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3. O LIVRO DIDÁTICO NA ATUALIDADE: DISCUSSÕES E PROGRAMAS

3.4 O PNLD E O LIVRO DIDÁTICO DE PORTUGUÊS

o que determina a política da escolarização do saber, e, portanto, a política do livro didático é, fundamentalmente, uma política da cultura, da ciência e das práticas sociais, e que é resultado de lutas e compromissos sociais e econômicos – um substrato ideológico, portanto (SOARES, 1996, p.55)”.

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. Eram consideradas entidades parceiras: os estados, Distrito Federal e municípios, que estabelecem parceria com o MEC, por intermédio da SECAD (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade) nas ações do programa Brasil Alfabetizado. Informação disponível em <http://portal.mec.gov.br.>

Conforme pudemos observar na seção anterior, o PNLD estabeleceu os critérios básicos sobre os quais os livros didáticos a serem distribuídos nas escolas públicas brasileiras deveriam ser avaliados. Neste sentido, no que se refere aos livros didáticos de Língua Portuguesa, o PNLD estabeleceu perspectivas teóricas e metodológicas bastante definidas, e que se tornaram possíveis devido à movimentação no campo da reflexão sobre a concepção do seja ensinar a língua materna (RANGEL, 2005), resultado da mudança da concepção de língua, antes vista como sistema (e que permeou até os anos 60, do século XX), como instrumento de comunicação (que compreendeu o período dos anos 60 a 80) e agora compreendida como enunciação, discurso, interação19. Sendo assim, cabia pautar o ensino de língua sob “uma forma específica de (inter) agir, e não apenas um conjunto de informações

sobre a língua (RANGEL, 2005, p.16).” Desse modo, além dos critérios de ordem conceitual,

política e metodológica, foi necessário aos LDP “enfrentar os novos objetos didáticos de ensino de língua materna: o discurso, os padrões de letramento, a língua oral, a textualidade, as diferentes “gramáticas” de uma mesma língua, etc. (RANGEL, 2005, p.19)”. Também, conforme esse autor,

Trata-se, portanto, de saber se o livro:

 oferece ao aluno textos diversificados e heterogêneos, do ponto de vista do gênero e do tipo de texto, de tal forma que a coletânea seja o mais possível representativa do mundo da escrita;

 prevê atividades de leitura capazes de desenvolver no aprendiz as competências leitoras implicadas no grau de proficiência que se pretende levá-lo a atingir;

 ensina a produzir textos, por meio de propostas que contemplem tanto os aspectos envolvidos nas condições de produção, quanto os procedimentos e estruturas próprios da textualização;

 mobiliza corretamente a língua oral, quer para o desenvolvimento da capacidade de falar/ouvir, quer par a exploração das muitas interfaces entre a oralidade e escrita;

 desenvolve os conhecimentos linguísticos de forma articulada com as demais atividades. (RANGEL, 2005, p.19)

Desse modo, essa concepção de língua corroborou para dar ênfase à utilização de textos como objeto de ensino, ideia também preconizada pelos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais, 1998), tomado como referência para a produção de livros didáticos,

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Remete-se aqui para a concepção de língua na perspectiva bakhtiniana, que a concebe como um fenômeno social de interação verbal realizada através da enunciação. Nas palavras Bakhtin (2006, p.127): “A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato fisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua”. (grifos do autor) É essa concepção de língua que passar a nortear o ensino de Língua Portuguesa e que está presente nos documentos oficiais que norteiam o seu ensino.

para a elaboração da Proposta Curricular para Educação de Jovens e Adultos20 (segundo segmento) e subjacente no Guia do PNLD EJA. Assim, segundo os PCNs e a referida proposta:

Os gêneros existem em número quase ilimitado, variando em função da época (epopéia, cartoon), das culturas (haikai, cordel) das finalidades sociais (entreter, informar),de modo que, mesmo que a escola se impusesse a tarefa de tratar de todos, isso não seria possível. Portanto, é preciso priorizar os gêneros que merecerão

abordagem mais aprofundada (...) é preciso que as situações escolares de ensino de

Língua Portuguesa priorizem os textos que caracterizam os usos públicos da

linguagem. Os textos a serem selecionados são aqueles que, por suas características e usos, podem favorecer a reflexão crítica, o exercício de formas de pensamento mais elaboradas e abstratas, bem como a fruição estética dos usos artísticos da linguagem, ou seja, os mais vitais para a plena participação numa sociedade letrada.(PCN – Língua Portuguesa, 1998, p. 24; grifos nossos)

A grande diversidade de gêneros, praticamente ilimitada, impede que a escola trate todos eles como objeto de ensino; assim, uma seleção é necessária. Neste documento, foram priorizados aqueles cujo domínio é fundamental à efetiva

participação social, encontrando-se agrupados, em função de sua circulação social,

em gêneros literários, de imprensa, publicitários, de divulgação científica, comumente presentes no universo escolar. (PCN – Língua Portuguesa, 1998, p. 53; grifos nossos)

A escola é o lugar privilegiado onde o aluno exercita os modos de abordar os textos e aprende a dialogar com o que está escrito. Resulta daí a necessidade de trabalhar textos pertencentes a diferentes gêneros, explorando as possibilidades que todos eles deixam em aberto. Textos verbais (bilhetes, anúncios, convites, bulas, notícias, artigos científicos, verbetes, contos, crônicas,fábulas, novelas, romances etc.) e textos não-verbais (fotos, desenhos, sons, gestos etc.) aguardam os olhos atentos de um decifrador, sempre disposto a perceber possibilidades intrínsecas que fazem parte da trama, da tecedura, da forma como estão apresentados.(Proposta Curricular Para a Educação de Jovens e Adultos, 2002, vol.02, pp.14-15, grifos dos autores)

Como podemos perceber, é nítida a ideia de que os mais diversos gêneros devam ser, agora, tomados como objeto de ensino, fato endossado também pelos “estudos críticos do letramento e os estudos sobre gênero do discurso21, nos anos 90, que enfocavam a relação entre os textos e seu funcionamento em práticas sociais situadas, contribuem também para esse processo (BUNZEN, 2005, p.45)”.

Mas essa defesa em relação ao uso da diversidade de textos, tomados agora como objeto para o ensino de Língua Portuguesa e disseminada pelos documentos oficiais aqui referidos, implica também valorizar os conhecimentos textuais com os quais os alunos já têm familiaridade ao chegarem à escola, além de promover um deslocamento na concepção de aluno, antes visto como aquele que não detinha o domínio da língua, por não conhecer a sua

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Trataremos da Proposta Curricular de Jovens e Adultos e do Guia do PNLD EJA, no que tange ao ensino de Língua Portuguesa, de forma mais detalhada em um capítulo mais adiante.

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gramática e os textos do cânone literário, para aquele que caminha por linguagens diversas e com elas é capaz de estabelecer diferentes relações (TABOSA, 2013). Resta saber, então, como o aluno é concebido, então, ao levarmos em consideração os textos presentes nos LDP destinados à EJA, assim como as atividades de leitura por eles proporcionadas, diante da mudança aqui referida no que tange ao ensino de língua, já que “a própria circunscrição e seleção dos textos feita por autores e editores já delimita um conjunto de possibilidades de leituras e de práticas de letramento possíveis e outro conjunto que não o é (ROJO, 2010, p.41)”. É por esse viés que caminharemos ao tentarmos apreender as identidades do (s) sujeito (s) de EJA.