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O JOGADOR “ÍDOLO” COMO REFERÊNCIA DO TIME PARA A TORCIDA

5 O QUE LEVOU A ASSISTÊNCIA A VIRAR TORCIDA?

5.7 O JOGADOR “ÍDOLO” COMO REFERÊNCIA DO TIME PARA A TORCIDA

Na era da torcida, os jogadores mais destacados são chamados de ídolos. A torcida os festeja nos momentos de conquista de título e grandes vitórias. O mérito é registrado nos jornais pela qualidade no trato com a bola e participação decisiva na definição do placar dos jogos. O “ídolo” é o jogador que tem seu desempenho elogiado, como Teotônio, “cuja atuação merece registro”272

e André, que “tocou com categoria, com raça, com amor e saiu correndo em direção a sua torcida”273

. O ídolo torna-se o jogador-referência, como no “onze de Bengalinha”.274

, ou seja, o time que tem como destaque o ídolo Bengalinha. O mesmo se verifica com “Cacetão, como sempre a máquina do time”.275

A expectativa por ser festejado é grande também entre os jogadores, que são conscientes do que representam para os torcedores. Depois de uma vitória sobre o Bahia, em uma série decisiva, o jogador Mário Sérgio anunciava, antes do Ba-Vi seguinte, ainda nos vestiários da Fonte Nova: “Se o Vitória vencer o jogo, vou dar todo meu material. Vou sair de campo de sunga. Só não saio nu porque complica276.

Ao entusiasmo pelas cores do clube junta-se a idolatria a jogadores que se destacam, como o argentino Bianchi: “...A Bahia jamais assistiu figura tão impressionante na sua posição”277

. Por outro lado, a condição de ídolo reforça de tal forma o capital simbólico do atleta que, em situações de confronto com a diretoria do clube ou qualquer outra situação de antagonismo dentro do ambiente do futebol, ele ganha mais visibilidade para sua reivindicação, como no caso da primeira greve, e provavelmente a única de jogadores de futebol envolvendo o clássico Ba-Vi: “A linha média portenha do tricolor (Papete, Bianchi e Avale) não compareceu, siquer, ao campo. A causa disso, segundo nos declarou pessoa digna de credito, foi terem os jogadores exigido pagamento de suas mensalidades”.278

272 E.C. Vitória, campeão. A Tarde, Salvador, 17 mar. 1958. 273

UM campeão, Tribuna da Bahia, Salvador, 18 dez. 1972

274

E.C. Bahia campeão virtual de 1958. A Tarde, Salvador. 20 out 1958.

275 VENCEU o Bahia o grande clássico. A Tarde, Salvador, 12 set. 1945.

276 O Vitória nem ligou para a retranca do Bahia.Tribuna da Bahia, Salvador. 11 dez. 1972 277

O Bahia “leader” absoluto do campeonato da cidade. Diário de Notícias, Salvador. 23 set 1940.

278 O treino de ontem na Graça. A Tarde, Salvador, 13 jan. 1941. Os jogadores argentinos são pioneiros na

Com o advento da fotografia, os “cracks” passam a ter suas imagens divulgadas.279 Mostrar a imagem do jogador favoreceu a cristalização da ideia de ídolo, pois o atleta tornava-se mais divulgado, por mérito. O torcedor passou a ter a oportunidade de guardar a página impressa onde vê estampada, quantas vezes quiser, a foto de seu ídolo em ação. Esta divulgação é valorizada pelas legendas, como são chamadas pelos jornalistas as frases de identificação do sujeito e da ação, aplicadas, geralmente, em uma linha situada sob a imagem: “Foto de Pipíu, cuja presença no cotêjo de hoje é duvidosa”.280

São publicadas fotografias do time composto da seguinte forma: seis jogadores em pé, atrás; e cinco jogadores, agachados, à frente, como no exemplo das fotos assim legendadas: “O quadro do Vitória, que enfrentará o Bahia, no maior prélio do campeonato local; O esquadrão principal do Bahia, que à exceção de Curto, enfrentará o rubro-negro hoje”281

.

As fotos de lances de área que ajudam a definir o jogo, até hoje as mais valorizadas no fotojornalismo esportivo, passam a constituir um diferencial importante para a edição, refletindo no sentimento de admiração que constitui motivo para a idolatria de um jogador por parte de seu torcedor, como no caso do goleiro Leça: “um baluarte, anulando o ataque do Vitória... aparece o “magriço abusado” numa defesa alta cercado por gregos e troianos”.282

Na era da torcida, a noção de “association”, base da origem do futebol, é superada pelo destaque individual. No ponto de ruptura „ídolo‟, a qualidade coletiva do grupo de jogadores, o que se entende por „time‟, fica em segundo plano em relação ao indíviduo, aquele que se destaca. De tal forma é reverenciado o ídolo que, mesmo após encerrar a carreira, mantém a aura, como no caso do jogador Bahiano, alvo de “uma expressiva homenagem como reconhecimento pela dedicação com que o veterano zagueiro sempre defendeu as cores do Esquadrão de Aço”.283

Gravemente lesionado, o ídolo é festejado como herói. É o caso de Carlinhos, que “fraturou a perna, surgiu no gramado antes do jogo e foi até a torcida do Vitória onde foi muito aplaudido”284

. Entre os ídolos, destacam-se os artilheiros, como são chamados, em

atletas profissionais organizam greves para exigir pagamento de dívidas dos clubes e mais segurança nos estádios.

279O texto „O clássico n.1 do futebol baiano‟, publicado em A Tarde, edição de 30/7/1942, é ilustrado com foto

da “parelha de „backs‟ dos “Leões da Barra” (sic).

280BAHIA x Vitória – o clássico que empolga! Tricolores e rubronegros realizando hoje à noite sensacional

confronto na cancha da Graça. A Tarde, Salvador, 1 jun 1944

281ABATENDO o Bahia por 3x0, o Vitória deixou o Guarani e Ipiranga em privilegiada situação. A Tarde,

Salvador, 13 jun 1946.

282SUCESSO tricolor no grande “clássico”. A Tarde, Salvador. 12 mai 1947.

283BAHIA x Vitória – o clássico que empolga! Tricolores e rubronegros realizando hoje à noite sensacional

confronto na cancha da Graça. A Tarde, Salvador, 1 jun. 1944

metáfora com a função militar, os jogadores responsáveis por concluir o lance ofensivo. Os artilheiros constituem categoria especial de ídolos, pois são eles que marcam os gols: “A torcida tricolor voltou a vibrar e Leo de braços abertos comemorou tradicionalmente a marcação de “seu tento”285

. Os gols são anotados pelo jogador que conclui o lance, dando vez à ideia de autoria, superando a noção anterior de uma ação coletiva e que não tinha assinatura, pois se entendia que o conjunto marcava o tento e não quem tocou a bola por último antes de ir às redes. Surgem as fichas técnicas, primeiro com o nome de “detalhes técnicos”286, informando os nomes dos jogadores, em separado ao texto da crônica do jogo. Na ficha, destacam-se os autores dos gols, uma ferramenta de edição inexistente no período de assistência, quando sequer as escalações completas eram divulgadas.

285 ENCERRANDO returno Bahia derrotou Vitória por 2x0. A Tarde, Salvador, 27 dez. 1960. 286 QUEBROU o Vitória a invencibilidade do E.C. Bahia. A Tarde, Salvador, 22 set. 1952.