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2. OS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA CONDICIONADA DE

2.1.6. Impactos do Bolsa Família

O Bolsa Família vem sendo, ao longo de seus dez anos de implementação, um dos principais objetos de estudo e análise na área de políticas sociais no Brasil. Dentre as inúmeras análises das quais tem sido alvo, aquelas que se debruçam sobre seus impactos são de especial relevância, pois permitem averiguar e, em certa medida, mensurar os efeitos do PBF nas famílias beneficiárias, como também na população em geral.

Por inserir-se no gênero de políticas sociais enquanto um PTCR, pode-se dizer que os objetivos precípuos do PBF equivalem à redução da pobreza e indigência vigentes, assim como à quebra de sua transmissão intergeracional. Sendo assim, cumpre averiguar os efeitos obtidos na queda do contingente de pobres e extremamente pobres, assim como os resultados nas áreas de educação e saúde, potencialmente derivados das condicionalidades do Programa. Ademais, há resultados atribuíveis ao Bolsa Família no que concerne à queda da desigualdade, fecundidade, entre outros.

A) Redução da pobreza e indigência

A redução do contingente populacional em condição de pobreza e extrema pobreza (ou indigência) é um dado verificável a partir de diferentes metodologias de determinação das respectivas linhas definidoras dessas condições. Um tipo de metodologia para mensurar pobres e extremamente pobres é a adotada pelo Ipeadata. Segundo esta metodologia, a linha de extrema pobreza corresponde a uma estimativa do valor de uma cesta de alimentos com o mínimo de calorias necessárias para suprir adequadamente uma pessoa, com base em recomendações da FAO (Food and Agriculture Organization – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) e da OMS (Organização Mundial de Saúde). A linha de pobreza, por sua vez, é o dobro da linha de extrema pobreza (IPEADATA, 2014b).

O gráfico 3 apresenta o número de pessoas pobres e extremamente pobres, a partir da referida metodologia. No gráfico em questão, nota-se que, a partir de 2003, há uma queda mais acentuada no contingente de pessoas pobres e também de extremamente pobres. A população sob pobreza extrema reduziu-se em 59,1%, entre 2003 e 2013. Já o contingente populacional sob pobreza apresentou queda de 51,1%, no mesmo período.

Gráfico 3

Número de pessoas pobres e extremamente pobres

Fonte: IPEADATA, 2014b.

Sob outra metodologia de mensuração do contingente de pobres e extremamente pobres, adotada pelo IBGE, a queda observada a partir de 2003 é igualmente notória, como pode ser observado no gráfico 4. Neste gráfico, apresentam-se os números de pessoas residentes em domicílios pobres e extremamente pobres, definidos a partir de critérios de renda familiar per capita: i) domicílios extremamente pobres, de R$0,00 a R$70,00 e ii) domicílios pobres, de R$70,01 a R$140,00. À semelhança do gráfico anterior, pode-se notar que a partir de 2003 o declínio no número de pobres e extremamente pobres se acentua. Entre 2003 e 2012, o número de pessoas residentes em domicílios pobres apresentou uma queda de 62,5%, enquanto o de residentes em domicílios extremamente pobres a queda correspondeu a 55,3%. 9 19 29 39 49 59 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2011 2012 2013 Milh ões de pess oas

Gráfico 4

Número de residentes em domicílios pobres e extremamente pobres

Fonte: SAGI, 2014c.

Ambas as metodologias para a obtenção das linhas de pobreza e extrema pobreza, do Ipeadata e do IBGE, empregam a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), dos respectivos anos. A diferença entre elas é importante, pois a primeira consiste em uma metodologia que privilegia a questão nutricional, enquanto a segunda considera o aspecto da renda. São, portanto, duas abordagens sobre a pobreza, embora ambas estejam sobre a perspectiva da subsistência; a primeira, do mínimo nutricional requerido para sobreviver; a segunda, do mínimo de renda requerido para adquirir o necessário para subsistir. Em ambas, contudo, a redução do contingente populacional vivendo em condição de pobreza e extrema pobreza é inconteste.

Trabalho de Souza e Osorio (2013), a partir de dados da PNAD de 2003 e 2011, comparou as características de estratos sociais definidos como extremamente pobres, pobres, vulneráveis e não pobres, categorizados pelos próprios autores para efeitos de seu estudo. Tais estratos foram classificados por renda familiar per capita, sendo os extremamente pobres aqueles que possuem renda inferior a R$70,00; os pobres, entre R$70,00 e R$140; os vulneráveis, entre R$140,00 e R$560,00; e os não pobres, renda superior a R$560,00. O estudo mostra que não apenas houve queda no contingente de pobres e extremamente pobres,

0 5 10 15 20 25 30 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2011 2012 Milh ões de pess oas

com simultâneo aumento dos não pobres, como também seu perfil mudou quando comparados os dois anos referidos. Na tabela 4 é possível observar a queda no percentual de pobres e pobres extremos, assim como o aumento dos não pobres, segundo o método aplicado pelos autores referidos. O percentual de pessoas em situação de pobreza foi o que apresentou a maior queda, equivalente a 9,6 pontos percentuais (p.p.) entre os dois anos considerados. Outro notório resultado consiste no aumento da participação das famílias brasileiras entre os não pobres, que foi de 16,2 pontos percentuais. Segundo a análise dos autores, esses resultados derivam do aumento da renda per capita brasileira no período retratado, assim como da queda da desigualdade que ocorreu no mesmo período. Ambos os processos decorrem, em diferentes medidas, da valorização real do salário mínimo, do crescimento econômico, da geração de empregos e do aumento do gasto social, principalmente através do PBF.

Tabela 4

População por estratos de renda – Brasil (2003 e 2011)

Pessoas Famílias

Estratos 2003(%) 2011(%) Variação(p.p.) 2003(%) 2011(%) Variação(p.p.)

Extremamente pobres 8,0 3,4 -4,7 5,5 2,6 -2,9

Pobres 15,9 6,3 -9,6 12,0 4,4 -7,7

Vulneráveis 50,3 49,1 -1,2 50,5 44,8 -5,6

Não pobres 25,9 41,3 15,4 32,00 48,2 16,2

Total 100,0 100,0 - 100,00 100,00 -

Fonte: SOUZA & OSORIO, 2013.

No período analisado, de acordo com os autores, a participação da renda do trabalho para os extremamente pobres decresceu e aumentou a participação das transferências, destacadamente o Bolsa Família. Esse decréscimo explica-se, primeiramente, pela própria redução dos extremamente pobres e pobres que se deslocaram para estratos mais elevados, em função tanto do crescimento do mercado de trabalho quanto da valorização do salário mínimo. Contudo, aqueles “cujas conexões com o mundo do trabalho são muito precárias” (SOUZA & OSORIO, 2013, p.145) e que não conseguiram inserir-se laboralmente, tiveram

renda assegurada pelo PBF. Assim, o Bolsa Família é um dos elementos, dentre outros (como crescimento econômico, geração de empregos, ganhos reais no salário mínimo, queda da desigualdade), que concorreu para a redução da pobreza e extrema pobreza, assim como para o aumento dos não pobres no período. Porém, ele é o principal elemento a aliviar a miséria daqueles que não conseguiram se beneficiar dos demais elementos de crescimento.

B) Perfil da população pobre e composição familiar

Ao alterar o nível de pobreza, altera-se o próprio perfil da população pobre, pois a diminuição da pobreza ocorre por meio da, e implica, modificação em seus determinantes. Deste modo, o perfil da população em pobreza e extrema pobreza apresentou importantes mudanças ao longo do período de implantação do PBF, concomitantemente ao processo de redução pelo qual tem passado.

Segundo Souza e Osorio (2013), houve aumento da participação dos segmentos mais pauperizados da população em todos os níveis de escolaridade, principalmente no ensino fundamental e médio. A própria composição familiar desses segmentos também tem se alterado, apresentando redução tanto no tamanho médio das famílias quanto no número de crianças por família, além de ter aumentado o percentual de famílias sem crianças, principalmente entre os extremamente pobres. Note-se que são os extremamente pobres que apresentam maior redução no tamanho médio das famílias, embora todos os demais estratos também apresentem diminuição nesse critério. Novamente são os extremamente pobres que detêm maior queda no número de crianças por família e no percentual de famílias com quatro crianças ou mais, bem como possuem o maior aumento percentual na participação de famílias sem crianças. Estes dados podem ser visualizados na tabela 5, que apresenta a composição familiar por estrato de renda para os dois anos (2003 e 2011) tratados no referido estudo.

Tabela 5

Composição familiar por estrato de renda – Brasil (2003 e 2011)

Estratos de renda

Tamanho médio

das famílias Crianças por família Famílias sem crianças (%) crianças ou mais (%) Famílias com 4 2003 2011 2003 2011 2003 2011 2003 2011 Extremamente pobres 5,1 4,1 2,7 1,9 10,3 21,9 27,9 13,9 Pobres 4,6 4,5 2,0 2,1 12,0 14,2 12,5 15,6 Vulneráveis 3,5 3,4 1,0 1,0 41,6 39,6 2,1 2,5 Não pobres 2,8 2,7 0,5 0,4 65,9 70,2 0,2 0,1 Total 3,5 3,1 1,0 0,8 44,1 52,8 4,2 2,2

Fonte: SOUZA & OSORIO, 2013.

C) Fecundidade

Um importante aspecto, bastante polêmico em programas como o Bolsa Família, consiste no seu desenho potencialmente pró-natalista. Alves e Cavenaghi (2013) realizam uma revisão da literatura dedicada a estudar os potenciais impactos do PBF sobre a fecundidade e, consequentemente, sobre a composição familiar. Os autores demonstram que apesar de possuir um desenho pró-natalista, pois o valor do benefício concedido aumenta na medida em que é maior o número de filhos, o PBF não aumentou a natalidade nas famílias beneficiárias. Ao contrário, mesmo nas famílias pobres a taxa de fecundidade tem decrescido (principalmente nas famílias extremamente pobres), como ocorre com as famílias de maior renda. A diferença é que a taxa de fecundidade é, ainda, mais alta nas famílias pobres, porém, passa por igual processo de redução como nas demais famílias, o que se deve ao fato de que está em curso no país um processo de transição demográfica, “que não é um fenômeno exclusivo da população rica” (ALVES & CAVENAGHI, 2013, p.237). Como ressaltam os autores, tal transição é favorecida pelo crescimento da urbanização, pelo acesso às políticas públicas de educação e saúde e pelo aumento da inclusão social. Sob estes aspectos, cabe considerar o PBF como favorecedor da queda na fecundidade e não o contrário. Assim, os

diferenciais de fecundidade tende a convergir e a se reduzir progressivamente, como tem ocorrido. O gráfico 5 mostra a trajetória da taxa de fecundidade total no Brasil, nos últimos 50 anos, de acordo com dados dos Censos Demográficos, elaborados pelo IBGE.

Gráfico 5

Taxa de fecundidade total – Brasil (1960-2010)

Fonte: ALVES & CAVENAGHI, 2013.

Na última década, a taxa de fecundidade permaneceu em trajetória declinante, assumindo, hodiernamente, um valor abaixo da taxa de reposição populacional (que é de 2,1). Em particular, no período correspondente ao funcionamento do PBF, a fecundidade declinou de 2,2 para 1,7, entre 2003 e 2014. As taxas de fecundidade referentes ao período em questão, disponibilizadas pelo IBGE, constam no gráfico 6.

Gráfico 6

Taxa de fecundidade durante a década de implantação do PBF (2003-2014)

Fonte: IBGE, 2014b. 6,3 5,8 4,4 2,9 2,4 1,9 1960 1970 1980 1991 2000 2010 2,20 2,14 2,09 2,04 1,99 1,95 1,91 1,87 1,83 1,80 1,77 1,74 0,00 0,50 1,00 1,50 2,00 2,50 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Desta forma, tem-se que o desenho pró-natalista do PBF não favoreceu um aumento da fecundidade, como muitos imaginavam. Na verdade, desde a implementação do Programa, a fecundidade tem caído tanto quanto nos demais períodos da história recente do país, refletindo um processo espontâneo de transição demográfica, presente em todas as classes sociais.

D) Saúde

Os impactos do PBF são destacados no trabalho de Jannuzzi e Pinto (2013), no qual os autores apresentam uma síntese dos principais resultados obtidos na segunda rodada da pesquisa de Avaliação de Impactos do Bolsa Família (AIBF II), realizada entre 2009 e 2012. Trata-se de uma pesquisa específica, desenhada para medir os resultados socioeconômicos atribuíveis às ações do Programa e cuja primeira rodada foi realizada em 2005.

Na área de saúde, os autores salientam, como observado na AIBF II, que o Programa implicou melhorias concretas na saúde das crianças beneficiárias, pois promoveu melhor acesso à alimentação, o que, em consequência, reduziu o patamar de desnutrição infantil. Como resultado das condicionalidades impostas, garantiu-se ainda que o calendário vacinal fosse mais regularmente observado e que o contingente de crianças acompanhadas pelo SUS crescesse progressivamente. O gráfico 7 apresenta a evolução do percentual de crianças beneficiárias acompanhadas pelo SUS e com controle de vacinação em dia, para o período de 2005 a 2013. Note-se o salto quantitativo no acompanhamento das crianças, durante o período. Como o acompanhamento da saúde infantil e o controle vacinal das crianças são condicionalidades impostas pelo PBF, seu cumprimento está diretamente relacionado à própria manutenção no Programa, o que explica, em grande medida, os expressivos resultados alcançados neste âmbito.

Estes fatores concorreram positivamente, como demonstram Rasella et al. (2013), para a diminuição da taxa de mortalidade infantil – principalmente, quando associada à causa desnutrição – entre menores de 5 anos, como também reduziu drasticamente a taxa de hospitalização em crianças nessa faixa etária.

Gráfico 7

Percentual de crianças com vacinação em dia e acompanhas pelo SUS

– condicionalidades de saúde

Fonte: CESTARI, 2014.

Ainda no que tange à saúde infantil, a AIBF II mostrou que bebês de mães beneficiárias apresentaram maior peso ao nascer que aqueles de mães não beneficiárias, 3,26kg e 3,22kg, respectivamente. Este fato, como frisam Jannuzzi e Pinto (2013, p.185), deriva em boa parte da maior realização de visitas de pré-natal (1,6 visitas a mais) das mães beneficiárias do que das não beneficiárias (em situação socioeconômica semelhante), resultado da queda de 19% para 5% das gestantes beneficiárias que não recebiam cuidados pré-natais.

E) Educação

Para a área de educação, um dos impactos do Bolsa Família, identificados pela AIBF II e apontados por Jannuzzi e Pinto (2013, p.184), compreende a maior progressão escolar, da ordem de 6 p.p., das crianças beneficiárias em relação às não beneficiárias de mesmo perfil socioeconômico. Também são destacados impactos positivos no aumento da frequência escolar das crianças beneficiárias, principalmente no Nordeste. Além disso, os autores apontam resultados do PBF sobre a diminuição da probabilidade de repetência por

3,4 43,1 51,1 62,7 68,7 69,0 71,0 73,1 73,0 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 Percentual de crianças

parte de alunos beneficiários, quando comparados a não beneficiários de mesma condição socioeconômica, tendo aqueles 11% menos chances de reprovação do que esses.

Quanto à condicionalidade de frequência escolar mínima de 85% para os menores de até 15 anos, os dados disponibilizados pela Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação (SAGI), do MDS, apontam elevado percentual das crianças beneficiárias com frequência escolar adequada, como ilustrado no gráfico 8.

Gráfico 8

Percentual de crianças, de 6 a 15, com acompanhamento de frequência escolar

– condicionalidade de educação

Fonte: SAGI, 2014d.

O gráfico 8 revela um fato que contraria (ou, no mínimo, constrange), de certa maneira, uma das justificativas das condicionalidades de educação, qual seja, a de que as crianças pobres trocariam as salas de aula por trabalhos precários como forma de complementar a renda familiar, de maneira que ter seus filhos estudando seria um grande custo de oportunidade para as famílias. Opostamente à condicionalidade de saúde – que

85 ,6 84 ,5 85,7 87 ,7 89 ,7 82 ,7 83,5 85 ,7 89 ,4 89 ,6 85 ,5 86,4 87 ,6 88,2 88,1 88,7 87 ,7 89 ,2 89 ,5 89 ,3 87 ,7 86 ,2 87,4 92 ,4 93 ,9 ma r/ 09 ma i/ 09 ju l/0 9 set /0 9 no v/ 09 ja n/ 10 m ar /1 0 ma i/ 10 ju l/1 0 set /1 0 no v/ 10 ja n/ 11 ma r/ 11 ma i/ 11 ju l/1 1 set /1 1 no v/ 11 ja n/ 12 ma r/ 12 ma i/ 12 ju l/1 2 set /1 2 no v/ 12 ja n/ 13 ma r/ 13 ma i/ 13 ju l/1 3 set /1 3 no v/ 13 Percentual de crianças

promovera um aumento superior a vinte vezes (mais de 2.000%) no controle da saúde infantil (entre 2005 e 2013) – no caso da educação, este aumento foi da ordem de 9% apenas, ao longo do período retratado. Isto porque já havia um percentual elevado de crianças pobres com taxa de frequência escolar adequada.

F) Trabalho

Jannuzzi e Pinto expõem os efeitos do Bolsa Família, identificados na AIBF II, sobre a oferta de trabalho e o mercado laboral. Segundo os autores, o PBF não provoca o “efeito preguiça” que lhe foi atribuído desde sua implantação pela crítica conservadora, de que promoveria algum tipo de desestímulo à procura de trabalho por parte dos beneficiários em idade ativa. Os resultados indicam que “os chefes de famílias beneficiárias, de 30 a 55 anos de idade, apresentam nível de atividade, ocupação e jornada muito próximos aos de chefes de nível socioeconômico equivalente” (JACCUZZI & PINTO, 2013, p. 186). Há, na verdade, como ressaltam os autores, um aumento de participação no mercado laboral para os beneficiários adultos, principalmente as mulheres. O estudo de Tavares (2008), citado pelos referidos autores, alega que ocorre não apenas o aumento da participação de mães beneficiárias do PBF no mercado laboral, mas que também este aumento é acompanhado de uma elevação da jornada trabalhada.

Portanto, o PBF não provoca qualquer tipo de enfraquecimento da oferta de trabalho, como sugere certo estigma que persegue seus beneficiários. Ao contrário, o Programa tem uma contribuição importante para o dinamismo da economia do país, pois ao transferir renda a populações pobres promove e estimula o consumo dessas populações, o que, consequentemente, fomenta o comércio e investimento, principalmente, em seu entorno, favorecendo em certo nível tanto a oferta quanto a demanda de trabalho. Isto ocorre em função da alta propensão marginal a consumir, próxima ou igual a um, característica de populações mais pobres (JACCUZZI & PINTO, 2013; KEYNES, 2012). Ademais, no caso do PBF, as transferências realizadas pelo programa são extremamente importantes para diversos municípios, principalmente os menores e mais pobres do Norte e Nordeste do país. As transferências do PBF superam, em muitos casos, os recursos correspondentes ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM), bem como de outras fontes. Foi mostrado que quanto menos desenvolvido o município, maior é a importância relativa das transferências do PBF

no nível de recursos e de atividade econômica de tais cidades (MARQUES, 2005). Estes fatos evidenciam o impacto das transferências monetárias do Bolsa Família no consumo das famílias beneficiadas, bem como na economia local.

G) Desigualdade de renda

Por fim, cabe destacar o papel do Bolsa Família no que concerne à queda da desigualdade de renda observada desde o início da década de 2000. Embora o tratamento da desigualdade não pertença aos objetivos específicos e diretos do PBF, ele acaba por inserir- se quase que naturalmente em seu contexto, pois a condição de pobreza, objeto do Programa, é uma função (dentre diversas outras) do grau de desigualdade existente. O gráfico 9 expõe a trajetória do grau de desigualdade no país, mensurado pelo Coeficiente de Gini. É possível observar no gráfico a aceleração no declínio desse coeficiente, a partir de 2003.

A importância do PBF sobre a queda da desigualdade constitui-se em um dos pontos mais pacíficos na literatura afim. Há um elevado número de trabalhos dedicados à análise da contribuição do Bolsa Família na queda da desigualdade. São destacados dois aqui. Em estudo realizado em 2010, Soares et al. já identificavam a contribuição do Programa no processo de declínio da desigualdade de renda que se desenvolvia desde o princípio da década de 2000. Segundo os autores, o PBF respondia por 16% da redução global observada no coeficiente de Gini durante a década de 2000, o que surpreende posto que o programa não atingia 0,8% da renda das famílias (2010, p.41). A relevância do PBF para a queda do grau da desigualdade de renda, medida pelo Gini, também é atestada em estudo de Hoffmann (2013). Nesse trabalho, o autor argumenta que as rendas associadas a programas sociais federais possuem razão de concentração negativa e, por isso, elevada progressividade. Dentre os programas que o autor considera em seu estudo, o Bolsa Família é o que detém a maior medida de progressividade, motivo pelo qual é o programa de transferência de caráter não contributivo que mais concorre para a redução da concentração de renda (HOFFMANN, 2013, p.209).

Gráfico 9

Evolução do grau de desigualdade – Coeficiente de Gini

Fonte: IPEADATA, 2014c.

Em síntese, ao longo de sua implementação, o PBF gerou, e tem gerado, impactos diversos em diferentes âmbitos da vida social e pessoal de seus beneficiários, mas também de outros segmentos da população. O Programa engendrou efeitos positivos nas áreas de saúde e educação, bem como no mercado laboral e no âmbito macroeconômico.