• Nenhum resultado encontrado

Um outro aspecto que chama a atenção nos resultados da análise realizada são as abordagens de temas relacionados às tecnologias de informação e comunicação e, também, ao uso da linguagem pela mídia. Nos relatórios dos exercícios de análise crítica, como vimos, não houve registros de reflexões sobre as tecnologias utilizadas para produzir e distribuir produções midiáticas, demonstrando a falta de atenção às características definidoras do atual cenário de digitalização e convergência midiática, tais como a multimodalidade e a interatividade. Nas sínteses, nos olhares sobre o polo da produção midiática, foram 12 os estudantes que trataram, de alguma forma, dessas tecnologias. No entanto, destes, quatro apenas associam o desenvolvimento recente das tecnologias de informação e comunicação à grande quantidade de informações produzidas na atualidade e à velocidade com que circulam, sendo que outros seis, como já destacado anteriormente, associam esse aspecto à ampliação do poder da mídia. Dois outros estudantes associam essas tecnologias a diferenças nos produtos midiáticos, sendo que um apenas registra que diferentes tecnologias resultam em diferentes tratamentos da informação e outro destaca o poder de atração conferido às mídias pelas novas tecnologias de informação e comunicação. Já na análise dos olhares sobre os textos midiáticos presentes nas sínteses, também não houve registro de reflexões sobre efeitos do uso de diferentes tecnologias sobre os sentidos produzidos. Ou seja, também as tecnologias ficam, preponderantemente, de fora da equação que resulta na compreensão da produção midiática como um processo social, aparecendo muito mais como meios neutros para a disseminação de produções midiáticas do que como definidoras de características que caracterizam a particularidade da cultura da mídia na sociedade contemporânea. Em outras palavras, as transformações advindas do desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação são descritas muito mais em termos quantitativos do que qualitativos.

Na abordagem da inserção das produções midiáticas no ambiente escolar e da educação para as mídias, a inserção das tecnologias de informação e comunicação como suporte ao processo de ensino e aprendizagem, como ferramenta pedagógica e/ou foco de problematização pelo professor e junto aos alunos, também não aparece, o que reflete, em parte, o contexto de produção dos documentos que foram objeto de nossa análise, já que a disciplina em que foram

produzidos teve foco especificamente na inserção das produções midiáticas, e não das TICs como suporte ao ensino. No entanto, essa ausência de reflexões sobre implicações sociais, culturais e educacionais do uso dessas tecnologias pode indicar que essa reflexão não parece prioritária para os estudantes, o que merece atenção. Além disso, vale destacar que, nos olhares sobre as audiências e os processos de recepção, apenas um estudante aborda, em uma de suas sínteses, a questão de novas desigualdades e exclusões sendo criadas pelas oportunidades de acesso a dispositivos digitais e à Internet, bem como que a dimensão criativa da educação para as mídias – cujos potenciais foram imensamente ampliados pelo desenvolvimento recente das TICs – é abordada na produção de apenas seis estudantes nas sínteses e em nenhum dos relatórios produzidos pelos grupos, sem que seja mencionada a relevância da criação de mídia alternativa ser acompanhada de processos de reflexão sistemática e autoavaliação, resultados que também evidenciam essa pouca atenção às implicações das características próprias dessas novas tecnologias.

Já em relação à linguagem, destaque deve ser dado ao fato de que, nos olhares sobre os textos midiáticos, apenas seis estudantes registram, em suas sínteses, reflexões sobre as linguagens utilizadas e, destes, um apenas reconhece que há o uso intencional da linguagem e outro que diferentes mídias utilizam linguagens distintas. Outros três estudantes registram – ainda que bastante superficialmente – reflexões sobre os efeitos das linguagens sobre os sentidos produzidos, e um único estudante aborda, e também superficialmente, os gêneros, códigos e convenções da linguagem midiática, sem, no entanto, tratar de seus efeitos sobre os sentidos produzidos e, tampouco, dos processos pelos quais se tornam familiares às audiências. Além disso, na abordagem da educação para as mídias, ainda no que diz respeito às sínteses individuais, apenas três estudantes tratam da necessidade de realização de atividades de análise textual e, novamente, de modo bastante pontual.

Já nos relatórios, destaca-se o fato das propostas de atividades didáticas também não preverem explicitamente a realização de atividades de análise textual. Também estão ausentes, dos relatos do exercício de análise crítica de mídia, reflexões sobre uso de diferentes linguagens em diferentes mídias e sobre convenções, códigos e gêneros das linguagens midiáticas e dos diferentes sentidos por eles produzidos, sendo este um dos principais resultados a serem destacados da análise dos relatórios, já que, como discutido no Capítulo 4, os grupos trataram de produções identificadas com gêneros bastante distintos – notícias, entrevistas, colunas de opinião

e, até mesmo, produções não midiáticas, como artigos acadêmicos, manifestos e materiais com fins didáticos – sem considerarem essa distinção. Só o que está presente nos relatórios de três dos cinco grupos são reflexões sobre os efeitos das linguagens sobre os sentidos produzidos, sendo que em um deles o registro é bastante pontual.

Porém, talvez o aspecto mais relevante no que diz respeito às reflexões sobre tecnologias e linguagens seja a ausência quase total da abordagem específica sobre as imagens – estáticas ou em movimento – presente na produção midiática contemporânea. Nas sínteses, apenas um estudante faz uma brevíssima reflexão sobre o registro em vídeo de um fato corresponder ou não ao fato em si. Já nos trabalhos produzidos em grupo, como visto, são poucas as menções às imagens presentes nas produções analisadas e, quando existem, tratam-se apenas do registro de sua presença, sem reflexões associadas. Ou seja, mesmo estando inseridos em uma cultura em que as relações sociais são mediatizadas por imagens, como formulado por Guy Debord (2000) em um momento em que a supremacia das imagens estava muito longe de ter se consolidado como nos dias atuais, os estudantes cujas produções foram objeto de nossa análise aparentemente mantêm a tendências a priorizar a cultura escrita em relação aos demais modos de expressão.