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res de Alexandre, especialmente de Antíoco IV Epifanes, se manifestaram com de-

IV. Judeus Convertidos

O grande pregador escreve acerca de alguns Judeus convertidos: E nos tempos mais modernos, houve sempre varões insignes assi- naladíssimos em virtude e acérrimos defensores da Fé de Jesus Cristo, como foram Santo Helião19, arcebispo de Toledo, escritor nobilíssimo espanhol; Miguel Adão, alemão; Nicolau de Lira, in- glês20; Paulo Herédio, Pedro Afonso, inimigos declarados dos erros da sua nação e zeladores da Fé de Jesus Cristo; Paulo Burgense, D. Afonso de Cartagena, e outros muitos que refere Eusébio, a quem elogiou o padre frei Jerónimo, escritor gravíssimo e venerado em todas as virtudes21.

É também conforme à sentença comum de todos os teólogos, os quais assentam que, para defesa e conservação dos reinos, podem os prín- cipes confederar-se e chamar e unir a si qualquer género de infiéis.

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Não menciona São Clemente, romano, de origem hebraica, que é o autor da Epís- tola de Clemente Romano (segundo Clemente de Alexandria e Orígenes), o pri- meiro documento de literatura cristã, endereçada à Igreja de Corinto, em que de- fende primazia da sé de Roma; pede para que recebam os bispos que tinham sido expulsos injustamente dizendo: «Se algum homem desobedecer às palavras que Deus pronunciou através de nós (plural majestático), saibam que esse tal terá co- metido uma grave transgressão, e se terá posto em grave perigo”. E S. Clemente incita então os Coríntios a “obedecer às coisas escritas por nós através do Espírito Santo» (São Clemente, Epístola aos Coríntios, Ep. 59). «Um Deus, um Cristo, um Espírito de graça» (Carta aos Coríntios 46, 6; «Como Deus vive, assim vive o Se- nhor e o Espírito Santo» (Carta aos Coríntios 58, 2.).

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Em vez de Julião de Toledo (642-690).

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Era francês e não inglês.

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Aproveitamos esta afirmação para identificar algumas das personali- dades referidas por Vieira.

1. ALFONSO DE Cartagena (Burgos, 1384 – Villasandino, 1456), que foi bispo de Burgos, escreveu obras sobre história, moral e outros temas. Contam-se ainda um comentário ao Salmo “Judica me, Deus” e o famoso Defensorium fidei, também chamado Defensorium unitatis chris- tianae (1449-50), que é um texto em defesa dos Judeus convertidos.

2. Julian of Toledo (642-690), nasceu de uma família judia em Tole- do. Discípulo de Santo Eugénio II e arcebispo de Toledo, foi o primeiro prelado a ter a primazia sobre toda a Península Ibérica, posição que asse- gurou por ter sido envolvido no envenenamento de Wamba, rei dos Visi- godos.

Presidiu a vários concílios e fez a revisão da liturgia moçárabe. Foi um escritor diversificado. Encorajou os reis visigodos a agirem duramen- te contra os Judeus. Por exemplo, ao presidir ao 12.º concílio de Toledo, induziu o rei Erwig a promulgar várias leis anti-judaicas. A pedido de Erwig, em 686, escreveu De Comprobatione Aetatis Sextae Contra Judaeos, em que trata das profecias messiânicas da Bíblia para converter os Judeus.

3. Nicolau de Lira (Vieille-Lyre, Evreux, Normandia, ca. 1270 – Outubro de 1349), ou Nicolaus Lyranus22, talvez de origem judaica, um mestre franciscano situado entre os mais importantes biblistas da Idade Média. As suas obras principais são: Postilla litteralis et perpetuae in universam S. Scripturam, o primeiro grande comentário à Bíblia (Postilla litteralis super totam Bibliam (1322-1331), que ele completou com Postilla moralis. Utilizou os textos hebraicos e serviu-se de comentários de Rashi (Rabbi Salomon Iarchi ou Ischaki de Troyes, 1040-1105). A Postilla litteralis encontrou grande eco por toda a parte e foi traduzida para castelhano, catalão e alemão. Em 1429-1431 elaborou o bispo de Burgos, Pablo de Santa María, 1100 críticas Additiones ad postillam Nicolai de Lyra super Biblia, que geraram uma grande polémica. A Postilla litteralis et moralis in Vetus et Novum Testamentum foi impressa em Roma em 1471-72, depois em Estrasburgo, em 1492 (reed., Frank- furt/Main, 1971). E com a Glossa ordinaria (desde a edição de Veneza, 1495, até à de Antuérpia, 1634). O dito «Si Lyra non lyrasset, Lutherus non saltaste» testemunha a forte influência sobre a exegese da Reforma. No Tractatus de differentia nostrae translationis ab hebraica littera in

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O Padre António Vieira Precursor do Diálogo Judeo-Cristão 109

veteri testamento, 1333, mostra as diferenças entre o seu texto e a Vul- gata.

Nicolau de Lira utilizou as fontes ao dispor, a maior parte hebraicas, e outros comentários rabínicos, copiosamente tirados de Rashi, o Pugio Fidei de Raimundo Martí23 e os comentários de Tomás de Aquino.

A sua obra tornou-se o manual mais consultado até ao séc. XVI. Martinho Lutero depende muito dele. Como outros autores do séc. XIV, preocupou-se com a conversão dos Judeus, aos quais dedicou diversos escritos. Lira escreveu Pulcherrimae quaestiones Iudaicam perfidam in catholicam fide improbantes, que veio a ser uma das fontes de Martinho Lutero utilizada no livro On the Jews and Their Lies24.

O Padre António Vieira serviu-se de Nicolau de Lira no Sermão do Bom Ladrão (1655): «Encomendou el-rei D. João, o Terceiro, a S. Fran- cisco Xavier o informasse do estado da Índia, por via de seu companhei- ro, que era mestre do Príncipe; e o que o santo escreveu de lá, sem nome- ar ofícios nem pessoas, foi que o verbo rapio na Índia se conjugava por todos os modos. A frase parece jocosa em negócio tão sério, mas falou o servo de Deus como fala Deus, que em uma palavra diz tudo. Nicolau de Lira, sobre aquelas palavras de Daniel: Nabucodonosor rex misit ad congregandos satrapas, magistratus et judices (Dan. 3, 2), declarando a etimologia de sátrapas, que eram os governadores das províncias, diz que este nome foi composto de sat e de rapio: Dicuntur satrapae quasi satis rapientes, quia solent bona inferiorum rapere: Chamam-se sátrapas, por- que costumam roubar assaz25. E este assaz é o que especificou melhor S.

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O dominicano catalão Raymundus Martí (+ 1286) foi um dos polemistas mais importantes da Idade Média.

24 Von den Juden und ihren Lügen (“Sobre os Judeus e as suas mentiras”) é um tra-

tado escrito em Janeiro de 1543 pelo teólogo protestante Martinho Lutero, em que defende a perseguição dos Judeus, a destruição dos seus bens religiosos, assim como o confisco do seu dinheiro. O Padre António Vieira nos seus sermões ataca com dureza a reforma protestante.

25 A etimologia referida não corresponde, pois sátrapa (grego σατράπης satrápēs, do

antigo persa xšaθrapā (van), i.e. «protector da terra/país») era o nome dado aos governadores das províncias, chamadas satrapias, nos antigos impérios aqueme- nita e sassânida da Pérsia. Cada satrapia era governada por um sátrapa, que era nomeado pelo rei. Para evitar a corrupção, o Rei dos Reis (Imperador Persa) pos- suía uma rede de espiões que foi chamada de “Os olhos e ouvidos do Rei”. Após a conquista de Alexandre o Grande, esse sistema de administração foi mantido. Se- gundo os antigos autores gregos (Heródoto, Tucídides e frequentemente Xenófa- nes), é traduzido por satrápēs “tenente, governador,” nos documentos – da Babiló-

Francisco Xavier, dizendo que conjugam o verbo rapio por todos os mo- dos. O que eu posso acrescentar, pela experiência que tenho, é que não só do Cabo da Boa Esperança para lá, mas também das partes daquém, se usa igualmente a mesma conjugação. Conjugam por todos os modos o verbo rapio, porque furtam por todos os modos da arte, não falando em outros novos e esquisitos, que não conheceu Donato nem Despautério».

4. PABLO DE HEREDIA – Escritor aragonês, polemista anti-judaico convertido, nascido cerca de 1405 em Aragão, morreu na idade avançada depois de 1486. Baptizado tarde, atacou o judaísmo. A fim de atacar o Talmud e os seus comentadores, escreveu um tratado místico, Iggeret ha- -Sodot (Epistola Secretorum).

Paulo de Heredia terá colaborado na Poliglota de Alcalá, mandada elaborar pelo Cardeal Ximenez, em 150226.