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As práticas institucionais aparecem fortemente nos temas discutidos no FSMEI ao longo desses anos. E por que essa preocupação? Com a inserção da Educação Infantil como primeira etapa da Educação Básica, as práticas antes de teor assistencialista e de caráter higienista não contemplam as necessidades das crianças pequenas, que agora estão inseridas em um segmento educativo.

Pensar nas práticas requer pensar em “o que e como fazer”. Cabe ressaltar que, até a publicação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) (Brasil, 2010), em 2009, os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (RCNEI) (Brasil, 1998) foram os documentos que se destacaram quando se pensava em orientações para a Educação Infantil. Documento bastante criticado por seu processo de construção, considerado um rompimento com outros que vinham sendo produzidos pelo MEC, os RCNEI têm um caráter escolarizante e, com isso, as práticas são organizadas por campos disciplinares. Não era, portanto, até o momento, o único documento existente. Havia a primeira versão das DCNEI, de 1998 (Brasil, 1998) e os Critérios para atendimento em creches e pré-escolas que respeitem os direitos fundamentais das crianças (Brasil, 1995), como parte das políticas nacionais para a Educação Infantil, por meio das quais, foram publicados vários cadernos entre 1993 e 1998. No entanto, apesar de avanços postos no documento, como o reconhecimento da igualdade de gênero (Vianna; Unbehaum, 2006), os RCNEI nos deixaram a herança de um modelo escolarizante, o qual se reflete, ainda, nos anseios da sociedade em relação à Educação Infantil.

Em 2009, com a publicação das novas DCNEI, a Educação Infantil passa ter um documento orientador cujo foco são as brincadeiras e as interações. Esse novo material, mais atual e mais próximo da realidade das instituições, valoriza a cultura e os direitos da infância, e auxilia na reflexão e reformulação das práticas, ampliando as fronteiras para construção de novos saberes na e para a Educação Infantil.

Ainda assim, pensar na orientação das práticas, ou currículo para essa faixa etária, é insuficiente considerando que, tão importante como o que fazer, é o como fazer. Que metodologias usar, quais processos educativos são possíveis construir para uma Educação Infantil de qualidade?

Alguns temas que apareceram nos debates do FSMEI ao longo dos anos são desafiadores! Química para crianças, Filosofia na Educação Infantil, alfabetização e letramento, literatura, música, movimento, relações matemáticas, entre outros. São desafiadores porque viemos de uma educação tradicional, metódica e escolarizante. E, por isso, muitas vezes, é desafiador entrelaçar todos os saberes propostos para a Educação Infantil sem perder de vista a dimensão lúdica e brincante dessa etapa. Ou seja, o como fazer precisa alinhar a construção do conhecimento nessa faixa etária, respeitando seus limites, suas necessidades e seus direitos. Por exemplo, é possível e preciso iniciar o processo de letramento das crianças, mas não de investir em alfabetizá-las antes do Ensino Fundamental. E esse preparo não precisa acontecer necessariamente em cadeiras enfileiradas ou mesmo dentro de uma sala.

É possível e muito mais prazeroso para a criança vivenciar, experienciar e construir seu conhecimento via ação concreta, por meio da ludicidade. Se retomarmos a discussão que apareceu no ano de 2005 no município de Lavras, de como ensinar química para as crianças, a resposta fica bem mais leve ao vivenciar uma experiência de culinária, colocando a mão

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na massa, experimentando o sabor, a textura, a olfato, o paladar. Ou até mesmo em uma atividade artística envolvendo tintas. Ou seja, brincando a criança aprende.

Salientamos que os processos educativos na Educação Infantil são possíveis e desejados entrelaçando o cuidar e educar, que são aspectos intrínsecos. Nesse sentido, a Educação Infantil pode ser um tempo espaço de muitos aprendizados, sem ser uma proposta escolarizante, como aponta o documento Critérios para atendimento em creches e pré- escolas que respeitem os direitos fundamentais da criança (Brasil,1995). Ou seja, é possível se preocupar com as dimensões educativas (e não apenas de cuidado) sem ser uma proposta escolarizante.

Nessa perspectiva as DCNEI, apontam para práticas que valorizem o corpo, o movimento e os brincares. E por falar em brincadeira, esse tema foi o que mais apareceu e dividiu opiniões nas discussões do FSMEI. Enquanto algumas pessoas defendem o espaço da Educação Infantil como um espaço brincante (Martins, 2015), outras, inadvertidamente, veem o brincar como perda de tempo. De acordo com os relatos que chegam ao FSMEI, muitas famílias pressionam as instituições para que as crianças aprendam a ler e escrever ainda na Educação Infantil. E também sabemos que muitas/muitos profissionais direcionam suas práticas para esse objetivo como primário. Por outro lado, chegam também pedidos de orientações para a desconstrução dessas práticas, uma vez que essas/esses profissionais não aprenderam a fazer de outra forma.

Kishimoto (2010) descreve a compreensão dos norteadores da Educação Infantil dispostos dos art. 9.º ao 12 das DCNEI. Os artigos citados tratam da abordagem de práticas

pedagógicas (art. 9.º), proposta curricular (parágrafo único), acompanhamento dessas práticas, avaliação do desenvolvimento das crianças (art. 10), transição para o Ensino

Fundamental (art. 11) e implementação dessas Diretrizes (art. 12). A autora analisa e amplia cuidadosamente a compreensão de cada inciso constante nos artigos citados, colocando em evidência a ludicidade e os brincares como elementos fundamentais para o desenvolvimento infantil de forma integral e para a qualidade da Educação Infantil, proporcionando-lhe experiências diversas.

Nesse sentido, as DCNEI foram um avanço, pois orienta que práticas baseadas nos brincares ampliam os saberes a serem abordados com as crianças, trazendo para a pauta a discussão das questões de gênero e diversidades, antes inviabilizadas no ato educativo, mesmo estando presentes no cotidiano das crianças.

Observamos que, embora a temática das diferenças e educação para as sexualidades apareçam timidamente nas discussões, podemos problematizar o despreparo de profissionais para lidar com essas questões, bem como dos sujeitos para ousar a colocar o assunto em pauta. Sabemos que, historicamente, o Brasil tem apresentado dificuldades em lidar com as diferenças, seja de raça e etnia, de gênero e sexual, de classe, de idade e tantas outras.

Ao nos determos no quadro com os temas discutidos no FSMEI, percebemos o interesse por elas, mesmo que timidamente. Destacamos que, como aponta as DCNEI, é compromisso ético-político da Educação Infantil promover uma educação inclusiva, que promova processos educativos intencionais que abarquem as diferenças.

O FSMEI conta com a participação de pesquisadoras da UFLA, que atuam no ensino, pesquisa e extensão na área de gênero e diversidade cultural. A atuação dessas pessoas no Fórum faz com que essa discussão esteja sempre circulando por meio dos cursos de extensão e aperfeiçoamento que o DED oferece. Embora muitas vezes a discussão não apareça com tanta evidência, alternadamente, os municípios se fazem presentes nesses cursos, por meio

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