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3 AS ABORDAGENS INSTITUCIONALISTAS

3.6 GERENCIAMENTO DE IMPRESSÕES

A teoria neoinstitucionalista ressalta como o campo organizacional pode modelar as organizações e indivíduos em um processo que envolve um quadro complexo de interações em permanente dinâmica. Segundo Mendonça e Amantino-de-Andrade (2003), essa interação entre organização e ambiente tende a refletir uma conformação defensiva ou de aproximação na qual a organização procura uma imagem de legitimidade. Para Elsbach e Sutton (1992), a teoria institucional fornece uma visão útil, mas incompleta, de como as organizações lidam com demandas conflitantes e inconsistentes. Dessa forma, uma maior compreensão de como as organizações adquirem e protegem a legitimidade pode ser obtida pela combinação de perspectivas institucionais e de gerenciamento de impressões.

Trabalhos existentes sugerem que essa integração entre as abordagens pode ser utilizada para a construção de novas abordagens teórico-metodológicas para o estudo do campo organizacional. Mendonça (2004) explorou as conexões entre processo de gerenciamento de impressões (GI), poder e influência como fenômenos cotidianos das organizações, e as utilizou para o estudo da sede do SESC Pernambuco. Outro trabalho que adota essa abordagem é o de Elsbach e Sutton (1992), buscando desenvolver um modelo de

estudo de duas organizações radicais do movimento social. Os autores revelam a possibilidade de complementariedade entre o GI e o institucionalismo. A literatura sobre GI é rica em aplicações para estudos organizacionais, no entanto, um ensaio teórico-metodológico em especial mereceu destaque nesta tese. Trata-se do artigo publicado por Mendonça e Amantino-de-Andrade (2003), que demonstra a estratégias e táticas de legitimação das organizações em um campo organizacional e como elas podem ser interpretadas.

De acordo com Mendonça (2003) o gerenciamento de impressões tem suas origens na sociologia, com os trabalhos de Erving Goffman, e na psicologia social, com os trabalhos de Edward Jones. Segundo Mendonça (2003), a obra seminal e que serve como primeira referência para a investigação científica é o livro de Goffman, The Presentation of Self in Everyday Life, de 1959. O ponto central do trabalho de Goffmam, segundo Mendonça (2003b apud LEARY, 1996), é o de que muitos dos insights mais reveladores sobre o comportamento social são encontrados no estudo da aparência externa (comportamentos públicos) a qual os indivíduos criam e transmitem uns para os outros, e não na análise dos motivos e personalidade desses indivíduos.

De acordo com Giacalone e Rosenfeld (1982), as estruturas de gerenciamento de impressões empregam uma metáfora teatral ou dramatúrgica para descrever a vida social. As pessoas seriam uma espécie de atores, assumindo muitos papéis, tentando agradar as audiências para ganhar seu apoio moral, social e financeiro. Assim, um ator social, que pode ser considerado uma organização, emprega muitas táticas de gestão de impressão visando à sua legitimação em determinado ambiente. Segundo Mendonça (2003), a perspectiva (ou metáfora) de dramaturgia é originária da escola de sociologia conhecida como interacionismo simbólico, que, segundo Carvalho et al. (2010), constitui uma perspectiva teórica que possibilita a compreensão do modo como os indivíduos interpretam os objetos e as outras pessoas com as quais interagem e como tal processo de interpretação conduz o comportamento individual em situações específicas.

Carvalho, Vieira e Goulart (2012) consideram que o interacionismo simbólico é, potencialmente, uma das abordagens mais adequadas para analisar processos de socialização e ressocialização, e também para o estudo de mobilização de mudanças de opiniões de comportamentos, expectativas e exigências sociais. De acordo com os autores, o interacionismo simbólico começou a se delinear entre os anos 1930 e 1940, e desenvolveu-se no transcurso das duas décadas seguintes. Hoje, entre as reflexões relacionadas à abordagem estão aquelas que tratam da maneira como o mundo social chega a ter um significado para os atores, conforme proposto por Berger e Luckmann (2001).

Com base nessas considerações, é possível perceber uma proximidade entre o institucionalismo e interacionismo simbólico, revelada por Prates (2000) através do conceito de instituição que, conforme aborda, são sistemas de valores e normas que molduram os contextos emergentes de interação ou “encontros sociais”. Grove, Fisk e Dorsch (1998), usando as observações de Erving Goffman, desenvolveram uma estrutura abrangente visando analisar o campo organizacional através da dramatização de sua estrutura abrangente. Para Mendonça (2003), a perspectiva da dramaturgia, a qual se baseia na visão do comportamento como uma metáfora dramática e retrata interações sociais como teatrais, oferece um meio de analisar e descrever os comportamentos humanos. Para Grove e Fisk (1989 apud MENDONÇA, 2003) salientam que um dos principais focos de análise da dramaturgia é como as pessoas criam e gerenciam impressões diante de uma audiência.

Nesta tese, adotou-se o conceito desenvolvido por Mendonça (2003), que aproxima o institucionalismo e a possibilidade de dramatização de abordagens do interacionismo simbólico, para a definição de gerenciamento de impressões, entendendo-o como todas as atividades que um ator social (indivíduo, grupo ou organização) desenvolve no sentido de influenciar o modo como os outros o veem, ou seja, a impressão ou a imagem que desenvolvem a seu respeito. O que justifica a adoção deste conceito de GI é que, em conjunto com a abordagem teórica do institucionalismo, é útil para o cumprimento do objetivo desta tese de analisar o campo organizacional do varejo de alimentos de Belém, no qual as lojas de orgânicos tornam-se atores que agem com o intuito de influenciar seus consumidores e, consequentemente, se legitimarem.

Segundo Mendonça (2003), o termo gerenciamento de impressões frequentemente evoca imagens de estratégias e táticas, de pessoas ou organizações manobrando por posições no mundo social, tentando controlar como elas aparecem visando à realização de objetivos particulares. O autor apresenta uma tabela com cinco estratégias adotadas pelos atores sociais, sendo elas insinuação, autopromoção, exemplificação, intimidação e suplicação, no sentido de serem percebidos, respectivamente, como simpáticos, competentes, moralmente confiáveis, perigosos e merecedores de pena.

Jones e Pittman (1982 apud BOLINO; LONG; TURNLEY, 2016) identificaram cinco táticas de gerenciamento de impressões associadas a imagens específicas desejadas. Especificamente, a insinuação (por exemplo, favores, conformidade de opinião) que é usada para ser simpático, a autopromocional (por exemplo, vangloriar-se, tomar crédito) usada para ser visto como competente, exemplificação (por exemplo, fazer mais do que necessário ou aparecer engajado) usada para ser visto como dedicado, a intimidação (por exemplo, fazer

ameaças) usada para ser vista como ameaçadora, e a súplica (por exemplo, se fazer de insignificante) é usada para ser vista como necessitada. Curiosamente, cada uma dessas imagens desejadas está associada a uma imagem indesejada. Assim, o gerenciamento de impressões pode ser contraproducente e as pessoas que procuram ser vistas como agradáveis, competentes, dedicadas, ameaçadoras ou necessitadas, podem ser vistas como bajuladoras, psicóticas, hipócritas, tempestuosas ou incompetentes, respectivamente.

No geral, há vários tipos diferentes de gerenciamento de impressões que foram identificados por diferentes pesquisadores. Neste trabalho adotou-se as estratégias diretas e assertivas de Gerenciamento de Impressões Organizacional e as táticas diretas e defensivas de Gerenciamento de Impressões Organizacional elaboradas por Mendonça e Amantino-de- Andrade (2003), que tiveram como inspiração Mohamed, Gardner e Paolillo (1999), por ser direcionada especificamente a análise de gerenciamento de impressões de organizações, detalhadas nos quadros 3 e 4.

Quadro 3 – Estratégias Diretas e Assertivas de Gerenciamento de Impressões Organizacional

Estratégia Definição/Descrição

Insinuação Comportamentos que o ator usa para fazer a organização parecer mais atrativa para outros.

Promoção Organizacional

Comportamentos que apresentam a organização como sendo altamente competente, efetiva e bem-sucedida.

Exemplificação Comportamentos usados pela organização para projetar imagens de integridade, responsabilidade social e confiabilidade moral; esta estratégia pode também ter como objetivo buscar a imitação de outras entidades.

Intimidação Comportamentos que apresentam a organização como uma entidade poderosa e perigosa, a qual é capaz e disposta a infligir sofrimento sobre aqueles que frustram seus esforços e objetivos.

Suplicação Comportamentos desenvolvidos pela organização que projetam uma imagem de dependência e vulnerabilidade com o propósito de solicitar a assistência de outros. Fonte: Mendonça e Amantino-de-Andrade (2003).

Quadro 4 – Estratégias Diretas e Assertivas de Gerenciamento de Impressões Organizacional

Tática Definição/Descrição

Explicações Explicações de um evento, na qual se busca minimizar a severidade aparente de uma situação difícil.

Retratação Explicações dadas antes de uma ação potencialmente embaraçosa para repelir qualquer repercussão negativa à imagem do ator.

Handicapping Organizacional

Esforços realizados por uma organização para fazer o sucesso das tarefas parecer improvável, no sentido de obter uma desculpa a priori para o fracasso.

Desculpas Admissões do mérito de culpa de um evento negativo, que incluem expressões de remorso e pedidos de perdão.

Tática Definição/Descrição

Restituição Ofertas de compensação, as quais são estendidas pela organização ao ofendido, ferido ou, por outro lado, uma audiência prejudicada.

Comportamento pró-social

Engajar-se em ações pró-sociais para reconciliar uma transgressão aparente e convencer uma audiência de que o ator merece uma identidade positiva.

Fonte: Mendonça e Amantino-de-Andrade (2003).

O gerenciamento de impressão tem implicações práticas para os indivíduos e para as organizações. Ter uma melhor compreensão da gestão de impressão é algo valioso para as organizações e gerentes, dadas as decisões importantes no local de trabalho. Com efeito, a coleta de dados a partir de múltiplas fontes é muitas vezes um desafio para tal área de pesquisa, apesar que, ao longo dos últimos 30 anos, os pesquisadores dedicaram atenção significativa à compreensão do gerenciamento de impressões nas organizações, no entanto, ainda hoje sabe-se muito pouco sobre como a fonte de classificações de gerenciamento de impressão pode afetar a sua validade.

Mendonça e Amantino-de-Andrade (2003) partem do pressuposto de que a teoria de gerenciamento de impressões, associada aos aportes oriundos do campo da comunicação corporativa e dos estudos organizacionais, pode auxiliar e enriquecer o entendimento do processo através do qual as organizações obtêm a legitimidade em seus ambientes. Por isso, no próximo capítulo será explorado o modelo teórico-metodológico elaborado a partir das discussões tratadas neste capítulo, que não é algo imune a críticas e sugestões.