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CAPÍTULO 4 PARENTALIDADE E A PRAXIOLOGIA DA DISCIPLINA

4.3 METODOLOGIA DA DISCIPLINA POSITIVA – NÍVEL EDUCADOR

Figura 9 – Baralho de Ferramentas

Fonte: Série Disciplina Positiva/baralho – Jane Nelsen e Lynn Lott – Editora Manole

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O processo de educação parental pela filosofia da Disciplina Positiva que rege as relações entre pais e filhos é instrumentalizado com o emprego de 52 ferramentas práticas desenvolvidas pela Dra. Jane Nelsen, que podem ser utilizadas, individual ou agrupadas, para guiar os pais na rotina da educação dos filhos. São estratégias, conectadas entre si, utilizadas para a educação das crianças, com a premissa de não usar a punição em nenhum momento de sua aplicação. As características que interligam uma ferramenta a outra podem ser reconhecidas na prática do respeito mútuo, na observação das necessidades da criança, na identificação da causa do comportamento, na comunicação sem ruídos, na cumplicidade para a resolução de problemas, na disciplina não punitiva e na valoração do estímulo ao invés do elogio ou da compensação (NELSEN, 2015).

Com a proposta de popularização, facilitação de acesso e convite interativo à participação das crianças, as 52 ferramentas foram impressas (desenho e texto) em forma de um baralho de cartas (Figura 9).

Todas as ferramentas da Disciplina Positiva seguem cinco critérios básicos: encorajamento do respeito mútuo; desenvolvimento na criança do senso de aceitação e importância; efetividade a longo prazo; ensino de habilidades sociais e de vida; e o incentivo à criança para descobrir a sua capacidade interna.

Quadro 11 - Ferramentas/estratégias da Disciplina Positiva

(continua) Quadro de rotina  Elaborar uma lista da rotina diária com a participação da criança. Dependendo da idade podem ser utilizados desenhos ou fotos para indicar cada momento da rotina. A intenção, com respeito e flexibilidade, é criar uma ordem e não obediência rigorosa a horários.

Escutar de perto  Reservar um tempo na sua semana para sentar-se ao lado da criança, em silêncio, apenas observá-lo e demonstrar proximidade. Se eventualmente indagado, empregar respostas curtas e objetivas.

Empoderar seu filho  Convidar a criança para que tome decisões junto com o adulto. Decisões da rotina doméstica, intensificando sua participação conforme a idade da criança. Permitir e estimular que a criança realize atividades individuais, mesmo que não cheguem a perfeição.

Conexão antes de correção

 Buscar se colocar no lugar da criança antes de corrigi-la. Conversar e buscar entender os motivos que fizeram agir de determinada maneira. Manter vínculo empático durante o processo de correção.

Reconhecimentos  É mais do que um elogio. É admirar, apreciar, reconhecer as gentilezas e o esforço que as crianças demonstram em suas atitudes. Enfatizar o envolvimento e compromisso da criança em suas atividades e relacionamentos.

Abraço  Forma mais simples de conexão com a criança. Deve ser empregado sempre que se percebe que a criança está em um processo emocional difícil (contrariedade, raiva, decepção, tristeza, frustração entre outros)

Quadro 11 - Ferramentas/estratégias da Disciplina Positiva

(continuação) Olho no olho  Ao determinar um comando ou buscar compreensão do que se fala é indispensável buscar os olhos da criança, efetivando a conexão e inibindo a desatenção, o descontrole e a irritação mútua.

Encorajar  Validar as atitudes da criança, incentivando para a coragem, compromisso e responsabilidade. Auxilia na superação dos medos e inseguranças.

Destruir e redirecionar  Afastar a criança, sem uso de punição ou ameaça, de uma atividade negativa ou perigosa e simultaneamente direcionar sua atenção para outra ação ou comportamento.

Ouvir  Ouvir a criança com paciência, sem interrupção ou julgamentos. Se necessário, indagações objetivas e sem censura.

Validar os sentimentos  Se envolver na fala da criança quando esta demonstra seus sentimentos, sem menosprezo, ridicularização, ironia ou soberba, independentemente do tema. Firmeza e gentileza  Buscar o meio termo sempre, ser firme para determinar os limites e valores

sociais e, ao mesmo tempo, ser gentil, respeitando as dificuldades, limitações e característica da criança.

Encorajar e elogiar  Valorizar o processo que a criança construiu e não somente valorar o resultado a qualquer meio. Reconhecimento da dedicação e envolvimento da criança para conquistar determinado resultado.

Motivar  É preciso motivar a criança para que ela adote atitudes positivas ao invés das negativas, e não usar de métodos punitivos como correção. A motivação tem um lócus interno e a punição, externo.

Focar na solução  Depois de identificado o problema, buscar, com a participação da criança, possibilidades para a sua resolução. A repreensão coercitiva em nada auxiliará na compreensão dos fatos para uma mudança de postura, tampouco resultados a longo prazo.

Limitar o tempo da tela  Concessão e controle de todos os eletrônicos disponíveis na proporção da idade da criança. O uso ilimitado ou exagerado pode resultar em vícios, fugas e isolamento, reduzindo consideravelmente o tempo de interação entre adultos e crianças.

Erros  Utilizar dos erros como incentivo para o aprendizado, sem culpas, sem condenações e sem punições.

Recuperar erros  Funciona em simetria com os três Rs: reconhecimento do erro; reconciliar com o outro e, por último, a resolução do problema. Proporcionar um ambiente dialogal.

Resolver problemas  Buscar a resolução de problemas sempre com a participação do grupo familiar, respeitando a opinião de todos, independentemente da idade. A procura participativa pela solução valora o compromisso de sua aceitação e cumprimento das medidas adotadas

Acordos  A combinação deve ser feita anteriormente aos fatos, caso contrário, serão compreendidos como represália. Estabelecer com a criança atitudes a serem adotadas na ocorrência de determinadas situações. Sem surpresas, o que foi acordado deve ser cumprido.

Agir sem palavras  Em caso de descumprimento do combinado, o adulto deve parar o que está fazendo e apenas ficar calado ou se distrair com alguma outra atividade próxima da cena. Essa postura faz com que a criança perceba que é o seu comportamento que interrompeu o que se estava fazendo. Ficar calado significa não acusar e nem relembrar porque se tomou a medida de se calar. Sinal secreto  Combinar com a criança algum sinal (silencioso ou secreto) para que pais e

filhos possam se comunicar sem interromper a programação de um ou de outro. Um gesto qualquer pode ser efetivo para chamar a atenção do outro.

Quadro 11 - Ferramentas/estratégias da Disciplina Positiva

(continuação) Uma palavra  Usar determinada palavra para lembrar do que foi acordado anteriormente sobre as responsabilidades. Essa palavra serve para chamar a atenção da criança, fazendo-a relembrar do que foi conversado anteriormente. Essa prática evita que, cada vez que não se cumpre o combinado, se repita todo o discurso de desaprovação.

Acompanhar  Quatro formas de contribuição para a eficácia dos combinados: conversa com a criança sobre o problema, ouvir todas as opções de melhor resolver a questão, escolher a melhor opção segundo a maioria e estabelecer um prazo para verificar se o planejado está dando certo ou para estabelecer novos acordos. O acompanhamento das obrigações assumidas por todos é necessário para despertar o senso de responsabilidade e compromisso.

Mesada  Tem como fim a aprendizagem do controle do dinheiro. Assim, é indispensável que a criança tenha muito claro o dia, o valor e para quais gastos se destina à sua mesada.

Evitar de mimar  Permitir que as crianças participem de todas as atividades possíveis na rotina doméstica e nas decisões de família, sob pena de manifestar o sentimento de dependência, incapacidade e desajustamento para resolver problemas.

Ensinar o que deve ser feito

 Priorizar os comandos positivos do que a criança pode fazer, justificando os benefícios resultantes. O discurso do „não pode‟ se apresenta como repressão e punição.

Investigar tempo em treinamento

 A aprendizagem da criança se faz na prática das atividades. É necessário que elas sejam ensinadas a executarem suas tarefas, pois apenas o exemplo é insuficiente para o acerto. É preciso investir tempo com a criança.

Pequenos passos  Os ensinamentos e realizações de tarefas devem ser dosados e fatiados para as crianças, respeitadas as idades e limitações.

Praticar  Praticar com a criança antes de efetivamente ela desenvolver e executar as tarefas. O exercício precisa ser repetido inúmeras vezes para que a criança se torne segura e autônoma.

Letting go/deixar  Oportunizar que a criança realize as tarefas por conta própria, mesmo que inacabada ou desconforme. As tentativas precisam ser valoradas e fazem parte do aprendizado. Não significa abandonar a criança, mas tampouco não deve ser desestimulada a tentar.

Espelhar  Não ficar aguardando que a criança perceba por conta própria que as tarefas não foram realizadas ou estão inacabadas. Apontar o que se está vendo, sem contudo repreender ou punir.

Mostrar fé  Demonstrar ostensivamente que acredita na capacidade, responsabilidade e compromisso assumido pela criança em todos os seus propósitos.

Prestar atenção  A criança precisa se sentir aceita e importante para os adultos e para o grupo familiar. Essa necessidade exige que o adulto perceba e se envolva com as manifestações da criança, valorando suas conquistas e conjecturas.

Tempo especial  Programar (e cumprir) com a criança um momento do dia ou da semana em que realizarão alguma atividade juntos, respeitando os interesses da criança. Senso de humor  Privilegiar o senso de humor nos momentos emocionais difíceis da criança

(raiva, frustração, ciúmes, brigas entre outros) buscando diminuir a tensão no ambiente.

Perguntas curiosas  Substituir os questionamentos impositivos (autoritários) por perguntas que levem a criança a ter opções de resposta. Ao invés de cobrança (Por quê?) trocar por indagação (Como podemos.?)

Escolhas limitadas  Substituir um comando imperativo por uma oferta de opções limitadas para a criança escolher. Ao invés de mandar fazer se pergunta como quer fazer.

Quadro 11 - Ferramentas/estratégias da Disciplina Positiva

(continuação) Colocar as crianças no

mesmo barco

 Nas desavenças entre os irmãos, o adulto não deve se solidarizar com nenhum deles. Não havendo situação de risco ou agressão, permitir que os envolvidos achem a melhor solução. Se não chegarem a um consenso, o adulto oferecerá opções para eles decidirem onde, quando e como querem voltar a tratar do assunto.

Reunião de família  A base de todas as outras ferramentas. A reunião de família é indispensável para a participação de todos os membros da família. Escolher um dia e horário que todos possam participar. Não deve ultrapassar 20 minutos e a pauta da reunião fica em aberto até o dia da reunião. Sugere-se que um caderno fique à disposição durante a semana e cada membro que achar que algo não está funcionando vai anotando neste caderno. No dia da reunião, se discutem os temas e se procura uma solução, com a conivência de todos.

Entender o cérebro  Compreender que, quando se age com a emoção, se está liberando o lado primitivo do ser humano, movido pelos impulsos e instintos. Procurar agir com racionalidade. A racionalidade deve prevalecer nos momentos de tensões. Pausa positiva  Quando os ânimos estão exaltados, o ideal é buscar um local para repensar e controlar as emoções. O local pode ser escolhido e preparado para a criança. Não se trata de um lugar de castigo ou de pensamento, mas um local que faça bem para a criança, que a acalme. O ambiente deve ser nominado pela criança.

Controlar o seu comportamento

 O adulto deve ser um modelo de autocontrole. A criança deve ter ciência de quando o adulto está irritado e precisa de um tempo para refletir.

Roda de escolhas  Com a participação da criança se faz uma relação de possibilidades para resolver os problemas. Desenha-se uma roda fatiada e se coloca fotos, gravuras, desenhos em cada uma das partes para indicar uma das possibilidades. No momento da tensão se busca com a criança rodando a roda para se indicar qual atitude se deve adotar naquela situação. Deixa de ser uma imposição e representa uma escolha da criança anteriormente estabelecida, inclusive por ela.

Roda de escolhas da raiva

 No mesmo formato da roda de escolhas, se colocam as atitudes que a criança deve adotar quando está com raiva. Anota-se as sugestões da criança do que fazem bem a ela. Assim, quando vivencia uma situação desgastante (raiva) a criança vai utilizar a roda de escolhas da raiva para realizar alguma das sugestões anteriormente anotadas.

Decidir o que você irá fazer

 A disputa de poder deve ser evitada, assim, previamente se estabelece os momentos em que o adulto poderá estar disponível. A postura deve ser firme no sentido de que se deve respeitar o combinado.

Revidar  Evitar a discussão de qualquer forma. Deve validar o sentimento da criança, reconhece que exagerou e busca uma alternativa. Recupera as rédeas da situação.

Tarefas  Todos devem ser incluídos nas tarefas domesticas, respeitadas as limitações de cada idade. Deve ser compreendida como trabalho em grupo no sentido de cooperação e não ajuda.

Consequências naturais  Não existe intervenção do adulto. A criança ciente das consequências naturais passará a se responsabilizar pelas suas obrigações. Os adultos não devem protege-la a ponto dela acreditar que não precisa se preocupar com os seus compromissos.

Consequências lógicas  Não se pune pelos atos praticados pela criança. Os resultados são consequências das escolhas. São quatro os critérios para distinguir entre uma consequência lógica e punição: comportamento adotado; respeitosa; razoável e por fim, revelada com antecedência.

Quadro 11 - Ferramentas/estratégias da Disciplina Positiva

(conclusão) Ganhar cooperação  Cinco passos para conquistar a criança para que ela coopere: expressar entendimento, compreensão, validar o sentimento da criança em razão do posicionamento, sem contudo concordar com ele; demonstração de empatia com a condição da criança (se colocar no lugar dela); compartilhar com a criança alguma situação que tenha experimentado semelhante ao que a criança está vivenciando; compartilhar com o seu filho os sentimentos desse momento; focalizar uma solução para a situação em parceria com a criança. Desvendar o código  Desvendar o código do mau comportamento. Entender que atrás do

comportamento inadequado tem sempre uma crença. Não adianta trabalhar o comportamento e sim observar o como a criança está se sentindo. Toda criança precisa ser aceita e se sentir importante. O comportamento pode ser resultado de uma busca pela atenção e afetividade. O mau comportamento é o instrumento que a criança emprega para se fazer notar.

Fonte: Adaptado de: Nelsen (2015)

Em razão da Disciplina Positiva ter como proposta a construção de uma conexão entre pais e filhos, as cinquenta e duas ferramentas representam um „caminho‟ de facilitação à compreensão do porquê dos comportamentos mais comuns das crianças e de algumas atitudes dos adultos que podem ser mais apropriadas para determinadas situações. Suas práticas sugerem um maior envolvimento do adulto com a criança, valorando o diálogo, a troca de olhares, a postura, a entonação da voz, a firmeza dos comandos, o cumprimento dos combinados, respeito às necessidades das crianças e às suas emoções, a escuta compreensiva, entre outras.

No entanto, considerando as singularidades de cada relação parental e a diversidade das rotinas familiares, reconhece-se que são apenas ferramentas de apoio e que servem de alicerce para alguns posicionamentos. Não têm caráter exaustivo e nem a pretensão de modelo. Destina-se a pais conscientes e envolvidos no aprimoramento da educação positiva, sendo assim, insuficientes por si só, ao enfrentamento de uma cultura punitiva.