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Toda criança no mundo Deve ser bem protegida Contra os rigores do tempo Contra os rigores da vida. Criança tem que ter nome Criança tem que ter lar Ter saúde e não ter fome Ter segurança e estudar. Não é questão de querer Nem questão de concordar Os diretos das crianças Todos têm de respeitar. (...) Ruth Rocha

Em continuidade à apresentação da história do Fórum Sul Mineiro de Educação Infantil, refletiremos sobre a educação de qualidade para as crianças redesenhada em diversos eixos de discussões temáticas que subsidiaram os encontros.

A Constituição de 1988 é um divisor de águas no que se refere aos direitos das

crianças. O documento registra a concepção da criança como sujeito de direitos e estabelece que a educação e o cuidado das crianças pequenas não são exclusivos das famílias, mas também dever do Estado e de toda a sociedade.

Ruth Rocha, no poema “O direito das crianças”, chama a atenção para que, querendo ou não, concordando ou não, os direitos das crianças precisam ser respeitados. Muitos foram e são os caminhos atravessados para que esses direitos fossem conquistados. Muitas foram as mudanças nas concepções em relação às crianças e à infância. Muitos foram os avanços em relação à educação das crianças, mas há, ainda, muito a lutar.

Em um breve olhar pela história, já na modernidade, a partir do século XVII,

passamos da ideia de criança – pequeno adulto – universal e abstrata para a ideia de infância como um momento peculiar da vida humana (Ariès, 1981). No século XX, passamos da ideia de uma infância à compreensão de diferentes infâncias (Sarmento, 2004). Passamos da ideia de uma criança irracional, inocente, imatura para a ideia da criança como sujeito social, de direitos, produtora de cultura, agente social, cidadã.

8Professora Adjunta do Departamento de Educação da Universidade Federal de Lavras (UFLA); Doutoranda em Educação

pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP); Integrante do Grupo de Pesquisa: Relações entre a Filosofia e Educação para a Sexualidade na Contemporaneidade: a problemática da formação docente (FESEX) da UFLA; Integrante do Grupo de estudos de gênero, educação e cultura sexual (EdGES) da USP; Integrante do Grupo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Infâncias e Educação Infantil (Nepi) da UFLA. Integrante do Comitê Gestor do FSMEI em 2015.

9Professora Substituta no Departamento de Educação da UFLA; Integrante do FESEX e do Nepi; Coordenadora do Comitê Gestor

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No campo da educação, conquistamos a entrada da Educação Infantil como a primeira etapa da Educação Básica, a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Brasil, 1996). Passamos, legalmente, do caráter assistencialista das instituições que atendiam as crianças pequenas, em especial, as crianças pobres, a um caráter educativo, articulado, indissociavelmente, à dimensão do cuidado.

A Educação Infantil traz esta nova dimensão para a educação brasileira: cuidar e educar. Campos e Rosemberg (2010) ressaltam que, desde a década de 1970, com as tensões criadas a partir dos movimentos de mulheres pela luta por creches, articulados a outros movimentos sociais, questões sobre as especificidades da Educação Infantil são colocadas em pauta.

Em 2007, com a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais de Educação (Fundeb), a Educação Infantil, pela primeira vez, disputa recursos públicos e é reconhecida pela sociedade, apesar de ainda ser colocada num patamar inferior ao do Ensino Fundamental. Portanto, para que a sociedade brasileira assuma a dívida que tem com a Educação Infantil e garanta a aplicação dos recursos do Fundeb, é indispensável a mobilização social (Rosemberg, 2010).

A pesquisadora denuncia duas forças contra as quais ainda é preciso lutar, decorridos anos após a promulgação da CF/88: a escolarização precoce e o caráter assistencialista das creches ofertadas para crianças pobres. De um lado, a Educação Infantil é encarada como uma fase preparatória para a “verdadeira vida escolar”, creches são transformadas em pré- vestibulinhos. De outro, mantém-se a lógica de instituições de pior qualidade para crianças

pobres. Além disso, em decorrência da ausência de vagas nas creches, corre-se o risco de parte dos recursos do Fundeb destinados à Educação Infantil serem destinados a soluções emergenciais de atendimento, como “creche domiciliar, mãe crecheira, hotelzinho, vale creche, brinquedoteca, bolsa para mães, entre outros” (Rosemberg, 2010).

Na elaboração do Fundeb, um exemplo da importância da mobilização social para a garantia dos direitos das crianças foi a atuação do Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (MIEIB), criado em 1999, na 22ª Reunião Nacional da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação (ANPEd).

Numa primeira versão do projeto de lei, por exemplo, a creche não estava contemplada com o recebimento de verbas. Por meio de inúmeros debates e ações de repúdio, o

Movimento Fraldas Pintadas, encabeçado pelo MIEIB e várias outras instituições, contribuiu para a inclusão das crianças de zero a três anos no Fundeb (Flores, 2010).

O MIEIB, com participação representativa no cenário educacional, articula, atualmente, os 27 fóruns, sendo um de cada estado brasileiro, que, por sua vez, agregam os fóruns regionais de seus estados. Especialmente, desde 2007, tem se mobilizado junto à Secretaria de Educação Básica, por meio da Coordenação de Educação Infantil - COEDI10,

e atuado intensamente nas lutas que envolvem a Educação Infantil: participação na

construção das diretrizes curriculares nacionais, em publicações sobre oferta e qualidade da Educação Infantil, nas Conferências Nacionais de Educação (Conae) para a elaboração do

10Atualmente, nosso país enfrenta uma crise política, em que a presidenta foi afastada do cargo por um processo de impeachment.

Concordamos com inúmeras análises políticas que afirmam esse ter sido um golpe de Estado, com o qual muitos dos direitos conquistados já foram retrocedidos <http://www.anped.org.br/news/reformas-administrativas-na-contramao-da-patria- educadora> e muitos outros estão em risco. Especificamente no campo da Educação Infantil, em julho/2016, foi exonerada da Coordenação Geral de Educação Infantil do MEC, Rita Coelho, que sempre teve uma atuação muito estreita junto à sociedade civil: <http://primeirainfancia.org.br/rnpi-lamenta-exoneracao-de-rita-coelho-da-coordenadoria-geral-de-educacao-infantil-do- mec/>. Acesso em agosto de 2016.

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