1”.

FIGURA 13 − Desenho tático 2.1.1 Fonte: FONSECA, 1997, p. 125.

Valdericeda (1994), Saad (1997), Chaves Chaves e Ramírez Amor (1998), Voser (2001), Saad e Costa (2001), Silva e Calado Filho (2005) entendem que o desenho 3.1 ou 1.2.1 é o mais utilizado no futsal. Sampedro (1997) explica que o 3.1 pode ser lido como 1.2.1 quando o posicionamento do fixo “toma” uma forma mais recuada, opinião compartilhada por

Lozano Cid et al (2002, p. 137), para os quais o 1.2.1 “É igual ao sistema 3.1, mas com os alas mais adiantados, trabalhando em contínuas fintas para ganhar terreno e progredir no jogo”. Esse desenho consiste “[...] em ter o fixo posicionado na altura da marca de penalidade máxima de sua quadra defensiva, com os alas abertos nas laterais um pouco mais à frente, ainda na meia-quadra defensiva, e o pivô posicionado na meia quadra ofensiva próximo à marca de pênalti” (LUCENA, 1994, p. 84).

FIGURA 14 − Desenho tático 3.1 ou 1.2.1 Fonte: LUCENA, 1994, p. 84.

A nosso ver, a exemplo do 2.2, em função do posicionamento defensivo do adversário, a equipe poderá se posicionar 3.1 ocupando, apenas, a quadra ofensiva.

FIGURA 15 − Desenho tático 3.1 ou 1.2.1 na meia-quadra ofensiva Fonte: SANTANA, 2004a, p. 108.

Lucena (1994), Voser (2001) e Costa Junior, Souza e Muniz (2005) ponderam que esse desenho facilita o deslocamento dos jogadores. Silva e Calado Filho (2005, p. 94) defendem que o jogador que ocupa a posição de pivô “[...] costuma ter um papel determinante, já que de seu posicionamento e mobilidade depende a aplicação dos diferentes padrões de jogo”. Entretanto, Velasco Tejada e Lorente Peñas (2003, p. 268) advertem que “O fato de jogar com um pivô não significa que tenhamos que lhe passar sempre a bola, nem tampouco que não o

façamos nunca. Temos que ensinar a nossos jogadores a observar o jogo e passar a bola ao companheiro mais bem situado para recebê-la”.

As vantagens desse desenho, segundo Lozano Cid (1995), Sampedro (1997), Chaves Chaves e Ramírez Amor (1998) e Lozano Cid et al (2002) podem ser resumidas da seguinte forma: (a) simples de realizar, (b) na zona de finalização se dispõem de espaços livres, (c) evita aglomerações no campo ofensivo, (d) em função de exigir uma linha de três jogadores, oferece segurança defensiva em caso de perda da bola, (e) é indicado para se usar contra marcações pressão e recuadas, individuais e por zona, (f) oferece muito mais possibilidades ofensivas do que os sistemas anteriores, como por exemplo, ganhar as costas do adversário, realizar diagonais, paredes com o pivô.

Santos Filho (1998) adverte que esse desenho, em função de exigir movimentações constantes dos jogadores, não deve ser usado por equipes mal preparadas em nível condicional e tampouco em equipes sem jogadores versáteis em atacar e defender.

Lozano Cid (1995) explica que o 4.0 ou quatro em linha foi inventado por um treinador brasileiro50 e se trata de um posicionamento inovador e criativo. Ao ver de Sampedro (1997), Saad e Costa (2001), Mutti (2003) se trata do desenho tático de futsal mais moderno. Consiste na disposição dos quatro jogadores em linha na meia-quadra ou, ainda, posicionar a todos na armação da jogada.

Por conseguinte, nesse sistema, os jogadores jogam em função do aproveitamento do espaço defensivo do adversário (SAMPEDRO, 1997).

FIGURA 16 − Desenho tático 4.0 ou quatro em linha Fonte: TATEYAMA; NAVARRO, 2008, p.93.

Velasco Tejada e Lorente Penas (2003, p. 271) ensinam que a característica de se jogar em função do espaço livre transforma o quatro em linha num “[...] sistema de rotação por

50 De nome Antonio Azevedo, mais conhecido como “Zego”. Tateyama e Navarro (2008) reportam que esse sistema foi criado por “Zego” no Brasil, em 1980, na equipe Citrosuco, em Santos (SP). Isso teria acontecido em virtude de a equipe ser mediana e “Zego” ter dado prioridade à posse de bola, o que teria feito o treinador recuar o pivô.

excelência, já que exige um contínuo movimento sem bola dos jogadores com o objetivo de limitar ao máximo a defesa de ajudas e de coberturas”. Em função disso, o posicionamento exige dos jogadores que “[...] Sejam rápidos e com uma boa mudança de ritmo que lhes permita ganhar as costas do adversário com facilidade; que tenham capacidade para ler o jogo, o qual requer uma grande inteligência tática, e que, se possível atuem com ambas as pernas”. Essa opinião é ratificada por Lozano Cid et al (2002, p. 139), ao sustentarem que se trata de um sistema utilizado na elite, pois (a) exige “Movimento constante com e sem bola e, como conseqüência, uma grande condição física”; (b) “Grande sincronização e automatização entre os jogadores” e (c) exige que estes últimos saibam “[…] jogar a bola com pressão e proximidade defensiva sem medo e com confiança, assumindo riscos”.

Sampedro (1997, p. 75) lhe imprime certas características, como por exemplo, (a) “Utiliza passes por cima da defesa, sobretudo ao espaço livre”; (b) “Obriga a defesa a mover- se continuamente e ter que eleger o tipo de marcação”; (c) “Idôneo para jogar com vantagem no placar, já que o adversário deve recuperar a bola”.

Velasco Tejada e Lorente Peñas (2003, p. 270) acrescentam que, além desse sistema favorecer que todos os jogadores atuem no ataque, integra três conceitos: o de “criação- ocupação de espaços”; o de “apoio constante ao companheiro que tem a bola” (atacante) e, por fim, conseguir ou alcançar, mediante os movimentos dos atacantes, o desequilíbrio “[…] contínuo da defesa contrária […] que permita finalizar com vantagem, seja posicional ou numérica”.

Lozano Cid (1995) cita que esse desenho favorece a criação de espaços livres, ganhar as costas do adversário, deixar o rival sem coberturas e, no caso de fazê-las, proporcionar um jogador livre para servir de apoio e, ainda, se o adversário marcar individualmente, imprimir- lhes um desgaste considerável. Por outro lado, algumas desvantagens precisam ser consideradas (LOZANO CID, 1995; LOZANO CID et al., 2002; VELASCO TEJADA; LORENTE PEÑAS, 2003): (a) inadequado para defesas muito recuadas, em função da pouca existência de espaços livres, (b) desfavorece a recomposição defensiva, em vista de os jogadores se posicionarem em linha, (c) exige muitas horas de treinamento o que, nem sempre, a maior parte das equipes dispõe, (d) exige muita sincronização e preparo físico dos jogadores, na medida em que estes precisam se movimentar muito sem bola, (f) exige um comportamento técnico-tático assentado o máximo possível na ambidestria.

Velasco Tejada e Lorente Peñas (2003, p. 271) têm uma visão interessante do posicionamento quatro em linha que, a nosso ver, o diferencia definitivamente dos anteriores. Para esses autores

Com esse sistema de jogo não somos nós quem colocamos a cada jogador onde julgamos oportuno, como ocorre, por exemplo, com o sistema anterior51, senão que são os próprios

jogadores quem devem realizar os movimentos que se adaptem melhor às suas determinadas características.

O fato é que nesse sistema, diferentemente dos anteriores, as posições/funções dos jogadores não são definidas previamente, ou seja, não é possível diferenciar, quanto ao espaço de atuação, os fixos dos alas, estes dos pivôs e estes dos primeiros. Logo, o sistema exige “[…] jogadores inteligentes que sejam capazes de reagir diante de situações complicadas e que se afastem da ação mecânica de se mover porque assim diz o treinador” (VELASCO TEJADA; LORENTE PEÑAS, 2003, p. 271).

Tateyama e Navarro (2008) reportam que as seleções do Brasil e da Espanha, as maiores forças do futsal mundial, usam esse sistema atualmente.