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aproximado das teorias e das dificuldades de pormenor, a teoria dos átomos é verdadeira nas suas grandes linhas, “que os átomos não são apenas conceitos auxiliares (helps) para os matemáticos (puzzled-

mathematicians), mas realidades físicas. Para Lénine “as imprecisões da filosofia de Rücker decorrem da

defesa, de modo nenhum obrigatória, da teoria «mecanicista» (porque não electromagnética?) dos movimentos do éter e da incompreensão entre a verdade relativa e a verdade absoluta. Considera que falta apenas a este físico o conhecimento do materialismo dialéctico, “se não tomarmos em consideração, naturalmente, as importantíssimas considerações sociais que obrigam os professores ingleses a dizerem-se «agnósticos»”363.

James Ward, por seu turno, é um espiritualista franco e consequente, diz Lénine. Para Ward, o naturalismo e a teoria mecanicista da natureza que está na base daquele não são uma ciência. “Mas embora o naturalismo e as ciências da natureza, a teoria mecanicista do mundo e a mecânica como ciência sejam logicamente coisas diferentes, à primeira vista são muito semelhantes e historicamente estão ligadas. Não há perigo de confusão entre as ciências da natureza e a filosofia de tendência idealista ou espiritualista, porque esta filosofia implica necessariamente a crítica das premissas gnosiológicas que a ciência admite inconscientemente”364. “É verdade!”, exclama Lénine: “As ciências da natureza aceitam inconscientemente que a sua doutrina reflecte a realidade objectiva, e só esta filosofia é compatível com

as ciências da natureza!”365. Para Ward, o naturalismo, tal como a ciência, é “inocente” de teoria do

conhecimento. E, tal como o materialismo, não é mais do que física tratada como metafísica, diz Ward repetindo com os humistas e kantianos o argumento já conhecido de chamar metafísica à realidade objectiva fora do homem.

Ward contesta a filosofia exposta por Rücker. E fá-lo, considera Lénine, de modo notavelmente verdadeiro e claro. Ward considera que, “quando surge a questão, no fundo filosófica, de como sistematizar melhor a experiência no seu conjunto, o naturalista afirma que devemos começar pelo aspecto físico. Só estes factos são precisos […]. Que afirmações de tal importância filosófica e tal amplitude sejam deduções legítimas da ciência física (isto é, das ciências da natureza), é coisa que os físicos contemporâneos não se decidem a afirmar directamente. Mas muitos deles consideram que minam o significado da ciência aqueles que se esforçam por tornar patente a metafísica dissimulada e denunciar o realismo físico em que assenta a teoria mecanicista do mundo […] Na realidade, a minha crítica [desta metafísica] baseia-se inteiramente nas conclusões de uma escola de físicos, se assim se lhe pode chamar, que cresce em número e alarga a sua influência, escola que recusa este realismo quase medieval [...]”. Ward nomeia Kirchhoff e Poincaré e, noutros locais, Poynting, Duhem, Pearson e Mach. “Para os distinguir da velha escola, que temos o direito de chamar realistas físicos, podemos chamar à nova escola simbolistas físicos. […] Ambas as escolas partem, evidentemente, da mesma experiência sensorial (perceptual); ambas usam sistemas abstractos de conceitos, que diferem nos pormenores mas são, no

363

V. I. Lénine, ibidem, p. 210.

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J. Ward cit. por V. I. Lénine, ibidem, p. 210-211.

fundo, idênticos; ambas recorrem aos mesmos processos de verificação de teorias. Mas uma delas crê que se aproxima cada vez mais da realidade última e deixa atrás de si cada vez mais aparências. A outra crê que substitui (is substituting) a complexidade dos factos concretos por esquemas descritivos generalizados, próprios para operações intelectuais...Nem uma nem outra afecta o valor da física como conhecimento sistemático acerca das coisas; a possibilidade de desenvolvimento futuro da física e das suas aplicações práticas é a mesma nos dois casos. Mas a diferença filosófica (speculative) entre ambas as escolas é enorme e neste aspecto adquire importância a questão de saber qual tem razão [...]”366. Com

estas considerações, Ward, ao contrário das pessoas com tendências filosóficas “intermédias” (positivistas, humistas, machistas), soube colocar de forma clara a discussão em apreço arrancando todos os véus, diz Lénine.

Ward, diz Lénine, não deixa de identificar os pontos fracos do materialismo espontâneo das ciências da natureza – sobretudo a incapacidade deste para explicar a correlação entre a verdade relativa e absoluta – com o objectivo de atacar as teses do materialismo e de reduzir a pretensão da ciência ao conhecimento da realidade objectiva. Como a verdade relativa, aproximada, apenas “tacteia” o fundo das coisas, então, ela não pode reflectir a realidade: assim é o argumento de Ward. O fideísmo contemporâneo, culto, constata Lénine, “nem sequer pensa em exigir mais do que a declaração de que os conceitos das ciências da natureza são «hipóteses de trabalho». Nós cedemo-vos a ciência, senhores naturalistas, cedei-nos a gnosiologia, a filosofia: tal é a condição de coabitação dos teólogos e dos professores nos países capitalistas «adiantados»”367, conclui.

Também a luta contra a matéria e pelo estabelecimento da concepção do movimento separado da matéria está presente na gnosiologia de Ward que ele liga à “nova” física. “Troçando da profusão e do carácter contraditório das hipóteses”, diz Lénine, Ward pergunta: “Que é a matéria? Que é a energia?” para concluir que “não encontramos nada de definido além do movimento”368.

“O movimento dos corpos transforma-se na natureza em movimento daquilo que não é um corpo de massa constante, em movimento daquilo que é uma carga desconhecida de uma electricidade desconhecida, num éter desconhecido”369. Estas transformações das formas de movimento da matéria, esta

“dialéctica das transformações materiais”, servem aos filósofos idealistas não como confirmação da dialéctica materialista, mas como argumento contra o materialismo, diz Lénine. Para os materialistas o mundo é matéria em movimento “e as leis do movimento desta matéria são reflectidas pela mecânica quando se trata de movimentos lentos, e pela teoria electromagnética quando se trata de movimentos rápidos...”370. Lénine reafirma a concepção materialista dialéctica da progressão do conhecimento quando

Ward pretende atacar o materialismo com a decomposição do átomo371. Diz Lénine que “a destrutibilidade

366

J. Ward cit. por V. I. Lénine, ibidem, p. 210-211.

367

V. I. Lénine, ibidem, p. 212.

368

J. Ward cit. por V. I. Lénine, ibidem p. 212-213.

369

V. I. Lénine, ibidem, p. 213