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Perspetivas dos/as idosos/as sobre as vivências da sexualidade pelas juventudes

Capitulo IV Sexualidade e saúde sexual na voz da pessoa idosa

2. Influências na gestão e vivências da sexualidade pela pessoa idosa

2.4. Perspetivas dos/as idosos/as sobre as vivências da sexualidade pelas juventudes

Os autores Bradford e Meston (2007) alertam-nos para as diferenças geracionais nas atitudes e formas de gestão e vivência da sexualidade, que devem acompanhar as abordagens à saúde sexual, as quais iremos explorar; tal como nos diz também M3, jovens e idosos assumem diferentes perspetivas.

idade ajuda-nos a compreender muitas coisas e a viver as coisas muitas vezes de maneira diferente (M3, 65 anos)

Pretendemos, nesta secção, explorar as perceções da pessoa idosa sobres as vivências e gestão da sexualidade das juventudes contemporâneas, e as diferenças que reconhecem entre esta e a expressão da sexualidade por si e pelos seus pares.

2.4.1. Importâncias atribuídas às emoções e à atividade sexual

As vivências sexuais para M1, à semelhança das conceptualizações de sexualidade, já descritas pelas idosas, centram-se na afetividade, no amor, e só depois no ato sexual, estas prioridades M1, apenas atribui à sua geração.

(…) a vida sexual deveria ter como suporte a vida afetiva com os afetos bem construídos tudo é possível (…) na atividade sexual (…) Eu sou uma pessoa apesar de tudo tradicional e que ainda continua a achar que a base (…) da vida sexual, da atividade sexual, tem muito a ver com os afetos, tem a ver com amizades bem construídas, amores bem construídos (…)

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Porque sexo por sexo para mim é pobre (….) vai passando, pode passar, mas sexo com amor nunca passa portanto eu sou dessa geração (…) (M1, 61 anos)

A M5 desenha uma mulher jovem que além de desvalorizar a virgindade, tem um inicio precoce da atividade sexual, demonstra “demasiado” os afetos em público e deixa de ser casadas para a vida., desvinculando-se dos valores socias da mulher jovem ideal, da época da sua juventude,

Acho que há liberdade a mais acho que as mulheres neste momento têm pouco recato (…) ter sexo é normal e tudo isso, mas acho que há uma idade para se começar e acho que devia haver um pouquinho mais de pudor não ficava nada mal. (M5, 77 anos)

(…) aqui eu vejo todos os dias moças abraçadas aos rapazes (…) acho que um pouquinho mais de cuidado, mais de pudor é melhor (…) o que atrás era demasiado acho que agora está demasiado também (…) por exemplo nós casávamos era para toda a vida. Hoje as mulheres não pensam assim (…) (M5,77anos)

As diferenças geracionais percebidas pelas pessoas idosas nas importâncias atribuídas ao amor e sexo, podemos encontrar refletidas no estudo de Neto (2012), são os/as idosos/as (60 – 90 anos), em relação aos/as adultos/às jovens (18 – 30 anos) e aos/às adultos/as (31 – 59) que, com diferenças estatisticamente significativas, colocam, na maioria, o amor como a condição que conduz ao sexo: “[p]ara este grupo de idosos, o amor enquanto entidade primária é o mais

importante, do que para os outros grupos etários”33 (p. 772)

Porém os discursos de M1 e M5 não se afastam muito dos discursos da investigação de Dias, Machado e Gonçalves (2012), que analisaram os discursos em torno da mulher, em revistas datas de 1965 a 2006, e onde verificaram que uma “(…) permanente associação entre sexo e

afetos é igualmente enfatizada nas revistas juvenis, colocando o amor como o contexto mais apropriado ou desejável, como se o amor fosse a “desculpa” para se envolver em relações sexuais sem perder o respeito próprio e social”34 de forma a (p. 9) mais acrescentam que a mulher continua a ser responsabilizada pelo bem-estar/sucesso da relação amorosa e sexual, devendo regular os seus comportamentos e os do parceiro.

Por outro lado, a desmarcação que M1 e M5, principalmente esta última, fazem de si e da sua geração de uma vivência da sexualidade centrada no ato sexual, para o que era considerado socialmente aceitável para a época em que cresceu, identificada como conservadora pela sociedade portuguesa contemporânea e cujos valores julgamos que eram vigentes.

33Traduzido do original “For this elderly group, love as the primary entity is more important than for the other

age groups”

34 Traduzido do original “(…) the permanent association between sex and affect is also stressed in adolescent magazines, placing love as the appropriate or more desirable context for sex, as though love were the “excuse” to engage in sex without losing self and social respect”

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Além das discrepâncias na priorização do amor e sexo, percebemos, pelo discurso de M5, que a juventude feminina atual transita para uma vivência da sexualidade desvinculada dos valores supremos da virgindade.

(…) enquanto a minha mãe dizia-me “as raparigas têm que casar virgens, não deixes o teu marido tocar-te.” (…) a minha filha soube muito mais nova o que havia de fazer e o que não havia de fazer (…) que ter relações demasiado cedo o corpo não está preparado (…) ficou com a mente mais aberta (…) do que nós raparigas da minha idade era escondido era vergonha (…) (M5, 77 anos)

Atualmente, há uma alteração, segundo Aboim (2013) dos valores que representam a virgindade, com as mulheres jovens a admitirem a primeira relação sexual fora do casamento, e as mais velhas a manterem a imagem da época em que cresceram: circunscrita ao casamento, mesmo que por vezes possa não ser a correspondente à realidade, afinal contextos menos favorecidos permitiam aos jovens expressar a sua sexualidade de forma mais livre, quando iam e vinham do trabalho, com Portugal a ter o maior número de crianças ilegítimas nos anos 50. Já para M3 a importância atribuída pelos jovens à experiência da relação em detrimento de outras demonstrações de afeto é justificada pela ausência de tempo.

(…) é mais importante as caricias todo o envolvente, porque nesta idade acho que (…) o ato sexual é mais um complemento, enquanto nos jovens pronto o ato sexual tem (…) muito valor (…) a relação praticamente baseia-se nisso porque também as pessoas trabalham e correm e praticamente não têm disposição e (…) na nossa idade há muito mais tranquilidade há muito mais sossego (…) (M3, 65 anos)

Sobre o aumento de tempo disponível, pela desobrigação de vinculação a uma profissão, que Cabral, Ferreira, Silva, Jerónimo e Marques (2013), nos dizem acompanhar a reforma, M3, mostra-nos que esta disponibilidade permite a descoberta e exploração de diferentes formas de gerir e viver a sexualidade, e em simultâneo desvaloriza, de novo, o ato sexual, colocando-o como a vivência primária da sexualidade.

Por fim, os homens idosos não corroboraram nem enumeraram diferenças geracionais na vivência da sexualidade, contrariamente às mulheres, talvez, porque foram “elas quem, afinal,

mais mudou o seu comportamento – e/ou os seus discursos – em matéria de sexo, representando talvez uma das mais relevantes viragens no campo da sexualidade” (Aboim, 2013, pp. 52-53).

2.4.2. Síntese

Percebemos, nesta secção, que numa geração, como a entrevistada, que cresceu antes do 25 de abril, quando pedido que se expresse sobre as juventudes contemporâneas, quanto à forma de

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estas gerirem a experienciarem a sua sexualidade é notória a maior expressão das mulheres sobre mulheres.

Apesar de poderem ser reflexo da manutenção destes discursos na sociedade portuguesa contemporânea, como vemos nos mídia, nas revistas do estudo de Dias, Machado & Gonçalves (2012), onde a mulher “com boa conduta” ainda é associada ao decoro, com a relação sexual a ser concebível só no amor, e que as mulheres entrevistadas identificam como ausentes nas juventudes contemporâneas; também esta diferença pode refletir uma necessidade por parte das entrevistadas de se distanciarem dos comportamentos sexuais das juventudes contemporâneas, apesar de, como o diz Aboim (2013) não ser atípico ser mãe solteira ou ter mais do que um companheiro, durante o estado novo, mas na tentativa de manter o decoro, muitas mulheres não relacionam, à sua geração, estes ou outros comportamentos desviantes da moral sexual, tornando as vozes femininas as mais criticas das atuais jovens mulheres.

Nestes discursos sobre as juventudes contemporâneas, os homens entrevistados não identificaram diferenças, talvez por contrariamente às mulheres identificarem-se mais com as vivências da sexualidade das juventudes do agora.

Todavia, é possível perceber diferenças geracionais nas vivências e gestão da sexualidade na voz das idosas, alertando para a pertinência de profissionais de saúde abordarem a sexualidade com a pessoa idosa, em particular a mulher, considerando que esta tem uma perceção da expressão da sexualidade diferente da das juventudes atuais, pelo menos na sua própria perspetiva.

2.5. Papel da educação e dos meios de comunicação e informação na gestão e vivência