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5.1 Os terapeutas antigos

5.3.1 Mara e as mães solidárias

Figura 41 - Mara e as Mães solidárias

Fonte: <http://www.rededefundos.org.br/membro_historias.php?id=45>. Acesso em: 15 mai. 2020.

Mara nasceu na zona rural de Uruçuca, onde vivia com seus pais e irmãos até os quatro anos de idade, quando se mudaram para o município. Apesar não saber ao certo o motivo, o período coincide com o momento de declínio do cultivo do cacau, ocasionando grande migração da zona rural para a zona urbana na região (como descrito no Capítulo 1). Ela cresceu em Uruçuca e trabalhou como empregada doméstica até fazer o curso Técnico em Enfermagem e assumir o cargo de agente de saúde, em 1999, no recém-criado Posto de Saúde da Família. Após se mudar para o distrito, passou a se envolver com as questões sociais da comunidade, tanto como agente de saúde quanto moradora.

Conforme seu relato, por volta de 2007, durante as consultas para aferir a pressão no Posto de Saúde, ela recebia frequentemente reclamações dos pais sobre a escola, justificadas como motivo de nervosismo para os responsáveis. Coincidentemente, nesse período o Instituto Arapyaú99 iniciava a elaboração do DPR de Serra Grande. Neste movimento, a comunidade participava de várias reuniões para decidir quais os principais problemas e as

soluções possíveis. Na mesma época Mara estava preocupada com a escola e com a educação de seu filho matriculado na Escola Municipal Prísco Viana, e refletia sobre o que poderia fazer para melhorar as condições de estudo das crianças da comunidade. Foi assim que ela começou a participar da elaboração do DPR.

Durante a realização do Diagnóstico Participativo Rural, ela conta que houve uma dinâmica em que a vila era comparada a um cacaueiro, sendo necessário identificar os frutos podres. Como Mara afirma, foram identificados vários problemas, especialmente o transporte e a merenda escolar. Assim, o Instituto, responsável pelo DPR, criou Grupos de Trabalho (GT) para atuar nas áreas definidas. Mara ficou responsável pelo GT de merenda, junto com algumas outras mães da escola que se voluntariavam para fazer uma merenda mais saudável para as crianças.

Dentro desses alunos, muitos chegavam às seis da manhã, porque vinham da roça, e a primeira refeição deles era só às dez horas, e ainda por cima ruim. Aí menino nervoso, muita briga, muita dificuldade. Aí o Arapyau entrava com o dinheiro e a gente com a mão de obra voluntária pra fazer a merenda e levar na escola. No início era um grupo grande e, no final, ficamos, eu, Gura, Soliene, Marlene, Dona Maria, Olga e Dalva (Mara, 2018).

Foi assim que surgiu o Projeto “Merenda Solidária”. No início, em 2011, Mara conta que elas trabalhavam na cozinha de sua casa, mas no ano seguinte a prefeitura trouxe o grupo para dentro da merenda escolar100: isso significava ter um espaço para a elaboração da merenda, apoiado pela prefeitura. Assim foi a dinâmica da merenda até o ano de 2013. No ano seguinte, mudou a prefeitura do município e, consequentemente, o projeto. Como já foi dito anteriormente, o poder público em Uruçuca parece oscilar entre duas famílias.

Até o ano de 2013 era o governo do Moacir, mas em 2014 começou o governo da Fernanda, aí mudou tudo. O secretário de saúde, que era o irmão de Fernanda, Fabrício Silva, ele não teve mais interesse em nos chamar. O dinheiro quem dava era o Arapyau, a prefeitura dava o espaço e ele não deu mais o espaço (Mara, 2018).

Com o fim do apoio da prefeitura, o Projeto Merenda Solidária perdeu a entrada na escola, que voltou a fornecer a merenda como era feita antes do projeto, uma alimentação muito pobre nutricionalmente e montada por um funcionário da prefeitura. Mara destaca que, tanto durante o desenvolvimento do DPR quanto nos anos que se seguiram com sua

100 A merenda escolar é um espaço da prefeitura, como um grande salão com alguns equipamentos de cozinha

localizado no outro extremo da praça Pedro Gomes. É lá que é feita a merenda, já que os prédios das escolas Municipais não possuem cozinha.

participação na Merenda Solidária, tornou-se evidente que a alimentação da comunidade era uma questão para muitas famílias carentes. Diante disso, em 2015 o grupo submeteu o Projeto Mães Solidárias a um edital aberto pelo Consulado da Mulher e foram contempladas. O projeto visava a elaboração de um sopão, nutricionalmente rico e balanceado, para a comunidade carente, distribuído quinzenalmente. Com a verba, as mães solidárias conseguiram adquirir freezer, fogão e arcar com os custos dos alimentos para o sopão durante um ano.

Essa estrutura foi montada e mantida em uma casa alugada pelo Instituto Arapyau, que funcionava como um espaço para receber crianças durante o dia, como apoio aos pais do Bairro Novo que precisavam trabalhar e não tinham com quem deixar seus filhos. Porém, em 2016, o Arapyau reformulou suas estratégias de ação nas comunidades atendidas e retirou alguns auxílios, como o aluguel da casa em que acontecia o projeto.

Desde então, as Mães Solidárias vêm buscando novas formas de manter o sopão solidário por meio de doações da comunidade em alimentos, mão de obra e lugar para a elaboração da sopa. Atualmente, elas oferecem serviços de alimentação (café da manhã, almoços e lanches) que podem ser contratados para eventos, sendo a verba destinada à manutenção do projeto.

Em 2019, conheci o novo espaço das Mães Solidárias às margens da represa do rio Pancadinha, que foi doado pela Associação de Moradores da Represa. Até o momento o espaço não possui banheiro, rede de esgoto e energia, o que torna o trabalho ainda bastante precário.

As mães solidárias vêm atuando dentro de Serra Grande sempre articulando e promovendo ações que despertam a vontade nas pessoas, para que busquem os seus direitos e deveres sociais que consistem na melhoria de vida. O projeto já funciona há quase dez anos e se tornou amplamente conhecido, tendo em vista que essas mulheres que compõem a equipe mantêm o espírito solidário para gerar uma melhor qualidade de vida na família. Através delas, que são multiplicadoras de opinião, e o que ela aprende é usado com toda a família, causando mudança no comportamento dos filhos e companheiro.

Trabalhar coletivamente despertou neste grupo o desejo de empreender uma ação permanente para assegurar a cultura da região, transferir conhecimento, despertar para uma alimentação mais saudável e melhor qualidade de vida. E também do voluntariado da comunidade. Solidariedade! É a palavra que melhor expressa a riqueza deste trabalho. (Página Facebook Mães Solidárias101)

101 Disponível em:<https://www.facebook.com/M%C3%A3es-Solid%C3%A1rias-1555907874641392/>. Acesso