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Foi durante o regime militar que o jornalismo econômico sofreu mudanças que o colocaram entre as editorias de grande prestígio no corpo do jornal, mais notadamente o impresso. Park (2016) destaca que, apesar de ter iniciado no governo de Juscelino Kubitschek, o jornalismo econômico no Brasil só se consolida na década de 70. Até os anos 50, as informações de economia não tinham um espaço fixo e as notícias eram especialmente sobre os portos e a produção do café (PARK, 2016). De acordo com o autor, a origem das notícias eram as agências de informação estrangeiras, as câmaras de comércio e o Ministério da Fazenda.

Park (2016) ainda destaca que o primeiro informativo de economia do Brasil foi lançado pelo jornal O Estado de São Paulo em 1949. Por volta de 1950, a Folha de São Paulo e o carioca “Última Hora” começam a ter jornalistas e colunistas especializados na temática econômica

(PARK, 2016). Esse movimento, influenciado pela instalação de empresas estrangeiras no País, dão dinamismo ao jornalismo econômico, que vai passando de exclusivamente analítico para mais factual (PARK, 2016).

O destaque à economia dada pelos militares na direção do país e o alcance do “milagre econômico” são os maiores responsáveis pela ascensão do jornalismo de economia. Neste sentido, Lene (2009) destaca o papel dado aos economistas durante o regime militar. Símbolo da eficiência e da cientificidade, os militares dispuseram a direção de órgãos voltados para políticas públicas e estratégias de desenvolvimento do país para economistas que agiam como verdadeiros políticos, mais não passavam pelo mesmo crivo de obrigações e prestações de contas a um partido ou eleitores. O controle centralizado do país e de sua economia pelo poder executivo e a necessidade legitimar o poder autoritário através da eficiência econômica fizeram com que economistas fossem escolhidos para diversos postos do governo militar (LENE, 2009; ABREU, 2003).

Os jornais também foram afetados pela intensa valorização da economia dessa época e o assunto, que geralmente era tratado em pouco mais de uma página, passou a tomar conta de uma média de seis páginas e meia, de acordo com pesquisa realizada por Kucinsk (2000), trazida por Lene (2009). Dessa maneira, o modelo econômico instaurado pelo regime militar foi de grande importância para o surgimento de diversos boletins e revistas especializados em economia (LENE, 2009).

Diante da influência da forma de governo nas raízes e desenvolvimento do jornalismo econômico, Abreu (2003) busca traçar a forma como o gênero reagiu e afetou as mudanças políticas ocorridas no processo de redemocratização do país. Importante destacar que, de acordo com a autora, antes da ascensão dos militares ao poder, os grandes jornais alertavam sobre os perigos das estatizações na economia, o que foi momentaneamente desconsiderado diante “ameaça comunista que representava” João Goulart e seus planos de reforma (p. 24).

Os governantes viam no jornalismo econômico instrumento de divulgação da política econômica e das conquistas e avanços que o governo havia alcançado, já que a área econômica era a sua principal legitimadora. Apesar da censura aos meios de comunicação, os militares viam pouco perigo nas editorias e publicações de economia, já que essas eram voltadas para públicos mais seletos e as maiores fontes de informações eram do setor público (ABREU, 2003).

Portanto, a conjuntura de governo do regime militar nos anos de 1960 foi importante fator na gênese e desenvolvimento do jornalismo de economia no Brasil, conforme ressalta o estudo de Abreu (2003):

As editorias de economia dos jornais rapidamente obtiveram grande espaço e prestígio, sendo nelas introduzidas inovações que em seguida se estenderam a toda a redação. Os proprietários, ante as pressões da censura e a apreensão dos jornais pela polícia, resolveram substituir o noticiário político pelo econômico ou por notícias internacionais. Foi o momento de profissionalização tanto das empresas quanto dos jornalistas. Outros empresários perceberam que a conjuntura permitia a entrada no mercado de veículos de comunicação especializados em economia e dirigidos a um público de tomadores de decisão, tecnocratas e formadores de opinião. (p. 26). Entretanto, apesar de fortemente financiados pelo governo militar (por meio da publicidade) e terem apoiado a intervenção dos generais no governo em 1964, os grandes jornais da época – a saber, O Estado de São Paulo, Folha de S. Paulo, Jornal do Brasil, Gazeta Mercantil e O Globo – utilizaram de suas editorias de economia, antes mesmo da ação dos empresários, para criticar o modelo centralizador e estatista de economia adotado pelos militares. Park (2016) explica que, como as críticas não poderiam ser feitas de forma direta, criticar a conjuntura econômica foi a saída encontrada pelos jornalistas para fazer considerações sobre o governo.

Durante o período militar, a cobertura econômica era marcada por intensa pessoalidade, em que as fontes, além de serem oficiais, tinham predileções quanto aos jornalistas com quem decidiam e aceitavam falar (ABREU, 2003). A relação entre os ministros da Fazenda na época do “milagre econômico”, Roberto Campos (1964-1967) e Delfim Netto (1967-1074), com a imprensa assegurou a imagem positiva da economia brasileira nos jornais, através de controle centralizador, das assessorias de imprensa dos ministérios e órgãos governamentais da área econômica e da estratégia de comunicação integradora aplicada à época (PULITI, 2009; ABREU, 2003).

Sobre isso, Park (2016) ressalta que a “aproximação de uma parte da mídia ao governo militar, a autocensura e a censura forçada provocaram a diminuição de assuntos políticos nas páginas dos periódicos, em contrapartida, os espaços dedicados aos artigos sobre economia cresceram” (p.82). A cobertura econômica, de acordo com o autor, valorizava as decisões do regime e desnacionalização da economia, sendo que, foi utilizada para incentivar as negociações no mercado financeiro e a abertura de capital das empresas familiares (PARK, 2016).

O jornalismo econômico, em sua fase inicial, passou pelo obstáculo da falta de conhecimento da área econômica por parte dos jornalistas que, muitas vezes, serviam apenas

como transmissores das informações obtidas com os tecnocratas. Isto se justifica pela falta de interesse das fontes em explicar os termos, mas também pela própria natureza da matéria econômica – voltada para um público já familiarizado com os termos e de conteúdo recheado pelos dados numéricos e estatísticos. (ABREU, 2003).

Dessa forma, o crescimento do jornalismo de economia no Brasil no início do regime militar é caracterizado, principalmente, por sua dependência de fontes reduzidas e controladas pelo governo, sem contar com espaço para órgãos representativos dos trabalhadores (ABREU, 2003). Sobre as fontes do jornalismo econômico nesta época, Puliti (2009) se refere a Quintão (1987) e define três tipos: autoridades, como Ministério da Fazenda, Banco Central, BNDE – o próprio ministro Delfim Netto costumava se encontrar com editores de economia às segundas- feiras –, os empresários representados por corporações empresariais; e os economistas ligados à academia.

Os jornalistas engajados politicamente, portanto, estiveram numa situação em que, ao mesmo tempo em que buscavam preservar certa autonomia, também tinham que pensar em manter condições para exercer a profissão. Neste contexto, a profissionalização do jornalismo chegou para responder às necessidades do repórter que devia sempre contar com as informações mais corretas possíveis para publicarem material que, porventura, fosse contra as decisões econômicas do governo no ambiente de falta de liberdade de expressão vigente (ABREU, 2003).

No contexto de abertura política iniciada com o governo de Ernesto Geisel, em 1974, e de deterioração do milagre econômico a partir de 1973, o jornalismo econômico passou por uma fase de expansão no espaço dentro das publicações e nas inovações aplicadas. Nesta época, as reportagens investigativas, debates que resultavam em críticas ao modelo econômico e à desigualdade e a introdução da linguagem jornalística foram inseridas na cobertura econômica. Os jornais, tanto os tradicionais como os alternativos, passaram a ser cada vez mais críticos ao modelo econômico instaurado pelos militares (ABREU, 2003).

Esta nova postura teve grande justificativa na conjuntura econômica e política do Brasil. Em busca do processo de abertura lento, gradual e seguro proposto pelos militares, a liberalização da imprensa era importante instrumento de legitimidade política ao projeto de redemocratização. Além disso, a desaceleração do crescimento, a crise do petróleo de 1973 e o advento de um processo inflacionário fizeram com que os temas mais técnicos dessem lugar a questões de maior impacto social. Neste quadro de mudanças de temas, a Associação dos Jornalistas de Economia e Finanças, depois de alteração na direção interna, passou a

desempenhar papel de fornecedora de informações, com a realização de seminários, debates e cursos sobre os temas mais teóricos e menos tecnicistas (ABREU, 2003).

Além das mudanças de temas da mídia econômica, a relação entre o jornalismo e os ministros da Fazenda e do Planejamento de Geisel, Henrique Simonsen e João Paulo dos Reis Veloso, mais abertos às críticas, foi importante para a mudança de postura do jornalismo econômico, que, por meio de suas matérias, também teciam avaliações a respeito do modelo político vigente. Empresários, antes constrangidos de emitirem opiniões contrárias ao regime, também mudam de comportamento e passaram a, além de se tornarem fontes da mídia econômica, usá-las em seu benefício para influenciar a cultura econômica nacionalizante e centralizadora (ABREU, 2003).

Pode-se dizer, portanto, que, neste período, a imprensa econômica passou de grande publicador de ações e conquistas do governo para um de seus principais analistas e repreensores. Este combate, no entanto, não era generalizado, já que, dentro do grupo dos militares, existiam aqueles que eram favoráveis à abertura política e econômica e utilizaram da imprensa para enfraquecer um grupo mais radical quanto à estatização da economia.

3.2 Jornalismo econômico no período democrático – pacotes econômicos,