• Nenhum resultado encontrado

Hegel, por outro lado, é um relativista Não vê nossa tarefa como uma procura de contradições com o fito de eliminá-las, pois pensa que as contradições são tão boas como (ou melhores do

que) os sistemas teóricos não-contraditórios (Popper, 1975: 126-7).

Após apresentar o processo de mudança de atitude de Lakatos abdicando ou rejeitando o seu passado hegeliano-marxista, Ernest se pergunta por que, dado o grande débito intelectual de Lakatos para com Hegel, ele deveria voltar-se tão energicamente contra aquele, e compreende que mais do que a reação de um ex-marxista contra a velha ideologia, a importância da influência do seu novo meio deve ser mais considerada. Admite que a influência de Popper e do ambiente da Escola de Economia de Londres e da filosofia anglo-americana em geral, com sua rejeição à metafísica, levaria a uma forte rejeição das idéias de Hegel. Porque a demarcação de Popper entre a ciência e a pseudociência ocultava uma forte ideologia cientificista e racionalista que claramente rejeitava a metafísica, o idealismo e idéias de Hegel.

Ernest especula acerca de uma possível tensão interna que existiria entre a tese histórico-dialética de Hegel e a antítese lógico-racionalista de Popper que sustentam a síntese lakatosiana. E vê a possibilidade de haver uma contradição no pensamento de Lakatos, com um elemento crítico, antiformalista (evidente na sua filosofia da matemática) e a linha demarcacionista, racionalista (na sua crescente estatura como um filósofo da ciência). Ancora

essa avaliação em uma análise de uma crítica feita por Lakatos a Toulmin (in: Lakatos, 1981: 299-323) e em seus escritos sobre ciência e educação, presentes em Lakatos (1981).

Também nos escritos de Lakatos sobre educação há contradições, diz Ernest. Pois, se por um lado, a crítica lakatosiana à abordagem dedutivista difundida no ensino da matemática, considerada por ele como autoritária, é progressista e radical, por outro lado, seus escritos posteriores contêm elementos que são autoritários e reacionários. Os dois elementos que podem ser distinguidos no pensamento de Lakatos penetram amplamente sua filosofia da matemática e sua filosofia da ciência, que é seu elemento posterior e mais reacionário (Berkson, 1981, apud Ernest

SCPM, p. 108).

Ernest considera que uma exploração do desenvolvimento e contradições no pensamento de Lakatos não estaria completa sem considerar a afirmação feita pelos editores de Proofs and Refutations, de que, nos seus últimos anos, Lakatos revisara e no fundo rejeitara sua filosofia da matemática falibilista. Para Ernest, o que os editores afirmam é dúbio. Primeiro, afirmam que a moderna concepção de inferência válida, do modo como é representada na lógica dedutiva formal, é essencialmente infalível (Lakatos, 1978: 180), o que levaria à conclusão de que Lakatos estava errado em negar esse fato em seus escritos sobre filosofia da matemática. Segundo, afirmam que Lakatos teria mudado sua opinião de acordo com esta afirmação (ou poderia ter sido assim persuadido) e, desta maneira, teria revisado suas publicações. Estas afirmações são feitas em notas de pé de página em Lakatos (1978) e, em um

novo final infalibilista para o diálogo lakatosiano no Capítulo 2 (escrito pelos editores), estes fazem uma revisão

que, segundo Ernest, subverte totalmente o texto de Lakatos.

Buscando encontrar a base das afirmacões dos editores, ele observa que a totalidade dos escritos publicados de Lakatos, incluindo um trabalho de 1973, não fornece evidência de sua mudança de opinião sobre o falibilismo da matemática e da lógica. E se reporta ao seu paper de 1967: A Renaissance of Empiricism, no qual reafirma, e mais, elabora seu falibilismo completo. Afirma que, mesmo que Lakatos tivesse mudado de opinião, isto não afetaria a validade de sua filosofia da matemática anterior como fora publicada, porque esta deveria ter seus próprios méritos; e que qualquer mudança posterior de Lakatos seria interessante biograficamente, mas isso não comprometeria sua filosofia primeira da matemática.

Na opinião de Ernest, a ação dos editores é surpreendente e incorreta, independentemente de seu mérito. E apesar de eles não negarem a sua intervenção, ela é ilegítima e não reperesenta o pensamento de Lakatos. Eles parecem pretender subverter a tese central da filosofia da matemática de Lakatos, diz ele.

Assim também pensam outros comentadores que comungam com o seu sentimento: Bloor (1978, apud Ernest), que cuidadosamente refuta a intervenção, e Hersh (1978b: 133, apud Ernest).

No livro de Davis & Hersh, A experiência matemática, os autores também condenam a atitude dos editores de Lakatos, ao considerarem que ele fora incorreto ao afirmar que para revisar a filosofia infalibilista da

matemática, ter-se-ia que abandonar a idéia de que nossa intuição dedutiva inferencial é infalível (Davis & Hersh,

1985: 394). Consideram que Lakatos está correto e seus editores, incorretos, e que o erro deles teria raízes no próprio erro que Lakatos atacara tão veementemente em sua introdução, isto é, o erro de identificar a matemática (o que os matemáticos realmente fazem na vida real) com seu modelo ou representação na metamatemática ou, na lógica de primeira ordem (Davis & Hersh, 1985: 399). A contestação dos autores às modificações feitas no texto original de

Lakatos pretende esclarecer aspectos que os editores de Lakatos parecem não considerar. Por exemplo, eles afirmam que os editores de Lakatos afirmam que uma dedução formal em lógica de primeira ordem não é falível, em

qualquer sentido sério. Mas não esclarecem que tais deduções são atividades puramente hipotéticas (excetuando problemas 'de brincadeiras', que podem servir de exercícios em um curso de lógica.) (Davis & Hersh, 1985: 395-

96). E mais adiante, ainda referindo-se aos editores, a propósito de suas modificações da obra prima de Lakatos e de acréscimos de notas, asseveram que eles

nunca explicam em que sentido os sistemas formais são um modelo da matemática. É no sentido

Outline

Documentos relacionados