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2. A HISTÓRIA DA LEITURA: ALGUNS RECORTES

2.4 OS LIVROS DESTINADOS A INSTRUÇÃO

Embora tenhamos traçado um panorama compreendido entre o período colonial até meados do século XX sobre o material destinado a leitura, e entendendo que “podem-se, em linhas gerais, considerar as seis décadas do século XX como o período predominantemente representado na coleção de livros de leitura” (BATISTA; GALVÃO, 2009b, p.79), não gostaríamos de deixar de chamar a atenção para a existência de outros livros, que também eram utilizados pelo ensino elementar. Neste sentido, alguns manuais portugueses e brasileiros, do tipo enciclopédico, destinados ao ensino primário, foram citados por Pfromm Neto et al, com base em Arroyo (1968), quais sejam, por exemplo, Enciclopédia das Escolas, de José Maria Latino Coelho (Lisboa, 1857), a Enciclopédia Popular, de João José de Souza Teles (Lisboa, 1857) e o Manual Enciclopédico para Uso das Escolas d’Instrução Primária, de Emílio Aquiles Monteverde, que reuniam noções de ciência, história, geografia, matemática e etc.

Os referidos autores ainda citam os livros chamados de “cadernos de pontos”, que segundo eles, apesar das críticas das autoridades de ensino e dos pedagogos, foram disseminados por todo o país durante muito tempo. São, pois considerados como prováveis precursores deste tipo de material didático, citados por Pfromm et al: os Pontos de Geografia

e Cosmografia, de L.H. Canezza, com cinco edições publicadas até 1882, os Pontos de Português, de Guilherme Reaux Brigges, os Pontos de Álgebra, de Emílio Deleau. São desses

que descendem os ”cadernos de ponto” e os “questionários”, os quais são caracterizados pela utilização do método catequético de perguntas e respostas e que “Apesar de suas deficiências, é necessário reconhecer que cadernos desse tipo, simples e baratos, possibilitaram a milhares de brasileiros o único e modesto contato destes com material impresso, nas áreas de português, história, geografia, matemática, etc.”, conforme Pfromm et al (1974, p.188).

Pesquisas realizadas por Batista e Galvão (2009a) sobre livros escolares de leitura produzidos no Brasil entre 1870 e 1975 para o ensino elementar, com base na análise dos pedidos e das notificações de envio de livros a professores de aulas públicas disponíveis no Arquivo Mineiro, entre 1830 e 1889, também destacam o predomínio de compêndios12 de doutrina cristã, de aritmética, geografia, história e conteúdos gramaticais. Citam como exemplo desse compêndio A pequena História do Brasil por perguntas e respostas, do Dr. J.

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De acordo com Batista e Galvão (2009b, p.90), “Consideram-se compêndios aqueles livros que se caracterizam como uma exposição didática de um conjunto de conteúdos organizados de forma progressiva, tendo em vista áreas de conteúdo distintas”. (grifo dos autores)

Maria de Lacerda (1906), que, segundo os referidos autores, apresenta uma exposição didática de sete grandes períodos da história brasileira, que vai do Descobrimento à República, em forma de questionário, no qual as perguntas deveriam ser memorizadas pelos alunos, o que parece endossar mais uma vez a forte presença do que nos foi legado pelos jesuítas: aprendizagem com ênfase na memorização.

É bom lembrar ainda, que, de acordo Pfromm et al, é recente a ideia de que o livro didático não era apenas para ser lido, mas também rabiscado pelo aluno. Nesse sentido, é também recente a existência de livros, tanto na área de língua portuguesa como nas demais, contendo textos de “leitura dirigida”, em que após cada trecho da leitura, o leitor deparava-se com testes sobre a leitura que acabava de fazer, com itens a completar, resposta múltipla, emparelhamento, resposta aberta, etc. Também, segundo os autores já referidos, “a tendência dominante presentemente, nas séries graduadas de leitura, é oferecer ao aluno, em volumes separados ou num só volume, o texto de leituras e a parte de exercícios” (PFROMM et al, p.1974, p.188).

Diante do recorte que fizemos até aqui, foi possível perceber, em linhas gerais, a evolução do material utilizado para o ensino da leitura, que se caracterizou pela utilização de textos manuscritos, livros religiosos, documentos de cartórios, entre outros, até que chegássemos aos livros elaborados especificamente para essa finalidade, mas que eram destinados aos quatro anos iniciais da escolarização, embora em pesquisa realizada sobre os livros escolares de leitura que circulavam no período imperial, Galvão (2009, p.107) ressalte a dificuldade “em apreender e estabelecer modelos, tipos e gêneros de livros no século XIX diz respeito à própria indefinição que, muitas vezes marcava a produção de livros quanto à sua destinação”. Em outras palavras, ainda segundo a autora, não havia definição precisa se o livro era direcionado ao uso escolar e, na escola, se estava direcionado e/ ou era adequado ao ensino primário e/ou secundário e isso refletia o pequeno grau de institucionalização da educação brasileira no período já mencionado, o que nos faz crê também que sinaliza para a importância do livro utilizado como recurso para a efetivação das práticas de leitura. Assim sendo, por entendermos a relação existente entre a história das práticas de leitura em concomitância com os livros utilizados para essa finalidade, passemos a refletir sobre eles, considerando o que nos coloca Lajolo (1999, p.91):

As pesquisas até agora desenvolvidas apontam o papel central representado pelo livro didático no panorama da história das práticas de leitura no Brasil, uma vez que ele (o livro didático) sempre esteve em posição hegemônica devido à intensidade de seu uso e à obrigatoriedade de seu manuscrito no interior das práticas de leitura.

Endossando o que nos diz a referida autora, Tokarnia (2013) reitera que quase todos os professores da escola pública no Brasil (98%) usam livros didáticos13. Ainda segundo ela, com base no levantamento efetuado pelo Instituto Pró-Livro, os livros didáticos ocupam o segundo lugar entre os livros mais lidos pelos brasileiros, logo após a Bíblia. Em depoimento, complementa essa informação a afirmação de Bittencourt (apud TOKARNIA, 2013): “O livro didático é, ainda, hoje, a principal ferramenta de professores e alunos, e ainda é o principal referencial educativo”. É sob esse viés que passaremos a refletir sobre o livro didático.