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Para concluir, é importante uma discussão específica sobre as relações estabelecidas pelos estudantes entre mídia, inserção das mídias no ambiente escolar, educação para as mídias e ensino das ciências, embora aspectos dessas relações tenham sido destacados ao longo de todo este capítulo. Um primeiro aspecto a ser destacado diz respeito ao fato de que apenas um licenciando, na abordagem do polo da produção midiática em suas sínteses, ao tratar das interações das instituições midiáticas com outros atores sociais, aponta também os interesses de atores e instituições associados à prática científica na informação sobre Ciência e Tecnologia que é veiculada, destacando que o desvelamento dessa relação deve fazer parte dos objetivos da educação para as mídias. Esta é a única menção a este objetivo, já que ele está ausente das produções em grupo. Embora outros quatro estudantes apresentem nas sínteses, como objetivo do tratamento das mídias como objeto de estudo na dimensão analítica a problematização da representação da Ciência marcada pelas mitologias da neutralidade e dos resultados, o fazem atribuindo a origem desses mitos à própria mídia. Ou seja, assim como observamos inicialmente sobre a indústria midiática, também a reflexão sobre a Ciência não aborda a discussão sobre suas relações com sistemas vigentes de dominação e estruturas de reprodução de poderes hegemônicos.

Especificamente sobre a inserção das mídias no ambiente escolar do ensino das ciências, são 13 os estudantes que abordam o tema nas sínteses, sendo que seis o fazem na perspectiva de remediação de efeitos negativos das mídias frente à identificação das possibilidades de uso das produções midiáticas como fonte de conteúdo e/ou ferramenta pedagógica ou apenas porque os estudantes já têm contato com essas produções fora do ambiente escolar. Cinco outros estudantes que abordam especificamente o ensino das ciências são aqueles cujas produções trazem aportes que podem ser identificados com a perspectiva da preparação para o uso das mídias – e que abordam o potencial de desenvolvimento do olhar crítico sobre a Ciência a partir das produções midiáticas – e outros dois estão entre aqueles que não puderam ser identificados com as perspectivas de proteção ou preparação, mas também tratam da possibilidade de desenvolvimento do olhar crítico sobre a própria Ciência a partir da análise de como é retratada pela mídia.

No entanto, um aspecto que, indiferentemente de como compreendem a associação entre ensino de ciências e educação para as mídias, chama atenção em relação a todo esse grupo de estudantes é que a abordagem da inserção das produções midiáticas no contexto do ensino das ciências é bastante limitada. Isto porque, ao abordarem a dimensão do uso das mídias como fonte de informações, cinco desses estudantes restringem-se a considerar que elas já o são fora do ambiente escolar, e três sequer registram essa constatação. Dos cinco estudantes que falam sobre o uso intencional das mídias como fonte de conteúdo para o ensino das ciências, três apenas registram essa possibilidade, sem justificá-la. Assim, apenas dois trazem abordagens mais complexas desse uso, com um licenciando falando da característica de simplificação do discurso científico pela mídia e outro na possibilidade de trabalhar com informações mais próximas ao estágio atual de desenvolvimento da Ciência. Já em relação ao uso das mídias como ferramenta pedagógica, são seis os estudantes que o abordam especificamente em relação ao ensino das ciências, sendo que três se restringem ao potencial advindo do poder de atração das mídias advindo do sensacionalismo com que tratam da Ciência e Tecnologia e, assim, apenas três os que associam às mídias o potencial de contribuir para conferir sentido e relevância aos conteúdos escolares. Por fim, na dimensão do olhar para as mídias como objeto de estudo, como já registrado, seis desses 13 estudantes tratam apenas da remediação dos efeitos negativos do contato com as produções midiáticas, sendo que os outros sete estudantes abordam o desenvolvimento do olhar crítico tanto para a mídia quanto para a Ciência.

Também nas propostas de atividades didáticas apresentadas pelos estudantes são pouco exploradas as possibilidades de inserção intencional das produções midiáticas no ensino das ciências. Como vimos, dos cinco grupos, apenas o Grupo 2 justifica a relevância dessa inserção, afirmando a importância da compreensão de como o tema escolhido pelo grupo – sexualidade – é tratado pela mídia e, também, do papel das produções midiáticas na formação de opinião sobre a diversidade. Os outros grupos parecem tratar dessa inserção apenas como pretexto para a abordagem de temas considerados relevantes por si só, sem tratarem especificamente do objetivo do uso das produções midiáticas no tratamento desses temas em ambiente escolar. Ao tratarem das produções midiáticas como possíveis fontes de conteúdo para o ensino das ciências, dois grupos partem somente da constatação de que elas já são fontes de informação fora do ambiente escolar (grupos 2 e 4), um apenas registra a possibilidade de inserção intencional (Grupo 1) e os outros dois tratam das produções midiáticas como uma espécie de “cardápio de argumentos” a serem utilizados pelos alunos em debates sobre os temas selecionados (grupos 3 e 5). Já em relação ao uso das mídias como ferramentas pedagógicas, embora as produções de três dos cinco grupos sugiram o uso para motivação e/ou aproximação de conteúdos escolares do cotidiano dos alunos (grupos 1, 3 e 5), essas menções não são desenvolvidas nas propostas didáticas apresentadas. Por fim, na abordagem das mídias como objeto de estudo, vimos que a dimensão criativa está praticamente ausente e, em relação à dimensão analítica, a perspectiva preponderante é a de proteção contra efeitos deletérios das produções midiáticas, e mesmo as menções a essa perspectiva são escassas nas produções concretizadas na disciplina.

Esses resultados apontam na direção da necessidade tanto de pesquisas futuras quanto de atenção, no planejamento de políticas e estratégias de formação de professores de ciências e de inserção das produções midiáticas no contexto escolar, a reflexões e práticas voltadas à consolidação de uma relação mutuamente benéfica e produtiva entre o ensino formal das ciências e aprendizagens informais concretizadas na interação com as produções midiáticas com conteúdos de Ciência e Tecnologia. Além desta, compreendemos como uma das contribuições mais relevantes da pesquisa aqui relatada a construção e aplicação de um conjunto de categorias e, considerando os resultados alcançados, constatação de seu potencial para apreensão do relacionamento de futuros professores e, também, professores já em exercício, com a mídia e de suas expectativas em relação à inserção das produções midiáticas no ambiente escolar. Assim, vislumbramos no horizonte, como possibilidades de continuidade dos esforços aqui iniciados, o

uso destas categorias em pesquisas futuras junto a outros grupos e, também, em contextos diferentes daquele onde foram produzidos os dados da presente pesquisa – como, por exemplo, fora de ambientes de educação para as mídias –, bem como a utilização dos resultados desta e de pesquisas futuras como subsídios à elaboração de políticas e projetos de educação para mídias voltados especificamente a professores de ciências em formação.