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A Lei nº 903, de 9 de dezembro de 1977, dispõe sobre a paridade de tratamento entre homens e mulheres, e visava a expandir a ocupação feminina, vedando as discriminações diretas e indiretas em razão do gênero296.

O artigo 1º da lei veda qualquer discriminação fundada no sexo no que se refere ao acesso ao trabalho, independentemente da modalidade de contratação, em qualquer setor ou ramo de atividade, em todos os níveis da hierarquia profissional.

Luisa Galantino aponta que a discriminação também é proibida se verificada através de referência ao estado civil, familiar ou de gravidez, ou se ocorrer de forma indireta, por intermédio de mecanismos na fase pré-contratual, como por anúncios ou qualquer forma publicitária que indique como requisito profissional o pertencimento a um ou outro gênero. A vedação se aplica inclusive às iniciativas de orientação, formação, aperfeiçoamento e atualização profissional, no que concerne tanto ao acesso, como ao conteúdo297.

A lei sobre paridade de tratamento tem como destinatários, naturalmente, trabalhadores homens e mulheres, já que nenhum dos sexos poderá ser preterido para o acesso ao trabalho, formação e orientação profissional, desenvolvimento do contrato de trabalho e atualização e aperfeiçoamento profissional. No entanto, observa Maria Vittoria Ballestrero que, como de fato e graças às previsões normativas anteriores relativas à formação profissional, as mulheres eram discriminadas em relação aos homens, considera-se naturalmente serem elas as destinatárias das normas sobre a paridade de tratamento298.

Há, contudo, artigos que se referem realmente a proteções específicas da mulher, como a que assegura a paridade retributiva das mulheres em relação aos homens (artigo 2º), a

296

BARROS, Alice Monteiro de. A mulher e o direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995. p. 277. 297

GALANTINO, Luisa. Diritto del lavoro. Torino: G. Giappichelli Editore, 2010. p. 114. 298

BALLESTRERO, Maria Vittoria. Dalla tutela alla paritá: la legislazione italiana sul lavoro delle donne. Bologna: Il Mulino, 1979. p. 224.

que veda o tratamento inferior da trabalhadora em virtude de encargos familiares (artigo 9º), ou as normas que alteram a proteção concedida pela Lei nº 1204/1971 para as trabalhadores mulheres (artigos 3º, 6º e 8º).

A norma permite eventuais derrogações às suas disposições para funções particularmente penosas, a serem especificadas através de negociação coletiva. Ainda, importa destacar, que a lei expressamente reconhece, que não constitui discriminação condicionar ao pertencimento a um determinado gênero a contratação em atividades no ramo da moda, da arte e do espetáculo, quando for essencial à natureza do trabalho ou da função.

O artigo 2º da lei trata do direito da igualdade de remuneração entre homens e mulheres, quando as prestações sejam iguais ou de igual valor. Alice Monteiro de Barros considera que a igualdade de salário foi reconhecida com base em critérios objetivos, destacando que devem ser comparados os conteúdos profissionais desempenhados, consoante sistemas de avaliação objetiva das funções realizadas por homens e mulheres299.

Entretanto, ressalta a autora que a lei em comento não resolvia o problema da disparidade retributiva proveniente do enquadramento das trabalhadoras mulheres em funções com menor remuneração, em virtude da exigência de nível de qualificação inferior. Aponta que, além da deficiência na formação profissional das mulheres, que normalmente são qualificadas para trabalhos menos especializados e menos técnicos que os realizados pelos homens, os condicionamentos psicoculturais conduzem as mulheres a funções que guardam certa analogia com atividades familiares e a atividades de tempo parcial, contribuindo para um patamar inferior de retribuição300.

O artigo 3º veda a discriminação das mulheres em relação à qualificação profissional, às funções e à progressão de carreira.

O artigo 5º da Lei nº 903/1977 manteve a vedação do trabalho noturno de mulheres, entendido este como o desempenhado entre as 24 horas de um dia até as 6 horas do dia seguinte, nas empresas manufatureiras, com exceção das mulheres que desenvolvam funções diretivas e em serviços sanitários empresariais, permitindo que tal vedação seja suprimida via negociação coletiva, exceto para mulheres em início da gestação, até que a criança complete sete meses de idade.

Luisa Galantino relata que, em virtude da manutenção da proibição do trabalho noturno para mulheres, a Itália foi considerada pela Corte de Justiça Europeia em 4 de dezembro de 1997, na causa C-207/96, inadimplente nas obrigações contidas no direito

299

BARROS, Alice Monteiro de. A mulher e o direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995. p. 279. 300

comunitário concernentes à paridade de tratamento entre homens e mulheres. Para adequar o ordenamento interno à decisão, a Lei nº 25, de 5 de fevereiro de 1999 substituiu o artigo 5º da Lei nº 903, de 1977, vetando o trabalho noturno apenas para mulheres grávidas, até a data em que seu filho complete um ano de idade, bem como prevendo limites ao trabalho noturno de trabalhadores com filhos menores ou responsáveis por algum portador de necessidades especiais. Essa vedação foi mantida no já citado Decreto Legislativo nº 151, de 26 de março de 2001, denominado “Texto Único das disposições legislativas em matéria de tutela e sustento da maternidade e da paternidade”.

Importa assinalar que o artigo 7º da Lei nº 903/1977 alterou a Lei nº 1204/1971, no que se refere à ausência da trabalhadora em caso de doença do filho menor de 3 anos, estendendo a mesma possibilidade ao trabalhador pai, no lugar da mãe. Maria Vittoria Ballestrero observa que essa inovação é certamente significativa da vontade de alterar o costume social, ao considerar menos rígido o papel familiar exclusivo da mulher, aumentando a possibilidade do seu trabalho fora de casa e da divisão de responsabilidades familiares com o pai da criança301.

No campo processual, como já assinalado (vide item supra sobre o Estatuto dos trabalhadores), o artigo 13 da referida lei promoveu importante alteração no artigo 15 da Lei nº 300, de 20 de maio de 1970 (Estatuto dos Trabalhadores), incluindo, dentre os motivos de discriminação vedados, a discriminação em razão do gênero.

Desse modo, as mesmas condutas discriminatórias já vedadas pelo Estatuto dos Trabalhadores em relação a opiniões políticas, sindicais e religiosas dos trabalhadores, também são proibidas com base em discriminação política, religiosa, racial, de língua ou de sexo, para fins de acesso ao emprego, rescisão do contrato de trabalho, transferências, procedimentos disciplinares, designação de tarefas e de funções.

Como visto, a inclusão da discriminação em razão do gênero dentre as condutas vedadas pelo Estatuto dos Trabalhadores acarreta a possibilidade de efetivação de uma tutela real contra a rescisão discriminatória, consoante as previsões contidas no artigo 18 da referida lei. O juiz, na sentença em que declare a nulidade da dispensa, determinará a reintegração da trabalhadora ao posto de trabalho, além de condenar o empregador ao ressarcimento do dano, como o pagamento de uma indenização correspondente à retribuição do período compreendido desde o afastamento até a data da efetiva reintegração, além dos recolhimentos previdenciários e assistenciais correspondentes.

301

BALLESTRERO, Maria Vittoria. Dalla tutela alla paritá: la legislazione italiana sul lavoro delle donne. Bologna: Il Mulino, 1979. p. 181.

A trabalhadora poderá optar pela substituição da reintegração por uma indenização equivalente a 15 vezes a última retribuição, desde que manifesta a opção dentro de 30 dias da notificação da sentença ou da comunicação para retornar ao trabalho.

Além de estender a proteção contra a dispensa discriminatória, o artigo 15 da Lei nº 903/1997 criou um procedimento jurisdicional de urgência inspirado no artigo 28 do Estatuto dos Trabalhadores, de natureza inibitória e restitutiva302, para casos de discriminação previstos nos artigos 1º e 5º da mesma lei. No procedimento, pode ser determinada a cessação do comportamento discriminatório e a remoção de seus efeitos.

Importante, ainda, a previsão contida no artigo 19, que afirma a nulidade de todas as disposições das convenções coletivas ou contratos individuais de trabalho, de regulamentos empresariais e de estatutos profissionais que sejam contrários às normas contidas na Lei nº 903, de 1977.

Posteriormente, a Lei nº 903 de 1977 foi ab-rogada praticamente em sua totalidade

pelo Decreto Legislativo nº 198, de 11 de abril de 2006, denominado “Código de paridade de oportunidades entre homens e mulheres” (vide item infra), o qual incorporou a maioria de

seus dispositivos, inclusive no que se refere à proteção contra a discriminação em razão do gênero.

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