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A. Convenção Americana de Direitos do Homem (Pacto de San José da Costa Rica), de 1969

4.1. A proteção contra a discriminação do trabalho da mulher na Itália

4.1.1. Normas internacionais e da União Europeia vigentes na Itália

De acordo com o artigo 10, parágrafo 1º da Constituição Italiana, o ordenamento nacional se conforma às normas de direito internacional geralmente reconhecidas.

Luisa Galantino ensina que a doutrina e a jurisprudência prevalentes na Itália entendem que o dispositivo se refere às normas internacionais de origem consuetudinária, ou seja, ao jus cogens internacional. As normas internacionais contidas em tratados

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VALLEBONA, Antonio. Istituzioni di diritto del lavoro: II Il raporto di lavoro. 5 ed. Padova: Casa Editrice Dott. Antonio Milani, 2005. p. 273.

internacionais estariam disciplinadas pelos artigos 80 e 87 da Constituição Italiana como fontes indiretas de direito, no sentido de que não produziriam efeitos jurídicos imediatos no ordenamento interno, mas exigiriam sua transformação em direito interno mediante um ato formal de ratificação por parte do Presidente da República e prévia autorização legal pelo Poder Legislativo258.

Tendo em vista que a transformação de tratados internacionais em normas de direito interno geralmente se dá por intermédio de uma lei ordinária, é este o status atribuído às normas internacionais incorporadas pelo ordenamento italiano. No entanto, em se tratando de direitos humanos fundamentais, Luisa Galantino afirma que a Corte Constitucional já se pronunciou, ao analisar questões atinentes à aplicação da Convenção Europeia de Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais, afirmando que as normas que tutelam direitos fundamentais da pessoa humana e, portanto, integradas por valores e princípios fundamentais protegidos constitucionalmente, assumem uma posição subordinada à Constituição, mas superior às leis ordinárias. O entendimento se fundamenta no artigo 117 da Constituição Italiana, segundo o qual o poder legislativo é exercido com respeito às restrições oriundas não só do ordenamento comunitário, como também das obrigações internacionais. Assim, as normas da referida Convenção seriam dotadas de maior força em relação às normas internas259.

A Itália se tornou Estado membro da Organização das Nações Unidas em 14 de dezembro de 1955260, tendo, nesta condição, consentido com os preceitos trazidos na Carta da ONU, de 1945, e na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948.

O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos de 1966, obtiveram do Poder Legislativo italiano a autorização de ratificação e ordem de execução pela Lei nº 881, de 25 de outubro de 1977261, tendo sido efetivamente ratificados em 15 de setembro de 1978, entrando em vigor em 15 de dezembro de 1978.

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GALANTINO, Luisa. Diritto del lavoro. Torino: G. Giappichelli Editore, 2010. p. 82. 259

Consoante as decisões proferidas pela Corte Constitucional Italiana em 24/10/2007, nº 348 e 349 (GALANTINO, Luisa. Diritto del lavoro. Torino: G. Giappichelli Editore, 2010. p. 82-83).

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Consoante informação constante no portal eletrônico da ONU ITÁLIA, disponível em: <http://www.onuitalia.com/eng/2015/01/19/italian-odyssey-ten-years-enter-un/>. Acesso em 06/09/2015. 261

ITÁLIA. Lei nº 881 de 25 de outubro de 1977. Ratifica ed esecuzione del patto internazionale relativo ai diritti economici, sociali e culturali, nonché del patto internazionale relativo ai diritti civili e politici, con protocollo facoltativo, adottati e aperti alla firma a New York rispettivamente il 16 e il 19 dicembre 1966.

Disponível em:

<http://legxv.camera.it/cartellecomuni/leg14/RapportoAttivitaCommissioni/commissioni/allegati/03/03_all_legg e1977881.pdf>. Acesso em 06/08/2015.

A Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979, teve sua autorização de ratificação e ordem de execução proferida pela Lei nº 132 de 14 de março de 1985262.

Ainda, tendo sido um dos Estados signatários do Tratado de Versalhes, de 28 de junho de 1919, e sendo membro da Organização Internacional do Trabalho, consentiu com as disposições contidas na Constituição da OIT de 1919, e em seu Anexo, a Declaração de Filadélfia, de 1946. Além disso, tem a obrigação de respeitar e promover os princípios fundamentais contidos na Declaração de Princípios e Liberdades Fundamentais no Trabalho, de 1998.

A Itália é signatária de diversas Convenções Internacionais do Trabalho, tendo efetuado o devido procedimento de incorporação de tais normas a seu direito interno.

A Convenção nº 100 da OIT, de 1951, teve sua ratificação e ordem de execução por intermédio da Lei nº 741, de 22 de maio de 1976263.

A Convenção nº 111 da OIT, de 1958, foi ratificada e teve sua ordem de execução pela Lei nº 405 de 6 de fevereiro de 1963264.

A Convenção nº 117 da OIT, de 1962, teve sua autorização de ratificação e ordem de execução na Lei nº 657 de 13 de julho de 1966265.

A Convenção nº 122 da OIT, de 1964, foi ratificada, com a devida ordem de execução, pela Lei nº 864 de 19 de outubro de 1970266.

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ITÁLIA. Lei nº 132 de 14 de março de 1985. Ratifica ed esecuzione della convenzione sull'eliminazione di ogni forma di discriminazione nei confronti della donna, adottata a New York il 18 dicembre 1979. Disponível em: <http://www.gazzettaufficiale.it/atto/serie_generale/caricaDettaglioAtto/originario;jsessionid=LwbcyE- gMG9wsdqKUp80Qw__.ntc-as2-guri2b?atto.dataPubblicazioneGazzetta=1985-04-

15&atto.codiceRedazionale=085U0132&elenco30giorni=false>. Acesso em 06/09/2015. 263

ITÁLIA. Lei nº 741 de 22 de maio de 1956. Ratifica ed esecuzione delle Convenzioni numeri 100, 101 e 102 adottate a Ginevra dalla 34ª e dalla 35ª sessione della Conferenza generale dell'Organizzazione internazionale del lavoro. Disponível em <http://www.normattiva.it/uri-res/N2Ls?urn:nir:stato:legge:1956;741>. Acesso em 06/09/2015.

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ITÁLIA. Lei nº 405 de 6 de fevereiro de 1963. Ratifica ed esecuzione della Convenzione internazionale del lavoro n. 111, concernente la discriminazione in materia di impiego e di professione adottata a Ginevra il 25

giugno 1958. Disponível em

<http://www.normattiva.it/atto/caricaDettaglioAtto?atto.dataPubblicazioneGazzetta=1963-04- 06&atto.codiceRedazionale=063U0405>. Acesso em 06/09/2015.

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ITÁLIA. Lei nº 657 de 13 de julho de 1966. Ratifica ed esecuzione delle seguenti Convenzioni internazionali adottate dalla Conferenza internazionale del lavoro: Convenzione internazionale del lavoro n. 117 concernente gli obiettivi e le norme di base della politica sociale, adottata a Ginevra il 22 giugno 1962; Convenzione internazionale del lavoro n. 118 concernente l'uguaglianza di trattamento dei nazionali e dei non nazionali in materia di sicurezza sociale adottata a Ginevra il 28 giugno 1962. Disponível em <http://www.normattiva.it/atto/caricaDettaglioAtto?atto.dataPubblicazioneGazzetta=1966-08-

27&atto.codiceRedazionale=066U0657>. Acesso em 06/09/2015. 266

ITÁLIA. Lei nº 864 de 19 de outubro de 1970. Ratifica ed esecuzione delle Convenzioni numeri 91, 99, 103, 112, 115, 119, 120, 122, 123, 124 e 127 dell'Organizzazione Internazionale del lavoro. Disponível em <http://www.normattiva.it/atto/caricaDettaglioAtto?atto.dataPubblicazioneGazzetta=1970-11-

Registre-se que a Itália não ratificou as Convenções nº 156, de 1981, e nº 158, de 1982, mencionadas no capítulo anterior. Não obstante, as garantias contidas nesses diplomas internacionais, relativos à proteção de trabalhadores com responsabilidades familiares e à proteção contra a dispensa imotivada, são efetivadas por intermédio de outras normas internas italianas, pelo que a ausência de sua ratificação não significa que os princípios nelas consagrados não sejam válidos naquele país.

Cumpre observar, aliás, que para alguns doutrinadores, os atos normativos editados pela OIT, em que pese expressarem importantes princípios trabalhistas, tiveram influência apenas relativa sobre a evolução do ordenamento jurídico italiano, tendo em vista que as normas já existentes no plano nacional previam níveis de tutela qualitativamente e quantitativamente mais elevados do que os estipulados nas Convenções internacionais da OIT, como nota Giuseppe Santoro-Passarelli267.

Ocorre que, como já ressaltado, os tratados e convenções internacionais possuem a tarefa de estabelecer um patamar mínimo de garantias trabalhistas no âmbito dos Estados signatários, pretendendo a instituição de políticas a serem implementadas nas respectivas jurisdições. A ratificação de diversas Convenções da OIT, portanto, não deixa de ter importância para assinalar os compromissos assumidos pelo Estado italiano perante a comunidade internacional, e também como forma de estipular um patamar em relação ao qual não poderá haver retrocesso.

As fontes comunitárias de direito do trabalho, isto é, as normas oriundas da União Europeia, possuem grande relevância no direito italiano.

Ao contrário das normas internacionais editadas contidas em tratados e convenções ratificadas pelos Estados no âmbito da ONU e da OIT, as normas supranacionais apresentam maior força vinculante em relação aos ordenamentos jurídicos internos.

Ensina Giancarlo Perone que a aplicabilidade direta das disposições dos tratados e regulamentos oriundos da União Europeia é constantemente proclamada pela Corte de Justiça Europeia, sem a necessidade de normas internas de adaptação ou de recepção268. Recorda o autor que, em que pese a falta de organicidade e a existência de lacunas no direito comunitário europeu, posto que não abarca toda a disciplina trabalhista, mas se restringe a regulação de pontos específicos de crucial relevância, não há como se negar a influência desta ordem normativa no território italiano. Além disso, deve-se considerar também uma influência ainda

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SANTORO-PASSARELLI, Giuseppe. Diritto dei lavori: Diritto sindacale e rapporti di lavoro. 4 ed. Torino: G. Giappichelli Editore, 2013. p. 2.

268

PERONE, Giancarlo. Lineamenti di diritto del lavoro: evoluzione e partizione della materia, tipologia lavorative e fonti. Torino: G. Giappichelli Editore, 1999. p. 301-302.

mais relevante exercida pelo fato em si da inserção da Itália no contexto europeu. Segundo o autor:

Se trata de uma influência que transcende a incorporação de normas comunitárias singulares e, de reflexo, transcende também a evolução dos institutos particulares aos quais as normas se dirigem; e requer seja avaliado com sensibilidade comparatista tais perfis transnacionais das conexões normativas e das convergências nos ordenamentos de fundo dos sistemas trabalhistas.

Toda a fisionomia do direito do trabalho nacional é afetada pelo contato com a experiência comunitária e com o direito vigente nos Estados europeus. Além das mesmas disposições implementadas, no campo do trabalho, pelas diversas fontes comunitárias, [...] pelo próprio fato de entrar em uma relação mais estreita com os ordenamentos de outros Estados pertencentes à União Europeia, o sistema italiano é levado a se orientar para determinadas direções, comuns àquele ordenamento. Por outro lado, normas específicas comunitárias, mesmo sem conterem um reconhecimento explícito neste sentido, mostram sofrer influências, ao menos de forma indireta, das tendências prevalentes nos Estados europeus, ou naqueles que no continente ocupam uma posição proeminente, como a França e a Alemanha.269

Assim, com o passar dos anos, pode-se observar uma progressiva adaptação das normas italianas ao ordenamento europeu.

Como notam Roberto Adam e Antonio Tizzano, os magistrados italianos são provocados a atribuir cada vez mais, na tutela das situações jurídicas levadas à apreciação judicial, um crescente e fundamental papel ao direito da União Europeia, graças ao desenvolvimento do processo de integração europeia. Assim, os juízes nacionais podem e devem tutelar as posições jurídicas subjetivas com base nas normas comunitárias, além de deixar de aplicar as normas internas italianas que forem incompatíveis com as normas europeias270.

Exemplo interessante dessa relação entre as normas italianas e europeias é o ocorrido na questão relativa ao trabalho noturno das mulheres. De acordo com Giancarlo Perone, na sensibilidade italiana, o problema do trabalho feminino foi enfrentado em uma perspect iva que conjuga o princípio da paridade com o de uma proteção especial, em razão da posição familiar especial e de mãe, que coloca a mulher em condições fáticas de desvantagem. Por isso, a regra, na Itália, era a vedação ao trabalho feminino noturno. No entanto, a orientação prevalente na Europa se baseia exclusivamente na busca pela paridade e se limita a algumas

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PERONE, Giancarlo. Lineamenti di diritto del lavoro: evoluzione e partizione della materia, tipologia lavorative e fonti. Torino: G. Giappichelli Editore, 1999. p. 308.

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ADAM, Roberto; TIZZANO, Antonio. Manuale di diritto dell’Unione Europea. Torino: G. Giappichelli Editore, 2014, p. 371-372.

proteções especiais. Em decorrência dessa divergência, o Estado italiano foi condenado pela Corte de Justiça Europeia em 4 de dezembro de 1997, em virtude da proibição do trabalho noturno das mulheres, que motivou a alteração da legislação nacional para restringir a vedação apenas no período da gestação até um ano de idade do filho271.

Neste ponto, cumpre ressaltar que tanto a Convenção Europeia de Proteção dos Direitos Humanos quanto a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia registram que todos os cidadãos têm o direito à proteção judicial dos direitos que derivam da ordem legal comunitária. Assim, as normas europeias se tornam diretamente aplicáveis pelos juízes nacionais.

Os tratados institutivos da União Europeia e suas modificações posteriores (Tratado de Roma, de 1957, Tratado de Maastricht, de 1992, Tratado de Amsterdam, de 1997, e Tratado de Lisboa, de 2007) são, naturalmente, incidentes na ordem jurídica italiana, já que o Estado italiano é membro da União Europeia desde a criação do bloco regional, tendo participado de todas as negociações dos referidos tratados e manifestado seu consenso em relação a seus termos.

A Convenção Europeia de Direitos Humanos, de 1950, foi firmada em Roma, com a participação do Estado italiano, tendo sido ratificada pela Lei nº 848, de 4 de agosto de 1955.A Carta Social Europeia, de 1961, foi ratificada pela Lei nº 929, de 3 de julho de 1965, ao passo que sua revisão, de 1996, foi ratificada pela Lei nº 30, de 9 de fevereiro de 1999.

As diretivas da União Europeia concernentes à proteção contra a discriminação em relação ao gênero possuem incidência no território italiano, e foram progressivamente influenciando nas alterações legislativas promovidas ao longo dos anos na legislação italiana.As diretivas mais recentes, editadas após o Tratado de Amsterdam, de 1997, amplamente descritas no capítulo anterior, têm reflexos em normas atualmente vigentes na Itália.

As diretivas europeias 2000/43 e 2000/78 foram recepcionadas mediante os decretos legislativos de 9 de julho de 2003, de nº 215 e 216, garantindo a paridade de tratamento aos trabalhadores, sem distinção de raça, origem étnica, religião, convicções pessoais, deficiência, idade, orientação sexual.

A diretiva nº 2002/73 foi incorporada à ordem jurídica italiana pelo Decreto legislativo nº 145/2005, sendo que suas disposições foram posteriormente inseridas no Decreto

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PERONE, Giancarlo. Lineamenti di diritto del lavoro: evoluzione e partizione della materia, tipologia lavorative e fonti. Torino: G. Giappichelli Editore, 1999. p. 343-344.

legislativo nº 198/2006, que instituiu o Código de paridade de oportunidade entre homens e mulheres.

A diretiva nº 2006/54, que consolidou o tratamento dado por outras diretivas anteriores sobre a proteção contra a discriminação, foi incorporada ao ordenamento italiano mediante o Decreto legislativo nº 5, de 2010, efetuando alterações no referido Decreto legislativo nº 198/2006.

Assim, observa-se que as diretivas europeias, cujo conteúdo já foi examinado no capítulo anterior, foram influenciando a evolução das normas nacionais relativas à proteção da mão de obra feminina, como se passa a analisar.

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