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Capitulo IV Sexualidade e saúde sexual na voz da pessoa idosa

3. Perspetivas das pessoas idosas sobre a saúde sexual e o seu lugar nos cuidados

3.2. Experiências e perceções da abordagem da saúde sexual por profissionais de saúde

3.3.5. Importâncias atribuídas à abordagem da saúde sexual

Segundo, Ports, Barnack-Tavlaris, Syme, Perera e Lafata (2014) dizem-nos que os/as médicos/as encontram-se numa posição privilegiada para abordarem questões sobre a saúde sexual: “as intervenções para os idosos devem proporcionar educação sobre comportamentos

sexuais saudáveis e de risco” (p. 907) e empoderar a pessoa idosa para que recorra aos/às

profissionais, quando pretender informações, neste âmbito.

Porém, nas valências atribuídas às abordagens da saúde sexual as pessoas idosas, em consonância com a conceptualização de saúde sexual transversal à atividade sexual, identificam, de acordo com uma dimensão biológica, o rastreio precoce e tratamento de doenças da SSR através da orientação para exames de rastreio.

(…) todos os médicos deviam fazer perguntas aos doentes, olhando para as idades, principalmente para a terceira idade (…) perguntar se eles (…) sentiam qualquer alteração na saúde (…) dos órgãos sexuais. Na próstata por exemplo, (…) está muito relacionado com (…) a sexualidade. A próstata estando inflamada o homem não se sente bem a fazer nem lhe apetece fazer sexo (H2, 78 anos)

As senhoras também é muito importante (…) fazer a mamografia que isso é o primeiro rastreio, que é o que elas devem fazer, não é? (…) fazer a papanicolau, (…) ver se as coisas estão todas em ordem se é preciso trata-la, até cedo não é preciso grande tratamento (…) (H2, 78 anos)

Ainda, e como explorado na problemática, a abordagem à saúde sexual deve ser iniciada por profissionais de saúde, pois os/as idosos/as, ao interiorizarem o preconceito que lhes está associado de assexualidade podem sentir-se inibidos a questionar os/as profissionais de saúde

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(WAS, 2008; Gott & Hichliff, 2003; Bradford & Meston, 2007) e as potenciais disfunções e problemas sexuais que tenham, imprimem danos maiores, pelo que a saúde sexual deve ser integrada na rotina dos cuidados de modo a contornar a inibição da pessoa idosa e abordar precocemente os problemas sexuais (Coleman, 2013).

Igualmente, em parte, as pessoas idosas, reconhecem, na generalidade a importância do/a profissional de saúde, principalmente da classe médica, abordar a saúde sexual, contudo ressalvam que essa abordagem deve ser justificada por uma necessidade detetada pelo/a profissional.

(…) por vezes a pessoa tem problemas a nível sexual e não o consegue exteriorizar anda ao redor da situação diz que lhe dói a cabeça diz que não dorme bem (…) mas não consegue dizer é por isto, porque é vergonha ainda não é? Quer dizer (…) parte das pessoas hoje em dia ainda têm vergonha de falar (…) na sua sexualidade, por isso às vezes a pessoa que está do outro lado (…) da secretária tem de ser perspicaz e ver que realmente a pessoa que está ali que se queixa da dor de cabeça (…) mas por trás dessas dores de cabeça (…) há uma outra coisa que ela não consegue falar não é? (…) não quer dizer que não consegue abordar, talvez por questões (…) pessoais (…) questões de educação (…) (M3, 65 anos)

Embora, constatem a importância da tomada de iniciativa por parte do/a profissional de saúde em questionar sobre a saúde sexual, não identificam que para si isso seja significativo, pois consideram-se capazes de autonomamente interpelar os/as profissionais.

(consequências de o profissional abordar a saúde sexual) depende muito das pessoas (…) eu (…) posso não sentir necessidade mas pode haver outras pessoas que sintam necessidade de ter alguém que que lhes dê apoio que lhes dê algum encaminhamento que falem sobre as coisas (M2, 61 anos).

(…) claro eu estou a falar do meu caso eu não sinto que eles [profissionais de saúde] tenham necessidade de de sei lá conversar comigo em relação a isto [saúde sexual] porque eu tenho abertura suficiente para ser eu, se eles não conversam, para ser eu a conversar (M3, 65 anos)

3.3.6. Síntese

Apesar, da identificação prioritária das especialidades de SSR, em particular pelas idosas, para expor dúvidas sobre a saúde sexual, pelo conhecimento que lhes associam, as pessoas idosas também identificam o/a médico/a de família, e por vezes, com menor relevo, o/a enfermeiro/a, mas estariam disponíveis para abordar a sua saúde sexual com qualquer destes profissionais.

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Quanto às características do profissional, segundo Ports, Barnack-Tavlaris, Syme, Perera e Lafata (2014), a similaridade entre géneros e idade dos/as idosos/as e dos/as profissionais, tornaria os primeiros mais disponíveis para envolverem-se num diálogo sobre a sua saúde sexual como os últimos; porém as pessoas idosas, na generalidade, não consideram que estas características dos/as profissionais tivessem alguma influência na sua disponibilidade para abordar a saúde sexual.

Enquanto, alguns/mas idosos/as identificam como pertinente que profissionais interpelem acerca da saúde sexual, em conjunto, com o/a parceiro/a, por considerarem que os problemas sexuais, mesmo que particular a um parceiro/a, afetam o casal. Outras pessoas idosas, identificam os homens como menos recetivos a esta abordagem conjugal, provavelmente porque mais do que exporem o problema sexual, põe em dúvida a sua capacidade sexual e por consequência o que ela ajuda a definir: a sua masculinidade e domínio.

Relembramos que segundo as diretrizes internacionais: WAS (2008), e outros/as autores/as: Gott e Hichliff (2003), Bradford e Meston (2007) os/as profissionais devem tomar a iniciativa de questionar sobre a saúde sexual do/a utente. Algumas pessoas idosas reconheceram a importância do/a profissional de saúde tomar a iniciativa de abordar a saúde sexual, sempre numa dimensão biológica, por existirem utentes que tenham vergonha, outras não. A educação pode ser um ponto chave: a máxima “públicas virtudes vícios privados” (Aboim, 2013, p. 11), pode ainda marcar uma presença que iniba a exposição pela pessoa idosa da sua sexualidade, afinal não será expectável, para este grupo etário que nem sexualidade tenha, quanto mais que dialogue sobre esta.

3.4. Conclusões

O conceito de saúde sexual, pela voz das pessoas idosas, aproxima-se do que os/as mesmos/as construíram sobre sexualidade, e portanto, do contexto histórico em que cresceram (estado novo), sendo que ser sexualmente ativo, foi mencionado por homens e mulheres, porém estas últimas alargaram a sua conceptualização ao bem-estar físico e mental e ao toque.

As pessoas idosas não identificam como necessário abordarem a sua saúde sexual com os/as profissionais de saúde, talvez pela incorporação da crença social de assexualidade (Gott & Hinchliff, 2003), ou pelo desconhecimento das potencialidades dos cuidados de saúde (Espanha, 2013). E ainda pela possível interiorização dos valores do estado novo: ser homem era ser viril e ser mulher era autorreprimir o desejo e prazer sexual, que estariam em risco se o idoso ou a idosa, respetivamente, interpelassem profissionais (outros) sobre a sua sexualidade. Porventura, advindo dessas mesmas influências, a mulher experiencie diálogos sobre a saúde

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sexual, em torno da sexualidade do companheiro, pois só assim legitima o seu interesse pela atividade sexual, e o homem idoso seja reticente quanto a uma abordagem conjugal da saúde sexual, sugerida pela literatura, pois implicaria reconhecer perante a companheira a sua perda de domínio (experiência sexual).

Uma outra linha orientadora é traçada por Sadovsky e Nusbaum (2006) que sugerem que os diálogos sobre saúde sexual tenham início nos cuidados primários e WAS (2008) sejam iniciados pelos/as profissionais de saúde, as pessoas idosas, mesmo não constatando para si a pertinência, mostraram-se disponíveis para conversar sobre a sua saúde sexual, numa aparente contradição.

Um outro momento de provável contradição percebemos quando, apesar da literatura indicar que, a proximidade de idade e género com os/as profissionais torna os/as idosos mais disponíveis para abordarem a sua saúde sexual (Ports, Barnack-Tavlaris, Syme, Perera & Lafata, 2014) e das próprias pessoas idosas identificarem os mais jovens como mais inexperientes, estas acabam por constatar que dialogariam sobre a sua sexualidade independentemente do género e idade do/a profissional. O que pode parecer contraditório principalmente para os idosos (as idosas têm maior experiência de conversas sobre SSR, pelo/a ginecologista), quando a virilidade poderá estar em causa, que exponha a mesma perda a uma profissional de saúde (mulher).

A permissividade demonstrada quanto à iniciativa do/a profissional e ao seu género e idade, numa aparente construção de diálogos contraditórios por parte dos/as entrevistados, é possível que tenha resultado das características da entrevistadora, na interação com a mesmas:

“[p]ensando nas subjetividades como fragmentadas e formadas de diferentes modos, dependendo dos discursos disponíveis então sugere que a idade e o género (neste caso) são realizados nas entrevistas, e o que significa ser velho/novo e homem/rapariga não tem um significado inequívoco na investigação”42 (Sandberg, 2011, p. 92). Estas questões relativas ao

diálogo com o profissional de saúde não pareceram antes ter sido refletidas pelo/a idoso/a, pelo que a juventude da entrevistadora, em conjunto com o ser mulher e enfermeira, poderá ter encaminhado, com maior intensidade, para a aceitação de conversar sobre sexualidade com alguém jovem, profissional de saúde e mulher.

Por fim, percebe-se que as experiências de abordagens sobre saúde sexual pelas vozes das pessoas idosas, centram-se numa dimensão biológica (modelo biomédico), com orientação para

42 Traduzido do original “Thinking of subjectivities as fragmented and shaped in different ways depending on

available discourses then suggests that age and gender (in this case) are also accomplished in the interviews, and what it means to be old/young and man/girl does not have one unequivocal meaning in the research.”

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rastreios, quando não lhes são negadas, o que resulta na violação de direitos sexuais, como “a

procurar, receber e transmitir informações relacionadas com a sexualidade” (WHO, 2006, p.

5), e que poderá estar na base das crenças erróneas sobre ITS’s e VIH-SIDA, em alguns idosos, com a consequente hipótese de adoção de comportamentos de risco.

Dialogar sobre sexualidade implica reconhece-la ao/à idoso/a e na sua abrangência sabendo que: “[a] sexualidade e o comportamento sexual fazem-se em interação entre o individuo e o

meio; aqui, a cultura, a educação, a classe e estatuto social, a etnia definem uma identidade entre sexo e género, o que está e mal, de acordo com as normais sociais” (Campos, 2007, p.

286), de forma a dar resposta às interpretações erróneas que as pessoas idosas formulam em torno das IST’s e HIV-SIDA.

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Capitulo V - Considerações finais